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Não constituem infração administrativa omissão da ans em face de direito do consumidor no PROCON

Não é relação de consumo

Não constituem infração administrativa omissão da ans em face de direito do consumidor no PROCON. Não é relação de consumo

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INFRAÇÃO DA ANS FRENTE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NÃO CONFIGURADO

RECLAMAÇÃO: FA n.º.  4613-062.656-2

RECLAMANTE: XXXX

RECLAMADA(S): ANS -  AGENCIA NACIONAL DE SAUDE

DECISÃO ADMINISTRATIVA

RELATÓRIO                                                      

Trata-se de Reclamação proposta pela Consumidora XXX, devidamente qualificado nos autos, contra a Empresa Reclamada ANS -  AGENCIA NACIONAL DE SAUDE: Reclama a consumidora que possuía um plano UNIMED GUARARAPES (plano AMB-H-APT-OBS-ATC aco:APTO identidade do plano 99999996 cod.555) desde 27/01/1994. Em agosto de 2013, a reclamante solicitou à ANS, por telefone, a informação do parâmetro ($) para a sua portabilidade junto às outras operadoras. Só após vinte dias a reclamante obteve resposta de que o parâmetro eram dois cifrões ($$). Considerando esse parâmetro a reclamante verificou junto às operadoras constantes da tabela da ANS que só poderia utilizar a portabilidade especial para planos bem inferiores ao seu plano original, ou seja, apenas ambulatorial ou apenas hospitalar de emergência. Em 23 de setembro de 2013, foi aberto um protocolo pelo site da ANS, nº 2042789, pedindo esclarecimento sobre a possibilidade de migrar utilizando a portabilidade especial para um plano compatível com seu plano Unimed Guararapes (acima descrito), mesmo pagando uma mensalidade superior a que pagava. No dia 27/09/2013 a reclamante recebeu um e-mail da ouvidoria da ANS cuja resposta na esclareceu as dúvidas pendentes. Ademais, no dia 02 de outubro de 2013, a consumidora enviou nova mensagem à ANS a fim de explicar melhor toda a sua situação, tendo no dia 04/10 a resposta de que a ANS não escolhe os planos disponíveis para portabilidade, que os planos são definidos de acordo com a disponibilidade/ oferta de planos compatíveis na localidade onde beneficiário deseja contratar (em anexo). Diante do exposto a reclamante solicita da ANS uma resposta e uma solução para sua demanda sem que haja perda na qualidade do atendimento a ser contratado na nova operadora.

Registrada a Reclamação neste  Órgão em   15/10/2013, conforme se observa, as partes foram regularmente NOTIFICADAS juntamente  com  a consumidora  que foram notificados respectivamente através de Termo de Notificação e AR às ( fls.14 e fls. ) dos autos.

No dia designado para a audiência em 31/10/2013, às ( fls. ) dos autos, realizado o pregão, constatou-se as presenças do reclamante e do reclamado ANS -  AGENCIA NACIONAL DE SAUDE, através de seus representantes irregularmente conforme consta seus nomes em audiência. Não houve juntada de defesa escrita nos autos às ( fls. ).

No mais, verifico que a representação processual da ANS nos presentes autos, encontra-se deformada, pois é dever e zelo da administração pública confiar a sua função de representação publica a quem observa a aplicação das leis, pois a meu ver os prepostos presentes em audiência não provaram que tem delegação especifica para representarem a autarquia ANS, e para tanto verifico que a representação nestes autos encontra-se em confronto com os requisitos previsto no  ( Art.17, I da Lei Complementar Federal n.º.73/1993 ), “ in verbis”:

“Lei Complementar Federal n.º.73/1993

Art. 17 - Aos órgãos jurídicos das autarquias e das fundações públicas compete:

 I - a sua representação judicial e extrajudicial;”

No, entretanto, em face do acima mencionados, pois não se tratando de relação de consumo o que de plano se afasta a aplicação da lei consumerista frente ao objeto da reclamação, de forma que firme pretexto de deformidade de representação, apesar de insanável não merece prosperar tais considerações.

