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A competência da Justiça do Trabalho na execução das contribuições previdenciárias.

Emenda Constitucional nº 20/98; art. 114, § 3º da Constituição Federal e Lei nº 10.035/2000

A competência da Justiça do Trabalho na execução das contribuições previdenciárias. Emenda Constitucional nº 20/98; art. 114, § 3º da Constituição Federal e Lei nº 10.035/2000

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Introdução

A Emenda Constitucional n.º 20/98, de 15 de dezembro de 1998, publicada no Diário Oficial da União em 16 de dezembro de 1998, data de sua entrada em vigor, implementou profunda modificação no nosso sistema de Previdência Social, providência há muito reclamada pelos especialistas no assunto, operadores do Direito e a classe política responsável pela administração do País. Vislumbrava-se, caso não fosse instituída, um quadro, no futuro, de total insolvência do sistema, que até então se sustentava e tinha as suas linhas mestras e diretrizes delineadas pela "Constituição Cidadã " de 05 de outubro de 1988 em vigor.

Procedeu-se, assim, como exemplo, à ampliação da idade mínima de ingresso no mercado de trabalho – e, via de conseqüência, no sistema da previdência social ( elevada para 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos – art. 7°, inciso XXXIII ); introduziu-se o fator previdenciário ; vinculou-se a concessão da aposentadoria ao tempo de contribuição ( em substituição ao tempo de serviço ) ; foram estabelecidas regras para assegurar uma transição entre um regime e outro, de modo a resguardar direitos dos contribuintes vinculados à previdência social pelo sistema anterior.

Veio, contudo, no bojo da referida Emenda, o acréscimo de um § 3º ao artigo 114 da Carta Magna, atribuindo à Justiça do Trabalho a competência para executar "...de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, "a" e II, e seus 9acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir.", aqui entendidas as contribuições previdenciárias devidas pelo empregador e empregado, incidentes sobre as parcelas constantes da condenação ( art.832, § 3º, CLT ; nosso destaque).

Por outro lado, passou-se a questionar sobre os efeitos dessa ampliação de competência, indagando-se, sobre aquela assegurada à Justiça Federal ( art. 109, inciso I, CF/88 ) para processar e julgar as ações do INSS, relativas à execução das referidas contribuições na relação previdenciária principal. E a dúvida que ainda persiste é se as competências são concorrentes ou se aquela concedida à Justiça do Trabalho é exclusiva.

Alguns demonstraram perplexidade em relação a determinadas situações que surgiram, trazidas pela novidade legislativa. Uma delas refere-se a uma eventual impossibilidade de o INSS vir compor o pólo ativo de um processo de execução sem ter participado do processo de conhecimento, pelo menos, na condição de assistente ( art.50, CPC).

Há, também, discussão a respeito dos requisitos para a formação do título executivo hábil a legitimar a execução dos mencionados créditos ( artigos 583 ; 584, inciso I - a sentença condenatória, aqui, referir-se-ia somente ao objeto principal da lide ; e 586, do CPC ), que, segundo alguns, estariam ausentes na relação, uma vez que a execução se processa de forma direta e sem observar os trâmites administrativos legalmente exigidos para a constituição do crédito previdenciário ( art.142 e seu parágrafo único, da Lei 5.172/66 – CTN ; arts. 33, § 7º e 39 e § 1º, da Lei 8.212/91 ), razão pela qual invocam, nesse caso, a lesão de direitos que lhes são constitucionalmente assegurados, tais como, o do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, incisos LIV e LV da Carta Magna ).

Afora essas perquirições, indaga-se também, nos termos do dispositivo constitucional sob análise, quais seriam as "sentenças exeqüíveis ". Estariam todas as espécies de decisões revestidas dessa condição de exeqüibilidade ? E ainda, superadas as etapas anteriores, como se processa essa espécie "sui generis" de execução no processo trabalhista ?

Como se vê, a questão não é tão simples como, num primeiro momento, possa parecer. Não tem, contudo, esse trabalho, a pretensão de esgotar o assunto, pois há muito ainda que se debater sobre ele.

O que se quer aqui, na sua abordagem, é fomentar esse debate, a discussão, colocando, para uma análise comparativa e posterior conclusão, os pontos de vista controvertidos surgidos sobre a matéria em face das questões acima suscitadas. Se da discussão "nasce a luz", como

diz o ditado popular, queremos ter o nosso caminho iluminado para melhor entender os aspectos relevantes da questão e, assim, tirar conclusões que não só venham a enriquecer o nosso conhecimento próprio, como também, de alguma forma, trazer alguma contribuição ao Direito Pátrio e, através, dele, à sociedade como um todo.

E para tanto far-se-á necessário, antes de tudo, discorrer sobre a natureza jurídica das contribuições previdenciárias, a forma de constituição do crédito respectivo e a sua caracterização para fins de execução, nas hipóteses distintas da relação meramente previdenciária e daquela decorrente da ação trabalhista, discorrendo sobre a competência originária da Justiça Federal e, agora, da Justiça do Trabalho, para executá-las. Serão abordados, ainda, aspectos peculiares que permeiam essa novíssima espécie de execução no âmbito do processo trabalhista, bem como, por sua pertinência, as substanciais e relevantes alterações introduzidas na CLT, pela Lei 10.035/2000, que a regulamentou e que foi por muitos atacada com a pecha de inconstitucional.

Os assuntos serão tratados, sempre que possível, para melhor compreensão e encadeamento lógico, na ordem em que foram expostas as questões a eles pertinentes.

O caminho nos será sobremodo longo.

Comecemos, pois, a caminhada


1 – A Natureza Jurídica das Contribuições Previdenciárias

Para melhor compreensão do "thema", faz-se necessário, antes de tudo, definir a natureza jurídica das "contribuições sociais" de que trata o artigo 195, "in fine", da Constituição Federal em vigor, valendo lembrar, apesar de óbvio, que segundo o mencionado dispositivo elas se destinam a financiar a Seguridade Social. E se assim é, o interesse social envolvido, como se verá, parece justificar e dar legitimidade à inserção, pela EC 20/98, no arcabouço constitucional, do polêmico § 3º do artigo 114.

Incidem tais contribuições, nos termos da norma constitucional citada em primeiro lugar, sobre "(...) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, a pessoa física... " que prestar serviços à empresa ( inciso I, letra "a"), sobre a receita e o faturamento da mesma ( inciso I, letra "b" ), sobre o lucro ( inciso I, "c" ), sobre o salário-de-contribuição do empregado e demais segurados (inciso II) e sobre a receita de concursos de prognósticos ( inciso III).

Segundo a Lei 8.212, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social e seu Plano de Custeio, somente as contribuições incidentes sobre a remuneração paga aos segurados a serviço de empresas, as relativas aos empregados domésticos e incidentes sobre o salário-de-contribuição dos trabalhadores, são arrecadadas pelo INSS. Aquelas incidentes sobre o faturamento e o lucro das empresas e receitas de concursos de prognósticos são arrecadadas pela Secretaria da Receita Federal ( art.33, caput ).

Como à Justiça do Trabalho compete " [...] conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores..." ( art. 114, caput, CF/88 ), deve-se entender, a teor do disposto no § 3º do mesmo dispositivo, que as contribuições sociais ( previdenciárias) passíveis de serem por ela executadas estão restritas àquelas incidentes, na forma da lei, sobre as parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado ( art. 832, § 3º, da CLT ; arts. 20, 22 e 28, Lei 8.212/91 ). As demais, incidentes sobre "a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física..." que preste serviços, mesmo sem vínculo empregatício, a "...empregador, empresa ou entidade a ela equiparada na forma da lei..." (art.195, I, "a", CF/88), representam crédito a ser constituído através de procedimento administrativo próprio e, após seu lançamento no livro próprio de inscrição na Dívida Ativa pelo Órgão competente, executáveis perante a Justiça Federal (art.142 e seu parágrafo único, CTN ; arts. 33, § 7º e 39 e § 1º, da Lei 8.212/91art. 109, I, CF/88).

Assim, pelo exposto, as que interessam ao nosso estudo dizem respeito, exclusivamente, àquelas contribuições cuja competência arrecadadora esteja afeta ao INSS e que derivem das decisões proferidas nos processos trabalhistas. E nós as identificaremos, para os mesmos fins, como "contribuições previdenciárias", pois essa a denominação adotada, por vezes, pela Lei 10.035/00, que regulamentou os procedimentos de sua execução.

Assim, independentemente da forma com que se constitui, como já explicitado acima, impõe-se definir-lhes a natureza jurídica. E com esta finalidade várias teorias foram erigidas na tentativa de fazê-lo.

Dentre elas, a do "prêmio de seguro", associa a contribuição previdenciária a uma espécie do "prêmio" de um seguro pago pelo beneficiário às companhias seguradoras, para fins de se ver coberto em relação aos benefícios inerentes ao sistema.

A fragilidade dessa afirmação reside no fato de tratar-se o seguro de uma contribuição de natureza privada, restrita à pessoa ou grupo de pessoas que a pagam. A contribuição previdenciária, ao contrário, tem natureza pública, é instituída por lei e se presta a financiar a "seguridade social" ( da qual participa a sociedade como um todo, direta ou indiretamente – art. 195, "caput", CF/88 ), cujo conceito é bem mais amplo que o de um seguro privado, pois visa, dentre outros objetivos, oferecer à população – e esse é um dos pilares sobre os quais se assenta - a "universalidade da cobertura e do atendimento" ( art. 194, parágrafo único, inciso I, CF//8 ), o que equivale dizer que os benefícios, em alguns casos, serão concedidos "...independentemente de contribuição..." a quem deles necessitar ( art.203, inciso V, CF/88), o que jamais ocorreria numa relação privada de seguro.

