Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/4186
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Os limites subjetivos da coisa julgada nas demandas coletivas

Os limites subjetivos da coisa julgada nas demandas coletivas

Publicado em . Elaborado em .

INTRODUÇÃO

A passagem do Estado Liberal para o Estado Social foi marcada pelo surgimento dos interesses metaindividuais, situados entre os direitos individuais e os direitos públicos.

Tais interesses, por se afastarem do paradigma processual até então existente - de cunho individualista - inspiraram a criação de demandas próprias, que realizassem uma tutela efetiva e diferenciada, surgindo assim a ação popular, a ação civil pública, o mandado de segurança coletivo e as ações coletivas de consumo.

Porém, não obstante tais demandas tenham possibilitado um avanço em relação à tutela coletiva, o debate ainda é acirrado em muitos pontos, destacando-se a dificuldade de adaptar o fenômeno da coisa julgada previsto no Código de Processo Civil pátrio às ações que tutelam direitos individuais homogêneos, difusos e coletivos.

Neste estudo, portanto, pretendemos investigar a coisa julgada, fruto de um processo civil de cunho individualista, em face da tutela de interesses metaindividuais, esperando levar a refletir sobre atual face do direito, o qual vai aos poucos se despedindo de certas características que o acompanham ao longo dos séculos e começa a retratar uma nova realidade social, preocupada com a defesa de bens como o direito ao meio ambiente, à cultura, à história, à educação e à dignidade, postulando que tais predominem sobre qualquer outro interesse.

Para tanto, faremos inicialmente uma abordagem histórica dos interesses metaindividuais e analisaremos os interesses individuais homogêneos, os direitos coletivos e os direitos difusos.

Apresentaremos, após, os aspectos mais relevantes das ações a que denominamos coletivas: o mandado de segurança coletivo, a ação civil pública, a ação popular e as ações de consumo.

A coisa julgada sob o enfoque processual individualista será estudada no terceiro tópico desse estudo e, na continuidade, apresentaremos o tratamento dispensado à coisa julgada pelo Código de Defesa do Consumidor, discutindo alguns posicionamentos doutrinários e retratando a coisa julgada secundum eventum litis e in utilibus, a litispendência e a limitação territorial à coisa julgada trazida pela Lei 9.494/97, apresentando algumas críticas à alteração do artigo 16 da Lei 7.347/85 e à criação do artigo 2º - A na Lei 9.494/97.


I – INTERESSES METAINDIVIDUAIS

Ao iniciarmos o estudo dos limites subjetivos da coisa julgada nas demandas coletivas é de fundamental importância a análise dos interesses defendidos por esse tipo de ação, os quais são denominados interesses metaindividuais e compreendem os interesses individuais homogêneos, difusos e coletivos.

1.A evolução histórica dos interesses metaindividuais

A história dos Estados é marcada por períodos cíclicos em que há a predominância de interesses coletivos ou privados, o que leva à valorização do individual em algumas épocas e à preocupação com o social em outros momentos.

Ao longo do período medieval, o Estado enfrentou grande enfraquecimento, em razão de guerras constantes e também por causa dos feudos, das corporações e da Igreja. Eram chamados de "corpos intermediários", segundo Rodolfo de Camargo Mancuso.

Terminada a Idade Média, instituiu-se o Absolutismo Monárquico, em que o poder concentrava-se nas mãos do Monarca. Nessa época, as liberdades individuais foram massacradas em prol do poder estatal soberano. Tal realidade, entretanto, foi modificada pelas instituição de um paradigma estatal liberal, o qual tinha como grande meta obter a menor presença possível do Estado, suprimindo-o da economia, da saúde, da religião e, enfim, tornando-o absenteísta.

A tímida intervenção do Estado, em especial na economia, contudo, acabou resultando em um dos maiores acontecimentos históricos do século XIX, a Revolução Industrial.

Tal fato significou uma época de progresso econômico, crescimento populacional, abertura de novos mercados consumidores e novas invenções mecânicas. Entretanto, também foi responsável pelo aumento da miséria entre o proletariado, pelas grandes concentrações de riquezas em mãos de uma minoria e pelo surgimento de trustes, cartéis, sindicatos, etc. Com isso, o modelo não intervencionista do Estado, representado pelo Liberalismo fracassou.

Diante do contexto social delineado pelo progresso das indústrias, o Estado não mais podia limitar-se a policiar a ordem pública. Viu-se obrigado a intervir, principalmente porque com as greves e revoluções ocasionadas pelos trabalhadores, recolhia-se menos tributos.

Assim, em virtude do retorno, por parte do Estado, a atividades que haviam saído da esfera de sua competência no liberalismo, foi surgindo um novo modelo estatal, chamado de Estado do Bem-Estar Social ou Welfare State.

Tal Estado Social, modelo existente nos dias atuais, procura atuar de modo intermediário entre um Estado totalmente intervencionista e um Estado completamente absenteísta. O compromisso maior do Estado, nesse modelo, é a busca da realização do bem-estar social.

Segundo José Luis Bolzan de Morais, o personagem principal no Estado Social é o grupo, que se corporifica diferentemente em cada movimento social.

Enquanto nos Estados liberais os direitos individuais tornaram-se o fundamento das estruturas constitucionais, no novo modelo, o Estado do Bem-Estar Social, os direitos individuais foram postos ao lado dos direitos sociais e coletivos, disciplinando as relações entre capital e trabalho, tratando da Previdência Social, da função social da propriedade, dentre outros.

José Luis Bolzan de Morais, leciona que partindo de um modelo liberal e de sua projeção jurídica no direito individual, chegamos ao Welfare State sob a roupagem de Estado Democrático de Direito, no qual o conteúdo jurídico fundamental é dado pelos interesses transindividuais.

No Brasil, não obstante o Welfare State ter surgido a partir da década de 1930, com a edição de normas sociais, principalmente referentes às leis trabalhistas e previdenciárias, foi com a Constituição de 1988 que se instituiu de verdade o Estado Democrático de Direito.

Um Estado solidário, portanto, exige direitos que transcendam a esfera individual, nascendo assim, os direitos metaindividuais, que são, em nosso ordenamento jurídico, divididos em direitos individuais homogêneos, coletivos e difusos.

1.2 Direitos individuais homogêneos, coletivos e difusos

Com o surgimento do Estado Democrático de Direito, a preocupação com a coletividade tornou-se cada vez mais acirrada, fato que é demonstrado no conteúdo das Constituições de diversos países, em leis ordinárias - preocupadas com a defesa do consumidor, do patrimônio histórico e artístico da humanidade e do meio ambiente - e também fora da área jurídica, em programas de ação social, de proteção ambiental, etc.

Desta forma, passaram a ser reconhecidos os direitos metaindividuais, ou seja, os direitos pertencentes não somente a um indivíduo, mas a uma coletividade.

Não obstante nossa legislação já fizesse referência a interesses transindividuais, tais direitos surgiram definitivamente com a edição do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990), que os classificou em interesses individuais homogêneos, interesses coletivos e interesses difusos.

De acordo com Kazuo Watanabe, um dos autores do anteprojeto da Lei 8.078/90, a tutela coletiva abrange dois tipos de interesses ou direitos: a) os essencialmente coletivos, que são os "difusos", definidos no inc. I do parágrafo único do art. 81, e os "coletivos" propriamente ditos, conceituados no inc. II do parágrafo único do art. 81; b) os de natureza coletiva apenas na forma em que são tutelados, que são os "individuais homogêneos", definidos no inc. III do parágrafo único do art. 81.

Assim, temos duas espécies de direitos essencialmente coletivos - ou direitos coletivos lato sensu - que são os direitos coletivos strictu sensu e os direitos difusos. Os direitos individuais homogêneos possuem particularidades que os diferenciam dos interesses individuais e os excluem da classificação de interesses essencialmente coletivos.

Tais interesses serão vistos isoladamente a seguir.

1.2.1 Interesses individuais homogêneos

Os interesses individuais homogêneos são, em sua origem, muito similares às famosas class actions do direito norte-americano.

Segundo Luiz Paulo da Silva Araújo Filho, as class actions foram herdadas do sistema legal inglês e eram utilizadas quando se tinha interesse comum ou geral de muitas pessoas. Por constituírem uma classe numerosa, seria impraticável trazer todos os seus membros a juízo. Assim, um ou mais membros poderiam propor a ação ou apresentar a defesa, pela totalidade da classe.

No Brasil, a tutela de interesses individuais homogêneos representou a incorporação das class actions acima mencionadas em nosso ordenamento jurídico, embora, como sustenta Kazuo Watanabe, não haja identidade entre tais ações, em razão da necessidade de adaptação às nossas peculiaridades geográficas, sociais, políticas e culturais.

Para o ordenamento jurídico brasileiro, os interesses individuais homogêneos são aqueles que, embora se apresentem uniformizados pela origem comum, permanecem individuais em sua essência.

Hugo Nigro Mazzilli defende tese de que os interesses individuais homogêneos, em sentido lato, não deixam de ser também interesses coletivos, porquanto os interesses individuais homogêneos, assim como os difusos, originam-se de circunstâncias de fato comuns; entretanto, os titulares dos primeiros são determinados ou determináveis, enquanto os titulares dos demais são indeterminados.

Teori Albino Zavascki, por sua vez, entende de modo diferente a concepção de interesses individuais homogêneos e denomina a sua defesa de "defesa coletiva de direitos", ressaltando que esta não se confunde com a defesa de direitos coletivos.