DA FUNDAMENTAÇÃO

O caso em pauta não se trata de relação de Consumo ou qualquer prática de desobediência, de forma que não poderá ser regido pelos  ( Art.2º e Art.55, § 4º da lei n.º.8.078/1990 ), já que em hipótese alguma foi demonstrada a existência de relação jurídica de direito econômico entre o conceito de fornecedor de um lado e consumidora do outro, vez que a autarquia federal em questão apenas tratar-se dentro das normas consumerista de Órgão articulador e fiscalizador juntamente com os órgãos de defesa da consumidora como se ver a seguir:

“Lei Federal n.º.9.961/2000

Art. 4o Compete à ANS:

XXIII - fiscalizar as atividades das operadoras de planos privados de assistência à saúde e zelar pelo cumprimento das normas atinentes ao seu funcionamento;

XXXVI - articular-se com os órgãos de defesa do consumidor visando à eficácia da proteção e defesa do consumidor de serviços privados de assistência à saúde, observado o disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990;”

Na presente lide não assiste razão a consumidora, vez  a autarquia pública federal ANS, exerce a função pública fiscalizadora e articula-se entre os órgãos de defesa da consumidora visando à eficácia e proteção as relações de consumo especifica a planos de saúde, pois se a mesma deixou de lado as suas obrigações inerentes a imposição das leis e regulamentos, caberia no mínimo reclamação junto ao órgão da controladoria federal, no sentido de apurar tais infrações administrativas peculiares as suas atribuições.

O Procon não tem competência absoluta para impor multas contra Autarquia Federal que tem a mesma função fiscalizadora dos órgãos de Defefa e Proteção ao Consumidor, porem as omissões ou negligências destas agencias frente ao seu papel especifico em seus deveres legais, cabe a sociedade e o próprio PROCON ajuizar ações civis públicas junto à Justiça Federal contra a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) por determinação da Secretaria Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor quando da eventualidade de descumprimento de normas e obrigações regulamentares.

A separação de Poderes na Constituição Federal não é um princípio que se possa mitigar ou desconsiderar sem maior consequência. É tão importante, que, além da chamada “Separação Horizontal de Poderes” (Executivo, Legislativo e Judiciário), fala-se hoje em diversas conformações desse princípio, porém toda e qualquer extrapolamento, deve ser precedido de lei autorizadora frente aos descasos.

Assim, existiria uma “Separação Temporal de Poderes”, para designar a necessidade de limitar-se temporalmente o exercício de poderes pelos agentes públicos; fala-se de uma “Separação Vertical de Poderes”, para explicitar a necessária divisão territorial de competências, sobretudo, no Estado federal; e fala-se também de uma “Separação Social de Poderes”, para designar a divisão de poderes entre os diversos agentes, mídia, associações, partidos e grupos sociais, todos podendo disputar com igualdade de chances o poder estatal o que não é o caso em discussão.

A proposta da separação dos poderes existente em nossa carta magna vai além de buscar a proteção da liberdade individual, tem por base também aumentar a eficiência do Estado, pois cada órgão do Governo  tornar-se-ia especializado em determinada função. Com isso, estas duas bases da teoria de  Montesquieu, acabavam por diminuir visivelmente o absolutismo dos governos.

O “Sistema de Freios e Contrapesos” é previsto também na Carta Magna de 1988, que significa dizer que a separação de poderes não é rígida, havendo sempre a possibilidade de interferência recíproca, ou seja, além de cada poder exercer suas competências ( funções típicas e assemelhadas ), estes fiscalizariam as competências dos outros ( exercendo funções atípicas, por exemplo, o que neste caso deve prevalecer sempre o respalde legal, como é o caso do Ministério Públioco e dos Tribunais de Contas ).

Em suma, como concretização da Teoria da Separação dos Poderes ou Teoria da Tripartição dos Poderes, a Constituição Brasileira de 1988, estabelece, em seu ( Artigo 2º ), que os Poderes devem ser independentes e harmônicos entre si, o que significa que, para a existência de conflitos sempre a nossa Carta Magna deve sempre dirimir e limitar ( Ar.4º, IV, V, VII da Constituição Federal ):

“Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

IV - não-intervenção;

V - igualdade entre os Estados;

VII - solução pacífica dos conflitos;

Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.”