Há, ainda, as teorias do salário diferido, salário atual e salário social, que têm em comum a afirmação de que o desconto mensal de parte do salário do empregado para o recolhimento à previdência social visa, na verdade, formar um fundo de recursos que, no futuro, irá prover-lhe a subsistência ou de sua família, no caso de ocorrência de aposentadoria, invalidez, morte, etc., constituindo, assim, o benefício, espécie de salário diferido, a ser pago no futuro, socializado entre todos. Entrementes, a contrariá-las e enfraquecê-las está o fato de que o benefício é pago pelo INSS ( e não pelo empregador ), razão pela qual não pode ser entendido como "salário" ; por outro lado, não é atual, pois não representa, com exatidão, a quantia percebida pelo trabalhador quando em atividade, além de que certos segurados, como os autônomos, não percebem salários.

Já a teoria parafiscal afirma que, por não ser exigida pelo Estado, mas pelo INSS, revestir-se-ia, a contribuição previdenciária, do caráter de uma contribuição parafiscal, ou seja, aquelas atinentes a finanças paralelas às do Estado. Pela teoria da exação, tratar-se-ia de espécie "sui generis" de contribuição, que embora prevista em lei, seria uma exigência distinta que não poderia ser considerada tributo, em seu sentido estrito.

A teoria fiscal, mais coerente em relação às anteriores, entende que a contribuição previdenciária é tributo, em face se seu caráter compulsório e previsão em lei. Os que a contestam o fazem sob o frágil argumento de que aquela não pode ser enquadrada como imposto, taxa ou contribuição de melhoria ( art. 5º, Lei 5.172/66, CTN ). A doutrina, no entanto, é unânime em reconhecer o caráter de tributo da contribuição previdenciária.

Nesse sentido, o professor Sérgio Pinto MARTINS :

Na verdade, a contribuição tem natureza tributária, pois é uma prestação pecuniária, exigida em moeda ou valor que possa exprimir-se. É compulsória, pois independe da vontade da pessoa de contribuir. Tem previsão em lei. Não se constitui em sanção de ato ilícito e é cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada (lançamento). A contribuição está enquadrada no art.149 da Constituição, na parte final do dispositivo, quando faz referência à contribuição prevista no § 6º do art. 195 da Lei Maior. Trata-se, portanto, de tributo, na modalidade contribuição social. A execução judicial para a cobrança da Dívida Ativa da autarquia da União, que é o INSS, será regida pela Lei 6.830/80.[1]

Associamo-nos à maioria que reconhece o caráter tributário da contribuição previdenciária. E essa compreensão nos abre campo para pesquisar e entender melhor a forma com que se constitui esse crédito a favor do INSS, autarquia federal responsável por sua arrecadação, com vistas à sua exigibilidade, seja no órbita administrativa, seja na judicial. E a partir daí, nessa última hipótese, poder-se-á estabelecer discussão acerca da competência da Justiça do Trabalho para executá-la nos moldes previstos no § 3º, do artigo 114, da CF/88.


2 – A constituição do Crédito Previdenciário na esfera administrativa -Leis 5.172, de 25/10/66 ( CTN ) e 8.212, de 24/07/91.

Entendida a contribuição previdenciária como um tributo, vale esclarecer que a constituição do crédito respectivo a favor do INSS, o credor, faz- se, em condições normais, através de procedimento administrativo-fiscal próprio e regular, nos moldes previstos no § 7º do artigo 33 da Lei 8212, de 24/07/91, ou seja, através de notificação de débito, auto de infração, confissão ou documento declaratório de valores devidos e não recolhidos apresentados pelo contribuinte.

Entretanto, sendo esse direito da Administração, em face da lei ( no caso específico, os artigos 195, incisos I, letras "a" a "c" e II, da CF/88; 11 e 33 da Lei 8.212/91 ), ilíquido e incerto, tem necessidade de ser definido, para se fazer exigível. Isso se faz através do lançamento, de natureza declaratória, que torna líquida e certa a obrigação do contribuinte e define o crédito da entidade tributante, no caso, o INSS. Daí afirmarem alguns juristas de renome – com os quais concordamos - que o lançamento não constitui, propriamente, o crédito tributário, como consigna o CTN em vários de seus dispositivos, especialmente no art. 142, e a própria Lei 8212/91, esta relativamente aos créditos previdenciários. Tais créditos decorreriam da obrigação de pagar, legalmente imposta ao contribuinte, nos termos e condições estabelecidos, sendo a lei, portanto, e não o lançamento, que os constitui.

Nesse sentido, Hely Lopes MEIRELLES define o lançamento, como sendo " [...] o ato ou sucessão de atos realizados pela Administração Pública, na forma determinada em lei, visando a identificação do contribuinte e à fixação quantitativa do tributo, para seu oportuno pagamento."[2]

Com essa compreensão, tem-se que as modalidades de lançamento encontram-se previstas nos artigos 147 a 150 do CTN : por declaração do sujeito passivo ou de terceiro - feito com base nas informações prestadas pelo contribuinte ou por terceiro sobre matéria de fato; de ofício – feito exclusivamente pelo fisco nos casos determinados em lei ou nas hipóteses previstas nos incisos II a IX do artigo 149 do CTN ; por homologação ou autolançamento, quando a lei impõe ao devedor a antecipação do pagamento, sem prévio exame da Administração, extinguindo, tal pagamento, o crédito tributário, sob condição resolutória da posterior homologação

Sobre o assunto ensina S. P MARTINS:

Na Seguridade Social, há normalmente o lançamento de ofício e por homologação. Em relação à pessoa física do produtor rural e ao segurado especial, há também lançamento por declaração, pois são obrigados a apresentar ao INSS, anualmente, a Declaração Anual de Operações de Venda (DAV). Na contribuição sobre o lucro o lançamento é por declaração. A hipótese contida no inciso IV do art. 32 da Lei 8.212 é também lançamento por declaração. [3]

No caso específico desse estudo – contribuições previdenciárias devidas, decorrentes da relação de emprego -, na esfera administrativa e em condições regulares de recolhimento espontâneo daquelas devidas pelo empregador e pelo empregado, dá-se a espécie de lançamento por homologação ou autolançamento. Nas hipóteses de inadimplência, dar-se-á o lançamento de ofício (art. 37 da Lei 8.212/91 ).

Tratando-se de relação jurídica previdenciária, estabelecida nas condições acima entre o contribuinte (empregador, inclusive na condição de depositário das contribuições devidas pelo empregado ) e o INSS, uma vez constituído o crédito previdenciário e inscrito este em Dívida Ativa, será objeto de execução judicial perante a Justiça Federal, que se processará com fundamento em título executivo extrajudicial, nos trâmites previstos na Lei 6.830/80 ( artigos 583, 585, VI e 586 todos do CPC ; art. 109, inciso I, CF/88 ; art. 39, § 1º, Lei 8212/91 ).

O fato gerador, qual seja, segundo H. L. MEIRELLES, "o elemento, o ato ou a ocorrência que a lei tributária indica como a causa jurídica do tributo" [4], no caso em tela, relativamente às contribuições devidas ao INSS na relação previdenciária principal, ocorre, em condições de regular cumprimento das obrigações contratuais, no momento em que o empregador, cumprindo a sua principal obrigação contratual, paga ou credita, à disposição do empregado, os salários respectivos, ficando obrigado, a partir de então, a recolher, aos cofres da Previdência Social, as contribuições incidentes sobre " a folha de salários... ", relativas à sua quota-parte e a do empregado (art. 30, inciso I, letra "a", Lei 8212/91 ; art. 462, CLT e OJ 32 da SDI -TST ).

Na hipótese de "...atraso total ou parcial no recolhimento das contribuições (...) a fiscalização lavrará notificação de débito, com discriminação clara e precisa dos fatos geradores, das contribuições devidas e dos períodos a que se referem..." ( art. 37 da Lei 8.212), caso em que, nos termos do artigo 144 do CTN, o lançamento reportar-se-á "...à data da ocorrência do fato gerador da obrigação...", regendo-se pela "...lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada.". Ainda aqui, a execução dos créditos decorrentes se faz perante a Justiça Federal, nas condições já mencionadas acima.

Já no âmbito da execução trabalhista, como se verá, o fato gerador decorre da própria sentença em seu efeito anexo ou secundário e não do momento em que se paga ao reclamante os créditos reconhecidos na decisão. Daí decorrer o entendimento de que, transitada em julgado a decisão que indicou a natureza jurídica das parcelas objeto da condenação ( fato que, em face do caráter acessório da contribuição previdenciária em relação ao débito principal, permite determinar, com precisão e em face da lei, as parcelas sujeitas à incidência ou não do tributo), fazem-se devidas as contribuições pelos seus valores originais, apurados em liquidação de sentença, mesmo que as partes, no curso da execução, venham a transigir em relação aos valores principais. Entendendo o contrário, estar-se-ia a concordar que a transação pudesse ser levada a efeito em detrimento do direito de terceiros interessados – no caso, o INSS – circunstância que não encontra amparo na Lei ( art. 1.031, CCB, subsidiário).

A constituição e exigibilidade dos créditos previdenciários na esfera trabalhista, por sua vez, processam-se de maneira bem mais simplificada e célere, visto que se torna desnecessário – e isso sem menoscabo, como se verá, dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa - não só o esgotamento da via administrativa na tentativa do recebimento dos mesmos, bem como a inscrição prévia do débito respectivo em Dívida Ativa, como requisito essencial à formação do título executivo extrajudicial ( artigos 33, § 7º, 37 e § 1º e 39 e § 1º, todos da Lei 8212/91 ; art. 585, inciso VI, CPC ).

Em verdade, a realidade inafastável é a de que, inspirado no § 3º do artigo 114 da CF/88 - que encontrou regulamentação tardia, diga-se de passagem, na Lei 10.035, de 25.10.2000, que alterou e inseriu dispositivos no corpo da CLT - instituiu-se, no âmbito da Justiça do Trabalho, um processo novo, "sui generis", de execução fiscal, autônomo em relação à execução dos créditos trabalhistas principais ( pois as partes são diversas ) e que se desenvolve paralelamente a esta, dela se desligando, contudo, quando necessário, como na hipótese contida no § 8º do artigo 897 da CLT.