Segundo o autor, direito coletivo é direito transindividual (= sem titular determinado) e indivisível. Pode ser difuso ou coletivo, strictu sensu. Já os direitos individuais homogêneos são, na verdade, simplesmente direitos subjetivos individuais. A qualificação de homogêneos não desvirtua essa sua natureza, mas simplesmente os relaciona a outros direitos individuais assemelhados, permitindo a defesa coletiva de todos eles.

Podemos dizer, portanto, que interesses individuais homogêneos são um conjunto de vontades individuais. O que os difere dos direitos coletivos é a divisibilidade desses interesses, ou seja, é possível que cada sujeito ingresse individualmente com sua demanda. E isso porque o objeto da ação é divisível.

Luiz Paulo da Silva Araújo Filho, ao abordar a evolução da tutela dos direitos individuais homogêneos no direito brasileiro, remete ao VII Congresso Internacional de Direito Processual, realizado em Würzburg, 1983, em que José Carlos Barbosa Moreira designou os interesses individuais homogêneos como "acidentalmente coletivos" e os interesses coletivos strictu sensu e difusos como "essencialmente coletivos".

Os interesses individuais homogêneos são acidentalmente coletivos mormente porque têm a mesma origem em relação aos fatos geradores de tais direitos, o que recomenda a defesa de todos a um só tempo.

A defesa em juízo dos interesses individuais homogêneos é feita, geralmente, pelo próprio titular. É possível a defesa por terceiro, mas somente através de representação, com a concordância do titular.

Também tais direitos são suscetíveis de renúncia e transação, salvo em caso de direitos personalíssimos.

Após a breve abordagem dos interesses individuais homogêneos, necessário dar continuidade ao estudo dos interesses metaindividuais, analisando os interesses coletivos.

1.2.2 Interesses coletivos

Interesses coletivos são direitos de natureza indivisível, pertencentes a um grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si por uma relação jurídica base. São indivisíveis porque todos os titulares do direito são beneficiados ou prejudicados, mesmo que apenas um sujeito ingresse com a demanda em juízo.

Na explanação de Gianpaolo Poggio Smanio, os interesses coletivos têm natureza indivisível, à medida que não podem ser compartilhados individualmente entre seus titulares. Atendido o interesse de um, estará atendido o de todos.

Essa espécie de interesse pertence a uma categoria determinada ou, pelo menos, determinável de pessoas. São titulares de tais interesses os membros de determinada classe, categoria ou grupo.

A respeito da diferença entre interesses difusos e coletivos, nos afirmam Arruda Alvim e outros: "A diferença está, neste inciso II, em relação ao anterior, na possível delimitação clara dos beneficiários do interesse ou direito, tendo em vista os pressupostos, em si mesmos definidos, para identificar a titularidade do grupo, categoria ou classe".

O Código de Defesa do Consumidor, ao definir os direitos coletivos, ainda dispõe como pressuposto para sua caracterização a existência de uma relação jurídica base, o que significa que os titulares desses interesses devem estar interligados por alguma relação jurídica.

No dizer de Kazuo Watanabe, essa relação jurídica-base é a preexistente à lesão ou ameaça de lesão do interesse ou direito do grupo, categoria ou classe de pessoas. Não a relação jurídica nascida da própria lesão ou da ameaça de lesão.

Continuando sua abordagem sobre o tema, afirma o autor que a relação jurídica-base que interessa é aquela da qual é derivado o interesse tutelando, ou seja, interesse que guarda relação mais imediata e próxima com a lesão ou ameaça de lesão.

Os interesses coletivos são insuscetíveis de renúncia ou transação e sua defesa em juízo ocorre sempre através de substituição processual.

Sinteticamente, portanto, os interesses coletivos são metaindividuais, porque se situam entre os interesses individuais e os interesses públicos secundários do Estado, têm natureza indivisível, atingem a todos seus titulares e possuem como sujeito ativo um grupo, uma classe ou categoria de pessoas, determinadas ou determináveis.

Para finalizar, estudaremos a última categoria de interesses transindividuais, os interesses difusos.

1.2.3 Interesses difusos

Interesses difusos são os de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

Assim como os direitos coletivos, os interesses difusos são também de natureza indivisível. A grande diferença, entretanto, é que os titulares desses direitos são pessoas indeterminadas e que se encontram ligadas por uma situação de fato e não por uma relação jurídica.

Quanto à possibilidade de renúncia ou transação, ressaltamos que, assim como os interesses coletivos, os interesses difusos são insuscetíveis de tais atos.

Ainda, a defesa em juízo desses direitos ocorre através da substituição processual. Em razão da indeterminação subjetiva que cerca os interesses difusos, há a chamada titularidade aberta, ou seja, podem ser titulares da ação organismos intermediários da sociedade civil, indivíduos isolados ou o Ministério Público.

Nesse sentido, temos a posição de José Luis Bolzan de Morais: "Eventualmente, podemos defini-la como uma titularidade aberta, podendo ser conferida a um ente esponenziale que refletiria de maneira maximizada o interesse pretendido [...]".

Por fim, ressaltamos que os interesses difusos são marcados por intensa conflituosidade interna, característica que os diferencia dos demais direitos metaindividuais.

Enquanto em uma ação que envolve interesses individuais ou mesmo coletivos strictu sensu temos uma situação jurídica definida, nas ações envolvendo interesses difusos tal fato não ocorre, por causa de sua indeterminação subjetiva e da efemeridade das situações que envolvem os titulares desses interesses (são fatos que tendem a mudanças no tempo e no espaço).

Assim, como afirma José Luis Bolzan de Morais, não se permite limitar a abrangência dos interesses difusos, oportunizando o alargamento ad infinitum, principalmente no tocante aos sujeitos envolvidos, mas também no que diz respeito à extensão dos objetos atingidos.

Analisada, portanto, a evolução histórica dos interesses metaindividuais e a subdivisão desses interesses trazida pelo Código de Defesa do Consumidor a seguir veremos como se processa a defesa coletiva dos direitos aqui estudados.


II - DEFESA DOS INTERESSES METAINDIVIDUAIS EM JUÍZO

A necessidade de modelos diferentes para a proteção jurisdicional dos direitos metaindividuais surgiu porque o instrumental individualista, de que é exemplo o código de processo civil, não oferece condições para a solução dessa nova realidade, sendo necessárias algumas medidas peculiares a essa espécie de direito para que a tutela dos mesmos surta efeitos, as quais se traduzem nas ações coletivas.

2.1. As ações coletivas

Não obstante a expressão "ações coletivas" não seja tecnicamente correta para designar o mandado de segurança coletivo, a ação civil pública e a ação popular, em nosso trabalho, deixamos de lado as divergências doutrinárias e utilizamos a referida nomenclatura para designar as ações que, em razão de seu objeto, destinam-se a defender os interesses coletivos lato sensu e os interesses individuais homogêneos, estudados precedentemente.

Neste tópico, cotejamos três ações coletivas: o mandado de segurança coletivo, a ação civil pública e a ação popular.

2.1.1 Mandado de segurança coletivo

O mandado de segurança coletivo foi criado pela Constituição Federal de 1988, como uma forma de facilitar a defesa de interesses líquidos e certos pertencentes a determinada coletividade.

Na renomada conceituação de Hely Lopes Meirelles:

Mandado de segurança é o meio constitucional posto à disposição de toda a pessoa física ou jurídica, órgão com capacidade processual, ou universalidade reconhecida por lei, para a proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça [...]

Como tal ação ainda não foi regulamentada por lei específica - a única previsão legal existente sobre o mandado de segurança coletivo está no art. 5º, inciso LXX da Constituição Federal - inúmeras são as divergências em relação ao writ, seja negando o mesmo como instituto novo, seja questionando a legitimidade ativa para sua propositura.

Os autores que negam a novidade do mandado de segurança coletivo defendem a tese de que a intenção do constituinte de 1988, ao criar tal ação, foi possibilitar o agrupamento de determinados indivíduos e dar a esse grupo, capacidade processual. Segundo tais juristas, o referido mandamus nem mesmo ampliou o universo de pessoas sujeitas a tal garantia.

Discordamos, entretanto, desses doutrinadores, por entender que o mandado de segurança coletivo difere do mandado de segurança individual no que se refere à legitimidade ativa, ao objeto e às eficácias da coisa julgada.

Não faria sentido ter sido criada ação com o único intuito de evitar os inconvenientes causados pela enormidade de pessoas que ajuizavam o mandamus em litisconsórcio ativo. Por óbvio, não foi somente essa a intenção do legislador, principalmente porque delimitou quais seriam as partes legítimas para figurar no pólo ativo, situação que restringe as possibilidades de sua impetração.

Assim, só podem impetrar mandado de segurança coletivo os partidos políticos com representação no Congresso Nacional, as organizações sindicais, as entidades de classe ou associações legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.

Os entes mencionados possuem legitimação extraordinária para a causa, sendo substitutos processuais.

Vale destacarmos a posição de Uadi Lamêgo Bulos:

No inc. LXX a legitimidade, para impetrar a segurança coletiva é direta, sem qualquer intermediação, e, por isso, nem os partidos políticos, nem as associações, nem as entidades e sindicatos, para defenderem os direitos de seus filiados, necessitam de qualquer autorização por parte deles, pois agem em nome próprio. Atuam como substitutos processuais, e devem ater-se à finalidade para que foram criados, agindo "em defesa dos interesses de seus membros ou associados" [parte final da alínea b, inc. LXX].

