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Processo eletrônico e o princípio da extraoperabilidade.

A conexão a serviço da causalidade (informação), da estrutura (operação) e da juridicidade

Processo eletrônico e o princípio da extraoperabilidade. A conexão a serviço da causalidade (informação), da estrutura (operação) e da juridicidade

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O artigo busca atualizar a teoria dos sistemas de Niklas Luhmann para o processo eletrônico, em que novas conexões (eConexões) permitem uma transformação informacional e estrutural.

Resumo: Sob luzes sistêmicas, este artigo apresenta elementos para a atualização da teoria geral do processo. Parte da constatação axiomática de que a conexão é um elemento essencial dos sistemas e sempre existiu no processo. Depois, (1) afirma que, no processo eletrônico, o sistema eletrônico de processamento de ações judiciais (SEPAJ) permite trabalhar com uma natureza de conexão nova, tecnológica (eConexão), para plugar o processo aos demais sistemas da internet e (2) repropõe, justificadamente, o princípio da extraoperabilidade, como comando aos tecnólogos, que autoriza e baliza as relações do processo eletrônico com seu entorno, informacional e estruturalmente, via eConexões (processo plugado), visando à redução dos riscos e à preservação da aderência jurídica das inovações. Sob tal diretriz, sustenta-se ser possível: (1) aproveitar a inteligência coletiva, estruturalmente, para o desenvolvimento do SEPAJ e (2) sem ofensa à autonomia do processo, conectá-lo aos demais sistemas do mundo virtual. O corolário será o aprimoramento qualitativo da prestação jurisdicional, inclusive em celeridade. Após propor abordagem inovadora das conexões – tipos, classificação etc. –, o artigo também analisa o princípio da conexão – proposto por outro teórico – e apresenta, ao final, um quadro de dupla entrada das características dos dois princípios.

Palavras-chave: Processo eletrônico. Extraoperabilidade. eConexão. eAutos. Mundo dos autos eletrônico. eSujeito.

Sumário: Introdução.1. Noções iniciais. 1.1 Processo, SEPAJ e processo eletrônico. 1.2 SEPAJ: agente processual tecnológico (eSujeito) e eConexões (conexões tecnológicas ou eletrônicas). 2. Sistema. 2.1. O processo judicial como sistema.2.2 Sistema à luz da análise de sistemas, o processo e o SEPAJ. 2.3 Sistemas naturais e artificiais. 2.4 O sistema Pje-JT (eSujeito) e seu papel central no processo eletrônico - resolução CSJT 136. 2.5 O processo judicial como sistema híbrido: sistemas de consciência e sistemas técnicos garantindo a operação do processo. Sistema à luz da teoria social.2.5.1 Luhmann e o acoplamento dos sistemas sociais e psíquicos. 2.5.2 Acoplamento de sistemas psíquicos e técnicos: sistemas causalmente abertos e causalmente fechados. 3. Conexão. 3.1 Noções preliminares. 3.2 A conexão mediada pelo homem no processo tradicional 3.3 Conexão tecnológica (eConexão): propriedade nova do processo. 3.4 Autos eletrônicos (eAutos). Mundo dos autos. Endo e heteroconexão. 3.4.1 Heteroconexões, conexões heteroreferenciais ou contextuais. 3.4.2 Endoconexões ou conexões autoreferenciais. 3.4.3 Endoconexões gerais e particulares. 3.4.4 Autos processuais eletrônicos (eAutos) 3.5 Radicalização da noção de mundo dos autos. 4 O princípio da conexão: o que está no google está no processo. 4.1 Compreensão e extensão do princípio conforme Chaves Júnior 4.2 Entendimento e posição de outros autores. Aplicações. 4.2.1 Henrique Gouveia da Cunha. 4.2.2 Kleber Waki 5. Princípio da extraoperabilidade. 5.1 O princípio: uma diretriz estratégica para os tecnólogos. 5.2 Até onde, como e quanto usar da capacidade de conexão?. 5.3 Interoperabilidade e extraoperabilidade. 5.4 Destinatários do princípio da extraoperabilidade. 5.5 Composição mono e poliestrutural do sistema processual em papel. Imanência da extraoperação no processo. 5.6 Natureza biestrutural do processo eletrônico: sistemas técnicos e de consciência. Hibridização e efeitos. 5.7 Autonomia. 5.7.1 Visao luhmanniana de autonomia e o SEPAJ. 5.7.2 Autonomia, autarquia, abertura cognitiva e fechamento normativo. Verdade processual e verdade da rede. 5.7.3 Outros fatores da autonomia: diferenciação funcional e outros. 5.7.4 Procedimento, complexidade e ameaças à autonomia. 5.8 Acoplamento estrutural 5.8.1 Evolução do pensamento luhmanniano a respeito do acoplamento estrutural. 5.8.2 Acoplamento operativo. 5.8.3 SEPAJ e acoplamentos: add-ons, plugins, APIs. 5.9 Função do princípio da extraoperabilidade. 6. Princípios da extraoperabilidade e da conexão:aproximação. Considerações Finais. Referências bibliográficas.


Introdução

"[...] tanto quanto possível, busquemos o realizável no presente humano para um presente ainda mais humano, não para utopias irrealizáveis [...]". 2

Este artigo persegue dois propósitos: (1) propor, de forma mais ampla e fundamentada, o princípio da extraoperabilidade e (2) dar as bases para distingui-lo (ou não) do princípio da conexão. Após os itens iniciais estabelecerem noções e conceitos necessários ao desenvolvimento das reflexões, traz-se uma abordagem dos dois princípios e, ao final, num quadro de dupla entrada, listam-se as características. A conexão ocupa lugar especial no estudo, porque ambos os princípios se amparam nela. O propósito (1), acima, inclui proposta do que fazer com as conexões tecnológicas para plugar o processo com segurança na internet.

Com a transferência do processo para o mundo virtual, algumas perguntas emergem persistentemente: é possível aproveitar o que se denomina de inteligência coletiva a favor da aceleração do processo? A qualidade da prestação jurisdicional pode ser aprimorada? Há riscos decorrentes dessa transferência do processo para o ambiente virtual? Há como evitá-los? Que características deve ter o sistema eletrônico de processamento de ações judiciais (SEPAJ3) para facilitar a vida dos operadores e ajudar a otimizar, com segurança, a efetividade da atuação jurisdicional, tão desacreditada pelos resultados e tempos que demanda? O princípio da extraoperabilidade é uma tentativa de resposta a tais perguntas.

Dentre as novidades do processo eletrônico, uma é realmente revolucionária: a amplificação e transmutação das possibilidades de conexão. Estudiosos e julgadores têm se referido, em artigos e decisões, ao que denominam ampla e genericamente de conexão. José Eduardo de Resende Chaves Júnior4, inclusive, sugere um princípio da conexão5 que, sob inspiração dos marcos teóricos que adota, afirma ser um dos inovadores princípios do processo judicial eletrônico.

Segundo Heisenberg6, nossas observações estão sujeitas ao nosso método particular de questionamento. A tese aqui esposada, sob luzes sociológico-sistêmicas, começa afirmando que a conexão é um elemento essencial de qualquer sistema. Sem conexão, interna e externamente, não há sistema. Portanto, a conexão sempre fez parte do processo. Sob tal assunção teórico-sistêmica, alguns questionam a propriedade de se enunciar um princípio da conexão.

Entretanto, mesmo que a conexão, per si, não possa ser erigida à condição de princípio informativo e diferenciador do processo eletrônico, porque sempre esteve presente no processo, parece pertinente investigar o que fazer a partir da constatação teórico-empírica da existência de novas e mais amplas possibilidades de conexão no processo eletrônico e, então, enunciar um princípio. Tal comando de otimização dá as balizas para o uso das relações do sistema eletrônico com seu entorno, informacional e estruturalmente, e define as linhas gerais a serem seguidas no trabalho:

  • (a) noções iniciais e sistêmicas: sistema, elementos e propriedades, classificação dos sistemas, o SEPAJ e seu papel no processo, o processo como sistema, emergência do sistema processual híbrido, conexão, mundo e mundo dos autos, interoperabilidade e extraoperabilidade e imanência da extra-operação no processo;

  • (b) Princípio da conexão: noção e alcance;

  • (c) Princípio da extraoperabilidade: autonomia, autarquia, abertura cognitiva e fechamento normativo, diferenciação e outros fatores promotores da autonomia, acoplamento estrutural, estrutura, interpenetração e

  • (d) Quadro de características dos dois princípios.

Espera-se contribuir para aprofundar as reflexões teóricas acerca do aperfeiçoamento do processo pelas novas possibilidades de conexão.


1. Noções iniciais

1.1 Processo, SEPAJ e processo eletrônico

O processo, como método de solução de conflitos, é um sistema de sentido, um sistema de comunicação ou social, como o classifica Niklas Luhmann e se verá mais adiante. Aplicado com ou sem tecnologia, é designado de processo ou sistema processual e está estruturado nos códigos e leis. O Poder Judiciário o utiliza para o exercício de sua função de império.

O SEPAJ é um sistema técnico – um sistema de informação (SI) - que serve ao processo. É uma ferramenta funcional, algorítmica, que supõe uma infra-estrutura ampla de meios computacionais e de comunicação e que é visto como apto a acelerar e aprimorar o funcionamento do sistema social processo. O funcionamento na internet (sistema WEB) é seu traço mais marcante7.

O processo eletrônico é o processo (o método de solução de conflitos) feito com o auxílio do sistema de informação SEPAJ.

O processo, o SEPAJ e o processo eletrônico são os objetos das teorizações deste artigo. O SEPAJ é analisado sob os ângulos tecnológico – pois é um ente tecnológico – e jurídico, porque incorpora regramentos normativo-jurídicos (eNormas ou normas tecnológicas8). Trata-se, portanto, de um Sistema de Informação9 (SI) extremamente regulamentado, especializado, e que deve implementar características muito particulares. Nele, aplicando analogicamente o dizer de Ferraz Jr., o Direito “ [...] se revela não como teoria sobre a decisão mas como teoria para a obtenção da decisão.”10

1.2 SEPAJ: agente processual tecnológico (eSujeito) e eConexões (conexões tecnológicas ou eletrônicas).

A resolução CSJT 13611 erige o SEPAJ à condição de verdadeiro sujeito processual eletrônico (eSujeito, um agente automatizado12) e o chama de sistema ou de PJe-JT. Esse eSujeito vale-se de conexões de um tipo que jamais existiu no processo: as eConexões ou conexões tecnológicas, típicas do mundo virtual, que ligam sistemas técnicos com sistemas técnicos. Existem vários SEPAJ em uso: Projudi, PJe, PJe-JT, eSAJ, eProc.

O comando de otimização sobre o uso eficaz e jurídico das eConexões foi enunciado em 2009 como o princípio da extraoperabilidade, embora sem o acompanhamento das fundamentações expostas neste artigo: “um SEPAJ deve ser concebido como um subsistema autônomo e estruturalmente acoplado”.

As idéias de autonomia e acoplamento estrutural exprimem características jurídico-tecnológicas a serem observadas na definição e desenvolvimento dos SEPAJ para explorar a potencialidade das eConexões com segurança. Elas são melhor explicadas no item específico sobre o princípio da extraoperabilidade.


2. Sistema

A palavra sistema há muito é utilizada no Direito. Mas na Resolução CSJT 136, e em outras normas recentes, ela é usada com significação oriunda da área tecnológica, para referir software ou um sistema técnico. A interpretação dessas normas e o avanço teórico do Direito, e especialmente da TGP, dependem da aplicação pertinente desse conceito.

2.1. O processo judicial como sistema

Assume-se, axiomaticamente, que (1) existem sistemas e (2) o processo judicial é um sistema. Assim se afastam dilemas epistemológicos iniciais. Existem sistemas, portanto, e o processo judicial é um sistema.

Por ora, a definição de sistema de Bertalanffy13, como complexo de elementos e suas interrelações, permite incluir a presença de conexões no esforço teórico. Luhmann critica esse conceito, centrado demais no objeto e retrato de uma visão ontológica superada. A visão sistêmica, contextual, inclui também as conexões sistema/entorno14. Stair e Reynolds, da área de tecnologia, baseados em Bertalanffy, definem sistema como “um conjunto de elementos que interagem para realizar objetivos”.15

2.2 Sistema à luz da análise de sistemas, o processo e o SEPAJ

À luz da análise de sistemas, vejam-se a seguir as lições de Alan Daniels e Donald Yeates16 que são úteis há décadas.

A palavra sistema, no sentido em que se diz análise de sistemas ou engenharia de sistemas, é difícil de definir. Muitos pensam ser melhor deixá-la indefinida e captar o sentido pela observação de como é utilizada17.

Na linguagem comum, o termo é aplicado com ao menos dois sentidos diferentes do da expressão análise de sistemas. O leigo chama de sistema uma coleção de coisas similares e inter-relacionadas, como em sistema numérico, ou um conjunto de regras de procedimento como em sistema para ganhar no bilhar.

Em sentido científico, interessam as situações em que o uso da palavra implica as duas coisas simultaneamente: um conjunto de coisas inter-relacionadas associada a uma série de regras de procedimento. As coisas são os elementos do sistema, sua composição, e as regras de procedimento são a dimensão operacional do sistema.

Para que um sistema seja submetido à análise de sistemas é necessário um terceiro requisito: a composição, a operação ou ambas devem estar sob controle humano. "O sistema solar não está sujeito à análise de sistemas, mas um satélite artificial sim."18

Ludwig Von Bertalanffy, captando o elemento operativo dos sistemas e focando os sistemas vivos (biologia), varia o conceito de sistema para " [...] um complexo de elementos em interação"19. A interação, que em outro momento o estudioso chama de processo, é destacada quando diz que "habitualmente não temos nenhuma dificuldade em distinguir entre um organismo vivo e um objeto morto. Em um ser vivo inúmeros processos [...] acham-se ‘ordenados' [...] "20. E, acresça-se, operacionais. A morte significa a cessação dos processos e a permanência, apenas, dos elementos compositivos. O sistema desintegra-se.

Sob a ótica da análise de sistemas, portanto,

Um sistema é uma coleção de entidades ou coisas (animadas ou inanimadas) que recebem certas entradas e é compelida a atuar sobre elas para produzir certas saídas, com o objetivo de maximizar certas funções das entradas e saídas. A característica essencial de um sistema é sua conexidade (conectividade). Isto é, algo que consiste de partes conectadas pode ser chamada de sistema. Por exemplo, um jogo de damas é um sistema, enquanto uma peça isoladamente não é. Um carro, uma tesoura, uma economia e uma linguagem são sistemas. Eles são agregados de partes e peças, mas começam a ser entendidos apenas quando as conexões entre as partes e peças e as interações dinâmicas de todo o organismo são estudadas.21 [tradução livre; sem negritos no original]

Daniels e Yates comentam alguns dos termos postos em negrito:

  • a) atuar sobre, para enfatizar o caráter dinâmico dos sistemas. Um objeto completamente estático não é um sistema. Um edifício não é um sistema mas o hotel que está instalado nele, com suas regras operacionais, é. Na verdade, o hotel compõe-se de inumeráveis subsistemas (staff, alimentação, climatização...).

  • b) Objetivo de, para destacar que, para o âmbito da análise de sistemas, um sistema existe quando alguém tem algo em mente. Deve haver uma finalidade. Portanto, o analista de sistemas dedica-se " [...] às situações onde a interação entre a intenção humana e as ações e a performance do sistema estão sendo consideradas."

  • c) Funções, para realçar que a idéia de maximizar uma função não é restritiva e que está ligada a alguma medida de valor para o sistema. Por isso que a otimização de um sistema - que é o escopo do trabalho do analista - consiste em (a) determinar a função de valor que se deseja maximizar e (b) promover a variação da composição do sistema ou de sua operação de modo a alcançar a maximização.

Como se vê, para a análise de sistemas interessam muito particularmente os elementos e as relações, vistos como o modo de interação das partes quando o sistema opera. Elementos e operações são objetos muito caros ao tecnólogo. Mas eles ganham relevância mesmo quando há intenções humanas envolvidas na determinação das ações.