E em razão dessa simplificação de procedimento, foi que muitas vozes se levantaram argüindo a inconstitucionalidade, não só do dispositivo constitucional, como da legislação periférica dele derivada, ao argumento de que os direitos e garantias individuais do contribuinte, assegurados pela Constituição Federal, estariam sendo vulnerados, tais como o do devido processo legal ( "dues process of law " ), o do contraditório e da ampla defesa ( fundamentam com os artigos 5º, incisos LIV e LV e 60, § 4º, inciso IV, da Constituição Federal em vigor ). Reserva-se para um capítulo à parte, mais à frente, a análise das questões aqui suscitadas.


3 – A Execução dos créditos previdenciários. A competência da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho

No item anterior discorremos sobre a forma com que se constituem, em condições regulares, os créditos da Seguridade Social. Na oportunidade enfatizamos que, naquelas circunstâncias, a competência jurisdicional para conhecer das ações de execução desses créditos é – e sempre o será, a menos que se processe uma radical mudança nesse sentido - da Justiça Federal, na forma que dispõe o artigo 109, inciso I da Constituição Federal.

A concessãoà Justiça do Trabalho, pela Emenda Constitucional n.º 20/98, de competência para executá-los, de ofício – exclusivamente em relação àqueles decorrentes das sentenças que proferir – se deu, assim, sem excluir à da Justiça Federal, que foi preservada para processar e julgar a lide estritamente previdenciária.

Uma questão, no entanto, a ser analisada é a de se definir se a competência ditada pelo § 3º do artigo 114 da Constituição Federal é exclusiva ou concorrente.

O Juiz do Trabalho da 3ª Região, Dr. JONATAS RODRIGUES DE FREITAS, escrevendo sobre o assunto, com clareza, assim se manifestou :

É importante frisar que a competência do juiz do trabalho é expressa no verbo executar ; já a do juiz federal, nos verbos processar e julgar. A primeira vista, verifica-se que nesta ( competência da Justiça Federal ) estaria contida aquela (competência da Justiça do Trabalho ). Mas a parte final do inciso I do artigo 109 citado exclui "as causas [...] sujeitas [...] à Justiça do Trabalho da competência da Justiça Federal.[...] Não foi sem finalidade que o legislador constitucional exprimiu a nova competência no verbo executar ( e não processar e julgar). A intenção é flagrante : restringir o âmbito de atuação do juiz do trabalho. Este não pode processar e julgar as causas que envolvem a lide estritamente previdenciária. Mas pode ( e deve) executar, inclusive de ofício, " as contribuições sociais [...] decorrentes das sentenças que proferir" e, neste sentido, resolver incidentalmente todas as questões subjacentes.[5]

Pelo exposto acima, pode-se afirmar em coro com o culto Magistrado que não há, na espécie, como afirmam alguns, uma competência concorrente entre a Justiça Federal e a do Trabalho, atuando ambas, nas questões previdenciárias e em situações específicas, nos limites estabelecidos pela Lei Maior. Conclui-se, pois, que a competência conferida à Justiça do Trabalho pela EC 20/98 é exclusiva para executar as contribuições previdenciárias decorrentes das sentenças que proferir, como exclusiva é a da Justiça Federal para executar aquelas que se constituem, nos termos da lei, através de procedimento administrativo-fiscal próprio, como exaustivamente já se expôs ( relação previdenciária principal ).


4 – Sentenças trabalhistas exeqüíveis na forma do disposto no § 3º do artigo 114 da CF/88, com regulamentação pela Lei 10.035, de 25 de outubro de 2000.

Como se viu anteriormente, o § 3º do artigo 114 da Constituição Federal de 1988, incorporado ao Corpo da Constituição Federal por via da Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998 ( em vigor a partir de 16 de dezembro de 1998, data de sua publicação no Diário Oficial da União ), trouxe consigo uma relevante ( e polêmica ) novidade relativa à execução das contribuições previdenciárias derivadas das relações de emprego, vez que conferiu competência à Justiça do Trabalho para fazê-lo em relação àquelas decorrentes das "... sentenças que proferir.".

Impõe-se aqui, face a tudo o que se expôs no item anterior que tratou dessa competência, uma análise mais acurada da expressão acima, adotada pelo texto constitucional, para os fins de se definir quais, efetivamente, as sentenças passíveis de execução naquela Justiça Especializada. Estariam todas as decisões ali proferidas revestidas dessa condição de exeqüibilidade?

A necessidade de se proporcionar resposta a tal indagação, pré-requisito para o regular desenvolvimento do tema, leva-nos a recorrer à teoria geral que informa o direito processual civil – subsidiário do processo do trabalho na forma do art. 769, CLT – na parte relativa à classificação das sentenças.

Urge, no entanto, em primeiro lugar, definir o que seja sentença.

Segundo o próprio Código de Processo Civil, "Sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa." (art. 162 ).

Numa distinção clássica, classificam-se em terminativas e definitivas, entendidas, as primeiras, como aquelas decisões que põem fim ao processo sem examinar o mérito e as segundas as que encerram o processo, "...ferindo a substância da lide." [6]

Já por estes conceitos pode-se dizer, não sem antes advertir quanto ao caráter óbvio da conclusão, que somente as sentenças definitivas são exeqüíveis nos termos do dispositivo constitucional, já que as terminativas do feito, por não adentrarem no mérito, são destituídas de conteúdo condenatório, exceção feita às custas processuais à cargo do Autor.

Entretanto, para os fins deste estudo :

A classificação realmente importante das sentenças ( considerando tanto a decisão do juiz singular como o acórdão dos tribunais) é a que leva em conta a natureza do bem jurídico visado pelo julgamento, ou seja, a espécie de tutela jurisdicional concedida à parte. Nessa ordem de idéias, ensina Chiovenda que "se a vontade da lei impõe ao réu uma prestação passível de execução, a sentença que acolhe o pedido é condenação e tem duas funções concomitantes, de declarar o direito e preparar a execução ; se a sentença realiza um dos direitos potestativos que, para serem atuados, requerem o concurso do juiz, é constitutiva ; se, enfim, se adscreve a declarar pura e simplesmente a vontade da lei, é de mera declaração. Classificam, portanto, as sentenças em : a) sentenças condenatórias ; b) sentenças constitutivas ; c ) sentenças declaratórias. [7]

Menciona ainda THEODORO JÚNIOR aquelas sentenças cuja definição do direito subjetivo dos litigantes não advém do próprio juiz, mas das próprias partes, através da autocomposição, limitando-se aquele, tão somente, "... a comprovar a capacidade das partes para o ato e a regularidade formal do negócio jurídico para opor-lhe a chancela de validade e força de ato judicial (ato processado em juízo).[8] São as denominadas sentenças homologatórias, muito comuns na realidade do Judiciário Trabalhista ( art. 831, parágrafo único, CLT).

Nesse contexto, as sentenças a que se refere o § 3º do artigo 114 da Constituição Federal de 1988, seriam, em princípio, as condenatórias, constitutivas e declaratórias de direito.

Análise mais acurada, contudo, autoriza excluir desse rol, por dupla razão, as sentenças meramente declaratórias de direito.

A primeira está vazada na própria conceituação dessa modalidade de sentença. Como se sabe, sua finalidade é a de declarar, pura e simplesmente, a existência ou inexistência de uma relação jurídica ou a autenticidade ou falsidade de um documento.

Dissertando sobre o assunto, o Dr. Márcio Flávio Salém Vidigal, com muita clareza, assim se posiciona :

A sentença declaratória no ordenamento positivo brasileiro é a que declara a existência ou inexistência da relação jurídica ou a autenticidade ou falsidade de um documento. Dispõe, com efeito, o art. 4º do Código de Processo Civil:

Art. 4º. O interesse do autor pode limitar-se à declaração :

I – da existência ou inexistência de relação jurídica;

II – da autenticidade ou falsidade de documento.

A norma consagra a espécie de ação a que corresponde a respectiva espécie de sentença. Neste tipo de ação, como se observa com facilidade, o provimento jurisdicional está limitado à declaração de uma das situações apontadas no dispositivo. Não vai além dessa declaração, pois o autor, na verdade, nada pretende além dela.

E cita AMARAL SANTOS, para concluir que :

...o "interesse", no caso, será a "certeza" quanto à existência ou inexistência de uma relação jurídica, ou quanto à autenticidade ou falsidade de documento. O autor não pretende nada mais que a própria "certeza" ; o "bem" pretendido será a própria certeza. Daí ser a sentença denominada "meramente declaratória". Representa apenas um preceito, exigindo que o vencedor, se for o caso, proponha outra ação, agora de natureza condenatória, para então obter o seu crédito.[9]

Cabe esclarecer ainda, segundo o autor mencionado, que, embora se afirme que toda sentença possui um conteúdo declaratório – o que não deixa de ser verdadeiro -, a distinção que se faz é a de que, nos demais tipos de decisão, a declaração constitui elemento prévio e imprescindível à obtenção do conteúdo finalístico do provimento, enquanto que, na sentença declaratória, a tutela jurisdicional se esgota com a mera declaração perseguida. [10]

A segunda razão encontra-se na própria lei que rege a matéria.

Com efeito, o § 3º do artigo 832 da CLT, acrescentado pela Lei 10.035/00, que regulamentou o procedimento relativo à execução das contribuições previdenciárias na Justiça do Trabalho, em face do disposto no § 3º do artigo 114 da Carta Magna, impôs aos magistrados trabalhistas, quando do proferimento de suas decisões, a obrigação de "...sempre indicar a natureza jurídica das parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado, inclusive o limite de responsabilidade de cada parte pelo recolhimento da contribuição previdenciária, se for o caso." (nosso destaque)

Ora, a construção legislativa não deixa qualquer dúvida no sentido de que são passíveis de serem executadas na Justiça do Trabalho, relativamente aos efeitos anexos ou secundários delas derivadas, ungidas com poder de gerar créditos a favor do INSS, as decisões condenatórias de que resultem o "... pagamento de direitos sujeitos a incidência de contribuição previdenciária... " (art. 43, Lei 8212/91), visto que, ao discriminar as parcelas objeto da condenação, deve o juiz, por dever de ofício, determinar-lhes a natureza jurídica, exatamente para se auferir, em confronto com a Lei de Custeio da Seguridade Social, em relação às mesmas, as hipóteses de incidência ( e não incidência ) das referidas contribuições (artigos 20 e 28 da Lei retro citada ).