Como vemos, no final da citação acima, Uadi Lamêgo Bulos afirma que os partidos políticos, associações, entidades e sindicatos devem ater-se à finalidade para que foram criados, agindo em defesa dos interesses de seus membros ou associados.

Com efeito, aderimos ao posicionamento deste autor em relação às associações, entidades e sindicatos e entendemos que tais órgãos, ao impetrarem mandado de segurança coletivo, devem fazê-lo na defesa de direito líquido e certo de seus membros. Trata-se, portanto, de direito coletivo em sentido estrito, pois que as associações, entidades e sindicatos atuam na defesa de uma coletividade determinada ou, pelo menos, determinável.

Contudo, não comungamos do posicionamento de Uadi Lamêgo Bulos quanto aos partidos políticos, pois acreditamos que os mesmos não estão legitimados apenas para defender interesses de seus filiados.

A noção de partidos políticos é trazida de forma exemplar por José Afonso da Silva: O partido político é uma forma de agremiação de um grupo social que se propõe organizar, coordenar e instrumentar a vontade popular com o fim de assumir o poder para realizar seu programa de governo.

De acordo com o conceito apresentado pelo autor, os partidos políticos propõem-se a organizar, coordenar e instrumentar a vontade popular. Destinam-se, desse modo, ao povo, não sendo correto impedir que tais agremiações impetrem o mandamus na defesa da coletividade.

Alexandre de Moraes, sobre a legitimidade dos partidos políticos, afirma, com propriedade, que se todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição (CF, art. 1º, parágrafo único), sendo indispensável para o exercício da capacidade eleitoral passiva (elegibilidade), o alistamento eleitoral (CF, art. 14, § 3º, III), a razão de existência dos partidos políticos é a própria subsistência do Estado Democrático de Direito e da preservação dos direitos e garantias fundamentais. Logo, o raciocínio, o legislador pretende fortalecê-los concedendo-lhes legitimação para o mandado de segurança coletivo, para a defesa da própria sociedade contra atos ilegais ou abusivos por parte da autoridade pública.

Temos, portanto, que o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partidos políticos para a defesa dos cidadãos em geral, e não apenas de seus filiados.

2.1.2 Ação civil pública

Não obstante a ação popular tenha sido o primeiro instrumento na legislação brasileira destinado a tutelar os direitos difusos, a ação civil pública, introduzida em nosso sistema legislativo pela Lei 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública), surgiu em razão da necessidade de um mecanismo mais eficiente à defesa de tais interesses.

Discorrendo sobre a ação civil pública, Hely Lopes Meirelles a conceitua como:

[...] o instrumento processual adequado para reprimir ou impedir danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e por infrações da ordem econômica (art. 1º), protegendo, assim, os interesses difusos da sociedade.

Para este autor, portanto, a ação civil pública destina-se a reger os interesses difusos da sociedade. Ocorre, porém, que o objeto da ação ora em estudo foi ampliado pela Constituição de 1988 - segundo a redação do artigo 129, inciso III - e pelo Código de Defesa do Consumidor.

Esse último diploma legal, inclusive, acrescentou vários dispositivos à Lei 7.347/85, como o inciso IV do artigo 1º, o qual estabelece que a ação civil pública, além de tutelar o meio ambiente (inciso I), o consumidor (inciso II), os bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (inciso III), a ordem econômica (inciso V) e a ordem urbanística (inciso VI), destina-se à tutela de qualquer outro interesse difuso ou coletivo.

Assim, a partir dos dois diplomas acima referidos, a ação civil pública passou a tutelar não somente os interesses difusos, como também os interesses coletivos.

Quanto aos interesses individuais homogêneos, embora não tenham sido mencionados no artigo 1º da referida lei, a doutrina majoritária entende pelo cabimento da utilização das normas processuais da ação pública às ações destinadas a reger os direitos individuais homogêneos, previstas no Código de Defesa do Consumidor, até mesmo em razão do artigo 90 desse Código e do artigo 21 da Lei da Ação Civil Pública, dispositivos que demonstram a complementaridade existente entre as duas leis.

Em relação às partes legitimadas para a propositura da ação civil pública, dispõe o artigo 5º, caput, da Lei 7.347/85, que podem propor a referida ação o Ministério Público, a União, os Estados, Municípios, autarquias, empresas públicas, fundações, sociedades de economia mista e associações.

Para essas últimas há, entretanto, duas exigências: devem estar constituídas há pelo menos um ano e precisam incluir, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

Todos aqueles arrolados no artigo 5º da LACP, a nosso ver, têm legitimação extraordinária para a causa, atuando na ação civil pública como substitutos processuais, assim como ocorre no mandado de segurança coletivo.

Mesmo que os legitimados para a ação defendam também seus interesses próprios, ainda assim tal situação não desnatura sua condição de substitutos processuais, como bem explica Hugro Nigro Mazzilli:

Na ação civil pública ou coletiva, embora em nome próprio, os legitimados ativos, ainda que ajam de forma autônoma e, às vezes, também defendam interesses próprios, na verdade estão a defender em juízo mais que meros interesses próprios: zelam também por interesses transindividuais, de todo o grupo, classe ou categoria de pessoas, os quais não estariam legitimados a defender a não ser por expressa autorização legal. Daí porque esse fenômeno configura preponderantemente a legitimação extraordinária, ainda que, em parte, alguns legitimados ativos possam, na ação civil pública ou coletiva, também estar a defender interesse próprio.

Por se tratar, desse modo, de legitimação extraordinária, os entes legitimados para a propositura da ação civil pública não têm disponibilidade sobre o direito material do substituído, e sim apenas sobre o conteúdo processual da lide, fato que fica ainda mais evidente em se tratando de interesses transindividuais, em razão de serem direitos indisponíveis.

Mas, mesmo diante dos fatos mencionados, alguns doutrinadores têm entendido pela possibilidade de transação na ação civil pública, ou seja, defendem o cabimento de os legitimados para a propositura dessa ação, mediante concessões recíprocas, darem fim ao litígio.

A nós, entretanto, tais afirmações carecem de fundamento, pois estaríamos desvirtuando as características próprias da legitimação extraordinária, bem como a própria natureza dos interesses metaindividuais.

Parece-nos que a melhor solução é trazida pelo Professor Teori Albino Zavascki, que nega a possibilidade de transação, visto que esta implicaria concessões mútuas, mas afirma que o Ministério Público pode ajustar com o réu a melhor forma de dar cumprimento à prestação exigida.

Ainda sobre a legitimação para a propositura da ação civil pública, convém ressaltar que se um legitimado tiver proposto a ação, outro não mais o poderá fazer, restando-lhe a possibilidade de ingressar na demanda como litisconsorte facultativo.

Há porém, grande discussão travada na doutrina, quanto à admissibilidade de litisconsórcio ativo entre os Ministérios Públicos, pois a situação era permitida pelo § 2º do artigo 182 do Código de Defesa do Consumidor até o mesmo ser vetado pelo Presidente da República.

Hugo Nigro Mazzilli, explicando as razões do veto presidencial, afirma:

Segundo o chefe do Executivo: a) o dispositivo do litisconsórcio de Ministérios Públicos feriria o art. 128, § 5º, da Constituição, que reserva à lei complementar a disciplina da organização, atribuições e estatuto de cada Ministério Público; b) somente poderia haver litisconsórcio se a todos e a cada um dos Ministérios Públicos tocasse qualidade que lhe autorizasse a condução autônoma do processo, o que o art. 128 da Constituição não admitia.

O autor, todavia, se diz contrário ao veto, argumentando sua ineficácia, tendo em vista a sanção do art. 113 do Código de Defesa do Consumidor, que repetiu a mesma norma do dispositivo vetado.

Ainda, segundo o doutrinador, se o fato de órgãos autônomos de Estados diversos se litisconsorciarem constituísse violação ao princípio federativo, então, por identidade de razões e, por absurdo, também seria impossível o litisconsórcio entre os próprios Estados ou entre estes e a União.

De acordo com Mazzilli, há interesses estatais que podem ser compartilhados, como ocorre na área tributária, patrimonial ou ambiental, ou na defesa de interesses coletivos de consumidores ou vítimas de infrações contra a ordem econômica. Assim, exemplifica o autor, questionando que, se para a defesa de consumidores ou do meio ambiente, o Estado de São Paulo pode litisconsorciar-se com o de Minas Gerais, por que não o poderiam seus Ministérios Públicos?

Nos apoiamos na doutrina de Hugo Nigro Mazzilli, o qual, na citação acima, afirma que o veto presidencial perdeu seu efeito em razão do art. 113 do Código de Defesa do Consumidor que acrescentou o referido parágrafo à Lei da Ação Civil Pública. Assim, entendemos perfeitamente cabível o litisconsórcio ativo entre Ministérios Públicos.

2.1.3 Ação popular

Ao iniciar o estudo da ação popular, devemos nos remeter ao conceito trazido pelo administrativista Hely Lopes Meirelles, que leciona:

Ação popular é o meio constitucional posto à disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos ou a estes equiparados – ilegais e lesivos do patrimônio federal, estadual e municipal, ou de suas autarquias, entidades paraestatais e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiros públicos.