Conforme essa ligação intenção-ação, os sistemas são classificados em mecânicos (um míssil, uma máquina, nos quais a participação do homem é apenas na concepção), adaptativos (onde, em certos momentos da operação, a intervenção humana direta se faz necessária porque é impossível programar o sistema para atuar automaticamente naqueles pontos de decisão operativa) e, finalmente, há sistemas competitivos quando o sistema A opera com outro sistema B que têm por objetivo negá-lo: competição comercial e guerra são situações onde operam tais sistemas.

Sob um critério de complexidade, os sistemas podem ser classificados em simples e dinâmicos, complexos mas descritíveis e excessivamente complexos que não podem ser descritos de modo preciso e detalhado.

Um outro critério classificatório, focado no modo de operação, permite classificar os sistemas em determinísticos e probabilísticos.

Nos determinísticos, as partes interagem de modo previsível. Conhecendo-se, num certo momento, o estado do sistema e sua estrutura operacional, é possível determinar o estado seguinte sem erro. Um revólver é determinístico: aciona-se o gatilho e a bala dispara. Do contrário, há defeito.

Nos sistemas probabilísticos, nenhuma previsão exata pode ser feita. Ele não é predeterminado e as predições não escapam da lógica apenas provável de seu comportamento. Um gato é, em geral, um sistema probabilístico. A reação pode ser, repentinamente, diferente da esperada.

É possível, finalmente, classificar os sistemas conjugando os dois critérios. Um computador executando um programa, por exemplo, é um sistema complexo mas inteiramente determinístico. Uma fábrica automatizada também.

Por outro lado, merece realce o sistema complexo e probabilístico onde se enquadra o processo judicial. O processo é probabilístico por natureza e inegavelmente complexo. Submetido a um esquema de alimentação baseado na dupla contingência22 que orienta a ação dos agentes processuais e em inumeráveis outros fatores, é impossível fazer previsões exatas. As partes do processo baseiam suas predições em esperanças (expectativas) e um cientista trabalha, no caso, com a teoria da probabilidade. O conjunto de variáveis e respectivos efeitos sobre os resultados são imperscrutáveis.

Até a chegada das novas tecnologias, o processo foi um sistema cujas operações estavam baseadas em humanos (sistemas psíquicos) e não se chamava analista de sistema para otimizar o procedimento. No máximo se recorria a um analista de organização e métodos. O SEPAJ, ao contrário, é um sistema determinístico, complexo, que está incumbido, ao lado dos operadores humanos, de concretizar a operação do processo eletrônico. Sobre ele atuam os analistas de sistemas.

O processo eletrônico é um sistema social, claramente adaptativo (o homem interfere constantemente), mas que ganhou espaços determinísticos, nos quais a operação está entregue a agentes automatizados, programas de computador, algoritmos ou agentes tecnológicos (eSujeitos). No todo, o processo eletrônico continua probabilístico como decorrência dos segmentos operativos que se mantêm probabilísticos.

Portanto, como se acentuará em item próprio, o processo eletrônico evoluiu para uma estrutura compositiva híbrida: trechos estruturais probabilísticos com trechos determinísticos. O princípio da extraoperabilidade está dirigido ao desenvolvimento do SEPAJ, o sistema de informação incumbido de garantir a operacionalidade do sistema nos trechos determinísticos.

2.3 Sistemas naturais e artificiais

Foque-se o procedimento, a sequência ordenada de atos, o elemento dinâmico, o corpo físico do processo, conforme a expressão de Dinamarco e deixem-se de lado as relações entre os sujeitos da relação processual (o elemento invisível do processo, na lição do mesmo Dinamarco). O procedimento, agora, é operado por sistemas de consciência (homens) e pelo SEPAJ, um sistema técnico.

Os sistemas naturais - não construídos pelo homem, como é o caso da consciência - adaptam-se ou evoluem sem controle humano, permita-se dizer. Os sistemas artificiais, ao contrário, são sensíveis às inovações, sejam do meio, sejam dos instrumentos de que são feitos. Sofrem o influxo aperfeiçoador porque seus artífices estão sempre incorporando avanços dos instrumentos e ganhando melhorias das condições de alcançarem mais eficientemente seus objetivos. A evolução é induzida.

Avanços da tecnologia, no caso do processo eletrônico, deveriam ser consistentemente incorporados, no sentido de chegar ao subsistema determinístico do processo - o SEPAJ - com rapidez, para aperfeiçoar, do ponto de vista sistêmico, o processo ao qual está vocacionado a servir.

O princípio da extraoperabilidade é um comando aos tecnólogos para que atuem no desenvolvimento do sistema técnico de modo a aproveitar, em prol do processo, as possibilidades que o ente tecnológico abre para a maximização do mecanismo decisório do Direito. No caso, buscam-se os benefícios da conexão técnica (eConexão) com o entorno virtual, observados requisitos de segurança e juridicidade.

2.4 O sistema Pje-JT (eSujeito) e seu papel central no processo eletrônico - resolução CSJT 136.

Para o estudo do princípio da extraoperabilidade, é fundamental perceber e entender o elemento diferenciador dos processos tradicional e eletrônico: o SEPAJ. A Resolução CSJT 136 rege o processo judicial eletrônico no âmbito da Justiça do Trabalho e torna o SEPAJ PJe-JT – o sistema! - indispensável à instauração e desenvolvimento de um processo trabalhista. Um sujeito eletrônico (eSujeito).

Vários e diferentes SEPAJ foram desenvolvidos após a edição da lei do processo eletrônico, em 2006: Provi/SC, Projudi, eProc/TRF4, eSAJ etc.23 Atualmente, o Conselho Nacional de Justiça tem investido intensamente no SEPAJ chamado PJe, cuja versão derivada PJe-JT, especializada para a Justiça do Trabalho, é a que vem sendo implantada com pretensão de unicidade nesse ramo especializado da Justiça brasileira. Nos últimos anos, por determinação do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), só podem ser instaladas novas varas se forem eletrônicas24. Varas antigas podem deter processos eletrônicos (novos) e tradicionais (início anterior à introdução do SEPAJ). Varas eletrônicas só terão processos eletrônicos.

A Resolução CSJT 136 contém 73 vezes a palavra sistema, a maioria delas com sentido de software ou programa de computador. No artigo 1º, a resolução estabelece que "a tramitação do processo judicial no âmbito da Justiça do Trabalho, a prática de atos processuais e sua representação por meio eletrônico [...] serão realizadas exclusivamente por intermédio do [...] PJe-JT regulamentado por esta Resolução."

No artigo 2º, PJe-JT fica incumbido do controle do sistema judicial em relação à tramitação do processo, à padronização de todos os dados e informações, à produção, registro e publicidade dos atos processuais e ao fornecimento de dados essenciais à gestão.

No glossário do artigo 3º, inciso IX, presente na resolução porque, nesta era de incorporação tecnológica ao processo, tornou-se moda do legislador explicitar conceitos operacionais/interpretativos, o juiz é reduzido à condição de usuário interno do sistema, equiparado a servidores e outros a quem se conceder a permissão de uso das funcionalidades internas, como estagiários e terceiros. E no inciso X, advogados, membros do MP e partes são classificados como usuários externos.

O artigo 4º, caput, tem como destinatário o eSujeito sistema, que fica incumbido de prover o meio eletrônico para a instauração e desenvolvimento do processo e de zelar para que tudo que chegue aos autos esteja assinado digitalmente e contenha elementos que permitam a identificação inequívoca do autor do documento.

O artigo 5º autoriza o eSujeito sistema a negar acesso ao espaço processual a todos os usuários, internos ou externos, inclusive ao Juiz, portanto, nos casos enumerados nos respectivos incisos, se o usuário não puder identificar-se inequivocamente por assinatura digital.

O artigo 11 autoriza o eSujeito sistema a negar-se a atender, ou seja, a negar-se a pôr em execução qualquer de suas funcionalidades, se o solicitante interlocutor não estiver autorizado à prática daquele ato segundo um esquema de identificação/permissão previamente definido pelo CSJT.

Continuando essa rápida mirada da resolução, cujo objetivo é realçar o papel superior que o agente automatizado sistema tem no processo judicial eletrônico, encontram-se, na seção III, vários papéis reservados ao Pje-JT. Diz o artigo 18 que "o sistema receberá arquivos com tamanho máximo de...", realçando o papel de controle das condições de produção dos atos processuais. Na interlocução com os usuários, o eSujeito está autorizado a não receber documentos fora das especificações, exatamente como faziam os chefes de distribuição em relação a documentos acostados sem observância das regulamentações internas dos tribunais. Se o usuário preferir juntar documentos em PDF, o eSujeito estará obrigado a recebê-lo, não podendo exigir a utilização de sua funcionalidade de edição de texto. No parágrafo 3º do artigo 18, a resolução estabelece que o sistema deve prover funcionalidade de gestão documental com registro formal que inclua, inclusive, a hora da ocorrência. Por força do § 4º deste artigo, o sistema está obrigado a indisponibilizar peças e documentos por comando dos magistrados de primeiro e segundo grau.

Finalmente, para encerrar esse exercício de destaque do papel do sistema no processo judicial eletrônico, citam-se as disposições dos artigos seguintes:

Art. 26. A distribuição da ação e a juntada da resposta, dos recursos e das petições em geral, todos em formato digital, nos autos de processo eletrônico, serão feitas diretamente por aquele que tenha capacidade postulatória, sem necessidade da intervenção da secretaria judicial, de forma automática, mediante recibo eletrônico de protocolo, disponível permanentemente para guarda do peticionante.

§ 1° A petição inicial conterá [...]

§ 2º O sistema fornecerá, por ocasião da distribuição da ação, o número atribuído ao processo, o Órgão Julgador para o qual foi distribuída e, se for o caso, o local, a data e o horário de realização da audiência, da qual estará o autor imediatamente intimado.

§ 3º Os dados da autuação automática deverão ser conferidos pela Unidade Judiciária [...]

Art. 27. Poderão ser criadas outras funcionalidades no sistema que indiquem a ocorrência de possível prevenção, suspeição e impedimento, bem como de litispendência e coisa julgada.

Parágrafo único. O alerta do sistema quanto à ocorrência de possível prevenção, suspeição, impedimento, litispendência e coisa julgada não afastará a livre distribuição do feito e o magistrado, sempre que acolher tal indicativo, proferirá decisão fundamentada. [sem grifos no original]

Ao longo dos artigos transcritos acima, encontram-se duas referências à automatização do processo, o que indica a natureza de agente automatizado do sistema. Na primeira delas, o legislador regulamentar não se satisfez e explicou não ser necessária a intervenção da secretaria judicial para a instauração do processo. Além disso, no futuro, o sistema poderá ser dotado de funcionalidades (quer dizer, estará apto a cumprir outras funções no momento inexistentes) para indicar a ocorrência de possíveis prevenção, suspeição, impedimento etc.

Enfim, nem é necessário um exame acurado para perceber que sem o sistema (SEPAJ) não há processo e que ele, o eSujeito, não exerce apenas um role (papel) no processo. Ele é elemento essencial do processo que, aliás, poderá existir sem parte (revelia) e sem advogado (jus postulandi), mas não sem o sistema. E mesmo o juiz, o tradicional condutor do processo, só poderá atuar no processo se observar os limites postos pelo agente processual automatizado sistema. O ente determinístico-tecnológico assume o controle e, como disse uma desembargadora, recentemente, "esse Pje-JT não cumpre ordem judicial". O que não está programado, não pode ser feito.

2.5 O processo judicial como sistema híbrido: sistemas de consciência e sistemas técnicos garantindo a operação do processo. Sistema à luz da teoria social.

2.5.1 Luhmann e o acoplamento dos sistemas sociais e psíquicos

No início da década de 80, Niklas Luhmann anunciava que "la ‘teoria de sistemas' es, hoy en dia, un concepto unificador de significados y niveles de análisis muy diversos. La palabra hace referencia a un sentido que no es unívoco."25 Para os juristas, que sempre utilizaram a palavra sistema, são necessários esclarecimentos especiais para evitar erros decorrentes da imprecisão conceitual.

O termo sistema é livre e intensamente utilizado ao longo da resolução CSJT 136. Mas não mereceu qualquer definição e os intérpretes navegam, em seus esforços de entendimento de leis e regulamentos, com um sentimento de precisão destituído inteiramente de fundamento. A teoria geral do processo precisa fazer um esforço interdisciplinar para apreender o sentido de sistema nesses textos jurídico-tecnológicos. As ditas ciências da complexidade, cujos aportes estão invadindo o jurídico e o processo, desenvolveram-se aceleradamente, prática e teoricamente, nos últimos anos. Os clássicos do jurídico já não têm respostas para as mudanças e evoluções que o processo está experimentando.

Estabeleceu-se, como início de raciocínio, que existem sistemas e que o procedimento judicial é um sistema. Nesse caso, que tipo de sistema é o processo judicial eletrônico?

Na introdução de sua obra Sistemas Sociales, Luhmann apresenta um pequeno esquema de classificação dos sistemas26, distinguindo três níveis que afirma serem úteis ao esforço teórico:

Como se vê, no primeiro nível, trabalha-se em extrema abstração, com a desconsideração de tudo que diferencie os sistemas entre si. Além desse ponto, para cima, o sistema se desintegra nos seus elementos e relações e as propriedades sistêmicas desaparecem. Como explica o autor, "en general, se puede hablar de sistema cuando se tiene ante los ojos características tales que, si se suprimieran, pondrían en cuestión el carácter de objeto de dicho sistema."27

No segundo nível, os sistemas estão classificados distintivamente em máquinas, organismos, sistemas sociais e sistemas psíquicos. Vale realçar duas coisas: (a) máquinas são sistemas técnicos, no sentido de Foerster28 (máquinas triviais e não triviais). Então, um algoritmo é uma máquina e (b) a separação de sistemas sociais e sistemas psíquicos, os quais, segundo o autor, são o entorno um do outro. No terceiro nível, os sistemas sociais são separados em três tipos: interações, organizações e sociedades.

Esta classificação, segundo o autor, "sirve [...] para comparar las distintas posibilidades de formación de los sistemas" e para evitar erros comuns e falta de claridade nas discussões. As comparações devem manter-se num único nível e um erro comum, por exemplo, é tentar " [...] construir teorías generales de lo social sustentadas em las teorías de la interacción."

Se puede decir lo mismo de la tendencia surgida recientemente, y estimulada por el invento de la computadora, de aplicar el concepto de máquina al nivel de la teoria general de sistemas (el rechazo total, por otro lado, es injustificado). La distinción de niveles debe fijar las posibilidades de comparación de una manera fecunda. Entonces, las afirmaciones sobre las igualdades pueden ser trasladadas al siguiente nivel más alto. [sem grifo no original]

A disposição lateral, no mesmo nível, dos sistemas sociais e dos sistemas psíquicos, aponta o traço mais polêmico, criticado e incompreendido, talvez, do todo teórico de Niklas Luhmann: a localização do homem no entorno dos sistemas sociais e não em seu interior. O jussociólogo alemão dedica-se, em variadas obras, a demonstrar a fecundidade dessa abordagem para o avanço teórico do social. Javier Torres Nafarrate, nas notas à versão espanhola da obra Sistemas Sociales, introduz o assunto com a pungente pergunta: "Y el ser humano?"29.

E o estudioso do pensamento de Luhmann continua dizendo que

La opción (¡arbitraria!) en favor de una teoría de sistemas sustentada en la operación conduce necesariamente a ubicar al ser humano en el entorno del sistema sociedad. Esto revienta el formato de todas las teorías universales a las que estábamos acostumbrados y apunta hacia un diseño teórico que sirve de visión del mundo (cosmovisión). Donde antes estábamos acostumbrados a observar unidades discretas articuladas (la realidad social, los problemas concretos, los individuos), hoy, desde una perspectiva insólita, observamos una multiplicidad de operaciones que siguen la dinámica de su propia autopoiesis.30 [sem grifos no original]

Por que, indaga ainda, se vê tão mal essa expulsão do homem para o entorno de todos os sistemas sociais? E responde que ela desafia a tradição humanista cujos pressupostos já não são mais aceitáveis. Por isso, " [...] el emplazamiento del hombre en el entorno del sistema no es tan ruin como se piensa. [...] orientadas por figuras sustentadas en el hombre, se han cometido experiencias terribles [...]"31. Daí, para Nafarrate, o preconceito humanista parece constituir-se num obstáculo epistemológico à descrição suficientemente complexa da sociedade moderna.