Nessa linha de raciocínio é lícito concluir, "sub censura", que numa ação trabalhista em que se pretenda tão somente o reconhecimento do vínculo empregatício ( declaração de existência de relação jurídica ), com o devido registro do contrato de trabalho na Carteira Profissional ( condenação em obrigação de fazer), caso venha a ser julgada procedente e uma vez transitada em julgado, as contribuições previdenciárias devidas em conseqüência desta declaração ( efeito anexo ou secundário da sentença ) não poderão ser objeto de execução na esfera trabalhista, simplesmente porque inexiste condenação no pagamento de qualquer parcela trabalhista de conteúdo econômico.

O mesmo se diga, em situação análoga, quando o autor, além do reconhecimento do vínculo de emprego e registro do contrato de trabalho na CTPS, admitindo haver recebido regularmente todos os salários na vigência do contrato ( alegado existente na forma do art. 442, CLT ), inclusive as férias e o 13º salário, mas afirmando ter sido dispensado imotivadamente sem receber os direitos decorrentes da rescisão, reclama, também, o pagamento das verbas rescisórias decorrentes ( aviso prévio, férias indenizadas, 13º salário, FGTS acrescido da multa rescisória, por exemplo ). A teor do disposto no § 3º do artigo 832 da CLT, em caso de procedência da ação, estas parcelas, relativas às verbas rescisórias, é que deverão ser objeto de definição por parte do juiz, quanto à sua natureza jurídica, para fins de verificação das hipóteses de incidência das contribuições previdenciárias e sua posterior execução nos autos. Infere-se, assim, por exclusão, que aquelas devidas em virtude do vínculo de emprego reconhecido, deverão ser objeto de apuração pelo Órgão arrecadador no âmbito administrativo e, se for o caso, executadas na forma da Lei 6.830/80, perante a Justiça Federal ( artigos 20, 28,I, 33, § 7º e 37 da Lei 8212/91 ; art. 109, I, CF/88). Admitindo-se o contrário, estar-se-ia, a um só tempo, vulnerando os artigos 128 do CPC, 832, § 3º da CLT e 43 da Lei 8.212/91.

De resto e na seqüência, quanto às sentenças condenatórias (de função sancionadora e eficácia executória ) e constitutivas ( aquelas que, dotadas de carga condenatória, projetam desde já os seus efeitos no mundo jurídico para criar, modificar ou extinguir uma relação jurídica, podendo-se citar, dentre estas, no âmbito trabalhista, aquela que decreta a rescisão indireta de um contrato de trabalho e condena o empregador no pagamento das verbas rescisórias decorrentes), por suas naturezas, é notória sua adequação à norma constitucional sob análise.


5 – A sentença trabalhista, crédito previdenciário e o processo de execução. Legitimidade ativa do INSS

Outra questão a ser enfrentada diz respeito à natureza jurídica dessa nova espécie de execução no âmbito da Justiça do Trabalho, que envolverá as questões relativas à constituição do título executivo respectivo – sob os aspectos de sua certeza, liquidez e exigibilidade -, a legitimidade do INSS para figurar no pólo ativo da relação processual – sem haver participado do processo principal – e a compatibilidade entre esta execução e aquela que se processa, concomitantemente e desenvolve-se em relação aos créditos principais, decorrentes da sentença de mérito no processo de conhecimento.

Estamos tratando de um processo de execução.

E sobre o assunto, na esfera trabalhista, parte da doutrina não admite a autonomia deste processo, em relação ao de conhecimento. Afirmam os mestres – e dentre eles, expoentes do Direito do Trabalho Pátrio como Francisco Antônio de Oliveira e Manoel Antônio Teixeira Filho -, tratar-se o processo de execução trabalhista, de uma "...simples fase ou epílogo da fase do conhecimento.", asseverando a existência de uma diferença estrutural entre ambos.

No âmbito do direito processual civil, no entanto, nenhuma dificuldade há de se reconhecer essa autonomia entre ambos os processos, aceitando-a, de forma unânime, a maioria dos jurisconsultos, especialistas que estudam e debatem a matéria. Da lavra de um deles, o professor HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, a confirmar esse entendimento, o texto seguinte :

Cognição e execução, em seu conjunto, formam a estrutura global do processo civil, como instrumento de pacificação dos litígios. Ambas se manifestam como formas de jurisdição contenciosa, mas não se confundem numa unidade, já que nos campos de atuação uma e outra se diversificam profundamente : o processo de cognição busca a solução, enquanto o de execução vai em rumo à realização das pretensões. Daí afirmar-se que a execução forçada não pode ser tratada como parte integrante do processo, em sentido estrito, nem sequer como uma conseqüência necessária dele. Importa a execução forçada a formação de uma relação processual própria e autônoma frente à do processo de conhecimento, ainda quando seu fito seja o cumprimento coativo de uma sentença condenatória.[11]

Já FRANCISCO ANTÔNIO DE OLIVEIRA, discorrendo sobre a execução trabalhista, para negar-lhe a natureza jurídica de processo autônomo em relação ao de conhecimento, manifesta-se argumentando o seguinte :

O fato de iniciar com a citação ( art.880,CLT), a exemplo do que sucede com o processo comum (art. 611, CPC), não aproxima o processo trabalhista do processo comum. Neste, a ação de conhecimento e a fase executória são autônomas, passando pela liquidação de sentença que também se traduz em verdadeira ação. Tanto é assim, que a decisão proferida tem a dignidade de verdadeira sentença, desafiando o recurso de apelação. Restou hoje excepcionada a liquidação que depender de simples cálculos aritméticos ( art.604, CPC), em que a execução tem início com pedido instruído pela memória discriminada. A fase executória, no processo do trabalho, passando pela liquidação de sentença ( cálculos, artigos de liquidação e arbitramento ) é simples incidente e as decisões proferidas na liquidação de sentença e em embargos são meramente interlocutórias, possibilitando o juízo da reforma pelo magistrado o qual inclui também no agravo de petição. As conseqüências dessa diferença estrutural residem no fato de não haver trânsito em julgado, mas mera preclusão nas decisões de liquidação de sentença e de embargos, as quais poderão ser desfeitas como simples ato processual (art.486, CPC), via de ação anulatória. Já no cível se exige a ação rescisória para a desconstituição, já que referendada por apelação.[12] ( destacamos)

No mesmo sentido acima expresso, MANOEL ANTÔNIO TEIXEIRA FILHO argumenta que assim é porquanto, no processo trabalhista, a execução pode ser promovida de ofício, na forma prevista no art. 878 da CLT, sendo esse o argumento central, e ainda pelo fato de não se admiti-la fundada em título extrajudicial, mas tão somente na "(...) sentença trânsita em julgado e o acordo inadimplido...(...)". Reconhece, contudo, "(...) que a doutrina se inclinou, acentuadamente, pela autonomia do processo de execução trabalhista (...), embora estejamos serenamente convencidos de que a execução "ex offício" e a inexeqüibilidade de títulos extrajudiciais surjam como dois grandes obstáculos jurídicos à sustentação desse entendimento, hoje predominante." [13] E aqui ele remete a renomados doutrinadores como CARRION, RUSSOMANO, CAMPOS BATALHA e COQUEIJO COSTA.

À corrente doutrinária que defende tal autonomia nos filiamos. E nos dias de hoje, com muito mais razão e pelos motivos seguintes.

No que diz respeito ao início da execução, de ofício, pelo Juiz ou Tribunal competente, o artigo 878 da CLT não contém, propriamente, uma determinação, mas uma faculdade. A expressão utilizada pelo legislador – " a execução poderá ser promovida (...) ex offício pelo próprio juiz(...)" - revela-o com muita clareza. (grifamos). Fosse outra a mens legislatoris e o dispositivo estaria redigido, v.g., nos seguintes termos : " A execução será promovida por qualquer interessado, ou ex offício pelo Juiz... ". E ainda que dessa forma não se entenda, a natureza das verbas envolvidas - de caráter alimentar - estaria a justificar esse poder conferido ao Juiz, mesmo assim, com as restrições impostas pelo art. 4º da Lei 5584/70, ou seja, nos "(...) dissídios de alçada exclusiva das Juntas ( leia-se Varas do Trabalho) e naqueles em que os empregados ou empregadores reclamarem pessoalmente (...)"., valendo ressaltar que, também aqui, o legislador coloca o ato no campo da faculdade e não no da obrigação.

Entretanto, a praxe trabalhista cristalizou-se no sentido de que o juiz da causa, pelas razões acima, deve dar início ao processo de execução, utilizando-se da faculdade que lhe é conferida por lei.

Dado o impulso inicial, a tramitação normal do processo se efetivará, contudo, por iniciativa das próprias partes, a quem a lei impõe obrigações ( arts. 879, §§ 1º- B, 2º ; 880, 884 e § 2º e 3º ), exceção feita às situações previstas no art. 4º, da Lei 5584/70, quanto à liquidação da sentença e ao início da execução propriamente dita. Assim, a possibilidade do juiz da causa iniciar, de ofício, a execução, não retira desta o caráter de processo autônomo, distinto em relação ao de conhecimento.

Relativamente ao segundo argumento apresentado por TEIXEIRA FILHO[14] - impossibilidade de se executar título executivo extrajudicial - tal circunstância não mais constitui obstáculo ao reconhecimento da autonomia da execução trabalhista, visto que ao criar as Comissões Prévias de Conciliação a Lei 9.958/00 o instituiu no âmbito da Justiça do Trabalho, na figura do "termo de conciliação" firmado perante as referidas comissões ( arts. 625-E, parágrafo único e 876, "caput", da CLT).

Finalmente, a reforçar mais ainda tal entendimento, a partir de dezembro de 1998, por força da EC 20/98, instituiu-se o processo de execução fiscal das contribuições previdenciárias decorrentes das decisões proferidas pela Justiça do Trabalho nos dissídios individuais, inteiramente distinto daquele em que se persegue a satisfação dos valores principais e que se processa nos mesmos autos, paralelamente a esse, em face da mesma decisão, mas com partes diversas.