A ação popular foi a primeira demanda existente no ordenamento jurídico brasileiro responsável pela defesa de interesses difusos, tendo percorrido várias Constituições, ao contrário das demais ações coletivas analisadas nesse trabalho.

Mas, não obstante sua existência tenha marcado praticamente todas as Constituições da história do país, seu conteúdo sofreu grande ampliação a partir da Carta Magna de 1988, passando a incluir atos lesivos à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.

J. M. Othon Sidou, ao referir-se à ampliação do objeto da ação popular trazida pela Constituição de 1988, sustenta que a nova Carta trouxe também à órbita da vigilância popular o ato lesivo à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.

Mas, adverte o jurista, não é apenas a isto que, imemorialmente, se destina a ação popular. Ela, acima de tudo, busca defender a coletividade, e então, o conceito largo de patrimônio não resulta tão ancho. Há interesses coletivos a defender que não integram no conceito patrimonial público, histórico e cultural, nem na preservação do meio ambiente, nem a moralidade administrativa. O maltraçado de uma via de trânsito; a utilização de um logradouro; uma medida tomada em detrimento da saúde e da economia do consumidor ou usuário difusamente considerado; a não preservação de serviços essenciais ao povo – podem não constituir lesão ao patrimônio público com a restrição que denota o texto constitucional, nem ser fruto de imoralidade administrativa, mas constituem interesses difusos, não individuais uti singuli e que, por não serem individuais, por não oferecerem a legitimação processual clássica, merecem a tutela por meio de uma garantia constitucional ativa, isto é, de acionamento por qualquer do povo.

Como percebemos, portanto, a ação popular é uma garantia constitucional posta à disposição do cidadão, para fiscalizar o desempenho do serviço público, independentemente de o mesmo causar lesividade ao patrimônio histórico, cultural, ou ao meio ambiente. Desde que o ato praticado pelo Poder Público cause danos à coletividade, o meio adequado para o cidadão ingressar em juízo é a ação popular, a qual tem natureza eminentemente desconstitutiva, porquanto visa à invalidação dos atos lesivos ao Poder Público.

A Constituição confere a qualquer cidadão - entendido como tal aquele que está em gozo de seus direitos políticos - a legitimidade para a propositura da ação popular.

Nesse sentido, Rodolfo de Camargo Mancuso assevera que somente a condição de brasileiro não basta para conferir legitimidade ativa na ação popular, porque os textos exigem ainda o implemento da condição de eleitor, a saber: a prova de estar o brasileiro no gozo dos direitos políticos - direito de voto, que a Constituição Federal atribui, obrigatoriamente, para os maiores de 18 anos e, facultativamente, para os analfabetos, os maiores de setenta anos, os maiores e menores de 18 anos - vedado tal direito aos estrangeiros.

Há alguns autores que afirmam não ser necessária a condição de eleitor imposta ao cidadão, afirmando que o sentido da palavra "cidadão", empregada na Constituição, diz respeito a qualquer do povo.

Tal discussão, contudo, não será travada em nosso trabalho, por entendermos ser a mesma de menor importância em relação ao tema ora em estudo. Vale somente ressaltar que a posição majoritária da doutrina inclina-se pela imposição da condição de eleitor àquele que ajuizar a ação popular.

Questão que não podemos nos eximir de abordar, entretanto, diz respeito à espécie de legitimidade conferida ao cidadão, se ordinária ou extraordinária.

Quando nos referimos à legitimidade para o ajuizamento da ação civil pública, frisamos ser a mesma extraordinária, porque os entes legitimados para a mesma não têm disponibilidade sobre o conteúdo material da lide. Embora defendam interesses próprios, também defendem interesses coletivos, pertencentes a um grupo, razão pela qual atuam como substitutos processuais.

Pelas mesmas razões, entendemos que na ação popular, o cidadão atua com legitimação extraordinária, sendo substituto processual, embora tal posição não seja unânime na doutrina.

Quando um cidadão ajuíza a ação popular, não está defendendo apenas um direito seu que, reflexamente, atingirá terceiros. Na verdade, o patrimônio público é comum a todos, pertence ao povo em geral. Portanto, mesmo que apenas uma pessoa do povo queira ingressar com a ação, ela agirá em nome de todos os demais populares.

Nesse sentido, destacamos a posição de Orlando Ribeiro:

[...] o autor popular está representando a sociedade civil da qual também faz parte, portanto, não se apresentando como único titular exclusivo daquele interesse em questão, tendo em vista que inúmeras outras pessoas, cidadãos eleitores, poderia, ter ingressado com a ação. Assim, os limites subjetivos desta nova situação, não poderiam ter seguimento nos moldes estabelecidos pelo Código de Processo Civil para os conflitos intersubjetivos, devendo sofrer as adequações suficientes.

Desse modo, na concepção do autor acima mencionado, quando o cidadão ajuíza a ação popular, não está se apresentando como único titular dos interesses em questão, atuando, portanto, como substituto processual e agindo com legitimação extraordinária para a causa.

Além do requisito subjetivo que acabamos de analisar, ainda se impõem como condições para o ajuizamento da ação popular a ilegalidade do ato a invalidar e a sua lesividade ao patrimônio público.

A legalidade é um dos princípios constitucionais que norteiam a Administração Pública. De acordo com tal princípio, o Poder Público somente pode fazer aquilo que a lei lhe permite, ao contrário do particular, que pode fazer tudo o que a lei não lhe proíbe.

O segundo requisito para a propositura da ação popular é a lesividade ao patrimônio público, o que, na visão de Hely Lopes Meirelles, seguindo a redação do art. 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal, abrange tanto a lesão ao patrimônio material quanto ao moral, ao estético, ao espiritual e ao histórico.

Parece-nos, contudo, mais adequada a expressão "lesão à coletividade", visto que, seguindo as idéias de J. M. Othon Sidou, expostas anteriormente, qualquer lesão sofrida pela sociedade pode ser objeto de ação popular, desde que, é claro, esteja conjugada com o primeiro requisito para o ajuizamento da demanda em estudo, qual seja, a ilegalidade do ato praticado pela Administração Pública.

Devemos ressaltar, ainda dentro do tema da lesividade, a inclusão do cabimento da ação popular ao atos lesivos à moralidade administrativa.

A moralidade dos atos do Poder Público, depois do advento da Lei Maior, ganhou papel de grande importância para a Administração, visto que foi elevada à categoria de princípio constitucional norteador da Administração Pública, ao lado da legalidade, publicidade, eficiência e impessoalidade.

Neste sentido, Renato Rocha Braga pronuncia-se, afirmando que, pela moralidade, não basta que o administrador paute-se apenas pela estrita legalidade do ato, antes devendo obrar com ética, razoabilidade e justiça.

Vale lembrar, no entanto, os ensinamentos de Hely Lopes Meirelles, no sentido de que, como a noção de imoralidade é muito vaga e imprecisa, é necessário que o ato imoral da Administração esteja atrelado ao direito positivo para que seja cabível a intervenção do Poder Judiciário, através da ação popular.

Tal ação é ainda hoje importante instrumento destinado a frear e reprimir o abuso praticado pelo Poder Público contra os direitos da coletividade.

Com já mencionado, tanto a ação popular, como o mandado de segurança coletivo e a ação civil pública, são meios de tutela que visam a proteger os interesses de uma coletividade, seja ela determinada ou não. Contudo, além dessas ações coletivas, atualmente o ordenamento jurídico pátrio conta com outras espécies de demandas, que também objetivam a proteção de um grande grupo de pessoas, os consumidores.

2.2. O Código de Defesa do Consumidor e a tutela coletiva

Até 1990, tínhamos um sistema de defesa de interesses coletivos representado pela ação popular e pela ação civil pública. A despeito das referidas leis, em 1988 foi promulgada em nossa pátria uma Constituição Federal símbolo do Estado Democrático de Direito, preocupada com interesses metaindividuais e prevendo a necessidade de amparo aos interesses dos consumidores.

Assim, no moderno ordenamento jurídico brasileiro urgiu a necessidade de criação de um instrumento responsável pela tutela das relações de consumo, o que foi consolidado em 11 de setembro de 1990, com a publicação do Código Brasileiro de Defesa dos Consumidores.

Tal código, foi de fundamental importância para a defesa de direitos transindividuais, inclusive porque trouxe vários conceitos que passaram a ser utilizados nas demais ações coletivas, como as noções de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, previstas no artigo 81.

A Lei 8.078/90 traduz-se em um microssistema jurídico, por conter normas de direito penal, civil, administrativo e processual civil. Contudo, em nosso trabalho vale apenas citar algumas das inovações processuais trazidas por este diploma legal, já que, segundo nosso entendimento, a grande modificação trazida pelo CDC está no tratamento dispensado à coisa julgada, tema principal deste estudo e que será analisada no quarto tópico.

Assim, verificamos que o Código de Defesa do Consumidor destaca-se na área processual por definir regras de competência para as ações de consumo, o que está disposto no artigo 93 deste diploma legal, por trazer regramento diferenciado ao ônus da prova, e por tratar da legitimação para essas ações, a qual, segundo o CDC, é concorrente, ou seja, todos os entes elencados no artigo poderão acionar a jurisdição a título coletivo, em prol da defesa dos interesses dos consumidores, a título coletivo.