A localização do homem (sistema psíquico) fora do sistema social (sistema de comunicação) exige de Luhmann a estipulação dos mecanismos pelos quais se articulam esses dois sistemas, cada um considerado condição da existência do outro, pois "los sistemas sociales [...] sólo se generan donde las acciones de diversos sistemas psíquicos o sociales deben ajustarse entre sí [...] "32. Os conceitos de estrutura, interpenetração, acoplamento estrutural, dupla contingência e autopoiese são alguns cuja teorização sente o impacto dessa separação dos sistemas psíquicos e sociais. "O fato de que os sistemas de comunicação se acoplem aos sistemas de consciência através da linguagem, assim como os sistemas de consciência se acoplem aos sistemas de comunicação, tem consequências extremamente importantes [...] "33.

Atente-se para o fato bem marcado por Luhmann: sistemas sociais nascem do acoplamento de sistemas sociais e de sistemas psíquicos. Variados sistemas sociais e psíquicos se articulam para a geração de um novo sistema social. O processo judicial sempre correspondeu a essa descrição: variados sistemas psíquicos, dos diversos agentes processuais, agindo acopladamente num cenário de dupla contingência e operando um programa posto nos códigos processuais (fechamento normativo), fizeram o processo conhecido como tradicional, em papel ou físico.

2.5.2 Acoplamento de sistemas psíquicos e técnicos: sistemas causalmente abertos e causalmente fechados.

Está-se, agora, preparado para enfrentar a afirmação do título deste item, segundo o qual o sistema processual (o processo), com a incorporação da tecnologia, ganhou um caráter híbrido, diferenciado. O processo judicial eletrônico é um sistema que se faz pela articulação de sistemas psíquicos, sociais e técnicos (algoritmos ou máquinas virtuais). No caso da Justiça do Trabalho, o agente automatizado sistema (Pje-JT), de que fala persistentemente a resolução CSJT 136, acopla-se com os sistemas de consciência (humanos) para a geração do sistema judicial eletrônico, incumbindo-se ele de inumeráveis papéis antes entregues somente a sistemas psíquicos.

A afirmação de transformação da natureza do sistema processual, para classificá-lo como híbrido, advém da afirmada articulação de sistemas técnicos e de consciência. Dessa hibridez emergem características distintivas do novo processo que forçam a TGP a se repensar. Vive-se, na visão kuhniana, uma transformação de paradigma34? De fato, são muitas as particularidades do novo ente processual que justificam essa idéia de natureza nova, híbrida.

A teoria do encerramento operativo, por exemplo, distingue sistemas técnicos e sistemas de sentido (psíquicos ou sociais), caracterizando os primeiros como sistemas causalmente fechados e os segundos como sistemas causalmente abertos35. Ao contrário dos sistemas técnicos, os sistemas psíquicos, até agora os únicos operadores/construtores do sistema processual, " [...] têm a particularidade de poder estar referidos ao meio e de reproduzi-lo dentro de si mesmos sem que tenham de produzir efeitos causais."36 Causalmente abertos significa que das mesmas causas podem advir mesmos efeitos, efeitos diversos ou até nenhum efeito. Ou, ainda, que causas diversas podem produzir o mesmo efeito. Com a hibridização do sistema processual, pela via do software (eSujeitos, agentes automatizados), o processo ganha trechos causalmente fechados (triviais, no linguajar de Foerster, que ligam causas e efeitos inescapavelmente) intercalados com segmentos operativos causalmente abertos.

Isso responde àqueles que dizem que o sistema técnico é mero instrumento de outros sistemas psíquicos e que, portanto, não há mudança de natureza do processo. Eles esquecem que tais sistemas psíquicos se manifestam, no processo, por meio de sistemas técnicos, determinísticos, causalmente fechados37. O meio altera a forma de manifestação, condicionando-a. A humanidade desaparece das operações entregues aos agentes automatizados (eSujeitos). É válido, portanto, afirmar a transformação da natureza do processo, considerando-o híbrido quando feito de forma eletrônica.


3. Conexão

3.1 Noções preliminares

Os princípios da extraoperabilidade e da conexão projetam visões do processo a partir das transformações e da amplificação das conexões no ambiente virtual.

O conceito de conexão não é estranho aos juristas. Dois processos conexos (pelas partes ou causa de pedir) são aproximados para que um, pela sua presença, influa no tratamento do outro, evitando contradições lógicas e duplicações desnecessárias38.

Segundo o dicionário on-line de português39, conexão é “ligação de uma coisa com outra” podendo tratar-se de dois sistemas.

Conexões internas e externas são elementos constitutivos dos sistemas e sempre existiram no processo judicial, feitas com mediação humana. O processo eletrônico tem a possibilidade inovadora de conexão tecnológica (eConexão), mediada pelo SEPAJ.

A eConexão não é, em termos estritos, uma emergent property40 do novo processo, mas é bem destacada neste artigo porque pode revolucionar o processo. A hibridização do processo judicial (agentes humanos e tecnológicos) traz ao processo essa característica conectiva dos sistemas técnicos.

Agentes humanos vêem o mundo virtual como um desafio. Agentes automatizados, ao contrário, como entes tecnológicos, são da mesma natureza do ambiente virtual e nele estão bem ambientados e integrados.

Somente as eConexões dos SEPAJ permitem plugar o processo aos outros sistemas do mundo virtual na internet. Aos juristas cabe definir as condições e o alcance dessa conexão e disso trata o princípio da extraoperabilidade.

3.2 A conexão mediada pelo homem no processo tradicional

Kleber Waki41 afirma que, se o relator de um processo consulta um site e internaliza uma informação para fundamentar uma decisão (certifica nos autos a informação obtida!), está repetindo o que se fazia a partir do Diário Oficial. A novidade, no caso, está apenas nos instrumentos de consulta/busca.

Até agora, o homem mediou o contato autos x mundo. Sistemas de consciência sempre selecionaram fatos do entorno (provas) e reproduziram-nos internamente no processo para fins causais. Com operações externas e próprias, vasculharam a vastidão factual do mundo e, segundo seus próprios interesses, constituíram o mundo dos autos fático-probatório, um ambiente factual-parcial, muitas vezes marcado pela contrafactualidade (ficto? Inconsistência do processual com o real?).

O sistema processual, por sua vez, sempre regulou a atuação dos vários agentes sob três aspectos: formal, conteudístico e temporal. O que passasse pelo triplo filtro integrava-se ao mundo dos autos. Temporalmente, a regulação mais incisiva sempre foi a do encerramento da instrução. Com a declaração, o juiz finaliza o esforço de objetivação do mundo dos autos e dispara a operação do algoritmo terminal do processo, o programa decisório entregue também a um humano.

O aforisma o que não está nos autos não está no mundo consagra essa noção. Embora o adágio tenha aplicação plena em qualquer momento do processo, os juristas o consideram especialmente em relação ao conjunto fático a ser utilizado pelo julgador (provado ou não) para expedir uma decisão42.

Autos e mundo se conectam, portanto, na fase de instrução, e o que chega ao processo compõe o mundo reduzido e seleto dos autos. Tais conexões têm utilidade notadamente informacional e, no processo tradicional, envolvem duplicações e reproduções em algum formato (cópia, transcrição, descrição...). Os vários agentes carreiam aos autos coisas do mundo, significativas para o processo e convenientes aos seus interesses. Trabalha-se com uma dupla ficção: a redução do mundo e a suposição de igualdade pontual de dois universos paralelos (mundo e mundo dos autos).

Problemas que a ficção resolveu, até agora, transformam-se no ambiente virtual.

Quando o juiz encerra a instrução, as conexões autos x mundo, de alimentação do processo e objetivação do mundo dos autos, são rompidas abruptamente. A recursão dos mecanismos de conexão externa (heteroconexões – ver abaixo) e a busca de novas causas (provas) são dogmaticamente interrompidas para liberar a operação do esquema de atribuição causal de decisão.

Sob enfoque sistêmico atual, a fase decisória exige a fixação das fronteiras do sistema processual, que delimitam o que está no sistema - autoreferenciabilidade - e o que está no entorno – heteroreferenciabilidade. Mudam as palavras mas a realidade continua a mesma: o que não está nos autos não está no mundo, não existe para fins operacionais.

3.3 Conexão tecnológica (eConexão): propriedade nova do processo

No processo eletrônico, o SEPAJ permite estabelecer conexões tecnológicas (eConexões) exclusivas, interna e externamente.

Os cientistas sistêmicos realçaram as relações frente às estruturas43.

Quem fala em internalizar dado, por exemplo, no sentido de replicar fisicamente (cópia) não pensa adequadamente em eConexão. A replicação de dado, tal como se exige no processo físico (mundo e mundo dos autos), sempre se fez e continuará sendo feita, no ambiente virtual, por exemplo, se a alimentação processual for mediada pelo homem e não houver condições de ambiente que permitam a simples ligação autos x dado (link). Não é esse o melhor rendimento das eConexões. Conexões são ligações de um elemento com outro, mutuamente influenciando-se, mas não se replicando para a obtenção desse efeito. No nível informacional, a eConexão permite colocar algo do mundo no mundo dos autos, mas apenas virtualmente (link)44. Frise-se, apenas virtualmente! Pontes tecnológicas podem conectar dados do mundo com os autos, dando a sensação de que o dado que está no mundo se encontra fisicamente nos autos (virtualidade). Essa é uma das contribuições valiosas que a eConexão pode dar ao processo.

Se A e B são sistemas técnicos e A está relacionado com B (conectado ou ligado), e vice-versa, pode haver uma mútua reflexão, uma mútua produção de efeitos, de um no outro, sem que isso implique o surgimento de dois A ou dois B. É verdade que A pode copiar um dado do universo de B, duplicando-o no seu ambiente, via eConexão. Às vezes isso pode ser importante e necessário, embora tecnologicamente os sistemas possam apenas compartilhar o dado sem duplicá-lo.

A eConexão permite ir além do dado e conectar estruturas. Nisso se esconde o poder mais poderoso das eConexões: uma via efetiva para a incorporação da inteligência coletiva ao processo.

Os SEPAJ, que são instrumentos sistêmicos, podem usar as eConexões de modo seguro, eficaz e sem violar a autonomia jurídica do processo. Os ganhos podem ser informacionais e estruturais como preconiza o princípio da extraoperabilidade.

3.4 Autos eletrônicos (eAutos). Mundo dos autos. Endo e heteroconexão.

A resolução CSJT 136, no artigo 3º, III, define autos do processo eletrônico ou autos digitais como “conjunto de metadados e documentos eletrônicos correspondentes a todos os atos, termos e informações do processo”. Pode-se criticar, mas o legislador tem o mérito de destacar a necessidade do conceito. De fato, o uso das eConexões e a exposição do processo na internet (processo plugado pelo SEPAJ) metamorfoseiam a noção corrente de autos e de mundo dos autos e ameaçam os mecanismos de diferenciação do processo existentes até agora.

Todo sistema tem seu entorno. Sistema e entorno têm seus respectivos elementos. Autoreferencialmente, um sistema é o conjunto dos seus elementos. Os elementos do entorno, inclusive outros sistemas, situam-se além das fronteiras do sistema e são, para o sistema, seu mundo heteroreferencial.

Essas noções continuam válidas no mundo virtual, embora os autos se esboroem fisicamente. Sem capas, inapreensíveis pelas mãos, transformam-se em um conjunto de elementos interconectados. Isso torna as conexões fundamentais para a a noção de mundo e mundo dos autos no virtual. Segue-se uma tentativa de especialização/distinção das conexões, em sintonia com a noção de sistema a partir da dicotomia dos elementos em auto e heteroreferenciais.

3.4.1 Heteroconexões, conexões heteroreferenciais45 ou contextuais.

As heteroconexões ligam o sistema processual com o mundo lá fora, o entorno sistêmico. O mundo é o conjunto dos elementos acessíveis pelas heteroconexões, as quais são úteis para alimentar o processo, se os dados passarem pelos filtros jurídicos e vierem a integrar os autos, caso em que a conexão, na qualidade de endoconexão (ver abaixo) integra-se aos autos. As heteroconexões mediadas pelo homem, que sempre existiram, exigem a internalização de frações do mundo no mundo dos autos. Com a internalização, elas se desfazem. Não há novidade nisso. Entretanto, no processo eletrônico, o homem pode apenas acionar uma eConexão (um link, por exemplo) ou o SEPAJ, autonomamente, pode estabelecê-la. Nesse caso, não há internalização física de informação (cópia, reprodução, duplicação...), apenas a conexão passa a ser elemento do sistema processual. As parcelas do mundo, apontadas por essas conexões, se passaram pelos filtros legal-processuais, são integradas apenas virtualmente aos autos eletrônicos. A conexão se transforma numa endoconexão, como se verá a seguir.

As heteroconexões são de grande utilidade na fase de instrução processual, para fins cognitivos. Mas permitem muito mais, servindo como via de saída, por exemplo, para a publicidade processual, ou como elos de acoplamento estrutural.

3.4.2 Endoconexões ou conexões autoreferenciais

As endoconexões apontam os elementos dos autos eletrônicos. São internas, autoreferenciais. Delimitam o mundo dos autos eletrônicos. A partir do encerramento da instrução processual, o processo deve operar, para a decisão, com base nos elementos acessíveis apenas pelas endoconexões. Abundantes e inteligentes, essas conexões devem permitir transitar pelos autos com facilidade e rapidez para otimizar o trabalho dos operadores, notadamente o do julgador. Um cenário muito diferente do que existe no PJe-JT, até agora, sem números de páginas e com identificadores alfanuméricos incapazes de transmitir o mínimo que uma série numérica simples permite saber: posição referencial para frente ou para trás, perto ou distante etc.

A idéia de endoconexão pode induzir em erro. É preciso pensar nos autos eletrônicos (eAutos), nos autos cujas fronteiras foram fixadas, virtualmente – virtualmente! - na fase de instrução e que envolvem, do ponto de vista informacional:

  • (a) coisas que estão sob os cuidados imediatos do SEPAJ – aquilo que está no espaço físico controlado pelo SEPAJ – e

  • (b) coisas do entorno, que não estão sob a guarda direta do SEPAJ, desde que a utilização tenha sido validada e autorizada na fase de instrução, antes da ruptura dos mecanismos de composição do mundo dos autos eletrônico.

Esse é o significado profundo de se trabalhar com autos virtuais, autos eletrônicos. Um dado da previdência social, por exemplo, não precisa estar no espaço físico-processual controlado pelo SEPAJ. O dado pode compor virtualmente os autos, embora esteja fisicamente localizado na base de dados, confiável e persistente, de outro sistema. Como afirma Luhmann, “el derecho presupone que el entorno estructura y reduce complejidad, de esta manera se aprovecha de esos resultados sin necesidad de analizar su génesis - cuando lo amerite, lo hará bajo aspectos meramente jurídicos.”46

3.4.3 Endoconexões gerais e particulares

Parece ser útil, ainda, separar as endoconexões segundo seja a fonte de justificação externa ou interna.

  • a) Endoconexões gerais ou de justificação externa: sua validez é estabelecida previamente e fixada na estrutura legal do processo. Ligam todos os processos a bases de dados ou sistemas sob autorização do regramento processual e podem ser acionadas a qualquer tempo, no processo, pelos diferentes agentes (bases legislativas, diários oficiais, bases jurisprudenciais dos tribunais, bases estatais de convenções, registros oficiais, bases da previdência social, bases de entidades financeiras oficiais etc). Não precisam legitimar-se pelas vias próprias, no âmbito de cada processo individual. Sob um critério apenas de pertinência, compõem virtualmente os autos de todo e qualquer processo.

  • b) Endoconexões particulares – nascem no curso processual e incorporam-se mediante necessária e indispensável justificação/legitimação pelos mecanismos do devido processo legal (contraditório/ampla defesa/oportunidade/pertinência).

3.4.4 Autos processuais eletrônicos (eAutos)

As endoconexões delimitam o mundo dos autos. Independentemente da localização física, um dado apontado por uma endoconexão está nos autos. Alguns elementos estarão sob o controle imediato do SEPAJ, outros sob o controle de outros sistemas do mundo, mas acessíveis ao SEPAJ porque a utilização foi validada na fase própria do processo.

A noção de mundo dos autos, como se vê, transforma-se no que Wiener, propriamente, chamaria de mundo só de informação47 logicamente organizado, desconsiderando-se suportes físicos e energia. Informação pura. O SEPAJ viabiliza as eConexões, pluga o processo e permite pensar em autos eletrônicos virtuais (eAutos).