Diante de tais circunstâncias, não há como negar a autonomia do processo de execução trabalhista face ao de conhecimento.

E se assim é, tratando-se de processo autônomo ( verdadeira ação de execução), há de observar, para o seu aperfeiçoamento e regular desenvolvimento as condições da ação ( artigos 3º, 267, inciso VI e 598 do CPC).

No caso específico da execução das contribuições previdenciárias decorrentes das decisões trabalhistas, tais requisitos encontram-se presentes, como se verá.

Pela possibilidade jurídica "(...) indica-se a exigência de que deve existir, abstratamente, dentro do ordenamento jurídico, um tipo de providência como a que se pede através da ação." [15], cabendo ao juiz a verificação da viabilidade jurídica da pretensão deduzida em juízo pela parte, face ao direito positivo em vigor. Ora, esta condição se verifica, em relação ao INSS, pelo simples fato de existir crédito de contribuições previdenciárias a seu favor, derivado dos efeitos anexos ou secundários das sentenças trabalhistas e cuja exigibilidade se faz com base em leis específicas que respaldam e ensejam o alcance de tal desiderato. Em suma, o objeto da execução é plenamente realizável no mundo jurídico.

Quanto ao interesse de agir e a legitimidade do INSS, estas condições se assentam, no primeiro caso, na existência de crédito a seu favor, aliado à circunstância de estar envolvido na questão o interesse da coletividade ( financiamento da seguridade social ) ; no segundo, no fato de que a própria Lei de Custeio lhe confere esta condição, indicando-o credor e destinatário das referidas contribuições previdenciárias ( art. 33, da Lei 8212/91 ). É irrelevante, pois, nesta última hipótese, não tenha ele participado do processo de conhecimento, visto que tais contribuições, instituídas por lei, decorrem, como se verá mais adiante, dos efeitos secundários da decisão, sendo devidas – e exigíveis - independentemente de haverem sido postuladas pelas partes.

O título executivo, na hipótese, é a própria sentença exeqüenda, e a execução se processa, concomitantemente, com a dos valores principais, nos mesmos autos, observando, contudo, regras próprias, inclusive quanto à atualização dos créditos respectivos ( arts. 34, Lei 8212/91 e 879, § 4º, CLT). Remete-se a apreciação destes pontos para os tópicos seguintes.


6 – A execução previdenciária trabalhista, os efeitos anexos da sentença e o título executivo.

De início, a questão a ser levantada refere-se ao momento em que o crédito previdenciário se constitui, no universo jurídico, a favor do INSS.

No caso, as "contribuições sociais" ( entenda-se, no caso específico, previdenciárias ) a que se refere o § 3º do artigo 114 da CF/88, surgem na esfera jurídica, em decorrência da sentença trabalhista, frutos de seu efeito anexo, reflexo ou secundário.

Com efeito, uma é a eficácia da sentença em relação às partes ( a qualidade de coisa julgada, cf. art.467 do CPC ) e outros os efeitos que dela decorrem e repercutem no mundo jurídico, em relação a terceiros.

O Juiz do Trabalho Paulo Gustavo de Amarante Merçon, da 3ª Região, discorrendo acerca da "Anexação de Efeitos às Sentenças", citando PONTES DE MIRANDA, discorreu, com muita propriedade, sobre a matéria :

PONTES DE MIRANDA tratou ainda dos efeitos anexos da sentença de mérito, definindo-os como efeitos do fato da sentença, não pertencentes à eficácia própria da mesma, e configurando pressuposto de direito, pretensão, ação ou poder, que se crie com eles. Ressaltou que os efeitos anexos não pertencem à coisa julgada material, e que é possível mesmo que o beneficiado não tenha sido parte na demanda principal. Ainda, segundo o i. processualista, os efeitos anexos da sentença dependem sempre de lei, e independem da vontade das partes. Como exemplo de efeito anexo, PONTES DE MIRANDA mencionava o pagamento das taxas pós-processuais da sentença, efeito anexo de direito fiscal.

E reforçando tal entendimento, no mesmo tópico, reproduziu a lição de LIEBMAN a respeito:

EURICO TULLIO LIEBMAN já abordara o mesmo tema, apenas adotando o termo secundário, em lugar de efeito em anexo: "Produz a sentença, às vezes, ao lado de seus efeitos principais, efeitos secundários que se distinguem dos primeiros (...) por sua falta absoluta de autonomia ; são simplesmente acessórios e conseqüentes aos efeitos principais e ocorrem automaticamente por força de lei, quando se produzem os principais (...) Quando o exame da causa autoriza a prolação da sentença com determinados efeitos (principais), dever-se-ão, só por isso, produzir, e logo se produzirão, também os secundários, os quais, portanto, não deverão ser pedidos pelas partes na demanda judicial, nem estar contidos e indicados na decisão ( e por isso é exato dizer que não fazem parte do objeto da sentença); e assim como não poderiam ser produzidos separadamente dos principais, não podem, tampouco, ser denegados quando se pronunciam aqueles." [16]

A clareza dos ensinamentos dispensa maiores questionamentos, podendo-se concluir com o culto magistrado e os mestres citados, que o efeito anexo atribuído por lei à sentença – da qual é sempre dependente e nunca autônomo -, independe, para a sua materialização no mundo jurídico, de qualquer manifestação das partes - pois não faz parte do objeto do pedido -, podendo, inclusive - e geralmente o faz - beneficiar terceiros, no caso específico, o INSS.

E em virtude desse efeito anexo da sentença, em conclusão, pode-se afirmar, no tocante às contribuições previdenciárias devidas, ser a própria decisão o título executivo no qual fundar-se-á a execução ( arts. 583 e 584, I, CPC ). E como tal ele é certo ( porque o crédito é gerado pela sentença, em virtude de seus efeitos anexos, de conformidade com a lei - art. 585, I, CPC) e exigível ( porque, decorrente de lei e imposto coativamente ao contribuinte, pode ser exigido a partir do trânsito em julgado da decisão que o constituiu, independentemente de quaisquer outras condições). Já a sua liquidez decorre da verificação de ser o crédito exequendo, certo quanto à sua existência e determinado quanto ao seu objeto ( art. 1533, CCB), ainda que os valores correspondentes necessitem ser apurados na fase prévia de liquidação da sentença.


7 – A Lei 10.035, de 25 de outubro de 2000 e os procedimentos, no âmbito da Justiça do Trabalho, de execução das contribuições previdenciárias.

A Lei 10.035, de 25 de outubro de 2000, em vigor desde 26 de outubro de 2000, data de sua publicação no Diário Oficial da União, regulamentando o disposto no § 3º do artigo 114 da CF/88, estabeleceu, no âmbito da Justiça do Trabalho, os procedimentos da execução das contribuições devidas à Previdência Social. Trata-se de modalidade especial e "sui generis" de execução fiscal que se desenvolve perante esta Justiça Especializada.

Esta execução de valores acessórios, derivados, como se viu, dos efeitos anexos da sentença, processa-se nos mesmos autos da ação trabalhista, correndo paralelamente com aquela que visa a satisfação dos créditos principais devidos ao reclamante.

Inicialmente, quando do advento da EC 20/98, o dispositivo constitucional inserido no artigo 114 da CF/88 ( o § 3º ) - que ampliou a competência da Justiça do Trabalho legitimando-a a executar, de ofício, as contribuições sociais decorrentes de suas sentenças -, como novidade legislativa de grande repercussão, gerou, no espírito dos julgadores e dos operadores de direito, perplexidade e apreensão, visto que, a par da mencionada norma, não se estabeleceu um procedimento próprio e adequado para o processamento da execução das referidas contribuições. Muitas dúvidas surgiram quanto às normas processuais a serem seguidas para se alcançar esse objetivo. Seriam, pura e simplesmente, as da Lei 6.830/80 ? Ou seria a própria CLT, a partir de seu artigo 880, adaptada, de forma improvisada, e buscando supletividade na Lei de Execuções Fiscais e no CPC ?

Face à inexistência, à época, de regulamentação própria quanto à forma de se processar dita execução, dever-se-ia concluir pelo caráter auto-aplicável do dispositivo constitucional incipiente ou, ao contrário, aguardar-se tal providência ?

Apesar das apreensões surgidas, o entendimento que prevaleceu entre os Tribunais do Trabalho foi o de que a norma constitucional era auto-aplicável e que, a partir de sua vigência, as contribuições previdenciárias previstas em lei e decorrentes das sentenças proferidas em primeira instância deveriam ser executadas de ofício (impulsionadas pelo juiz da causa), utilizando-se, em princípio, adaptadas às circunstâncias, as normas processuais relativas à execução trabalhista, contidas no Capítulo V do Título X da CLT ( artigos 876 a 902 ), muito embora não se tratasse de execução estritamente trabalhista, mas de natureza fiscal, processada entre o INSS e o empregador, este na condição de devedor principal e depositário das contribuições devidas pelo empregado.

Para os Juízes da 3ª região, a qual pertencemos com muito orgulho, essa atuação improvisada se estendeu de janeiro, após o recesso da Justiça do Trabalho, até abril de 1999. Após esse período, sensível aos anseios da magistratura trabalhista mineira, o TRT da 3ª Região, em resposta às muitas consultas dos magistrados, elaborou, através de sua Corregedoria, o Provimento 01/99, estabelecendo o modus procedendi em relação ao processo de execução das contribuições previdenciárias decorrentes das decisões trabalhistas, que julgamos necessário incorporar a esse trabalho, para reflexão e oportuna análise em comparação com as normas posteriormente editadas em virtude da Lei 10.035/00, que vieram suprir a lacuna legislativa até então existente (na íntegra, em apêndice, juntamente com a mencionada lei).