Em suas razões às ( fls.18 ) a ANS através da Douta Procuradora responde lidimamente a controvérsia de forma cabal nos seguintes termos:

“De outra parte, a ANS NÃO PODE SER QUALIFICADA COMO FORNECEDORA DE PRODUTOS E SERVIÇOS, visto tratar-se de autarquia federal, que regula o mercado de saúde suplementar, devendo-se. pois. tal qualificação ser desconsiderada por ser inadequada e desprovida de fundamento legal.

Ademais disso, a ANS é regida pelo disposto no art. 37 da Constituição Federal, em especial no que tange à observância do princípio da legalidade na prática de seus atos, que, conforme ensina Hely Lopes Meirelles "(...) significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e dele não se pode ajustar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso", razão pela qual somente na hipótese de existir norma específica, é permitida a realização de acordo.

No contexto técnico obrigacional a ANS prestou todas as informações que foi de caráter cooperativo junto ao PROCON, bem como demonstrou que de fato esclareceu todas as dúvidas da  consumidora conforme relato da própria em sua reclamação, de forma que no contexto geral a ANS vem assumindo um papal importantíssimo na resolução dos conflitos em defesa dos consumidores e, a prova disse foi no dia 18 de fevereiro de 2014, a dita agencia, suspendeu as vendas de 111 planos de saúde, conforme noticia veiculada no Jornal do Commécio do dia 19/02/2014, que segue transcrita:

No mais, não poderia se ignorar as palavras da Douta Procuradora Federal que apesar de ausente a audiência, no entanto se fizeram marcantes e profundos esclarecimentos em suas explicações nos autos, quando diz:

“Assim, a ANS, dentro do seu poder de regulamentação do setor, não pode impor mais do que lhe é permitido pela Lei. já que sua intervenção no mercado deve ser conjugada com o princípio da livre iniciativa e assegurado, de qualquer forma, o devido processo legal aos envolvidos na causa.”

Por ultimo, devemos salientar o papel fundamental das agencias reguladora frente a nossa Carta Constitucional de 1988, que por sua vez autorizou a presença marcante da maquina estatal com o encargo de regular, normatizar, controlar e fiscalizar um tipo especifico de atividade econômica de interesse exclusivamente de caráter privado, só veio a fortalecer junto com os PROCON´S o papel fundamental do Estado como Nação com fins especifico de barrar os abusos. 

Esse papel importante das Agencias Reguladoras que nunca pode deixar de lado o seu verdadeiro papel em defender a consumidora, nem deve sofrer pressões de qualquer que seja, pois se encontra dentro dos patamares da mais alta expressão de legitimidade de poder fiscalizador frente aos planos de saúde.

Aliás, foi nesse contexto que o ( Art. 174 da Constituição Federal de 1988 ) previu que o Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica exercerá, na forma da lei, as funções de controle e fiscalização, incentivos e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado, que no caso em questão as Agencias Reguladoras como a ANS – Agência Nacional de Saúde foi espelhada e criada nada menos pelo ( Art.174, Caput da   Constituição  Federal ), “ in verbis”:

“Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.”           

A professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, em passagem de trabalho especifico sobre o tema menciona que,

 “a idéia se reforça com a norma do art.174 que, ao falar no papel do Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica, designa a intenção de reduzir o papel do Estado como agente prestador de serviços, que atua diretamente na ordem econômica (intervenção direta), e, paralelamente, realçar o seu papel de Estado regulador, que se limita a disciplinar, fiscalizar, reprimir a atividade econômica exercida pelo particular (intervenção indireta). O objetivo é que o Estado reduza a chamada intervenção direta exercida por meio de empresas estatais que atuam no domínio econômico, limitando-a as hipóteses previstas no art. 173, e acentue a intervenção indireta, que corresponde, em grande parte, ao poder de polícia exercido na área econômica. O Objetivo fundamental seria o de corrigir as deficiências do mercado e proteger o consumidor. (Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Omissões na Atividade Regulatória e Responsabilidade Civil das Agências Reguladoras. In. FREITAS, Juarez. (org). Responsabilidade Civil do Estado. São Paulo: Malheiros, 2006).”