3.5 Radicalização da noção de mundo dos autos

Os limites apenas virtuais dos autos (eAutos) e a segurança jurídica exigem uma radicalização da idéia de mundo dos autos.

No processo tradicional, antes do encerramento da instrução, restrições de diferentes ordens atuam para minorar a busca por mais causas: dificuldade de pesquisa, dificuldade de interação, fragilidade e insubsistência dos registros etc. Quando se consolida o mundo reduzido dos autos para consideração do juiz (o tal do mundo dos autos fático), todos os demais fatores já haviam operado. Os vários agentes processuais, na maior parte dos casos, aplaudem a chegada a esse momento de fixação de horizontes para a decisão.

No processo eletrônico, ele mesmo imerso num mundo virtual ampliado de que os agentes humanos também se valem, as possibilidades de novos achados são inesgotáveis e o encerramento da instrução corta na base muitas esperanças ainda candentes de reforço fático-probatório de posições. Por isso, a interrupção da agregação de novos fatos, para avançar para a funcionalidade de decisão, soa mais arbitrária.

Nesse cenário, fixar e garantir os limites do mundo dos autos eletrônico é um desafio em vários sentidos. Marcos Flávio Araújo Assunção48, em segredos do hacker ético, após dar jocosamente as boas vindas ao obscuro mundo da segurança digital, aponta “configurações malfeitas, softwares com falhas, redes desprotegidas, proteções ineficazes, falta de atualizações e fator humano” como as portas para um cenário de obscuridade e insegurança típico do mundo virtual e preocupante para o processo.

Embora o autor aluda a fator humano, os técnicos não estão preocupados com os riscos para a uma efetiva diferenciação do processo, decorrentes da presença na internet. Trata-se de requisito jurídico-sociológico que eles desconhecem. Fazer o julgador basear-se apenas no que está nos autos virtuais (eAutos) é, sob a ótica da diferenciação funcional, necessário e difícil.

O esquema de atribuição causal (atribuição de efeitos aos fatos comprovados) só pode operar a partir da fixação de limites e da consolidação de um cenário fático. O julgador somente pode atribuir efeitos às causas se essas, trazidas na forma de fatos, estiverem devidamente fixadas. O que está no entorno, embora acessível, não deve existir. Uma base fática movediça, não legitimada, constitui-se em ameaça constante à lisura do processo. Motivos ocultos, não declarados ou considerados sem submissão aos mecanismos de legitimação/validação, violam os fundamentos constitucionais do processo: livre convencimento motivado, publicidade, contraditório.

Imagine-se, apenas exemplificativamente, um sistema processual sem juiz, apto a examinar os fatos e a expedir a sentença automaticamente. Mais radical ainda será a necessidade de especificação de um mundo dos autos, pois um algoritmo decisor (decisão automática), por definição, não apenas exige um cenário definido (os dados, a entrada) a partir do qual vai operar, como também, pela própria condição de programa de computador que é, demanda se fixe muito antecipadamente o que pode e o que não pode estar nesse cenário (dados e suas regras de tratamento), ou seja, adiciona-se uma restrição de conteúdo que no processo com juiz humano não existe. O mundo dos autos tem de ser previamente definido, inclusive quanto aos conteúdos possíveis, uma condição que o juiz humano não demanda. Exigências de forma e tempo estão postas em todos os processos. A especificação prévia de todos os conteúdos possíveis só é exigível no mundo dos autos de um sistema decisor, onde o juiz não está presente.


4 O princípio da conexão: o que está no google está no processo

4.1 Compreensão e extensão do princípio conforme Chaves Júnior

Com o princípio da conexão, Chaves Júnior49 chama a atenção para as conexões no processo judicial eletrônico. As noções que seguem são captadas de suas lições na obra Comentários à lei do processo eletrônico e de outros teóricos que tiveram oportunidade de ouvi-lo. O autor não enuncia o princípio, apenas o anuncia e discorre a respeito, deixando ao leitor a elaboração de um conceito que albergue a idéia em termos de compreensão e extensão50.

No prefácio da obra referida, de Luiz Otávio Linhares Renault, está posta a mais polêmica conseqüência do princípio aventada pelo doutrinador:

Em sessão de julgamento perante a 4ª Turma do TRT/3ª Região, o Juiz Convocado Dr. José Eduardo Chaves, em uma de suas lúcidas intervenções, disse algo mais ou menos assim, e que me despertou para a importância dos princípios especiais do processo eletrônico: “no novo processo não vigora mais o dogma, segundo o qual o que não está no processo está fora do mundo; o princípio é outro: o que está no google está no processo”.51 [sem grifo no original]

Segundo Chaves Júnior, o processo eletrônico tem um caráter reticular pela “ [...] sua virtual inserção na rede, especialmente na rede mundial de computadores, a Internet.”52 Consequentemente, “[...] é desmaterializada a fronteira autos-mundo, já que ambos estão inseridos no chamado data space [...]” e isso “ [...] traz para os autos um outro mundo de informações, provas e muda radicalmente inclusive a própria racionalidade processual”53.

Tocando num ponto central do princípio que anunciou, Chaves Júnior afirma que “essa novel conexão autos-mundo, na verdade, é a conexão dos sujeitos processuais, juiz, autor e réu, com a sociedade virtual“, distinta, portanto, da eConexão focada pelo princípio da extraoperabilidade. E salienta que, pelo caráter cumulativo e expansivo da rede, “ [...] tudo tende a crescer em proporções e escalas gigantescas e até fora do controle aparente."54 [sem grifo no original]

Com apoio em Marshall McLuhan (o meio é a mensagem55), deduz que, nessa mudança de meio físico para o virtual, o processo sofre um condicionamento, inclusive, de conteúdo e de racionalidade, porque “os meios são concebidos como extensão dos seres humanos" e, então, todos se vêem condicionados pelo novo meio e tudo se transforma: “ [...] o próprio desenrolar do processo, a forma de participação das partes litigantes e até o conteúdo da decisão do juiz [...] “56.

Chaves Júnior vê positivamente o novo paradigma do processo porque a tecnologia “ [...] vai exponencializar a própria instrumentalidade do processo, que passará a ter muito menos amarras e limitações materiais, permitirá o aumento de sua deformalização e alargará as possibilidades probatórias."57

Relacionando a conectividade com o juiz, o autor atrai a idéia de inteligência coletiva, ataca o juiz solipsista dworkiano e sugere que, para a decisão e na prática, se realce “ [...] toda a potência das conexões interativas da inteligência articulada coletivamente."58

Para o autor, o processo baseia-se em dois tipos de conexão - tecnológica e social – entre sistemas, máquinas e pessoas59. O autor distingue, ainda, o que chama de princípios da conexão reticular e da conexão inquisitiva, o que se deve entender como subprincípios do princípio da conexão.

Explicando o primeiro – subprincípio da conexão reticular -, diz Chaves Júnior que “com o adjetivo reticular o que se deseja significar e enfatizar é que não se trata apenas de mera conexão, de uma conexão linear, mas de uma conexão qualificada, em rede."60 Disso decorre que "não há lineariadade rígida na sequência do fluxo processual eletrônico conectado. Não há nos autos virtuais nem mesmo folhas numeradas, mas ’eventos em fluxo'".61 O processo eletrônico viabiliza “ [...] a transmissão incessante, em tempo real, do conteúdo dos atos e das práticas processuais"62 e, daí, deduz-se, segundo o autor, que “[...] o meio eletrônico transcende as limitações materiais do meio de papel [...] permite a aproximação entre os autos e a verdade (real e virtual) contida na rede [...]."63

Os atos tornam-se " [...] menos dedutivos e silogísticos. [...] O prazo deixa de ser um conceito estanque, para assumir uma perspectiva mais dinâmica [...] da preclusão lógica caminha-se para uma indução preclusiva [...]” e, o próprio saneamento das nulidades formais “ [...] não está mais condicionado apenas à inércia da parte na primeira oportunidade que tiver de se manifestar nos autos."64

Em relação ao segundo subprincípio - da conexão inquisitiva -, informa o doutrinador que a conectividade dá ao juiz um caráter inquisitivo ampliado:

No processo de papel [...] não há como se exigir que o julgador conheça algo fora da realidade materializada e estabilizada nos autos. No processo virtual essa separação é literalmente desmaterializada. As fronteiras entre os autos e o mundo já não são tão claras, pois ambos pertencem ao mundo virtual.

Por outro lado, reconhecendo um dos inúmeros riscos da observância estrita do princípio, o autor adverte que "[...] doutrina, jurisprudência e legislação vão, com o passar do tempo, estabelecer os limites para a navegação virtual, sob pena de se infundir o caos no fluxo processual [...]" e, depois, reforça que " será a possibilidade de conexão por parte do juiz - conexão inquisitiva - o critério decisivo para a inserção da informação na esfera probatória do processo em rede. "65

4.2 Entendimento e posição de outros autores. Aplicações.

4.2.1 Henrique Gouveia da Cunha

Henrique Gouveia da Cunha66 ocupa-se dos princípios processuais no processo eletrônico e repercute o pensamento de Chaves Júnior atinente ao princípio da conexão. Identifica esse princípio com o da extraoperabilidade.

Resumindo o que entendeu dessa diretriz principiológica, realça o seguinte: o princípio preconiza que os SEPAJ devem estar conectados à rede mundial de computadores - a internet - para que " [...] a partir desse ambiente, possa ser realizada a colheita de todo e qualquer dado ou informação útil ao exercício da atividade judicante."67 Há uma contraposição do princípio à máxima o que não está nos autos não está no mundo porque tudo o que está disponível na vastidão do mundo virtual está disponível para o processo. Os autos do processo eletrônico estão conectados ao mundo e permitem ao juiz beneficiar-se da inteligência coletiva da rede.

Expondo visão crítica a respeito, Cunha68 entende que todo elemento de convicção deve ser submetido ao contraditório, mesmo aquilo que o magistrado busque pessoal e diretamente. A parte não pode " [...] ser surpreendida com a apresentação de fundamentos ou provas não submetidas ao debate dialético." Busca, em prol de sua posição e preocupado com o caráter inquisitivo sugerido para o processo, as lições de José Carlos de Araújo Almeida Filho e Francis Noblat, para os quais a " [...] idéia de um processo inquisitivo, que vem ganhando força [...] viola o contraditório a partir do momento em que o juiz passa a ser produtor da prova."

4.2.2 Kleber Waki

Kleber Waki69 também faz um esforço de captação do sentido do princípio da conexão e, a partir do conceito formado, tece reflexões interessantes a respeito, resumidas abaixo.

Após ter ouvido exposição de Chaves Júnior, diz ter entendido que o princípio envolve “[...] a) o fortalecimento da oralidade no processo; b) a introdução do link como escritura e do hipertexto como exercício de linguagem processual; c) a ampliação do diálogo processual para além da escrita [...] e d) a prática de uma nova hermenêutica, mais indutiva [...] . ".

Em busca da fixação de um conceito, dispõe-se a "[...] averiguar se o acesso a informações alheias aos autos examinados consiste em inovação introduzida pelo (por causa do) processo eletrônico".

A procura da resposta o leva a acórdão70 em que, no item 5, a relatora informa ter consultado o site do TSE para obter informação sobre ter ou não, certo candidato, sido eleito no ano de 2004, informação esta que lastreou a decisão. Aliás, segundo o articulista, "há vários e vários exemplos assim, extraídos naquela Corte Superior” e, então, se pergunta: “Seria isto o chamado Princípio da Conexão?”. Se tal princípio se aplica exclusivamente ao processo eletrônico, então o exemplo não ilustra o princípio, segundo o autor. E se há conexão, então ela existe também no processo em papel, conclui. E explica:

[...] se é possível recorrer a publicações fora dos autos, mas encartadas em Diários da Justiça encontrados na rede mundial de computadores, por exemplo, então não haveria nada de diferente se utilizássemos este mesmo recurso para buscar idêntica informação em publicações digitais, digitalizadas ou mesmo nos antigos diários impressos.

Segundo entende, "o Princípio da Conexão tem que ir além disso. Ele precisa se basear não só em informações oficiais [...] mas admitir a possibilidade de que as provas integrem o corpo probatório do caderno processual, ainda que, efetivamente, não integrem este caderno processual [...] “. A alternativa seria “ [...] modificar o conceito do que sejam os autos processuais [...] sem que isso prejudique [...] o debate processual [...] “.

Com mais alguns exemplos, o juiz articulista suscita outras questões, atinentes à internalização de informações e à idéia de caderno processual, utilizando como base metódica a presença ou não da característica exclusivamente no processo eletrônico.


5. Princípio da extraoperabilidade

5.1 O princípio: uma diretriz estratégica para os tecnólogos

Um SEPAJ deve ser concebido como um subsistema autônomoe estruturalmente acoplado

O princípio71 da extraoperabilidade, lançado em 200972, é uma diretriz estratégica, no sentido das ciências administrativas e organizacionais, para o desenvolvimento do SEPAJ, passada pelos juristas aos tecnólogos. Sua enunciação funda-se no surgimento das eConexões. O comando, advindo do jurídico e direcionado aos técnicos, cumpre também o papel que Luhmann refere ao dizer que "el sistema jurídico se convierte a si mismo em ley"73, ou seja, os juristas autorizam características tecnológicas do sistema de informação SEPAJ e legitimam os sistemas que as incorporam conforme recomendado. As preocupações do princípio são a segurança74 e a aderência jurídica do SEPAJ: processo na internet, conectado, com segurança e sem ofensa ao Direito. O direito fundamental do devido processo legal é o limite75.

A ferramenta tecnológica (SEPAJ) de produção do processo eletrônico implica, como se viu, uma transformação de natureza do próprio processo, que se tornou híbrido: sistema sócio-técnico. A diretriz dirige-se aos desenvolvedores da ferramenta porque o ganho decorrente da amplificação das possibilidades de conexão (eConexões) se faz exatamente pela ferramenta (o sistema de informação SEPAJ) e não pelas conexões típicas que sempre caracterizaram o sistema processual, proporcionadas pelos agentes processuais humanos (sistemas de consciência).

Na época, para a formulação textual da diretriz, utilizou-se o enfoque sistêmico luhmanniano do processo e do procedimento judicial expostos em legitimação pelo procedimento76, mais tarde ampliados em sistemi sociali. Apenas o SEPAJ é capaz de plugar o processo na internet e deve-se balizar essa conexão.

Ao teorizar a sociedade sob as luzes da teoria dos sistemas, Niklas Luhmann introduziu conceitos que são fundamentais, também, quando se pensa nos sistemas eletrônicos de processamento de ações judiciais (SEPAJ).

À luz do pensamento sistêmico das décadas de 50 e 6077, Luhmann afirmava que os subsistemas sociais, aos quais equipara expressamente o procedimento judicial, se formam por diferenciação funcional e são autônomos78. A ferramenta SEPAJ não existia, na época. Os sistemas sociais – que são sistemas de comunicação - dependiam exclusivamente de sistemas psíquicos, também ditos de consciência.

O Niklas Luhmann que Alberto Febbrajo chama de segundo Luhmann absorveu, na década de 70, as novas idéias sobre sistemas autopoiéticos e passou a referir-se a sistemas autoreferenciais, que têm sua sobrevivência condicionada pela heteroreferenciabilidade, ou seja, devem estar estruturalmente acoplados ao sistema total, ao ambiente79. "O sistema e o ambiente concorrem sempre para a realização de todos os efeitos [...] Não existem sistemas sem ambientes ou ambientes sem sistemas [...] "80 [tradução livre].

Na introdução à edição italiana de sistemas sociais, Alberto Febbrajo afirma que Luhmann realça, desse modo, o problema da conexão entre os subsistemas, conforme a recomendação caracterizadora do pensamento sistêmico (sistemas são redes, teias) e fixa a comunicação como operação básica dos sistemas sociais: "se pode assim dizer que o conceito de comunicação tende não mais a se apoiar no conceito de função, mas a substituí-lo como conceito-guia [...]"81 [tradução livre]. Duas outras categorias são, ainda, teorizadas por Luhmann, exaustivamente: interpenetração e acoplamento estrutural. Elas são correlatas das idéias de clausura operacional e abertura causal.