Além de ser concorrente, a legitimação para as ações de consumo é bem ampla, não obstante exista a restrição de não se admitir que o consumidor ajuíze a demanda individualmente, sem que almeje a tutela dos demais consumidores, a título coletivo.

Adiante, passamos à análise do fenômeno da coisa julgada no processo civil de cunho individualista.


III – O FENÔMENO DA COISA JULGADA

Ao estudarmos as ações destinadas à defesa de interesses transindividuais, ressaltamos que tais interesses requerem uma concepção de processo diferente do tradicionalmente previsto no Código de Processo Civil Pátrio – individualista –, em razão de algumas peculiaridades que apresentam.

Dentre os institutos processuais previstos no ordenamento processual brasileiro que recebem tratamento diferenciado frente à disciplina normativa das ações coletivas está o fenômeno da coisa julgada, que possui limites subjetivos diversos dos previstos nas demandas individuais.

Antes, contudo, de verificarmos como se operam os limites acima referidos, é mister entender como se processa a coisa julgada no processo civil tradicional.

3.1 Coisa julgada: conceito e limites objetivos

A coisa julgada, por ser matéria extremamente abstrata, traduz-se em tema de grande complexidade aos estudiosos do processo civil, razão pela qual há grande diversidade de trabalhos doutrinários sobre o tema e muitos posicionamentos conflitantes, o que demonstramos ao longo deste capítulo.

Neste tópico, estudamos conjuntamente o conceito e limites objetivos da coisa julgada porque verificamos que tais assuntos estão intimamente conectados. Ao conceituarmos a coisa julgada, obrigatoriamente nos deparamos com seus limites objetivos.

A noção de coisa julgada é trazida pelo artigo 467 do Código de Processo Civil, mas tal definição é extremamente criticada pela maioria dos doutrinadores, por não tratar a coisa julgada como uma qualidade da sentença, posição defendida por Enrico Tullio Liebman. Na verdade, o artigo 467 do referido diploma legal estaria conceituando coisa julgada formal e não material, temas que serão vistos adiante.

Para Liebman, a coisa julgada não é um efeito da sentença, mas uma qualidade da mesma, que a torna imutável. Segundo esse autor a autoridade da coisa julgada não é efeito da sentença, como postula a doutrina unânime, mas, sim, modo de manifestar-se e produzir-se dos efeitos da própria sentença, algo que a esses efeitos se ajunta para qualificá-los e reforçá-los em sentido bem determinado.

Cumpre destacar que efeito e eficácia não se confundem, significando conceitos distintos. Paulo Valério Dal Pai Moraes, brilhantemente traz a distinção:

Eficácias são potencialidades, virtualidades inclusas no conteúdo das sentenças, as quais são "materializadas, concretizadas", atualizadas sob a forma de efeitos. Efeitos, portanto, corresponderiam à expressão dinâmica das eficácias ou à sua exteriorização em relação ao formalismo sentencial, representando, precipuamente, a execução, por intermédio da atividade jurisdicional, da ação de direito material a que foram impedidos os "particulares".

Portanto, eficácia é a possibilidade de materializar o conteúdo da sentença, e efeito é a exteriorização dessa materialização.

Ovídio Araújo Baptista da Silva sustenta que as eficácias fazem parte do conteúdo da sentença, assim como se diz que este ou aquele medicamento possui tais ou quais virtudes (ou eficácias curativas). Para o autor, não se pode confundir a virtude curativa com o efeito produzido pelo medicamento sobre o organismo enfermo.

Não obstante a definição de coisa julgada trazida por Liebman tenha influenciado uma série de doutrinadores, é preciso fazer constar algumas críticas à sua tese.

A obra do mestre italiano Liebman, "Eficácia e Autoridade da Sentença", causou certo furor no mundo jurídico, porque veio modificar conceitos condizentes com a coisa julgada, os quais estavam aparentemente consolidados.

Para o festejado mestre peninsular, não há distinção entre eficácia e efeito, sustentando o mesmo que a coisa julgada nada mais é que a indiscutibilidade ou imutabilidade da sentença e dos seus efeitos, aquele atributo que qualifica e potencializa a eficácia que a sentença naturalmente produz, segundo a sua própria essência de ato estatal.

Todavia, entendemos que os efeitos da sentença não se tornam imutáveis. Estes são passíveis de modificação, até porque o Estado não pode invadir o relacionamento extra-autos. Como impedir que, em uma ação condenatória, v.g., o autor deixe de optar pelo recebimento de outra prestação que não a que consta nos autos? Mesmo que a sentença tenha transitado em julgado, podem as partes acordar de modo diferente e alterar os efeitos da decisão. Que ingerência pode o Estado ter sobre a referida situação? Entendemos que nenhuma. Portanto, não podemos afirmar que na coisa julgada ocorre a imutabilidade dos efeitos.

Outro importante ponto a ser comentado refere-se à crítica feita por Ovídio Baptista da Silva às afirmações de Liebman, que diz que todas as cargas de eficácia da sentença são passíveis de produzir coisa julgada. Para Ovídio, seguidor do jurista alemão Hellwig, apenas a eficácia declaratória torna-se imutável.

Segundo Enrico Tullio Liebman, todos os efeitos possíveis da sentença (declaratório, constitutivo, executório) podem, de igual modo, imaginar-se, pelo menos em sentido puramente hipotético, produzidos independentemente da autoridade da coisa julgada, sem que por isso se lhe desnature a essência. A coisa julgada é qualquer coisa mais que se ajunta para aumentar-lhes a estabilidade, e isso vale igualmente para todos os efeitos possíveis das sentenças.

Ovídio Araújo Baptista da Silva, no entanto, discorda do jurista italiano e sustenta que a imutabilidade só atinge a eficácia declaratória da sentença, pensamento compartilhado com Pontes de Miranda.

De acordo com Ovídio:

[...] desaparecendo os efeitos constitutivos, ou executivos, ou condenatórios que são absolutamente mutáveis, e mesmo assim a imutabilidade correspondente à coisa julgada permanecendo inalterada, a conclusão que se impõe é a de que essa qualidade só se há de referir ao efeito declaratório, já que, como diz Barbosa Moreira, ‘a quem observe, com atenção, a realidade da vida jurídica, não pode deixar de impor-se esta verdade simples: se alguma coisa, em tudo isso, escapa ao selo da imutabilidade, são justamente os efeitos da sentença.

Já afirmamos que efeito e eficácia se distinguem, e que a coisa julgada é uma qualidade que se agrega à sentença, tornando-a imutável. Sustentamos também que eficácia é virtude, qualidade, de modo que uma sentença, assim como um medicamento (seguindo o exemplo de Ovídio), pode ter diversas eficácias. Para os processualistas, tais eficácias são declaratórias, constitutivas, condenatórias, mas, para Pontes de Miranda, elas são ainda mandamentais e executivas lato sensu.

Logo, o que precisamos compreender é se todas as eficácias tornam-se imutáveis, como defende Liebman, ou se apenas a eficácia declaratória, como prega Ovídio Araújo Baptista da Silva, seguidor do jurista Hellwig.

De fato, os efeitos são mutáveis e, portanto, os efeitos constitutivos, condenatórios ou executivos também são mutáveis. Todavia, porque não dizermos que o efeito declaratório pode ser modificado? Se é efeito, não está abrangido pela autoridade da coisa julgada, deixando de fazer parte do conteúdo da sentença e, então, é também passível de modificação.

Indiscutíveis são as eficácias da sentença, o seu próprio conteúdo e nesse caso, entendemos ser possível afirmar que a autoridade da coisa julgada atinge, além da carga declaratória, também as cargas constitutivas, condenatórias, executivas lato sensu e mandamental.

Outrossim, vale esclarecer que, quando mencionamos a mutabilidade dos efeitos e imutabilidade das eficácias, estamos nos referindo a direitos disponíveis, porque tal raciocínio não se adecua aos direitos indisponíveis, aqueles a que não se pode renunciar.

Brilhante é a colocação de Sérgio Gilberto Porto ao afirmar que não há como modificar certos efeitos produzidos pela sentença. Exemplifica o doutrinador que na demanda investigatória de paternidade julgada procedente, um dos vários efeitos produzidos é a expedição de mandado de retificação do assento de nascimento do investigante, para que nele se inclua o nome do pai. Segundo o jurista, não há como impedir a produção deste resultado no sistema brasileiro, sendo, portanto, imodificável o efeito, razão pela qual se tem por incorreta a afirmação genérica de que os efeitos são modificáveis – pois nem sempre serão.

Logo, efeitos são mutáveis quando os direitos forem disponíveis, e imutáveis, assim como as eficácias, quando nos depararmos com direitos indisponíveis, sendo, para nós, os limites objetivos da coisa julgada.

Após o estudo sobre conceito e limites objetivos da coisa julgada, passamos à análise dos limites subjetivos da coisa julgada.

3.2 Limites subjetivos da coisa julgada

O artigo 472 do Código de Processo Civil refere-se aos limites subjetivos da coisa julgada. Para compreender a significação do referido dispositivo, mister entender dois conceitos distintos, quem são as partes em um processo e quem são os terceiros.

Para Ovídio Baptista da Silva, podem ser designados como parte somente aqueles sujeitos que integram o litígio, considerados componentes do litígio, reservando-se para os demais figurantes da relação processual, que, embora não integrando a lide, participem também do processo, a denominação de terceiros.