Como se poderá observar, dentre as "recomendações" e "determinações" constantes no referido Provimento, destinadas aos juízes de primeira instância, encontravam-se as de :

a) discriminação, nas decisões cognitivas ou nos acordos homologados, das parcelas de natureza salarial e indenizatórias, bem assim a delimitação da responsabilidade de cada parte em relação ao recolhimento das contribuições previdenciárias ( art. 1º ) ;

b) determinação de execução, de ofício, das contribuições previdenciárias incidentes, relativas às decisões proferidas, após o seu trânsito em julgado, e aos acordos homologados, com observância dos trâmites previstos no Capítulo V da CLT - "Da Execução", aplicáveis ao processo de execução trabalhista (art. 2º);

c) liquidação do processo, inclusive no tocante às verbas devidas à Previdência, com intimação das partes ( Reclamante e Reclamado ) para a apresentação da versão de seus cálculos, providência suprível, ante a omissão destas, através dos cálculos elaborados pelo "setor próprio" ( entenda-se, setor de cálculos do Foro ), com vistas ao INSS, por 10 dias, através de sua unidade local, com intimação via postal ( art. 3º e seu § 1º ) ;

d ) Após a ciência do INSS, homologados os cálculos, a determinação de expedição de mandado de citação do devedor para o pagamento do débito, inclusive aquele relativo à Previdência Social e, na ausência de quitação espontânea, a determinação de prosseguimento da execução na forma dos arts. 880 e seguintes da CLT, com os recursos e impugnações inerentes ( artigos 5º, 6º e 7º );

e) processamento, em autos apartados, do agravo de petição que versasse exclusivamente sobre as contribuições previdenciárias; ainda, o parcelamento do débito pelo INSS com efeito suspensivo da execução, orientações às Secretarias do Juízo quanto à remessa mensal de cópias das guias de recolhimento de contribuições previdenciárias efetivado nos autos e informação à Corregedoria do montante arrecadado. ( artigos 8º, 9º e 10º ).

Assim, face à lacuna existente no período de abril de 1999 a outubro de 2000 ( quando foi sancionada a Lei 10.035/00), as ações do Judiciário Trabalhista Mineiro, no tocante à execução das contribuições previdenciárias, foram ditadas pelo referido Provimento, adaptadas aos trâmites da execução trabalhista. Mas, ainda assim, apesar de todos os percalços, obteve-se resultado bastante favorável – e até certo ponto, surpreendente – relativamente ao montante dos valores arrecadados. E ao que parece, esse foi um dos motivos – senão o principal - que levaram à concepção do § 3º do artigo 114 da CF/88 pela E.C. 20/98.[17]

Após esse longo período de lassidão das autoridades competentes, finalmente, em outubro de 2000, editou-se a Lei 10.035/00, em vigor a partir de 26 de outubro do mesmo ano, que, promovendo alterações na estrutura da CLT, na parte relativa às decisões e ao processo de execução, veio preencher o vazio até então existente, estabelecendo regras próprias para a liquidação e execução das contribuições previdenciárias, no âmbito da Justiça do Trabalho.

Uma perfunctória análise de seu conteúdo revelará que muitas das disposições do Provimento 01/99-TRT- 3ª Região serviram-lhe de inspiração. Veja-se, por exemplo, a correspondência de seu artigo 1º com o § 3º do artigo 832 da CLT; ou de seu artigo 2º com o parágrafo único do artigo 879 da CLT; ou ainda, do artigo 3º, "caput" e seu § 1º, com os §§ 1º-B e 3º do artigo 879 da CLT; de seu artigo 6º, com o artigo 889-A da CLT ; da parte final de seu artigo 7º, no tocante ao julgamento dos embargos à execução e impugnações à conta de liquidação com a disposição do § 4º do artigo 884 da CLT; de seus artigos 8º, 9º e 10º, com, respectivamente, o disposto nos artigos 897, § 8º e 889, §§ 1º e 2º, ambos da CLT.

No bojo dessas alterações, todo o procedimento administrativo-fiscal que se adotava anteriormente a dezembro de 1998, para fins de constituição, exigibilidade e recebimento desses mesmos créditos – resultantes das decisões trabalhistas – com vistas à formação do título executivo extrajudicial ( arts.39, § 1º da Lei 8212/91 e 585, VI, CPC ), foi simplificado. Anteriormente a 15 de dezembro de 1988, em havendo – decorrentes de decisões e acordos homologados - pagamento de "direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária", cumpria ao juiz da causa, tão somente, determinar " [...] o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social", e velar " [...] pelo fiel cumprimento..." desta determinação, fazendo notificar o INSS "[...] dos termos da sentença ou do acordo celebrado." ( artigos 43 e 44 da Lei 8212/91) ].

Na nova realidade, os juízes do trabalho de primeira instância ficam obrigados a "indicar " sempre, quando da prolação das decisões, "...a natureza jurídica das parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado... ", delimitando, ao mesmo tempo e na oportunidade, a responsabilidade de cada parte no recolhimento da contribuição previdenciária decorrente, se houver ( art.832, § 3º, CLT ).

Visa essa medida, obviamente, tornar clara a natureza de cada parcela, de modo a propiciar, quando da liquidação da sentença, a verificação de sua adequabilidade às hipóteses de incidência previstas na Lei 8.212/91 ( art. 28 ), bem como a determinação das alíquotas aplicáveis e delimitação da responsabilidade de cada contribuinte em relação ao seu recolhimento ( art. 20, empregado ; art. 22, empregador ). E ela é bastante eficaz, pois de forma salutar elimina todos os trâmites burocráticos legalmente concebidos para a constituição e exigibilidade dos créditos previdenciários, mesmo os decorrentes de decisões trabalhistas, tal como ocorria anteriormente a 16 de dezembro de 1998.

Indicada, pois, a natureza jurídica de cada parcela objeto da condenação e transitada em julgado a decisão, nada há mais a discutir nesse particular ( arts.467,CPC e 879, § 1º, CLT ). Excetuam-se, aqui, contudo, as sentenças homologatórias de conciliação, que produzem, entre as partes, os efeitos de coisa julgada, salvo em relação à Previdência Social " (...) quanto às contribuições que lhe forem devidas." ( art. 831, parágrafo único, CLT ). Nesses casos - e tão somente, porquanto a lei não ordena que se intime o INSS das demais decisões, senão das homologatórias -, poderá esse recorrer ordinariamente da sentença homologatória, exclusivamente quanto à natureza jurídica das parcelas indicadas na ocasião. ( arts. 832, §§ 3º e 4º, 893, II e 895, "a", da CLT, no prazo de 16 dias, conforme o disposto no art.1º, inciso III, do Decreto-Lei n.º 779/69).

Ato contínuo, proceder-se-á à liquidação do processo, que abrangerá, também, o cálculo das contribuições previdenciárias devidas, concernentes às parcelas indicadas na decisão (ou acordo homologado), ônus das partes que integraram o processo principal ( art. 879, §§ 1º-A e 1º-B, CLT). Caso estas não o façam, como deflui do disposto no § 3º, primeira parte, do art. 879 da CLT e, no nosso entender, exclusivamente no caso de reclamações atermadas ( arts. 791, da CLT e 4º da Lei 5584/70 e mesmo assim para os cálculos simples, de menor complexidade ), fá-lo-á a Contadoria do Juízo. Em outras situações, o Provimento 03, de 17 de julho de 1991, da Corregedoria do TRT da 3ª Região, ainda em vigor, limita as atribuições do setor de cálculo do Juízo, atribuindo às partes, pena de ser determinada a realização de perícia para estes fins, com os ônus dos honorários periciais recaindo sobre as mesmas, a obrigação de apresentar os cálculos de liquidação, como se vê adiante :

Art. 1º - As partes deverão apresentar cálculo de liquidação das decisões sujeitas a execução, no prazo comum de dez dias, a contar do recebimento da intimação específica para tal fim.

§ 3 º - Inexistindo manifestação [...], o Juiz do Trabalho [...] nomeará, imediatamente, contador ou perito para elaborar laudo, em prazo prefixado segundo a complexidade do trabalho a ser executado.

Art. 2º - Os honorários do contador ou perito serão fixados o prudente arbítrio do Juiz do Trabalho [...] e deverão ser pagos pelo executado, ou pelo reclamante, quando este houver dado causa desnecessária à atuação do nomeado.

O procedimento acima é adotado na 3ª Região, exceto quando se tratar do Poder Público, como disposto no Provimento 01, de 20 de setembro de 1993, oriundo do mesmo Órgão, verbis :

Art. 1º - Nas reclamações trabalhistas movidas contra entidades integrantes da Administração Pública Direta e Indireta, nesta incluídas as Autarquias como tal criadas em lei, e as Fundações Públicas da União, dos Estados e Municípios, os cálculos de liquidação serão elaborados pela Diretoria do Serviço de Cálculos Judiciais, relativamente aos processos em curso nesta Capital, e pelas Secretarias [...] no âmbito das demais Juntas de Conciliação e Julgamento desta Terceira Região.

Em face do exposto, para evitar-se qualquer interpretação equivocada a respeito, - como, por exemplo, a afirmação de que, a partir do advento da Lei 10.035/00, por força do disposto no § 3º do art. 879, omitindo-se as partes quanto à obrigação de apresentarem os cálculos de liquidação, consubstanciada no § 1º-B do mesmo dispositivo, seria tal omissão suprida pelo Setor de Cálculos Judiciais do Juízo, a quem incumbiria fazê-lo - melhor seria que o legislador tivesse sido mais explícito, utilizando na referida norma, entre as expressões "órgãos auxiliares", a conjunção alternativa "ou", caso em que o texto legal seria construído nesses termos : "Elaborada a conta pela parte, pelos órgãos ou auxiliares da Justiça do Trabalho, o juiz procederá à intimação [...], etc. ". Nesse caso, todas as hipóteses que aventamos estariam contempladas, visto que, por "órgãos", entender-se-ia a Contadoria do Juízo, nas hipóteses previstas no Provimento 01/93-TRT-3ª Região e na Lei 5584/70, art. 4º ; por "auxiliares", o perito ou contador, em consonância com o Provimento 03/91-TRT-3ª Região e o disposto no art. 145 do CPC, subsidiário.