O princípio da extraoperabilidade destaca autonomia e acoplamento estrutural como características que o sistema técnico do processo deve ter.

5.2 Até onde, como e quanto usar da capacidade de conexão?

O princípio da extraoperabilidade, em primeiro lugar, obriga a área tecnológica a cobrar dos juristas a definição dos níveis em que um SEPAJ pode valer-se das novas possibilidades de conexão: só no informacional (abrir-se apenas cognitivamente), só no estrutural (permissão de penetração estrutural/acoplamento) ou em ambos? Em segundo lugar, os tecnólogos deverão maximizar o uso da conexão nos limites das permissões postas.

A capacidade conetiva pode ser o limite? Parece que não. Na busca dessa resposta, os juristas se questionarão, por exemplo, sobre os riscos que existem, para a autonomia sistêmica processual, com as quebras do regramento milenar do processo que podem decorrer das inovações tecnológicas atinentes à amplificação quantitativa e qualitativa das conexões. Terão de atentar para o princípio da dupla instrumentalidade – ou da subinstrumentalidade – da tecnologia.82 Perceberão que as eConexões são de natureza diversa daquelas que sempre estiveram presentes no processo e que a mutação de natureza das conexões evidencia uma propriedade do processo eletrônico, introduzida pelo eSujeito, o SEPAJ. Os riscos do descontrole do fluxo informacional ou da composição estrutural desse sistema técnico, pela via das conexões tecnológicas, certamente serão objeto da consideração ponderada dos juristas (ou deveriam ser). Estar na internet é um risco83. Afinal, quem controla ou deve controlar os fluxos e os contatos do sistema processual com o entorno? Esses fluxos são naturalmente exacerbados pelas novas formas de conexão do processo com os demais sistemas do mundo virtual.

Atualmente, os SEPAJ, embora timidamente, já adotam, em diferentes níveis, mecanismos que incorporam utilizações das eConexões para alimentação informacional e para acoplamento estrutural virtual. É o caso do bacenjud, por exemplo. O princípio deve abrir o caminho para a expansão segura e legítima dessas interações/absorções.

Um erro comum nesse espaço de reflexão é pensar numa relação diretamente proporcional entre quantidade de conexão e qualidade do processo: quanto mais conexões, maior a qualidade do sistema processual. Estudos sociológico-sistêmicos e neurofisiológicos, no entanto, refutam essa expectativa84. Na verdade, empiricamente as ciências demonstram que essa relação tende a ser inversamente proporcional. O aumento de complexidade sistêmica só pode ser construído a partir de uma consistente redução seletiva das conexões.

5.3 Interoperabilidade e extraoperabilidade

Sob enfoque da tecnologia da informação, a interoperabilidade ganhou força a partir do surgimento da internet. No mundo virtual, todos os sistemas devem poder comunicar-se. A idéia de teia (web) não resiste a uma composição de mundo virtual a partir de sistemas incapazes de se comunicar. A comunicação entre os sistemas é condição da sobrevivência dos milhões de sistemas presentes na rede e da operacionalidade da própria rede, ela mesma um sistema imenso cuja função é prover vias de comunicação. Os sistemas da rede devem ser capazes, portanto, de comunicar-se entre si, segundo determinados padrões (protocolos), com fluxo de informação em geral bilateral85. Basta lembrar que a evolução para a web 2.0 trouxe a característica inovadora da bilateralidade do fluxo comunicacional (interação).

Ocorre que, entre os técnicos que trabalhavam em sistemas eletrônicos para o processo, reduziu-se o alcance do termo interoperabilidade para significar a possibilidade de contato apenas entre os sistemas processuais - dos diferentes tribunais, das diferentes instâncias etc. Ainda hoje se pode dizer que ela é mínima e continua sendo uma melhoria a ser perseguida.

Por isso, o termo extraoperabilidade foi interpretado por alguns, quando do anúncio do princípio, como tendo caráter apenas provocativo, para combater a redução conceitual de interoperabilidade no âmbito do judiciário.

O neologismo extraoperabilidade, então proposto, de fato serviu também para quebrar o viés reducionista do conceito de interoperabilidade. Ele foi eficaz para aludir à necessária conexão dos sistemas processuais com o mundo, com os demais sistemas eletrônicos disponíveis na sociedade e nos quais se encontra a grande massa de informação necessária para as ações e decisões processuais. Mas o escopo real do princípio dizia respeito à própria concepção do SEPAJ, à sua conformação estrutural e à sua imersão no mundo virtual de maneira a aproveitar ao máximo as eConexões por ele introduzidas no processo, com segurança.

5.4 Destinatários do princípio da extraoperabilidade

Para aproveitar o alargamento das conexões sistêmico-tecnológicas que a nova ferramenta processual propicia (eConexões), propôs-se que os técnicos se desvinculassem da visão secular cultuada pelos operadores do processo (o que não está nos autos não está no mundo, a qual, frise-se, continua fundamental na fase operativa do processo!), substituindo-a por outra: "o que não está nos autos, está no mundo ou num outro sistema".

Alguns entenderam, então, que a diretriz se dirigia à fase operativa do sistema e aos agentes processuais humanos. Um erro. Ela, enquanto diretriz para o desenvolvimento da ferramenta, estava vocacionada a regular a atuação dos técnicos desenvolvedores do SEPAJ.

As duas idéias fundamentais, presentes na diretriz, são autonomia do sistema processual e acoplamento estrutural. A primeira, autonomia, envolve a questão do fluxo informacional (abertura cognitiva) mas sob estrito controle do SEPAJ. A segunda toca na questão da estrutura e estabelece, talvez, o ângulo mais profundo da diretriz: sistemas compartilhando/somando estruturas (algoritmos).

Um sepaj, concebido e desenvolvido com observância das duas idéias chaves, habilitar-se-ia a ser um agente automatizado (eSujeito) acelerador do sistema processual, seja controlando o fluxo virtual das informações para os autos processuais, na forma adequada para o processamento e para o alcance da máxima automação, seja incorporando virtualmente segmentos estruturais de outros sistemas do entorno, fazendo-os colocar suas próprias capacidades de trato do contingente (o entorno) a serviço do processo.

Tudo isso está ao alcance da tecnologia e é amplamente utilizado, na atualidade, em diferentes ramos de atividade, inclusive por alguns SEPAJ, embora minimamente. A conexão, como se vê, é a característica sistêmica que permite se avance nessa direção. Links, webservices, contracts e serialização são alguns dos ferramentais tecnológicos que podem ser acionados pelas eConexões.

O princípio da extraoperabilidade, portanto, estabelece o que se deve fazer com esse elemento constitutivo de todo e qualquer sistema, a conexão, mas focando especificamente a conexão tecnológica (eConexão), feita pela via do eSujeito, do sujeito tecnológico que a resolução CSJT 136 chama de sistema ou de Pje-JT.

5.5 Composição mono e poliestrutural do sistema processual em papel. Imanência da extraoperação no processo.

Os sistemas sociais, como o processo, exprimem-se mediante acoplamentos estruturais com sistemas de consciência, os operadores da estrutura legal fixada nas diferentes fontes do Direito (códigos, costumes, jurisprudência)86. Essa dependência é empiricamente verificável. Evidenciam-na os diferentes resultados alcançados durante a operação de um mesmo código legal, quando se troca o juiz, por exemplo, ou o advogado, num processo.

Um sistema de consciência não é um processador neutro como um computador. Ele interpreta e conjuga o programa legal ao seu próprio programa particular – resultado de aprendizagem, convicções, formação87 -, gerando um programa final (estrutura) único e diferenciado, só em parte condicionado causalmente pelo programa legal (estrutura legal fixada nos códigos)88.

Por isso, a extraoperação é imanente no sistema processual (o processo em si). Toda operação ocorre externamente em sistemas de consciência (juiz, advogados, servidores). O sistema legal – cuja estrutura está fixada nos códigos legais – se manifesta operativamente pelos processadores psíquicos dos diferentes agentes processuais humanos. Lembre-se que Luhmann, num dos traços polêmicos de sua teoria, põe o homem no entorno dos sistemas sociais.

O programa processual, no processo físico, sempre dependeu de extraoperação e, considerando-se os diferentes sistemas de consciência que atuam, ele pode ser dito poliestrutural, em dois sentidos: (a) são múltiplas e distintas as estruturas psíquicas que se conjugam com a estrutura legal dos códigos para gerar a estrutura do programa do caso específico e (b) portanto, são diferentes as estruturas operativas finais em cada caso (acoplamento operativo89).

Atentando-se, entretanto, para a natureza dos sistemas envolvidos, ou seja, para o tipo dos sistemas que se acoplam no processo em papel, tem-se o sistema legal extraoperado exclusivamente por sistemas de consciência (psíquicos). Pode-se dizer, então, que o processo físico é monoestrutural quanto à sua natureza.

5.6 Natureza biestrutural do processo eletrônico: sistemas técnicos e de consciência. Hibridização e efeitos.

No presente momento, está-se associando ao processo um novo tipo de sistema (sistema técnico, software, agente automatizado) e o processo, então, passa a ser um sistema híbrido, composto de sistemas de consciência e sistemas técnicos. O sistema processual não é mais monoestrutural, portanto (somente sistemas de consciência se acoplando), mas biestrutural.

Exemplo simples: na autuação, sistemas de consciência estão sendo substituídos por sistemas técnicos.

Tais substituições crescerão muito, com o tempo, e não são triviais, como alguns pensam. Sistemas técnicos são, em si, neutros (causalmente fechados). Sistemas de consciência, ao contrário, são causalmente abertos. Operativamente os dois tipos de sistema são fechados (clausura operacional). As consciências mesclam o sistema legal com seus próprios programas operativos para gerar o programa (estrutura) do caso particular. Mas como são operativamente fechadas e as alterações da estrutura própria são difíceis, elas não têm a maleabilidade dos sistemas técnicos para abrir-se estruturalmente e enriquecer a mescla estrutural que promovem ao operar o sistema processual em cada caso. Isso acontece, é verdade, mas numa perspectiva evolutiva, não operacional. Uma mudança de entendimento do julgador, por exemplo, significa que, dali em diante, passará a operar sob novas condições (novo programa). Outro exemplo é um curso que, pela via da aprendizagem, reestrutura o sistema de consciência do julgador. Nos dois casos, o trecho sistêmico operado pela consciência se transforma e passa a produzir resultados diferentes. As entradas que, no passado, geravam o resultado A, passam a gerar, em operações futuras, o resultado B.

Por outro lado, como a operação básica dos sistemas de consciência é a percepção, o sistema processual absorve essa característica e os quadros fáticos considerados na aplicação do esquema de causalidade ganham maleabilidade. Günther fala em perístases ou em características relevantes da situação, um cenário de abertura peculiar do discurso de aplicação, considerado condição de imparcialidade e justiça90. Essa é uma característica relevante que se perde ao substituir sistemas de consciência por sistemas técnicos no processo91.

Apesar dessa perda, os sistemas técnicos trazem a possibilidade de se pensar/conceber o processo com uma característica inovadora, típica da natureza de formação dos sistemas tecnológicos. Sistemas de consciência são estruturalmente fechados. Suas malhas estruturais são monolíticas e cerradas. Sistemas técnicos, ao contrário, são entes construídos e suas malhas estruturais são virtualmente abertas. Operacionalmente fechados mas estruturalmente abertos.

As consciências, quando operam, são causalmente abertas (probabilísticos). Os sistemas técnicos são causalmente fechados (determinísticos).

Sistemas técnicos se compõem aditivamente de estruturas menores. Sua evolução não necessita de um mecanismo de diferenciação, como ocorre com os sistemas naturais. Novas funcionalidades ou alterações funcionais podem ser intencionalmente desenvolvidas. Em sistemas técnicos como o SEPAJ, que são sistemas virtuais (softwares), funcionalidades inteiras e inovadoras podem ser, inclusive, o resultado de acoplamentos virtuais de estruturas de sistemas exógenos. Em tempo de operação, o sistema pode atuar sob determinação de uma estrutura algorítmica mista, própria e de terceiros sistemas, as quais virtualmente são integradas/incorporadas à malha estrutural do sistema processual:

Sistemas de consciência

Estruturalmente fechados

Causalmente abertos

Evolução/diferenciação: difícil – aprendizagem etc

Sistemas técnicos

Estruturalmente abertos (poliestruturalidade)

Causalmente fechados

Evolução intencional: fácil - ficta, somativa ou subotimizadora92.

A diretriz da extraoperabilidade propõe que, graças às possibilidades abertas pelos sistemas técnicos (eConexões), trabalhe-se com uma perspectiva de permissão de poliestruturalidade do componente tecnológico do processo. Quer-se que muitos sistemas técnicos atuem, ao lado do sistema legal e dos sistemas de consciência, acopladamente, na constituição do sistema processual.

5.7 Autonomia

A primeira prescrição do princípio da extraoperabilidade atine à autonomia do SEPAJ: ele deve ser concebido como um subsistema autônomo. O que isso quer dizer?

No artigo de 2009, afirma-se que, para o sistema processual judicial produzir seus resultados com independência e imparcialidade, é indispensável que o sistema seja autônomo, uma característica dos sistemas dependentes de um intercâmbio ativo com o meio-ambiente, mas com controle absoluto da regência do processo de permuta. O sistema se diz autônomo se estruturas e métodos próprios, internos, controlam o processo de troca. Em vez de independentes, sistemas autônomos costumam ser muito dependentes do meio-ambiente, em vários sentidos. Mesmo assim, a aplicação do Direito deve fazer-se segundo as regras internas do procedimento. O cumprimento da função deve ser autônomo.93

Como se alcança um procedimento com tais propriedades?

5.7.1 Visão luhmanniana de autonomia e o SEPAJ

Para Luhmann, " [...] ni el hecho de consultar reglas externas, ni el acceder a motivos de la legislación que se pudieran determinar fácticamente, pueden valer como objeción contra la tesis de la unidad operativa y la autonomía del sistema jurídico.” 94 Para o jussociólogo, o Direito pressupõe que o entorno (outros sistemas) estruturam e reduzem complexidade e se aproveita, então, desses resultados, verificando-os, quando necessário, por critérios meramente jurídicos. Isso, diz Luhmann, “ [...] no conduce a que los límites del sistema se hagan borrosos, ni tampoco a un traslape de los sistemas, ni necesariamente a que el peso social del derecho se traslade a otro sistema”, pois se trata de um “ [...] comercio entre sistemas”.95

La autonomía (que permanece incólume) se reconoce por el hecho de que las decisiones específicamente jurídicas son normalmente aquellas que logran un enlace estrecho con el derecho y que, en él, encuentran su responsabilidad. La autonomía se reconoce también por la circunstancia de que la autorización del derecho cubre lo que no puede cubrir la técnica [...] En todas las operaciones cognitivas el derecho reconoce que puede equivocarse, y se reserva la decisión de lo que ha de decidir cuando el error se hace evidente. El que el derecho tenga que legitimar dentro del derecho lo que consulta fuera del derecho, es una muestra más de que las referencias a cogniciones externas, son aspectos de las operaciones internas del sistema jurídico.96 [sem grifo no original]

A prevalência do jurídico, sempre e inescapavelmente, é bem estabelecida por Luhmann, como expressão da autonomia. Pensando nos SEPAJ e nas possibilidades inovadoras de conexão, o que se consultar fora, ou se absorver estruturalmente, deverá passar pelos filtros jurídicos para ser legitimado. O acionamento das eConexões não afronta ou nulifica, só por si, o caráter autônomo necessário do processo. A idéia luhmanniana de autonomia alberga um rigoroso controle do que é tomado em consideração pelo sistema jurídico, como informação e como estrutura. Code is not law, salvo se o Direito o reconhecer como tal97.

5.7.2 Autonomia, autarquia, abertura cognitiva e fechamento normativo. Verdade processual e verdade da rede.

As idéias luhmannianas concernentes à autonomia estão expostas no Capítulo II, Parte I - Processos Judiciais, da obra Legitimação pelo procedimento98. Para o autor, o conceito de autonomia, amplamente utilizado em várias áreas, inclusive do Direito, pode ser estabelecido a partir de uma distinção entre autonomia e autarquia.