Como bem explica o mestre gaúcho:

Muitos processualistas, como é o caso de CARNELUTTI (Sistema di diritto processuali civile, I/36 e segts.), empregam um conceito de parte em sentido formal, para indicar as posições dos sujeitos do processo, distinguindo-os das partes em sentido substancial, que seriam os sujeitos da lide. Esta concepção é errônea, uma vez que não pode haver, por definição, uma lide diversa daquela descrita pela parte em sua petição inicial. Como a lide será, necessariamente, o conflito narrado pelo autor em seu pedido de tutela jurídica, partes da lide, serão sempre as mesmas partes do processo. É necessário, todavia, estarmos atentos, porque o legislador brasileiro, freqüentemente, seja por convicção ou conveniência, refere-se aos terceiros que ingressam no processo, sem integrar a lide, como se eles fossem partes secundárias ou acessórias, ou simplesmente partes em sentido formal.

Saber quem são os terceiros, por outro lado, e até onde de fato estes não são beneficiados ou prejudicados pela autoridade da coisa julgada, é outra importante tarefa a que nos propomos.

Com efeito, sustenta Enrico Tullio Liebman que o processo não é um negócio combinado em família e produtor de efeitos somente para as pessoas iniciadas nos mistérios de cada feito. É o processo, ao contrário, atividade pública, exercida para garantir a observância da lei. Desse modo, todos estão, abstratamente, submetidos à eficácia da sentença, embora nem todos sofram os efeitos da mesma.

De acordo com o processualista italiano, sofrem os efeitos da sentença aqueles em cuja esfera jurídica entre mais ou menos diretamente seu objeto. Assim, em primeiro lugar estão as partes titulares da relação afirmada em juízo, e depois, gradativamente, todos os outros cujos direitos estejam de certo modo com ela em relação de conexão, dependência ou interferência jurídica ou prática. A natureza da sujeição é para todos, partes ou terceiros, a mesma. A medida dessa sujeição, porém, é que irá determinar-se pela relação de cada um com o objeto da decisão.

Conclui Liebman: "Entre as partes e terceiros só há esta grande diferença: que para as partes, quando a sentença passa em julgado, os seus efeitos se tornam imutáveis, ao passo que para os terceiros isso não acontece".

Abordando a situação dos terceiros frente à coisa julgada, Alexandre Freitas Câmara, apud Renato Rocha Braga, lembra que nem todos sofrem, com a mesma intensidade, os efeitos da sentença e afirma que os mesmos se posicionam em duas grandes categorias: terceiros juridicamente indiferentes, subdivididos em terceiros desinteressados e terceiros interessados de fato; e terceiros juridicamente interessados, que, por sua vez, também se subdividem em terceiros com interesse idêntico ao das partes e terceiros com interesse inferior ao das partes.

Para Renato Rocha Braga só os terceiros com interesse inferior ao das partes que aleguem injustiça da decisão e os terceiros com interesse idêntico ao das partes podem resistir à coisa julgada, não sendo, pois, atingidos pela indiscutibilidade da mesma.

Entretanto, concordamos com Liebman quando afirma que só as partes são alcançadas pela imutabilidade dos efeitos da coisa julgada.

De fato, embora discordemos da nomenclatura "efeitos", pois, como já asseveramos antes, o mais correto é falar em imutabilidade de "eficácia", entendemos que não só os terceiros das categorias mencionadas acima podem discutir a matéria atingida pela coisa julgada, sendo atingidos pela imutabilidade das eficácias da sentença somente as partes entre as quais foi proferida a decisão. A coisa julgada, portanto, tem eficácia inter partes, mas não erga omnes, como pretendemos investigar.

Com efeito, como sustenta Renato Rocha Braga há um repúdio em pensar que terceiros, ausentes da relação processual de onde emanou a decisão, terão de se conformar com ela, acatando-a, não sendo correto afirmar que a coisa julgada nas ações individuais opera-se erga omnes, entendida a expressão como a imutabilidade do conteúdo da sentença para terceiros que não participaram da relação processual.

Comprovando sua tese, o autor afirma que o instituto da oposição reflete historicamente essa aversão à coisa julgada erga omnes. Segundo Renato Rocha Braga, apud Alexandre Freitas Câmara, no antigo direito germânico permanecia entre povos o "juízo universal", em que a decisão acerca de um conflito de interesses atingia não só as partes, mas todos aqueles que tivessem notícia da referida decisão. Surgiu então a oposição, como forma de remediar a injustiça que se proclamava entre terceiros. Por meio do referido instituto, os terceiros, atingidos por uma decisão, poderiam ingressar na relação.

Na perspectiva de Athos Gusmão Carneiro:

Sabemos que a sentença a ser proferida na ação entre A e B somente fará coisa julgada entre as partes (CPC, art. 472); portanto, não prejudicará os eventuais direitos de terceiro. Este pode, em princípio, aguardar a prolação da sentença, e resguardar-se para agir mais tarde, em defesa de seus interesses. Todavia, de fato, [...] pode convir ao terceiro uma imediata afirmativa de suas pretensões sobre a coisa ou direito controvertidos entre autor e réu; e também pode ser-lhe conveniente, de jure, agir sem mais delongas, para interromper, por exemplo, o prazo de prescrição de seu alegado direito (CPC, art. 219, caput).

Portanto, ao terceiro que quiser opor pretensão própria em uma relação jurídica em que duas partes contendem, é resguardado o direito de ingressar com ação autônoma. Tal ação poderá ser proposta sozinha ou juntamente com outra, que é o caso da oposição. Não há que se negar, desse modo, a faculdade de terceiro pleitear em juízo direito que alega ter, mesmo que a relação jurídica entre as partes já tenha transitado em julgado.

Ressaltamos que o instituto da oposição serve tanto ao terceiro juridicamente interessado quanto ao terceiro juridicamente indiferente, visto que, de acordo com a classificação de Ovídio Baptista da Silva, estão compreendidos na categoria de terceiros juridicamente indiferentes os interessados de fato, os quais não podem ser tolhidos de exercer suas pretensões em juízo.

Nada impede, por exemplo, que um credor, percebendo que seu devedor é demandado em juízo por outro credor, queira reclamar algum direito que lhe pertence. Não seria justo que tal credor fosse atingido pela eficácia da sentença transitada em julgado porque considerado terceiro interessado de fato. Desse modo, entendemos que a indiscutibilidade da sentença trânsita em julgado, nas ações individuais, opera-se inter partes e não erga omnes.

Frisamos que são considerados terceiros todos aqueles que não figurarem como parte no processo. Sobre a matéria, vale lembrarmos que, na substituição processual, o substituído, embora formalmente considerado terceiro, figura de fato como parte no processo.

A substituição processual, já analisada anteriormente, é chamada de legitimação extraordinária e tem previsão legal no artigo 6º do Código de Processo Civil. A última parte do dispositivo, "salvo quando autorizado por lei", refere-se aos casos de legitimação extraordinária, em que alguém substitui a parte no processo, passando a ocupar seu lugar.

Para José Frederico Marques, dá-se a substituição processual quando alguém está legitimado a agir em juízo, em nome próprio, como autor ou réu, para a defesa do direito de outrem.

Ao abordar o tema ora em análise, José Maria Tesheiner, sustenta que, de acordo com Ada Pellegrini Grinover, a sucessão do terceiro à parte, na relação jurídica já deduzida em juízo, e a substituição processual – não representam extensão da coisa julgada ultrapartes, porquanto nem o sucessor nem o substituído são propriamente terceiros. O primeiro porque, sucedendo à parte, torna-se titular da relação jurídica; o segundo porque, por definição, a atividade processual desenvolvida pelo substituto processual tem necessariamente influência e eficácia sobre o substituído.

Portanto, em casos de legitimação extraordinária, o substituto, que figurou na relação como parte, defendendo em nome próprio direito alheio, é atingido pela coisa julgada, assim como o substituído.

Athos Gusmão Carneiro, posicionando-se sobre o tema, afirma que a sentença, proferida na demanda, faz coisa julgada também perante o substituído, pois, como elucida mestre Chiovenda, seria absurdo que a lei conferisse a alguém autorização para defender em juízo direitos alheios e, ao mesmo tempo, não conferisse a tal atividade uma plena eficácia relativamente aos direitos assim deduzidos.

Sinteticamente, portanto, como a coisa julgada opera-se inter partes e não erga omnes, somente os sujeitos que integrarem o processo, como elementos componentes do litígio, serão atingidos pela coisa julgada.

Após percorrermos o fenômeno da coisa julgada, passamos para a última parte desse trabalho, onde abordaremos como se operam os limites subjetivos da coisa julgada frente às demandas coletivas, que se destinam à defesa de interesses metaindividuais.


IV – OS LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA NAS DEMANDAS COLETIVAS

A coisa julgada anteriormente adquire contornos bem diferenciados quando se está diante de ações coletivas, pois tais demandas, como já analisamos, possuem características peculiares que as afastam do modelo tradicional implementado pela lei processual civil pátria. Há autores, inclusive, defendendo o surgimento, em nosso ordenamento jurídico, de uma teoria geral do processo coletivo.

Nesse contexto, percebemos que um dos pontos mais debatidos na doutrina moderna refere-se ao confronto entre os limites subjetivos da coisa julgada e os direitos metaindividuais, pois, para que as demandas coletivas efetivamente atinjam os objetivos a que se propõem, isto é, defender direitos que escapam à esfera individual - molecularmente e não de modo atomizado -, é mister que os limites subjetivos da coisa julgada também recebam tratamento diferenciado.