No entanto, da forma como se encontra redigido o texto legal, só se pode entender como "órgão auxiliar" da Justiça do Trabalho o setor de Cálculos Judiciais do Foro, e a hipótese de açambarcar esse, toda e qualquer responsabilidade pela elaboração de cálculos de liquidação em virtude da omissão das partes é absurda e inaceitável. Além de inexistir uma estrutura administrativa que suporte o volume dos serviços que resultaria, a prevalecer esse entendimento, ainda se estaria premiando a parte omissa, beneficiando-a, ao invés de puni-la. Mesmo sendo o INSS o maior interessado, tal não se pode admitir, porquanto não se espera que o Serviço de Cálculos Judiciais promova a liquidação parcial dos créditos previdenciários, sem fazê-lo em relação aos valores principais, dos quais aqueles dependem em face de seu caráter acessório. Assim, sub censura, o entendimento que manifestamos acima é o que melhor concilia os interesses do INSS e da Justiça do Trabalho.

Prosseguindo na caminhada, temos que, elaborada a conta, pelas partes, pelo Setor de Cálculos Judiciais do Juízo ou, na nossa realidade, através de perícia determinada na forma do Provimento 03/91-TRT- 3ª Região, proceder-se-á à intimação do INSS, por via postal, para que sobre ela se manifeste no prazo preclusivo de 10 (dez) dias, pena de preclusão. É só nesse momento que o INSS passa a falar nos autos e assume a sua posição no processo, visto que a execução é impulsionada, de ofício, pelo Juiz da causa ( art.876, parágrafo único, CLT).

Alegam alguns – e essa circunstância tem sido levantada em "exceções de pré-executividade" que vêm sendo interpostas – que talvez aqui se possa enxergar omissão por parte do legislador, lesiva aos interesses do Executado, porquanto, não tendo esse "vista" dos cálculos elaborados pelo Juízo e homologados eles à sua revelia, estar-lhe-ia sendo negado o contraditório, cerceando-lhe o direito de defesa.

Não entendemos assim.

O dispositivo sob análise contempla duas hipóteses : a da elaboração e apresentação dos cálculos liquidatórios – incluídos os relativos à contribuição previdenciária -, pelos próprios devedores, para posterior manifestação do INSS, o Credor, e aquela que contempla a omissão das partes, suprível pelo Setor de Cálculos do Juízo, como se viu, somente nos casos em que estiverem elas litigando ao abrigo do disposto no art. 791 da CLT.

Na primeira hipótese, não se vislumbra nenhuma dificuldade, porquanto os valores relativos ao crédito da Previdência Social são apresentados pelo próprio contribuinte/devedor, para análise e posterior manifestação do INSS no prazo de 10 dias, "[...] pena de preclusão", o que equivale dizer que, no silêncio desse, os cálculos serão tidos por corretos e como tal homologados. Se vão ser espontaneamente satisfeitos, isso é outra história !

Já na segunda - cálculos efetuados pela Contadoria do Juízo - embora a lei só determine a intimação do INSS para sobre eles se manifestar, não se pretendeu, nessas circunstâncias, privilegiar o credor em detrimento dos direitos e interesses do devedor. Pode-se afirmar, com convicção, que o dispositivo sob comentário não fere, em relação ao devedor, o seu direito ao contraditório e à ampla defesa.

Mesmo soando estranha tal afirmação, ela se faz com base no fato de que a lei assegura ao devedor, quando da interposição dos embargos à penhora ( ou à execução ) - o que deve ser feito no prazo de 5 (cinco) dias após garantida a execução ou penhorado os bens, na forma do § 3º do artigo 884 da CLT - o direito de impugnar "a sentença de liquidação" ( embora a lei use a terminologia "sentença", trata-se, na verdade, de uma "decisão interlocutória" ) e com ela, os cálculos elaborados pela Contadoria do Juízo, sejam os relativos aos autos principais, sejam aqueles concernentes às parcelas previdenciárias. E se a decisão dos embargos lhe for desfavorável, poderá ainda atacar o "mérito" daquela decisão homologatória, quando da interposição do Agravo de Petição ( arts. 893, inciso IV e § 1º e 897, letra "a", da CLT ).

Embora se estenda ao Exeqüente, - no caso o INSS - "...igual direito e no mesmo prazo", deve-se interpretar essa norma em consonância com o disposto no § 3º do artigo 879 da CLT, ou seja, se o INSS, com vistas dos cálculos, deixar de se manifestar no prazo de 10 dias de que fala a lei, não poderá fazê-lo em sede de impugnação, na forma do artigo 884, "caput", in fine" e § 3º, da CLT, porquanto precluso estará o seu direito. Admitindo-se o contrário, aí sim, estar-se-ia cerceando o direito de ampla defesa do devedor/executado e negando-lhe o contraditório, fazendo notório o tratamento desigual que se estaria dispensando às partes.

Vale a pena transcrever o que a respeito, em comentário ao art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, escreveu RODRIGO CÉSAR REBELLO PINHO :

Uma das decorrências desse princípio é o da igualdade entre as partes de uma relação processual. Não podem ser atribuídas a uma delas vantagens de que a outra não disponha. Deve existir paridade de forças. A ampla defesa constitui decorrência lógica do princípio do contraditório. Ao réu devem ser concedidas todas as oportunidades para ver respeitado o seu direito [...].[18]

Em seqüência, opostos os embargos à execução, se desfavorável a decisão, poderá o Executado interpor recurso próprio – Agravo de Petição -, que, se versar apenas sobre as contribuições previdenciárias, será autuado em apartado para remessa à Instância Revisora ( artigos 897, letra "a" e §§ 3º e 8º, da CLT). Aqui se revela, com mais nitidez, a total autonomia e independência do processo de execução das contribuições previdenciárias em relação àquele que se desenvolve visando o recebimento dos créditos derivados da relação principal. Em outras palavras, a interposição de recurso por parte do INSS, relativamente ao que se decidiu em sede de "impugnação à liquidação", não interrompe e nem prejudica o processamento da execução principal.

Seria ideal que o mesmo ocorresse em relação aos acordos homologados, na hipótese de interposição de recurso ordinário na forma prescrita no § 4º do artigo 832 da CLT. Esse, a nosso ver, deveria também ser processado em apartado e, nessa condição, remetido ao Tribunal para apreciação, exatamente para que não haja solução de continuidade quanto à regular tramitação do processo principal, mormente quando encontrar-se ele em fase de cumprimento da avença, nos casos de pagamento parcelado do valor respectivo, o que é muito comum na nossa realidade diária.

Julgado o Agravo de Petição, na hipótese acima, e proferido o acórdão respectivo – que não é recorrível, salvo se houver na decisão respectiva ofensa direta e literal à Constituição Federal, conforme dispõe o art. 896, § 2º, da CLT - uma vez transitado em julgado e baixados os autos, a execução prosseguirá em seus trâmites regulares.

Como se vê, o processo é simples e célere e nem por isso deixa de assegurar às partes – mais de uma vez - a oportunidade de discutir, amplamente, as questões que constituem o objeto da ação.

E nessa esteira de entendimento, pode-se afirmar com convicção, sem o temor de se estar cometendo alguma heresia jurídica, na situação sob análise, a inexistência de qualquer ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal ( que se revela na proteção outorgada pela Constituição, contra atitudes arbitrárias e opressoras por parte do Poder Público, inclusive através de leis dele emanadas, no sentido de subjugar e sujeitar o cidadão à sua vontade despótica e soberana ; art. 5º, LIV, CF/88). Não há, como se vê, nenhum vestígio de arbítrio por parte do Estado, através do Legislador, quando da implementação das alterações introduzidas na CLT pela Lei 10.035/00, em regulamentação do § 3º do artigo 114 da CF/88, que, como se pôde perceber, repise-se, teve o cuidado de resguardar os direitos do contribuinte/devedor, de impugnar e discutir, no processo de execução das contribuições previdenciárias, os cálculos, valores e até mesmo a existência do crédito respectivo. Como decorrência do primeiro princípio, estar-se-ia assegurando aqui ao executado, no mesmo processo, o contraditório e a ampla defesa.

Sob o aspecto jurídico, é incontestável a possibilidade de se exigir, através do processo de execução e nos mesmos autos em que foram proferidas as decisões trabalhistas, o pagamento dos créditos previdenciários delas decorrentes.

Antes mesmo do advento da EC 20/98, vale repetir, o direito aos créditos previdenciários, oriundos dos efeitos secundários ou anexos das decisões proferidas ou acordos homologados pela Justiça do Trabalho, já existia e era reconhecido e declarado por lei ( art. 43, Lei 8212/91 ), só que exigíveis – se não recolhidos espontaneamente nos autos do processo trabalhista - em relação previdenciária principal perante a Justiça Federal. O que a Emenda Constitucional n.º 20/98 fez, concedendo à Justiça do Trabalho a competência para executá-los diretamente, de ofício – procedimento que a Lei 10.035/00 regulamentou - foi otimizar o procedimento para a sua apuração, no sentido de, simplificando-o, suprimindo trâmites burocráticos desnecessários, agilizar a forma de sua exigibilidade e recebimento, mas sempre com o cuidado de resguardar, ao devedor, o direito de discuti-los, não só quanto aos valores apurados e formas de sua atualização, como também e até mesmo, em face da lei, quanto à sua própria existência.

Não se enxerga, assim, em conclusão, nenhuma eiva de inconstitucionalidade, seja no § 3º do artigo 114 da Constituição Federal em vigor, seja na Lei 10.035/00 que o regulamentou e adaptou ao processo de execução trabalhista.


8 – Conclusão

Neste estágio, após um longo caminho percorrido e analisadas, senão todas, mas muitas das questões que envolvem a matéria, pode-se, em síntese, concluir.

Primeiro, que o § 3º do artigo 114 da Constituição Federal em vigor, bem como a Lei 10.035, de 25 de outubro de 2000 que introduziu mudanças no Título X, Capítulo II, Seção X ; Capítulo V, Seções I, II, III, IV e Capítulo VI da CLT, ao instituir e regulamentar, respectivamente, no âmbito da Justiça do Trabalho, um novo e sui generis processo de execução fiscal, relativo aos créditos previdenciários devidos e decorrentes das decisões por ela proferidas, não vulneraram, em relação aos contribuintes/devedores, os direitos constitucionalmente assegurados do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, vez que, a simplificação do processo de apuração dos referidos créditos e a agilização do procedimento para a sua exigibilidade, seja por satisfação espontânea ou através de execução forçada, deram-se assegurando ao devedor, seja na fase de liquidação da sentença ( art.879, §§ 1º-A, 1º-B e 2º, da CLT), seja na de sua execução ( arts. 884, § 3º; 893, IV e § 1º e 897, "a", da CLT), o direito de discutir os valores levados à execução, afastando, assim, em relação aos mesmos, qualquer eiva de inconstitucionalidade.