Fala-se em autarquia, diz Luhmann99, para aludir a processos de permuta (intercâmbio) entre sistema e meio-ambiente: "um sistema é autárquico (ou independente) na medida em que pode reduzir essas relações de intercâmbio, na medida em que pode se tornar independente do meio ambiente e existir por conta própria". A possibilidade de vida isolada do mundo circundante caracteriza o sistema autárquico. Por natureza, portanto, o processo não pode ser autárquico.

Autonomia, ao contrário, é característica de sistemas dependentes de um intercâmbio ativo com o meio-ambiente e diz respeito à regência desse processo de permuta. O sistema se diz autônomo se controla o inescapável processo de troca que deve manter com o entorno.

Pensando em procedimento judicial de aplicação do Direito, facilmente se visualiza uma imensa dependência de outros sistemas sociais. O procedimento não pode prescindir da contratação de juízes, da fixação de competências, da ratificação ou promulgação de leis e de que fatos sejam conhecidos e participados ao sistema. Mas "[...] tudo isso não exclui que a ação dentro do sistema seja, em parte, orientada segundo critérios próprios de seleção"100. O processo opera segundo regras internas, suas.

Isso pode ser observado no desenrolar do processo. Os vários pontos de vista vão se firmando, preclusivamente, e circunscrevendo o raio de ação das atuações subseqüentes, até o resultado. A autonomia manifesta-se desde a especificação das inferências permitidas, quanto às normas e fatos, até os comportamentos esperados do sistema, selecionados a partir das informações inferidas.

Cada seleção é um exercício de autonomia, como o é também a seleção da lei, que se pode utilizar numa conjuntura de fatos que adquiriram força no procedimento. E todos os participantes podem, de acordo com as possibilidades que o seu papel lhes dá, participar nesta autonomia - também, por exemplo, o réu que resolve não indicar determinadas testemunhas, ou o acusador que decide fazer uma demanda de preferência sobre uma relação de dívida basicamente existente, do que sobre uma troca.101

Uma coisa é a autonomia do procedimento, tomado como sistema social e outra, muito mais limitada, é a do juiz no papel que lhe é destinado no procedimento.

O SEPAJ deve ser concebido de forma a otimizar os contatos com o meio ambiente (permite ampliar significativamente a abertura cognitiva do sistema), mas sem deixar de exercer um profundo papel seletivo-valorador do conhecimento buscado no ambiente:

Según esto, el sistema jurídico puede tomar en consideración hechos externos, pero sólo como información que há sido generada internamente: sólo como "difference that makes a difference" (Bateson).102

Embora se vasculhe com maior amplidão o entorno, em busca de fatos externos ao procedimento, tais fatos só podem ser levados em consideração sob estrita observância do regramento normativo do processo (fechamento normativo). A verdade é processual, jurídica. Não há verdade na rede103. Além disso, somente os fatos que ultrapassarem os filtros de forma e esquema de causalidade postos na lei processual podem ganhar o status de informação, quer dizer, podem ser erigidos à condição de "diferenças que fazem a diferença" internamente. Essa condição de informação, ou seja, de capacidade para influir na operação sistêmica e orientar os ciclos operativos, deve ser dada internamente pelo sistema processual. O SEPAJ deve ser desenvolvido com observância estrita desse requisito sistêmico, não podendo funcionar como veículo de quebras à autonomia. Interpretações dos códigos, pela via das regras de negócio – um conceito bom para os técnicos mas perigoso para o jurídico - podem ser vias abertas para a quebra da autonomia do sistema processual.

Portanto, o SEPAJ deve ser um subsistema autônomo: aberto aos contatos ambientais (cognitivamente aberto) e estritamente vinculado às regras de cognição jurídicas postas nos códigos normativos ( normativamente fechado).

5.7.3 Outros fatores da autonomia: diferenciação funcional e outros.

Com uma efetiva diferenciação, busca-se a especificação de um sistema de ação procedimental capaz de tratar, com autonomia, os dados seletivamente admitidos no âmbito restrito e diferenciado dele. Os mecanismos de diferenciação foram pensados para os sistemas de consciência (agentes processuais, homens). O SEPAJ é um sistema de outra natureza e exige meios inovadores de garantia da diferenciação, sob pena de haver interferências espúrias, não legítimas, no processo.

Além da diferenciação, outros fatores contribuem para a autonomia. Para Luhmann, diversas circunstâncias precisam harmonizar-se "[...] para os sistemas em geral e para os processos jurídicos em particular, numa perspectiva temporal, objetiva e social [...] ”104. O SEPAJ introduz desafios especiais nessa conjuntura.

a) Dimensão temporal: metas, produtividade e efetividade do Direito.

Os procedimentos devem estar organizados de modo a poder controlar, no tempo, a interação com o seu meio-ambiente105. Autonomia supõe obrigatoriamente esse controle e elaboração interna das informações. Tem-se de "[...] dar tempo ao procedimento para poder pôr em funcionamento os seus próprios métodos de elaboração de informações", sob pena de tirar-lhe a autonomia.

Ora, no mundo virtual e principalmente nos novos espaços determinísticos do processo, a instantaneidade e o desmonte do tempo são muito presentes. Nos espaços probabilísticos, entregues aos sistemas psíquicos, os prazos devem ser compatibilizados. Juízes devem ter prazos, mais ou menos elásticos, para elaborar e expedir a decisão.

As novas tecnologias podem ser usadas para acelerar o processo, mas precisarão abster-se de violar os tempos necessários aos operadores incumbidos do processamento das informações quando isso lhes incumbe. Pense-se nas metas. As instâncias gerenciais do processo têm ameaçado, para não dizer, comprometido, a qualidade da prestação jurisdicional. A celeridade tem focado a produtividade e atropelado a efetividade. Violações à autonomia sistêmica do processo são evidentes.

Independentemente das circunstâncias, os procedimentos judiciais só se estabelecem autonomamente se tiverem um relativo controle do processo em termos temporais. O processo eletrônico é híbrido, meio técnico (SEPAJ), meio social (agentes humanos). O SEPAJ deve respeitar o tempo humano necessário à preservação da autonomia. Sem esse balanceamento, não se pode falar em autonomia.

A aceleração desbalanceada do procedimento, facilitado em certa fase, pressiona os elos operativos da fase decisória, principalmente pelo vazio de ferramentais de suporte aos julgadores. Esse apressamento provocado pela tecnologia milita em desfavor da autonomia e, em conseqüência, da segurança jurídica.

b) Dimensão das diferenças objetivas de sentido: regras de negócio e automação.

A autonomia do processo depende da estabilização objetiva e segura das diferenças de significado entre meio e sistema. Isso não significa determinar o procedimento concreto. A aceitação do procedimento deve dar-se sem intervenção atentatória à sua autonomia, deixando-se "[...] em aberto um espaço de manobra para a decisão. Nesse espaço de manobra pode desenrolar-se uma elaboração de informações relativamente autônoma." Portanto, no plano do "processo concreto de interações entre sistema e meio", prevalece a ductilidade como elemento significativo generalizado. Assim, a imposição de uma organização jurídica de caráter apenas geral faz parte das condições essenciais para assegurar a autonomia procedimental.

O SEPAJ, com suas definições prévias de regras de negócio e pela automação (agentes automatizados, normas tecnológicas), leva trechos operativos do procedimento, do espaço deôntico, em que sempre ocorreram, para espaços lógico-formais e rígidos, muitas vezes estruturados fora do âmbito do procedimento, o que viola claramente a idéia de autonomia. A preponderância do tecnológico sobre o jurídico é uma ameaça constante. O processo concreto de interação entre sistema e meio despe-se da ductibilidade garantida por um agente humano e afasta do processo, para os momentos de definição das regras de negócio, a especificação dos significantes e das condições sob as quais ganharão ingresso nos autos eletrônicos. Sem falar na pré-especificação dos significados internos de cada significante, muitas vezes feitas em instâncias cuja legitimidade é questionável.

c) Dimensão social: processo não pode ser braço de um setor do meio ambiente.

Resta examinar, ainda, a autonomia numa dimensão social.

Afirma Luhmann que o procedimento poderia apenas constituir-se de um "[...] meio que lhe apresentasse, em primeiro lugar, as informações gerais, depois as especiais e, no fim, lhe diminuísse a capacidade". Não haveria, então, autonomia. E continua: "para os procedimentos judiciais das sociedades civilizadas (contrariamente aos das arcaicas) é característico que os âmbitos de introdução para premissas jurídicas ou efetivas de decisão, sejam socialmente distendidos"106. Há, portanto, uma separação das fontes das premissas em duas instâncias apartadas.

Uma instância incumbe-se de estabelecer o Direito (processo legislativo). Outra enuncia os fatos verdadeiros e não verdadeiros. Atuam em planos distintos e devem estar separadas, sem possibilidade de se dominarem reciprocamente. O embate entre ambas só pode realizar-se dentro e através do processo jurídico.

Essa dicotomia de fontes de premissas decisórias livra o processo da pressão social. As premissas aptas para uma decisão não estão ao alcance monopolístico de um único ambiente.

Assim se evita o perigo de que o processo se possa tornar um braço prolongado dum determinado setor do meio ambiente. Na linguagem de decisão dos próprios processos jurídicos, esta condição de autonomia exprime-se manifestamente sob a forma duma separação rígida entre problemas de direito e problemas de fato, cuja correlação fica a cargo de cada caso particular.107 [sem grifo no original]

A referência a “braço prolongado dum determinado setor”, diante da disposição de unificação do SEPAJ, suscita imensas preocupações que fogem ao referente do presente trabalho. Mas, mesmo sob o enfoque deste estudo, a afirmação faz sentido.

A separação entre questões fáticas e jurídicas é questão relevante de que se ocupa a teoria do Direito, onde a diferença se radicaliza sob a forma de dicotomias bem conhecidas: norma e realidade, ser e dever ser108, faticidade e validade.

Aqui, importa a diferenciação entre os processos de definição do direito e de apuração dos fatos, como condição de autonomia do procedimento judicial de aplicação do direito. Num ambiente de processo eletrônico, o SEPAJ pode tornar-se a trilha de controle do procedimento, por exemplo, pela imposição de uma visão específica da fonte jurídica. Um atentado à autonomia, sem dúvida.

5.7.4 Procedimento, complexidade e ameaças à autonomia

Pelas condições que devem ser articuladas para se obter a autonomia dos procedimentos de aplicação judicial, vê-se a complexidade inerente ao processo de sua montagem. E também se expõem os meios de perturbá-los.

Os procedimentos, nas sociedades primitivas, não conseguiam se estabelecer autonomamente, porque tais sociedades eram incapazes de promover a diferenciação. As sociedades atuais, altamente complexas, embora possam prover as condições de autonomia, estão sujeitas a, voluntária ou involuntariamente, destruí-la ou perturbá-la109.

O procedimento constitui um sistema programado de decisão110. Se era assim no processo em papel, no processo eletrônico essa afirmação ganha significação ampliada. "A programação objetiva e detalhada da decisão, podendo chegar até à automação, constitui uma dessas possibilidades[...]"111, advertia o autor no final dos anos 60.

A programação do processo, a partir das Constituições, aliviou as preocupações a respeito. A dogmatização dos ditames constitucionais leva a isso. Ocorre que "as regras mais minuciosas do direito processual, com todas as garantias dum estudo constitucional, não levam à autonomia, se não forem secundadas pela diferenciação social do meio[...]"112. Sem essa condição prévia estabelecida, a especificação minuciosa do direito processual destrói a autonomia e põe o procedimento de aplicação nas mãos do que poderia ser chamado de uma "central política, controlando tanto as informações jurídicas, quanto as efetivas que são apresentadas ao tribunal".113 Portanto, “ [...] a seletividade, e com ela a autonomia do processo jurídico, têm de ser maiores perante um meio encarado duma forma mais complexa.”114

Os riscos à diferenciação e à autonomia, com a introdução do SEPAJ no processo, só se amplificaram. As preocupações jurídicas a respeito precisam tornar-se balizas efetivas de controle da tecnologia. O princípio da extraoperabilidade é uma delas.

5.8 Acoplamento estrutural

Neste item, toma-se da computação a noção de que estrutura115 é programa, algoritmo, malha de instruções que o computador segue quando opera.116.

O acoplamento estrutural, previsto no princípio da extraoperabilidade, é uma via aberta para o uso efetivo da inteligência coletiva no desenvolvimento do SEPAJ. A coletividade tecnológica pode ajudar, com aportes estruturais, a construção/complementação do SEPAJ. A inteligência não está nos fatos (que importam no aspecto informacional cognitivo) mas principalmente na criação das estruturas dos softwares do entorno, especializados no trato da contingência e da complexidade que estão além do limite auto-referencial do SEPAJ.

5.8.1 Evolução do pensamento luhmanniano a respeito do acoplamento estrutural

O problema da composição das estruturas dos sistemas ocupou imenso espaço no pensamento luhmanniano117 e oscilou realçando, ora a idéia de penetração (ou interpenetração quando bidirecional), ora a de acoplamento estrutural.

Na obra sistemas sociais, um extenso capítulo 6118 tem o título de interpenetração e inicia informando que "el presente capítulo trata de um entorno especial de los sistemas sociales: El de los seres humanos y sus relaciones con los sistemas sociales."119 Marcado muito profundamente pelo estruturalismo funcional de Talcott Parsons, Luhmann utilizou o conceito estabelecido pelo mestre. "Utilizamos El concepto ‘interpenetración' para indicar uma manera particular de contribución a la construcción de sistemas que es aportada por los sistemas en el entorno."120

Humberto Maturana e Francisco Varela, com a idéia de autopoiese, introduziram também o conceito de acoplamento estrutural 121 para o âmbito biológico. Desde então, Luhmann concentrou-se em absorver, no seu arcabouço teórico, a abordagem dos chilenos122. Na aula X de sua introdução à teoria dos sistemas, ao final, o sociólogo alemão demonstra desesperança em relação às possibilidades de uso da idéia parsoniana de interpenetração e, na sequência, dedica uma aula inteira, a aula de nro. XI, à idéia de acoplamento estrutural: "Antes, portanto, de tomar uma decisão pela continuidade ou descontinuidade em relação ao termo interpenetração, o importante é enfrentar o problema ao qual ela se refere, sendo, talvez, necessário lançar mão de outro conceito."123 Günther Teubner, sob a mesma dificuldade, introduz o conceito de interferência: “ [...] sistemas interferentes apresentam-se mutuamente complexidade já ordenada”124, uma noção importante para este trabalho.

Em obras posteriores, embora sem a forma assertiva de sistemas sociais, Luhmann recorre, volta e meia, à idéia de penetração:

Se trata más bien de un caso de interpenetración. Esto quiere decir: el derecho presupone que el entorno estructura y reduce complejidad, de esta manera se aprovecha de esos resultados sin necesidad de analizar su génesis - cuando lo amerite, lo hará bajo aspectos meramente jurídicos.125

O texto deixa claro que há a externalização de uma função, entregue a sistema do entorno. Isso significa duas coisas: (a) abertura cognitiva do sistema chamador ao resultado do sistema chamado/acionado: “[...] se aprovecha de esos resultados [...]” e (b) abertura estrutural, porque o algoritmo da função que serve ao sistema chamador se encontra num outro sistema e, portanto, esse trecho do programa é só virtualmente incorporado (daí Luhmann falar em penetração) e não precisa situar-se fisicamente na malha estrutural do sistema chamador.126

Essas idéias são melhor formuladas nas obras tardias de Luhmann, mediante a distinção de acoplamento operativo e acoplamento estrutural. Mas o fantasma da separação do sistema enquanto é concebido do sistema em operação permeia todo o pensamento luhmanniano, reprisando a antiga discussão filosófica da distinção entre o universal e o particular. Pode-se dizer que a estrutura do universal (abstração do que está em todos os particulares) contém a miríade de estruturas particulares que se manifestam em tempo de operação. Os técnicos distinguem isso chamando de classes e objetos127.

5.8.2 Acoplamento operativo

O SEPAJ é um sistema técnico (software), instalado sobre uma rede virtual, e os rendimentos da idéia de conexão podem ser maximizados por intermédio desse sistema.