Desse modo, impõe-se verificar qual a extensão dos limites subjetivos da coisa julgada nas ações coletivas lato sensu, bem como o modo como se operam as eficácias da sentença trânsita em julgado nessas demandas.

4.1 A coisa julgada e os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos

O Código de Defesa do Consumidor, além de conceituar interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, também trouxe dispositivo legal referente à coisa julgada nas demandas de consumo, disciplinando assim a forma como a autoridade da coisa julgada processa-se em relação aos direitos transindividuais. Justamente por ultrapassarem a esfera do interesse individual, não se pode afirmar que teremos coisa julgada inter partes em ações coletivas.

Destarte, segundo o art. 103 do CDC, na hipótese de interesses difusos, pela própria natureza de tais direitos, a sentença fará coisa julgada erga omnes, o que também ocorrerá quanto aos interesses individuais homogêneos, mas apenas em caso de procedência da ação, a fim de beneficiar todas as vítimas e seus sucessores. Por fim, quando a ação coletiva versar sobre direito coletivo, a autoridade da coisa julgada processar-se-á ultrapartes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe.

Vale ressaltarmos, todavia, que o artigo 103 do CDC, não obstante tenha sido taxativo quanto às eficácias da coisa julgada nas ações coletivas, gerou dúvidas em várias questões, as quais vêm sendo debatidas no mundo jurídico contemporâneo. Por tal razão, nesse trabalho apresentamos as principais conclusões derivadas da interpretação do dispositivo supra referido, acerca da coisa julgada na tutela coletiva.

Em primeiro lugar, os incisos I e II do art. 103, que se referem a direitos difusos e coletivos, trazem uma exceção à existência da coisa julgada, que é a improcedência da ação por falta de provas. Isso significa que, neste caso, será possível aos autores intentar nova ação, assim que surgirem novas provas sobre o direito pleiteado na demanda.

A grande problemática que surge nessa situação é delimitarmos o que efetivamente consiste em nova prova, questão que é brilhantemente dirimida por Renato Rocha Braga:

[...] a prova nova referida nos incisos I e II do artigo 103, como de óbvio, não se confunde com ‘documento novo’ mencionado no inciso VII do artigo 485 (aqui possui uma acepção muito mais reduzida), já que podem se referir a outros elementos que não sejam necessariamente ‘documento’, como novas testemunhas ou perícia. ‘Prova nova’ é todo elemento probatório que não pôde ser produzido na instrução anterior, seja por impossibilidade física ou por falta de conhecimento pela parte de sua existência.

Assim, só podemos considerar prova nova aquela que não foi produzida na demanda anterior por manifesta impossibilidade. Nos demais casos, haverá coisa julgada, não podendo as partes negar a sua existência no sentido de intentar nova demanda após o trânsito em julgado na primeira ação.

A segunda questão que se impõe diz respeito aos vocábulos erga omnes e ultrapartes, pois há autores que os consideram como sinônimos, enquanto outros afirmam a sua distinção.

Antônio Gidi é um dos juristas que entende serem sinônimas as expressões. Segundo o autor, os dispositivos legais constantes nos três incisos do art. 103 poderiam ter sido redigidos de duas formas dogmaticamente indiferentes, no que diz com as expressões latinas empregadas, as quais acarretam, inelutavelmente, a mesma e única interpretação. Por outro lado, Antônio Gidi sustenta que é certo que erga omnes ("contra todos"), abstrata e isoladamente considerado, tem feição aparentemente mais ampla e peremptória que ultra partes ("além das partes"), havendo nítida impressão que a primeira atinge a todos, e a segunda atinge alguns.

Assim, para o jurista, o mais técnico seria a utilização indiscriminada, nos três incisos do art. 103, da expressão ultrapartes.

Já Arruda Alvim e outros ao diferenciarem os sentidos das expressões erga omnes e ultra partes, parecem-nos contrários ao posicionamento citado acima. Segundo os autores, o sentido de ultra partes é aquele em que a coisa julgada atinge o grupo, categoria ou classe e todos os seus membros nessa qualidade, não abrangendo, porém, toda a coletividade. Comparativamente, a erga omnes é mais extenso.

Entendemos, contudo, que quem melhor sintetiza a questão posta em debate é Renato Rocha Braga, ao mencionar:

A par da discussão, conclui-se sobre a inadequação de uma coisa julgada erga omnes ou ultra partes. Conforme visto, por ser a legitimação do autor coletivo extraordinária, a extensão da autoridade da res iudicata se dá do mesmo modo previsto pelo CPC, isto é, tanto o substituto quanto o substituído, apesar deste nunca ter ingressado na relação processual, ficarão submissos ao decisum, de forma imutável e indiscutível. [...] Destarte, apenas os indivíduos que tiveram sua esfera jurídica atingida pelo evento danoso, representados pelo autor coletivo, serão atingidos pela coisa julgada.

Desse modo, independentemente de estarmos diante de uma ação coletiva que defenda interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, é importante saber que todos aqueles que foram atingidos pelo evento danoso estarão sob a autoridade da coisa julgada.

Por tal razão, adotamos, nesse trabalho, a expressão utilizada por Márcio Flávio Mafra Leal, apud Renato Rocha Braga,que diz ser a coisa julgada extra partes, expressão que engloba ambos os conceitos erga omnes e ultra partes, na medida que significa a extensão de sua autoridade para pessoas que não fizeram parte da relação processual.

Travado o debate em torno do significado dos adágios latinos trazidos pelo art. 103 do Código de Defesa do Consumidor, não nos podemos esquivar de mencionar o parágrafo 1º do referido dispositivo, o qual prevê a possibilidade de serem intentadas ações individuais na defesa do mesmo interesse difuso ou coletivo, postulado na ação coletiva.

Conforme o referido parágrafo 1º, a autoridade da coisa julgada, a qual, como vimos, opera-se extra partes nas ações coletivas, em nada obsta a possibilidade de um cidadão, insatisfeito com o resultado da demanda, intentar nova ação, individualmente. Mas, gizamos que por óbvio, tal só irá ocorrer em caso de improcedência da ação ou mesmo de parcial procedência, porquanto, se o pleito for integralmente acolhido, a eficácia do decisum se estenderá a todos os substituídos, não havendo necessidade de se intentar nova demanda.

Assim, em uma ação em defesa de interesses difusos ou coletivos, podem surgir três casos distintos em relação à coisa julgada. Em primeiro lugar, se a demanda for acolhida integralmente, a sentença prevalecerá a todos os substituídos. Em segundo lugar, se o pedido for rejeitado no mérito, não poderá ser intentada nova ação coletiva, mas são admitidas ações individuais. E, finalmente, em terceiro lugar, se a sentença for julgada improcedente por falta de provas, não haverá coisa julgada, podendo nova ação ser ajuizada a qualquer tempo, desde que surjam novas provas.

Ainda em relação ao parágrafo 1º do art. 103, devemos frisar que a referida regra somente se estende aos direitos difusos e coletivos, já que os direitos individuais homogêneos possuem dispositivo específico - parágrafo 2º do art. 103 - o qual disciplina de modo distinto a matéria.

Segundo o referido parágrafo, só poderão propor ação de indenização a título individual aqueles que não intervieram no processo como litisconsortes e apenas em caso de improcedência da ação.

A fim de entendermos corretamente o dispositivo acima mencionado, contudo, é mister conjugá-lo como o inciso III do artigo em comento. Segundo a regra inserta nesse inciso, nas ações destinadas à defesa de interesses individuais homogêneos somente haverá coisa julgada em caso de procedência da ação.

Desse modo, se o parágrafo 2º sustenta que em caso de improcedência da ação, apenas quem não autuou como litisconsorte poderá propor ação individual, como ficam aqueles que encabeçaram o pólo ativo da demanda coletiva e tiveram seu pleito rejeitado? Quem soluciona a problemática é Antônio Gidi:

O inciso III do CDC prevê que a sentença fará coisa julgada somente no caso de procedência do pedido. Surge, então, a perplexidade de se saber o que aconteceria no caso de improcedência. Não haveria formação de coisa julgada material nesse caso? A coisa julgada seria apenas inter partes? Resolve-se o problema com uma interpretação conjugada com o § 2º do mesmo artigo. Se esse dispositivo ressalva aos ‘aos interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes’, a possibilidade de propor a sua ação individual é porque, contrario sensu, aqueles interessados que intervieram, aceitando a convocação do edital a que se refere o art. 94, são atingidos pela coisa julgada inter partes.

Portanto, quem ingressou na ação coletiva, como litisconsorte, em caso de improcedência da ação, é atingido pela autoridade da coisa julgada inter partes.

Vale transcrevermos ainda o posicionamento de Renato Rocha Braga sobre o tema:

A extensão subjetiva para os interessados que se habilitaram como litisconsortes é clara, porque os mesmos serão tratados como partes e não como terceiros subordinados. Esta diferença ocorre porque nas demandas em defesa de interesses difusos e coletivos não é permitido ao substituído o ingresso na relação processual, já que a regra contida no artigo 94 do CDC, que permite esse ingresso, somente se aplica aos direitos individuais homogêneos. Esta é a outra diferença de muita importância entre o regime dos direitos individuais homogêneos e os difusos/coletivos, na medida em que, nestes, não é permitido o ingresso do lesado na relação processual.