Assim sendo, pois não demonstrado cabalmente a existência de relação de natureza consumerista, o que de plano se afasta a aplicação do Código de Defesa do Consumidor -CDC claramente demonstrado não existir obrigações a serem cumpridas em relação a fornecedores e consumidores conforme se verifica provados nos autos.

Portanto classifico que a ação em relação ao Reclamado é considerada regular nos termos da lei vigente  em relação ao objeto da lide, tornando-se a RECLAMAÇÃO como NÃO FUNDAMENTADA.           

DO ENQUADRAMENTO LEGAL

O caso em questão cabalmente já demonstrado em pauta que não tratar-se de relação de Consumo ( Art.2 e Art.3 e seguintes do CDC ), nem de infração de desobediência, não existe narração lógica ou fatos novos que pudesse atuar esse órgão fiscalizador frente a presente reclamação, pois em tese caberia a Douta Controladoria da União apurar a eficácia ou não da dita reclamação proposta pela consumidora, o que sem nenhuma dúvida também foge a alçada deste PROCON para apura os fatos narrados na presente reclamação por impossibilidade jurídica do pedido.

Contudo, não se vislumbra nenhuma lesão ou ameaça a direito da consumidora, devendo por isso, o presente feito ser reclassificado como sendo Reclamação NÃO FUNDAMENTADA, remetendo e sem mérito, devendo ser remetida ao arquivo.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, JULGO a presente reclamação como NÃO FUNDAMENTADA, em relação ao reclamado ANS -  AGENCIA NACIONAL DE SAUDE, vez que o presente caso concreto não tratar-se de relação de consumo, bem como não há existência de qualquer ato que viesse a constituir infração administrativa de natureza consumerista ou de qualquer ato desobediência, que ora pudesse ser evidenciada qualquer ilegalidade frente ao CDC e, por consequente seja a presente RECLAMAÇÃO EXTINTA COM A RESOLUÇÃO DO MÉRITO PELA TOTAL IMPROCEDÊNCIA da reclamação de ( fls.02 ) dos autos.

Recife, 19 de fevereiro de 2014

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JUSCELINO DA ROCHA

MAT. 318.582-6

OAB/PE n.º.17.840

Homologo a presente decisão. Remetam-se os autos ao arquivo.  

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JOSÉ CAVALCANTI DE RANGEL MOREIRA

GERENTE GERAL DO PROCON/PE


Autor

  • Juscelino da Rocha

    Sou advogado militante formado em Direito pela Universidade São Francisco São Paulo, Pós-Graduado Lato Senso em Direito do Consumidor, Pós-Graduado Lato Senso em Direito Processual Civil, Pós-Graduação Lato Senso em Negociação, Conciliação, Mediação, Arbitragem e Práticas Sistêmicas e cursando Pós-Graduação Lato Senso em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário; Ex-Secretário Geral da OAB OLINDA, e de Jaboatão dos Guararapes, Ex-Presidente do Conselho de Usuários de Telefonia do Grupo Claro na Região Nordeste, Ex-Vice-Presidente do Conselho de Usuários de Telefonia do Grupo Claro na Região Nordeste, Presidente do Conselho de Usuários da OI S/A, Ex-Presidente do Conselho de Usuários de Telefonia do Grupo TIM na Região Nordeste, Membro do CEDUST - Comitê de Defesa dos Usuários de Serviços de Telecomunicações da Anatel, Presidente da Associação dos Advogados Dativos da Justiça Federal em Pernambuco, Ex-Presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB OLINDA e Advogado do PROCON ESTADUAL DE PERNAMBUCO. FONES: 081-99955.8509 e 988264647- Sitio Eletrônico: https://juscelinodarocha.jus.com.br .

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