No acoplamento estrutural, o sistema supõe determinadas características do entorno – há, portanto, uma restrição, os limites supostos do universo - e facilita a influência do entorno sobre ele. A estrutura do sistema está preparada para aceitar/rechaçar, nas relações com o entorno, o que se ajusta ou não ao suposto:

Los cerebros, con sus ojos y oídos, se acoplan únicamente en un rango físico muy estrecho con su entorno -y, en todo caso, no lo hacen por medio de sus propias operaciones neurofisiológicas. Pero, precisamente por ello, hacen al organismo increíblemente sensible desde el punto de vista del entorno. La restricción es condición necesaria de la capacidad de resonancia, y la reducción de la complejidad es condición necesaria de la construcción de complejidad.128

Luhmann aponta como vantagem teórica da idéia de acoplamento estrutural o fato de que responde com precisão pouco comum “ [...] a las relaciones entre sistema y entorno”.129 E diz que a designação se deve à oposição “ [...] entre este concepto y los acoplamientos operativos [...] “ que, entre outras coisas, apóiam-se “ [...] en la simultaneidad que debe suponerse siempre entre el sistema y el entorno. Esta simultaneidad permite un acoplamiento momentáneo de las operaciones del sistema con aquellas que el sistema atribuye al entorno.”130 Esta simultaneidade operativa permite que cada sistema execute uma malha algorítmica estrutural composta pela malha própria e por trechos estruturais que só virtualmente se integram para servir ao sistema. Por isso, “ [...] los acoplamientos operativos entre sistema y entorno son posibles [...] exclusivamente en intervalos de eventos [...] ”131.

5.8.3 SEPAJ e acoplamentos: add-ons, plugins, APIs

A idéia de acoplamento operativo é real no mundo dos programas de computador: sistemas técnicos virtuais (softwares) compartilham facilmente suas habilidades funcionais (externalizam o cumprimento de certas funções) e compõem-se, desde a base, a partir dessa idéia. Analistas e programadores sabem disso muito bem. As eConexões permitem que dois sistemas, cada um no entorno do outro, em tempo de operação, se sirvam de estruturas situadas no espaço do outro.

A permissão de acoplamento estrutural, por seu turno, dá a possibilidade de definir os limites próprios, não virtuais, do sistema – núcleo duro sistêmico – supondo que certas características funcionais serão supridas pelo entorno, na forma de estruturas acopladas ao próprio sistema. Os tecnólogos falam de APIs132, add-ons, plugins, extensões etc. para exprimir essa idéia.

5.9 Função do princípio da extraoperabilidade.

Os juristas devem ficar atentos, pois

la ciencia evoluciona justamente porque en ella todo sirve para algo, pero nada sirve para todo. Para poder ver algo distinto es necesario “moverse” y eso en la ciencia quiere decir: disolver los elementos que constituyen una determinada teoría para recombinarlos con elementos venidos de otras perspectivas.133 [sem grifos no original]

A advertência de Monteagudo serve para os juristas em dois sentidos: para moverem-se a si mesmos e para porem em movimento os que estão incumbidos do desenvolvimento do SEPAJ.

O princípio da extraoperabilidade preconiza e autoriza a aplicação das possibilidades tecnológicas de (a) amplificação do intercâmbio ativo e controlado de informação com o ambiente (autonomia) e (b) de constituição multiestrutural/poliestrutural do sistema técnico que está posto a serviço do processo, o SEPAJ.

A inteligência coletiva pode chegar efetivamente ao processo pelo desenvolvimento, em sistemas do entorno, de habilidades de trato especializado da complexidade externa e que sejam postas a serviço do SEPAJ via eConexão, mediante acoplamento operativo ou estrutural. Segundo Monteagudo, a teoria sistêmica luhmanniana remete “[...] a la flexibilización del concepto de estructura. Por lo regular, las teorías de sistemas se asocian a conceptos duros de estructura.”134 Essa abordagem permissiva, no nível estrutural, é extremamente relevante para o desenvolvimento do SEPAJ. Como o sistema técnico está posto a serviço de um sistema social, deve carregar-se, até onde possível, da natureza deste, flexibilizando-se estruturalmente, mas preservando o guarda-chuva da autonomia para eliminar riscos à higidez processual.

Ora, os desenvolvedores têm formação técnico-sistêmica e têm trabalhado, até agora, com o que Monteagudo denomina “conceptos duros de estructura”. No caso do SEPAJ, o encastelamento/fechamento dos códigos e a resistência dos técnicos ao compartilhamento e ao aproveitamento das contribuições do entorno, no plano estrutural, são emblemáticos e um obstáculo efetivo à evolução e ao desenvolvimento do sistema. É preciso dividir o trabalho com os demais sistemas do mundo. Plugins, add-ons, APIs são caminhos para fazer estruturas externas operarem para o SEPAJ.


6. Princípios da extraoperabilidade e da conexão:aproximação.

O quadro adiante aproxima os princípios e tenta realçar a natureza dos efeitos de sua observância. Não pretende ser exaustivo, mas suscitar reflexões:

Princípio da Extraoperabilidade

Princípio da Conexão

1. Destinatários

Dirige-se aos tecnólogos. Dá diretrizes para o desenvolvimento do SEPAJ com uso das eConexões para cognição e aporte estrutural

Agentes humanos: autoriza ou impõe o uso das conexões (conexão inquisitiva). Não distingue as eConexões.

2. Escopo /validez

Só o Direito é fonte de legitimidade. Reserva frente à tecnologia.

Tecnologicamente possível é igual a juridicamente legítimo (o meio é mensagem).

3. Posição frente ao Devido Processo Legal (DPL)

O DPL é o limite intransponível. Preservação da diferenciação funcional do processo. Radicali- zação da noção de mundo dos autos. Cuidado com os riscos à autonomia processual. Processo na internet, conectado – sim! Mas com segurança e aderência jurídica máxima. Não há verdade na rede.

Flexibilização do DPL. Des-diferenciação. Desconstrução de direitos fundamentais (contraditório, livre conven- cimento), da estrutura proces-sual (instrução/decisão - deformalização). Autos difusos (mundo dos autos e o google). Crença na verdade da rede.

4. Como vê a tecnologia

Instrumento a serviço do instru- mento: papel subinstrumental. Code is not law.

Tecnologia autorizada a impor-se ao jurídico. Assunção e reforço do code is law (Lessig).

5. Enfoque sistêmico amplo

SEPAJ sob as restrições impostas aos humanos. Conexão seletiva. Preservação dos papéis. Introdu- ção de eSujeitos: consciência da mudança lógica do modal (probabilístico) para o formal (determinístico).

Uso da conexão pelos humanos. Alteração de papéis (julgador inquisitivo). Alimentação inces-sante. Revisão das preclusões (inviabilização operacional/re-cursividade sem fim). Inestabi- lidade contínua. Rejeição da seletividade.

6. Diferenciação sistêmica: condição de autonomia do processo

Preocupação com a diferenciação. Fechar a via do SEPAJ para o ingresso de influências espúrias no âmbito processual. Atenção aos novos riscos à diferenciação.

Esmaecimento da diferenciação: abrandamento de institutos promotores da diferenciação. Obrigação de inquisitividade do julgador.

7. Autonomia sistêmica

Submete o SEPAJ às regras severas da diferenciação para garantir a legitimidade do processo. Preservação de direitos fundamentais processuais.

Atua no sentido da desdiferenciação do sistema processual: desmonte de esteios constitucionais do DPL. Permissão da surpresa.

8. Acoplamento estrutural / Interpenetração

Recomenda e autoriza. O SEPAJ pode constituir-se utilizando virtualmente estruturas dos sistemas do entorno (Add-ons, plugins, externalização funcional), controlando esse afluxo estrutural virtual (abertura estrutural).

Foco apenas no contato informacional/cognitivo, pela via dos agentes humanos. Desconsideração do SEPAJ como agente de conexão (eConexão). Não abertura estrutural.


Considerações Finais

O processo eletrônico representa a instalação do processo no ambiente virtual (internet) com o uso de um novo agente processual eletrônico, o eSujeito que o legislador chamou de Sistema Eletrônico de Processamento de Ações Judiciais (SEPAJ) e que a resolução CSJT 136 chama de sistema ou de Pje-JT.

O SEPAJ é um software e permite utilizar um novo tipo de conexão, a conexão tecnológica (eConexão), diferente da conexão que existiu no processo, até agora, mediada pelos sujeitos humanos (sistemas psíquicos). O processo, no ambiente virtual, pode ser mais ou menos plugado na rede, conforme o nível de acionamento das eConexões pelo SEPAJ.

Tecnologicamente, as eConexões podem ser utilizadas para plugar o processo sob as óticas informacional (abertura cognitiva) e estrutural. O Direito deve definir os níveis de conexão permitidos aos SEPAJ e se os rendimentos desejados são apenas informacionais ou também estruturais.

A história do processo demonstra a promoção continuada da diferenciação sistêmica do procedimento, para garantir autonomia e decisões legítimas. Conectar o processo ao mundo da internet envolve efetivas possibilidades de ganhos e também riscos que devem ser adequadamente ponderados pelos juristas para, por um lado, perseguir o aperfeiçoamento do método de adjudicação do direito – uma necessidade inquestionável – e, por outro, não permitir retrocessos.

O princípio da extraoperabilidade preconiza, como balizas da autorização de conexão do processo na internet (demais sistemas do mundo), o aperfeiçoamento da autonomia sistêmica (intercâmbio informacional ativo com máxima aderência ao jurídico) e a permissão de acoplamento estrutural (sistemas do entorno compondo virtualmente o SEPAJ). Aberturas informacional e estrutural, portanto.

As reflexões sobre o princípio da extraoperabilidade levantam uma miríade de conceitos interdisciplinares, inovadores, desafiadores e necessários para a rearticulação teórica da TGP. E o princípio estabelece uma pauta fundamentada para o desenvolvimento consistente, juridicamente sustentável, dos SEPAJ.


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WAKI, Kleber. Princípios do processo eletrônico. O princípio da conexão. Disponível em: https://direitoeoutrostemas.wordpress.com/. Acesso em: 3 nov. 2014.


Notas

2 MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. A árvore do conhecimento. As bases biológicas do entendimento humano. Trad. Jonas Pereira dos Santos. Campinas:Editorial Psy II, 1995. p. 24.

3 SEPAJ é a sigla da denominação adotada pelo legislador para os sistemas eletrônicos de processamento de ações judiciais (artigo 8º da Lei 11.419/2006).

4 Chaves Júnior tem dado importantes contribuições ao avanço da teoria geral do processo para o cenário justecnológico. Seu pensamento caracteriza-se pela abertura para interdisciplinaridade.

5 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à lei do processo eletrônico. São Paulo:LTr, 2010. p. 27-30.

6 "O que observamos não é a natureza em si, mas a natureza exposta ao nosso método particular de questionamento". [sem grifo no original] Disponível em: https://www.infoescola.com/ciencias/inexatidao-cientifica-para-heisenberg/. Acesso em: 2 nov. 2014.

7 Sobre o impacto da internet nos sistemas de informação, veja-se LAUDON, Kenneth C.; LAUDON, Jane Price. Sistemas de informação. Tradução de Dalton Conde de Alencar. Rio de Janeiro:LTC, 1999. p. vii.

8 PEREIRA, S. Tavares. Processo eletrônico, software, norma tecnológica e o direito fundamental à transparência tecnológica. Elementos para uma teoria geral do processo eletrônico. Revista trabalhista: direito e processo, São Paulo, n. 43, p. 54-72, jul.ago.set. 2012.

9 Stair e Reynolds analisam extensamente os princípios dos SI, sob a ótica dos negócios. Os SEPAJ têm sido feitos sob essa principiologia, cujos contornos precisam ser muito alterados num sistema que serve ao processo. STAIR, Ralph M.; REYNOLDS, George W. Princípios de sistemas de informação. Tradução de Harue Avritscher. 9. Ed. São Paulo:Cengage Learning, 2011, especialmente cap. 1 e 2.

10 FERRAZ JR, Tércio Sampaio. A ciência do direito. 2.ed. São Paulo:Atlas, 1980. p. 88.

11 BRASIL. Resolução CSJT n. 136, de 25 de abril de 2014. Institui o Sistema Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho – Pje-JT como sistema de processamento de informações e prática de atos processuais e estabelece os parâmetros para sua implementação e funcionamento. Disponível em: https://www.csjt.jus.br/c/document_library/get_file¿uuid=8722e5f0-edb7-4507-9dcf-615403790f7c&groupId=955023. Acesso em: 15 set. 2014.

12 Sobre agentes automatizados ou inteligentes, ver: KRAMMES, Alexandre Golin. Workflow em processos judiciais eletrônicos. São Paulo:LTr, 2010. p. 47; LAUDON, Kenneth C.; LAUDON, Jane Price. Sistemas de informação, p. 340 e, ainda, PEREIRA, S. Tavares; KRAMMES, Alexandre Golin. Processo judicial eletrônico: agentes automatizados e seus atos. Norma tecnológica e ato tecnológico (eNorma e eAto). Revista trabalhista: direito e processo. São Paulo, n. 46, p.113-140, abr.mai.jun., 2014.

13 BERTALANFFY, Ludwig Von. Teoria geral dos sistemas. Petrópolis:Vozes, 1973. p. 82-84.

14 A relação sistema/entorno ocupa a reflexão luhmanniana ao longo e toda a trajetória do jussociólogo. Veja-se, por exemplo, em sua obra culminante: LUHMANN, Niklas. La sociedad de La sociedad. (Die gesellschaft der gesellschaft). Trad. Javier torres Nafarrate. México:Herder, 2006. p. 40 e seguintes.

15 STAIR, Ralph M.; REYNOLDS, George W. Princípios de sistemas..., p. 7.

16 DANIELS, Alan; YEATES, Donald. Systems analysis. Palo Alto:SRA, 1969. p. 238-251.

17 DANIELS, Alan; YEATES, Donald. Systems analysis, p. 239.

18 DANIELS, Alan; YEATES, Donald. Systems analysis. p.239.

19 BERTALANFFY, Ludwig Von. Teoria geral dos sistemas, p. 84. A definição mais corriqueira do cientista é complexo de elementos e suas inter-relações.

20 BERTALANFFY, Ludwig Von. Teoria geral dos sistemas, p. 191.

21 DANIELS, Alan; YEATES, Donald. Systems analysis., p. 239.

22 LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos para uma teoria general. Tradução para o espanhol de Silvia Pappe e Brunhilde Erker, coord. Por Javier Torres Nafarrate. Nota à versão em língua espanhola de Javier Torres Nafarrate. Barcelona: Anthropos; México:Universidad Iberoamericana; Santafé de Bogotá:CEJA, 1998. p. 113-139.

23 Alguns SEPAJ tiveram seu desenvolvimento interrompido. Foi o caso do SUAP, cujo nome anunciava a pretensão de unicidade (Sistema Único da sigla SUAP).

24 O art. 10, § 2º, da resolução CSJT 136 estabelece regra de atendimento aos portadores de necessidades especiais, que poderão peticionar "fisicamente". Mas isso não interfere no sistema e no processo. A resolução cria para as secretarias de vara a obrigação de intermediar a atuação desses atores de modo a atender às exigências do Pje-JT. O apoio é fora do sistema.

25 LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 27

26 LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 27.

27 LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 27-28.

28 FOERSTER, H. apud LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas. Trad. De Ana Cristina Arantes. 2. ed. Petrópolis:Vozes, 2010. p. 114.

29 NAFARRATE, Javier Torres in LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 23.

30 NAFARRATE, Javier Torres in LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 24.

31 NAFARRATE, Javier Torres in LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p.24.

32 LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 121.

33 LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas, p. 135.

34 “Outros problemas, mesmo muitos dos que eram anteriormente aceitos, passam a ser rejeitados como metafísicos ou como sendo parte de outra disciplina.” KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 5.ed. São Paulo:Perspectiva, 1997. p. 60.

35 Como se viu no item 2.2, à luz da análise de sistemas existe a classificação análoga dos sistemas em determinísticos e probabilísticos.

36 LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas, p. 106.

37 Este aspecto é explorado nas discussões sobre a eNorma (norma tecnologia). Veja-se: PEREIRA, S. Tavares. Processo eletrônico, software, norma tecnológica..., p. 131 e seguintes.

38 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 3.ed. São Paulo:Malheiros, 2003. v.2. p. 151: “ [...] proporcionar harmonia de julgados ou a convicção única do julgador [...] “.

39 Disponível em: https://www.dicio.com.br/conexao/. Acesso em: 15 set. 2014.

40 " An emergent property of a system, in this context, is one that is not a property of any component of that system, but is still a feature of the system as a whole." Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Emergence. Acesso em: 3 nov. 2014.