Segundo, que as "contribuições sociais" a que se refere o mencionado dispositivo legal, objeto de execução perante a Justiça do Trabalho, são, exclusivamente, aquelas devidas à Previdência Social, incidentes sobre as parcelas deferidas ao empregado/reclamante na decisão ou constantes do acordo celebrado, segundo a indicação de sua natureza jurídica ( arts. 28, Lei 8212/91 e 832, § 3º, CLT), incidindo, nessa última hipótese, sobre o valor total do acordo, quando omitida a discriminação das parcelas a que se refere ( art. 43, parágrafo único, Lei 8212/91, aplicável somente nas hipóteses de "acordo", visto que na parte relativa às "sentenças judiciais", foi o dispositivo derrogado, na forma prescrita no artigo 2º, § 1º da LICC, pelo § 3 º, do art. 832 da CLT, ali introduzido pela Lei 10.035/00). Incluem-se, aqui, os acordos celebrados em que não haja o reconhecimento do vínculo empregatício.

Terceiro, que as sentenças exeqüíveis perante a Justiça do Trabalho a partir de 16 de dezembro de 1998 são as condenatórias e as constitutivas, em que haja condenação em parcelas de natureza estritamente trabalhista, devidamente individualizadas, bem assim aquelas homologatórias de acordo (art. 831, parágrafo único, CLT), não se admitindo, contudo, a execução das contribuições previdenciárias porventura devidas em virtude dos efeitos reflexos de sentenças meramente declaratórias, nas hipóteses já aventadas, que deverão ser objeto de apuração e constituição prévia em procedimento administrativo próprio e executadas, se for o caso, perante a Justiça Federal, em relação previdenciária principal.

Quarto, que o crédito previdenciário, nas ações trabalhistas, se constitui e tem como fato gerador a própria sentença nelas proferidas, em face de seus efeitos anexos ou secundários, sendo a própria decisão, na forma da lei, o título executivo hábil a legitimar a execução ( art. 584, inciso I, CPC c/c art. 769, CLT). Em conseqüência disso, discriminadas na decisão, a natureza jurídica das parcelas objeto da condenação, para fins de determinação da incidência das contribuições previdenciárias segundo as hipóteses legais ( art. 28, Lei 821/91 ), e uma vez transitada em julgado a decisão, essa circunstância se coloca também sob o abrigo da coisa julgada, não podendo mais ser objeto de discussão e/ou impugnação no processo de execução ( art.879, § 1º, CLT). Daí afirmar-se que, mesmo na hipótese em que as partes venham a transigir nessa fase, os créditos assegurados ao INSS não poderão ser objeto de transação, sendo devidos, independentemente da conciliação, pelos valores originais reconhecidos na sentença ( inteligência dos artigos 467, CPC e 1.031 do CCB ).

Quinto, que o § 3º do artigo 114 da CF/88 concebido pela EC 20/98 instituiu, na Justiça do Trabalho, ao ampliar-lhe a competência, um novo e "sui generis" processo de execução fiscal das contribuições previdenciárias decorrentes de suas decisões. Em relação, pois, a essas contribuições, especificamente, a competência trabalhista é exclusiva e não concorrente com a da Justiça Federal, o que se infere pelo disposto na parte final do artigo 109, inciso I da CF/88 que exclui, expressamente, do âmbito da competência desta, as causas sujeitas àquela. Entretanto, a competência da Justiça Federal foi preservada para a execução das contribuições previdenciárias devidas, na forma da lei, em relação previdenciária principal, apuradas em procedimento administrativo-fiscal próprio.

Sexto, que, embora não participando do processo de cognição, o INSS é parte legítima para figurar no pólo ativo da execução que se processa perante a Justiça do Trabalho, visto que é inquestionável o nascimento do crédito a seu favor em virtude da decisão ali proferida, como se viu, face aos efeitos reflexos, anexos ou secundários dessa ( art.33, Lei 8212/91 ). Esses efeitos, com o poder de gerar tais créditos, já eram reconhecidos antes mesmo do advento da EC 20/98, encontrando previsão, inclusive, no Plano de Custeio da Seguridade Social, no art. 43, Lei 8.212/91. Só que naquele tempo, o crédito, para sua constituição e exigibilidade, necessitava ser apurado em procedimento administrativo-fiscal próprio, exigindo, no caso de cobrança judicial, a sua inscrição prévia na Dívida Ativa do INSS, com vistas à formação do título executivo, nesse caso, de natureza extrajudicial ( arts.33, § 7º, 39, § 1º Lei 8212/91 e 585, inciso VI, CPC). Assim, o mérito da EC 20/98 foi o de simplificar todo esse procedimento burocrático - exclusivamente em relação aos créditos oriundos das decisões trabalhistas - sem alterar a substância do direito..

Em sétimo lugar e finalmente, os efeitos práticos dessa alteração, de que resultou um significativo aumento de arrecadação das contribuições previdenciárias no âmbito da Justiça do Trabalho, por si só, justificam-na e lhe dão legitimidade, em face do interesse social envolvido. Os recursos arrecadados destinam-se a financiar a Seguridade Social que alcança, ampara, beneficia e assiste, indistintamente, a todos os cidadãos, desde que geridos e aplicados com sensibilidade social, austeridade, honestidade e competência. É o que se espera !


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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2) BRASIL. Consolidação das leis do trabalho: e legislação trabalhista. Antônio Luiz de Toledo, Márcia Cristina V. dos Santos Windt e Lívia Céspedes (Colab.) 29. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

3) BRASIL. Constituição Federal (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília DF: Senado 1998.

4) BRASIL. Lei federal 8.212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio e dá outras providências. D.O.U 25.07.1991.

5) BRASIL. Lei federal 10.035, de 25 de outubro de 2000. Altera a consolidação das Leis do Trabalho CLT, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 5.452, de 1º de maio de 1943, para estabelecer os procedimentos, no âmbito da Justiça do Trabalho, de execução das contribuições devidas à Previdência Social.

6) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Provimento nº 03, 17 de jul. 1991. Simplifica procedimentos de liquidação trabalhista

7) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Provimento nº 01, 20 de set. 1993. Institui nova sistemática de cálculos de liquidação em reclamatórias trabalhistas movidas contra Entidades Públicas em geral.

8) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Provimento n.º 01, 17 de abr. 1999. Dispõe sobre os procedimentos a serem adotados com relação à execução e ao recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social pelas MM. JCJs da Terceira Região.

9) FREITAS, Jônatas Rodrigues de. A execução das Contribuições Sociais na Justiça do Trabalho. Belo Horizonte, maio, 2002. Disponível em: http://www.faroljuridico.com.br. Acesso em: 10 ago. 2002.

10) JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. v. 1, 26. ed. Rio de Janeiro: Forense. 1999.

11) JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. v. 2, 7.ed. Rio de Janeiro: Forense. 1991

12) MARTINS, Sérgio Pinto. Fundamentos de Direito da Seguridade Social. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

13) MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981.

14) MERÇON, Paulo Gustavo de Amarante. Sentença Trabalhista e o Efeito Anexo Condenatório das Contribuições Previdenciárias. - Revista Síntese Trabalhista, jul.2000, Ed. Síntese, n. 157, p.24 a 43.

15) OLIVEIRA, Francisco Antônio de. Manual de Processo do Trabalho. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

16) REBELLO, Rodrigo César. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

17) TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. Liquidação da Sentença no Processo do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTR, 1991.

18) VIDIGAL, Márcio Flávio Salem. Sentença Trabalhista: Teoria e Jurisprudência. Rio de Janeiro: Aide, 1997.


Notas

1- "Fundamentos de Direito da Seguridade Social", 3ª edição, 2002, Editora Atlas, p.34.

2- Direito Municipal Brasileiro, 4ª ed., 1981, Ed. Revista dos Tribunais, p.151.

3- obra citada, pág.80.

4-obra. citada, pag.149

5- "A Execução das Contribuições Sociais na Justiça do Trabalho ", maio/2002 – Farol Jurídico - site

6- HUMBERTO THEODORO JÚNIOR; Curso de Direito Processual Civil, Vol. I, 26ª edição, Ed. Saraiva, p.518

7- HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, obra citada, p. 518/519.

8- obra citada, p.519.

9- Sentença Trabalhista - Teoria e Jurisprudência, Ed. AIDE, 1997, p.39.

10- obra citada, p.40.

11- Curso de Direito Processual Civil, vol. II – Processo de Execução e Processo Cautelar – 7ª edição, Ed. Forense, 1991, p. 715.

12- Manual de Processo do Trabalho, 2ª edição, 1999, Editora Revista dos Tribunais, p.153.

13- Liquidação da Sentença no Processo do Trabalho – Ed. LTR, 3ª ed.1991, p.31/32/33.

14- obra citada, p. 33.

15- H. THEODORO JÚNIOR, ob. citada, vol. I, p.54

16- "A Sentença Trabalhista e o Efeito Anexo Condenatório das Contribuições Previdenciárias" - Revista Síntese Trabalhista, edição de julho de 2000, Ed. Síntese, n. 157, p.24 a 43 sob o título

17- Só no primeiro semestre do ano de 2002, foram arrecadados, na 3ª Região, R$38.528.582,83.

18- "Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais", 3ª edição, 2002, Ed. Saraiva, p. 115


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOTTA, José Carlos Lima da. A competência da Justiça do Trabalho na execução das contribuições previdenciárias. Emenda Constitucional nº 20/98; art. 114, § 3º da Constituição Federal e Lei nº 10.035/2000. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3378. Acesso em: 18 abr. 2024.