41 WAKI, KLEBER. Princípios do processo eletrônico. O princípio da conexão. Disponível em: https://direitoeoutrostemas.wordpress.com/. Acesso em: 3 nov. 2014.

42 Os tecnólogos falariam em “ [...] informação como o conjunto de dados aos quais seres humanos deram forma para torná-los significativos e úteis.” LAUDON, Kenneth C.; LAUDON, Jane Price. Sistemas de informação, p. 10.

43 CAPRA, Fritjof. A teia da vida. Uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. Tradução de Newton Roberval Eichemberg. São Paulo:Cultrix, 2000. p. 46: “pensar em termos de conexidade, de relações e de contexto.”

44 A existência de bases confiáveis e persistentes é uma condição desse rendimento: PEREIRA, S. Tavares. Processo eletrônico: é preciso virtualizar o virtual. Elementos para uma teoria geral do processo eletrônico. Revista trabalhista direito e processo. São Paulo, n. 41, p. 185-207, jan.fev.mar, 2012. p.202.

45 Para os fins deste trabalho, as noções dadas são suficientes. Entretanto, o conceito de heteroconexão comporta desdobramentos muito relevantes e adicionais.

46 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 61.

47 GARCIA, Dinio de Santis. Introdução à informática jurídica. São Paulo:Bushatsky, 1976. p. 21-98.

48 ASSUNÇÃO, Marcos Flávio Araújo. Segredos do hacker ético. 3.ed. Florianópolis:Visual Books, 2010. p. 27.

49 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários..., p. 27-30.

50 JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo.Dicionário básico de filosofia. 3.ed. Rio de Janeiro:Jorge Zahar Editor, 1996. p. 47 e 97.

51 RENAULT, Luiz Otávio Linhares. Prefácio. In:__ CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à lei do processo eletrônico, p. 9-10.

52 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 15.

53 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 16.

54 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 16/17.

55 O processo eletrônico brasileiro demonstra que o poder do meio às vezes é insuficiente para alterar substancialmente o objeto. O que fazer no novo meio é uma decisão que remanesce nos homens. O processo, embora levado para o espaço virtual, continua com autos monolíticos, feito de peças monolíticas, submetido à mesma lógica, sem adoção de ferramentais tecnológicos inovadores para ajudar, por exemplo, o julgador que, aliás, tem visto dificultar-se seu acesso às informações processuais necessárias para o julgamento.

56 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 20/22.

57 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 22.

58 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 22.

59 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 27.

60 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 27.

61 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 28.

62 Os SEPAJ, até agora, não conseguiram sequer estabelecer mecanismos hígidos e seguros para comunicar citações/intimações, gerando confusões para os usuários e fazendo-se vítimas do assédio de robôs desesperados em busca de informações processuais.

63 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 28. Veja-se que a verdade, tomada como correspondência fato-enunciado (não a consensual habermasiana) só pode ser estabelecida no discurso processual, interno do procedimento, segundo o regramento jurídico. ATIENZA, Manuel. As razões do direito. 2.ed. São Paulo:Landy, 2002. 352p.

64 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 28/29.

65 CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 30.

66 CUNHA, Henrique Gouveia da. Sistema eletrônico de processamento de ações judiciais: princípios processuais. I Jornada sobre teoria e prática do processo eletrônico. Brasília:ESMAF, 2014. (Coleção Jornada de Estudos ESMAF; 24). p. 95-112.

67 CUNHA, Henrique Gouveia da. Sistema eletrônico..., p. 107.

68 CUNHA, Henrique Gouveia da. Sistema eletrônico..., p. 108.

69 WAKI, Kleber. Princípios do processo eletrônico. O princípio da conexão.

70 REsp 742.451/SC, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/11/2007, DJ 10/12/2007, p. 292 JC vol. 115, p. 21321

71 Emprega-se princípio com o sentido alexyano, de comando de otimização, de mandamento ou ordem para a perseguição continuada de posições de maior concretização do fenômeno denominado pelo neologismo extraoperabilidade. ALEXY, Robert apud ATIENZA, Manuel. As razões... p. 267.

72 PEREIRA, S. Tavares. Processo eletrônico, máxima automação, extraoperabilidade, imaginalização mínima e máximo apoio ao juiz: ciberprocesso. Revista trabalhista direito e processo. São Paulo, n. 30, p. 168-187, abr.mai.jun. 2009.

73 LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. (Das recht der gesellschaft). Formatação eletrônica. Versão 5.0, de 13/01/2003. Disponível em: https://forodelderecho.blogcindario.com/2008/04/el-derecho-de-la-sociedad-niklas.html. Acesso em: 10 nov. 2011. p. 58.

74 Sobre os riscos de estar na internet veja-se STAIR, Ralph M.; REYNOLDS, George W. Princípios de sistemas..., p. 534 e seguintes.

75 No sentido proposto por Peter J. Rubin, para quem o próprio direito a um procedimento justo é um direito substancial. RUBIN, Peter J. Square pegs and round holes: substantive due process, procedural due process, and the bill of rights. In:___ Columbia law review. New York, v.103, n. 833, p.833-892, maio 2003. p. 848.

76 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento. Trad. De Maria da Conceição Corte-Real. Brasília:UnB, 1980. 210p.

77 A teoria dos sistemas sofreu enorme impacto ao final da década de 60 e durante a década de 70 com as idéias de Maturana e Varela atinentes aos sistemas auto-organizadores e à autopoiese.

78 Idéias encontradas, notadamente, na obra LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento.

79 Idéias extraídas de LUHMANN, Niklas. Sistemi sociali. Fondamenti di uma teoria generale. Tradução para o italiano de Alberto Febbrajo e Reinhard Schmidt. Introdução à edição italiana de Alberto Febbrajo. Bologna:Società editrice il Mulino, 1990.

80 LUHMANN, Niklas. Sistemi sociali, p. 89-90.

81 FEBBRAJO, Alberto. Introduzione all´edizione italiana. In:__ LUHMANN, Niklas. Sistemi sociali. Fondamenti di una teoria generale, p. 19.

82 PEREIRA, S. Tavares. O processo eletrônico e o princípio da dupla instrumentalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1937, 20 out. 2008. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/11824/o-processo-eletronico-e-o-principio-da-dupla-instrumentalidade>. Acesso em: 16 mar. 2009.

83 A respeito, veja-se LAUDON, Kenneth C.; LAUDON, Jane Price. Sistemas de informação, p. 260-284.

84 Comparando cérebros de primatas com os do homem (menores mas superiores), Gazzaniga diz que “ [...] enquanto o tamanho absoluto do cérebro e o número total de neurônios aumenta, a conectividade proporcional decresce e a estrutura interna muda ao mesmo tempo que o padrão de conectividade se altera. Para adicionar novas funções, o decréscimo na conectividade proporcional força o cérebro a se especializar. Pequenos circuitos locais, feitos de um grupo de neurônios interconectados, são criados para executar tarefas de processamento específicas e se tornam automáticos.” [sem grifo no original, tradução livre] GAZZANIGA, Michael S. Who´s in charge? Free will and the science of the brain. New York:Harper Collins Publishers, 2011. p. 33. Ver, também, LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas, p. 116, e LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad, p. 316: “la reducción de la complejidad es condición necesaria de la construcción de complejidad”.

85 Nos meios tecnológicos, fala-se, nesse sentido, em engenhos de serialização, desserialização, contracts e, inclusive intraoperabilidade (fluxo num sentido único, de dentro para fora).

86 Segundo Luhmann, todos os sistemas sociais dependem de acoplamento estrutural com sistemas de consciência e deles são dependentes: “La sociedad depende del acoplamiento estructural con los sistemas psíquicos; el derecho también”. LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 174.

87 “[...] la inteligencia es asimilación en la medida en que incorpora a sus marcos todo lo proporcionado por la expe­riencia. Bien se trate del pensamiento, que, gracias al juicio, hace entrar lo nuevo en lo conocido y reduce así el universo a sus nociones propias, o de la inteligencia sensoriomotriz, que estructura igual­mente las cosas percibidas reduciéndolas a sus esquemas, en todos los casos la adaptación intelectual implica un elemento de asimilación, es decir, de estructuración mediante la incorporación de la realidad exterior a unas formas debidas a la actividad del sujeto”. PIAGET, Jean. El nacimiento de la inteligencia en el niño. Barcelona:Editorial Crítica, 1985. p. 16-17.

88 Sobre o programa combinatório de estruturas normativas e sistemas psíquicos, Monteagudo afirma que “la superación de la doble contingencia y la continuidad del orden social dependen, pues, del mantenimiento de estructuras (normativas) fuertemente institucionalizadas en lo social e interiorizadas en lo psíquico.” MONTEAGUDO, Jorge Galindo. In:_ LUHMANN, Niklas. La sociedad de la..., p. XXXII.

89 Na evolução do seu pensamento a respeito da relação sistema-entorno, Luhmann oscilou entre as visões oriundas de Parsons – interpenetração – e suas últimas concepções de acoplamento estrutural, desenvolvidas a partir das idéias de Maturana e Varela sobre os sistemas autopoiéticos e auto-organizadores, dependentes do acoplamento estrutural com o meio. Em suas últimas obras, Luhmann refere-se também a “ [...] acoplamientos operativos (acoplamientos de operaciones por operaciones) [...] “. LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad, p. 315.

90 GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. São Paulo:Landy Editora, 2004. p. 25.

91 Para mais reflexões a respeito, ver PEREIRA, S. Tavares. Processo eletrônico, software, norma tecnológica..., p. 67 e seguintes.

92 “ [...] in the real world only suboptimizations are performed.” DANIELS, Alan; YEATES, Donald. Systems analysis, p. 242.

93 PEREIRA, S. Tavares. Processo eletrônico, máxima automação..., p. 175-176.

94 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 61.

95 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 61.

96 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 61.

97 A tecnologia não é uma fonte de legitimação de norma e, portanto, o código não é direito, no sentido da advertência empírica de LESSIG, Lawrence. Code. Version 2.0. New York: Basic books, 2006. 410p. Disponível em: https://codev2.cc/download+remix/Lessig-Codev2.pdf. Acesso em: 10 jan. 2013. Também se trata do assunto ao falar da eNorma e da necessidade de submeter as expressões tecnológicas de normas jurídicas aos mecanismos de legitimação do Direito. PEREIRA, S. Tavares. Processo eletrônico, software, norma tecnológica..., p. 67 e seguintes.

98 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 61-64.

99 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 61.

100 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 61.

101 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 61.

102 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 57.

103 Contra toda evidência empírica, Chaves Júnior sugere a existência de uma verdade da rede. A rede, em verdade, é um ambiente inseguro e inóspito. CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à Lei do processo eletrônico, p. 28.

104 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 62.

105 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 62.

106 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 62.

107 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 63.

108 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 63, nota 5.

109 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 63.

110 "Até agora deitamos uma vista de olhos aos procedimentos de aplicação jurídica, aos procedimentos para uma decisão programada", diz Luhmann na abertura da parte III. LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 117.

111 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 63.

112 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 63.

113 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 63

114 LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 64.

115 Mas é válido lembrar que “a pesar de haber sido desarrollado en el marco de una teoría de sistemas, el concepto luhmanniano de estructura se nos presenta como un concepto flexible, capaz de dar cuenta de la regularidad de lo social, sin abandonar la contingencia que le es inherente. Luhmann concibe a las estructuras de los sistemas sociales en términos de expectativas.” MONTEAGUDO, Jorge Galindo. In: LUHMANN, Niklas. La sociedad de la..., p. XXXII.

116 “As linguagens de programação tem diversas estruturas básicas que as compõem. Falamos já sobre estruturas de laços, funções, variáveis e arrays. Agora falaremos sobre estruturas condicionais. Estas são parte fundamental em qualquer linguagem de programação, em termos básicos, as condições que guiam por onde o código deve prosseguir.” MÜLLER, Nicolas. Condições em PHP: IF, ELSE IF, ELSE, SWITCH. Disponível em: https://www.oficinadanet.com.br/post/9507-condicoes-em-php-if-else-if-else-switch. Acesso em: 10 nov.2014.

117 Veja-se a manifestação do final dos anos 60: “ [...] existe uma interde­pendência entre a variabilidade estrutural e a complexidade nas relações entre o sistema e seu ambiente”. LUHMANN, Niklas. Sociologia do direito II. Trad. De Gustavo Bayer. Rio de Janeiro:Edições Tempo Brasileiro, 1985. p. 42. Sobre variação estrutural, veja-se, também, a p. 16.

118 LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 199-235.

119 LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 199.

120 LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales. Lineamientos..., p. 201.

121 MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. A árvore do conhecimento, p. 112-116.

122 A obra culminante da carreira de Luhmann contém várias referências a essa absorção das idéias de Maturana e Varela. Veja-se, por exemplo, LUHMANN, Niklas. La sociedad de la..., p. 44 e seguintes.

123 LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas... , p. 270.

124 TEUBNER, Gunther. Social order from legislative noise. Autopoietic closure as a problem for legal regulation. In: State, law, and economy as autopoietic systems. Regulation and autonomy in a new perspective. Gunther Teubner e Alberto Febbrajo (eds.) Milan: Dott. A Giuffrè, 1992. p. 633.

125 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 61.

126 Em termos tecnológicos, função é um algoritmo que pode ser acionado, recebe certos parâmetros e gera e devolve um resultado. O algoritmo chamador supõe a correção do algoritmo chamado.

127 Os tecnólogos falam de classes e objetos. Uma classe é a idéia de objeto, seu projeto. No mundo real, na faticidade, no momento mesmo de operação do sistema, o objeto é um objeto mesmo, o dasein heideggeriano, um ente como tantos outros que podem ganhar vida por algum tempo (instante, daí o instanciar um objeto do linguajar deles), idênticos aos demais cuja objetivação se faz a partir da mesma classe. Classe e objeto, dois momentos de existência do objeto, no primeiro como idéia, no segundo como realidade fática. A partir de uma classe geram-se muitos objetos.

128 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 316.

129 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 315.

130 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 315.

131 LUHMANN, Niklas. El derecho de La sociedad, p. 316.

132 A respeito, a Wikipédia tem ótimo resumo. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Interface_de_programa%C3%A7%C3%A3º_de_aplica%C3%A7%C3%B5es. Acesso em: 15 out. 2014.

133 MONTEAGUDO, Jorge Galindo. In: LUHMANN, Niklas. La sociedad de la..., p. XXXIV.

134 MONTEAGUDO, Jorge Galindo. In: LUHMANN, Niklas. La sociedad de la..., p. XXXII


Autor

  • S. Tavares-Pereira

    Mestre em Ciência Jurídica pela Univali/SC e pós-graduado em Direito Processual Civil Contemporâneo. Autor de "Devido processo substantivo (2007)" e de <b>"Machine learning nas decisões. O uso jurídico dos algoritmos aprendizes (2021)"</b>. Esta obra foi publicada em inglês ("Machine learning and judicial decisions. Legal use of learning algorithms." Autor, também, de inúmeros artigos da área de direito eletrônico, filosofia do Direito, direito Constitucional e Direito material e processual do trabalho. Várias participações em obras coletivas.

    Teoriza o processo eletrônico a partir do marco teórico da Teoria Geral dos Sistemas Sociais de Niklas Luhmann. Foi programador de computador, analista de sistemas, Juiz do Trabalho da 12ª região. e professor: em tecnologia lecionou lógica de programação, linguagem de programação e banco de dados; na área jurídica, lecionou Direito Constitucional em nível de pós-graduação e Direito Constitucional e Direito Processual do Trabalho em nível de graduação. Foi juiz do trabalho titular de vara (atualmente aposentado).

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Informações sobre o texto

O artigo dá sequência às elaborações teóricas do autor acerca do processo eletrônico. O marco teórico do autor é o jurista e sociológico alemão Niklas Luhmann. Os artigos anteriores também estão publicados no Jus Navigandi e demonstram que o autor é entusiasta da tecnologia mas preconiza sua absorção, no Direito, sem ofensa aos direitos fundamentais, notadamente ao devido processo legal, no caso do processo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, S. Tavares-. Processo eletrônico e o princípio da extraoperabilidade. A conexão a serviço da causalidade (informação), da estrutura (operação) e da juridicidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4235, 4 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35718. Acesso em: 18 abr. 2024.