Logo, é o artigo 94 do CDC, que permite o tratamento diferenciado às ações em defesa de direitos individuais homogêneos, na medida em que determina que os interessados intervenham como litisconsortes ativos nessas ações, tornando-se partes.

Na perspectiva de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery litisconsórcio é a possibilidade que existe de mais de um litigante figurar no(s) pólo(s) da relação processual. O listiconsórcio classifica-se em inicial ou ulterior, quanto ao momento de sua formação; necessário ou facultativo; quanto à obrigatoriedade de sua formação; ativo, passivo ou misto quanto ao pólo ativo da relação processual; e unitário ou simples quanto ao destino dos litisconsortes no plano do direito material.

No caso do artigo 94 do CDC, trata-se de litisconsórcio unitário necessário, regido pelo artigo 47 do Código Processual Civil.

Segundo José Frederico Marques apud Adolfo Schönke, litisconsórcio unitário é aquele em que sobre a relação jurídica tenha a ser dada uma decisão uniforme para todos os litisconsortes.

Assim, todos aqueles que se habilitarem na ação coletiva para defesa de direito individual homogêneo, atuarão como listisconsortes, ou seja, partes, da relação. Logo, não haverá, na espécie, legitimação extraordinária para causa, explicando-se, assim, porque a sentença, nesse caso, faz coisa julgada inter partes e não erga omnes.

Analisados os parágrafos 1º e 2º do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor, devemos mencionar que a referida norma ainda traz mais duas regras (parágrafos 3º e 4º), de importante compreensão.

4.2 Questões processuais pertinentes

Os limites subjetivos da coisa julgada merecem estudo especial em relação às demandas coletivas não apenas por se diferenciarem quanto à extensão, mas também por trazerem algumas peculiaridades processuais, tais como a coisa julgada secundum eventum litis, a coisa julgada in utilibus e a litispendência.

4.2.1 Coisa julgada secundum eventum litis

Na seção anterior, foi estudada a autoridade da coisa julgada frente a ações destinadas à defesa de interesses metaindividuais e notamos que, em conformidade com os incisos I e II do artigo 103 do CDC, a sentença faz coisa julgada erga omnes ou ultra partes, exceto se for julgada improcedente por falta de provas.

Tal determinação demonstra, assim, importante característica da coisa julgada em demandas coletivas, que é o fato de seus limites subjetivos estenderem-se aos demais substituídos "secundum eventum litis".

Isso significa que as eficácias da sentença trânsita em julgado, em ações destinadas a defesa de interesses metaindividuais, somente atingirão aos demais interessados, dependendo do resultado da ação (se procedente ou improcedente) e de sua fundamentação (se improcedente por falta de provas, p. ex.).

Como explica Renato Rocha Braga, nas demandas coletivas, a extensão subjetiva da coisa julgada material somente se dá secundum eventum litis e não pro et contra. Conforme o resultado da sentença, mesmo que o mérito seja analisado, os limites subjetivos variarão de acordo com o deslinde do feito (improcedência) e sua fundamentação (insuficiência probatória).

Mas, não devemos confundir a extensão dos limites subjetivos da coisa julgada com a sua formação, pois essa não se dá de acordo com o evento da lide. Na verdade, como afirma-nos Antônio Gidi, a coisa julgada sempre se formará, independentemente de o resultado da demanda ser pela procedência ou improcedência.

O que há de novo, portanto, é a possibilidade de modificação do rol das pessoas atingidas pelo fenômeno da coisa julgada, sempre que se estiver diante de uma ação coletiva.

Nesse sentido, exemplifica Renato Rocha Braga, demonstrando a diferença existente entre os limites subjetivos da coisa julgada nas demandas coletivas e no sistema tradicional de cunho individualista trazido pelo Código de Processo Civil:

[...] a coisa julgada material de caráter coletivo continua a se formar pro et contra, contudo sua extensão aos substituídos somente se dá secundum eventum litis. Isso difere radicalmente do sistema tradicional – artigo 472 – em virtude de tanto a formação da coisa julgada, quanto sua extensão subjetiva ocorrerem independentemente do resultado do processo. Por exemplo: o Ministério Público ajuíza uma demanda em face de uma fábrica que pôs no mercado um produto de alta nocividade à saúde – caso seu pedido seja julgado procedente, a coisa julgada material se formará, além de haver sua extensão a todos os substituídos (os consumidores lesados); caso seu pedido seja julgado improcedente por insuficiência de provas, ainda assim a coisa julgada material se formará, contudo a extensão do dispositivo não se estenderá aos substituídos e demais co-substitutos processuais, operando-se apenas entre o autor coletivo (nesta hipótese, o Parquet) e o demandado. Com isso, os substituídos não serão prejudicados pelo resultado desfavorável, além de os demais co-legitimados poderem ajuizar demanda, com idênticos fundamento e pedido, valendo-se de prova nova. Conclusão: sendo a decisão favorável ou desfavorável, por insuficiência probatória ou outro motivo, sempre haverá formação da coisa julgada material entre o autor coletivo e o réu.

Não obstante a precisa explanação do autor acima, a coisa julgada secundum eventum litis não foi acolhida pela unanimidade de juristas, já que alguns deles sustentam sua inconstitucionalidade, argumentando que sua aplicação viola o princípio da isonomia, na medida em se favorece nitidamente ao autor coletivo.

Dentre os que defendem a contrariedade à Carta Magna do princípio ora em debate, José Rogério Cruz e Tucci e Rogério Lauria Tucci, apud Orlando Ribeiro:

[...] há inconstitucionalidade no tratamento porque, citando a doutrina de José Botelho de Mesquita, haverá afronta ao princípio da isonomia. Que nos Estados Unidos os interessados manifestam-se para não serem atingidos pela coisa julgada (chamado right to opt out) num prazo razoável, após serem notificados o que não ocorre no Brasil.

Contudo, em que pesem os fortes argumentos defendendo a inconstitucionalidade da coisa julgada secundum eventum litis, entendemos que mais coerentes com o espírito das ações que versam sobre direitos coletivos lato sensu são aquelas posições que afirmam que o princípio vai ao encontro da Lei Maior.

Destarte, na perspectiva de Renato Rocha Braga sobre o tema, não se pode argumentar que o sistema mencionado viole a isonomia, visto que não há direitos absolutos, antes devem ser confrontados, interpretando-se as normas constitucionais a fim de que não surjam antinomias. Por isso, o conflito aparente que há, v.g., entre os incisos IX e X do artigo 5º da CF, deve ser resolvido sopesando-se os interesses em jogo: há, efetivamente, liberdade de expressão, livre de censura, contudo essa liberdade não é plena, antes limitada pelo direito à honra e intimidade das pessoas.

Outrossim, devemos lembrar que o princípio da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, inserido no Código de Defesa do Consumidor, não existe por mero acaso.

Obviamente, consumidor e fornecedor não se encontram em igualdade de condições, daí porque devemos sempre almejar o equilíbrio nas relações, o que se faz tratando desigualmente aos desiguais.

A respeito da vulnerabilidade do consumidor, trazemos a esse trabalho as brilhantes colocações de José Geraldo Brito Filomeno, um dos autores do anteprojeto do CDC:

‘O consumidor é o elo mais fraco da economia; e nenhuma corrente pode ser mais forte do que seu elo mais fraco’. O autor dessa frase, ao contrário do que possa parecer, não é qualquer consumerista exacerbado. Ao contrário, é o ‘pai da produção em série’, ninguém menos que o célebre magnata da indústria automobilística Henry Ford [...]. Como já afirmava o célebre Ruy Barbosa, a democracia não é exatamente o regime político que se caracteriza pela plena igualdade de todos perante a lei, mas sim pelo tratamento desigual aos desiguais. No âmbito de tutela especial do consumidor, efetivamente, é ela sem dúvida a parte mais fraca, vulnerável, se se tiver em conta que os detentores dos meios de produção é que detêm todo o controle do mercado, ou seja, sobre o que produzir, como produzir e para quem produzir, sem falar-se na fixação das margens de lucro.

Assim, não podemos nos olvidar que a proteção ao consumidor existe porquanto esse é a parte mais fraca em uma relação de consumo. Ademais, atrela-se aos argumentos favoráveis à constitucionalidade da coisa julgada secundum eventum litis o princípio da economia processual, pois a possibilidade de se beneficiar a todos os interessados é um dos maiores objetivos das demandas coletivas.

A fim de concluir o debate acerca do tema, devemos ressaltar ainda a posição de Antônio Gidi, que sustenta que não poderia haver qualquer dúvida quanto ao fato de haver harmonia entre o regime jurídico da coisa julgada nas ações coletivas e o ordenamento jurídico-constitucional, porque a proteção do consumidor está incluída expressamente entre os princípios gerais da atividade econômica (CF, art. 17, V), ao lado da soberania e da propriedade privada, e entre os direitos e garantias fundamentais do homem, bem como a própria elaboração de um Código de Defesa do Consumidor é proveniente de um comando constitucional.

4.2.2 Coisa julgada in utilibus

Os princípios da coisa julgada secundum eventum litis e in utilibus estão diretamente vinculados na medida em que os limites subjetivos da sentença trânsita em julgada só irão estender-se aos substituídos (secundum eventum litis), se vierem em seu benefício (in utilibus).

Segundo a definição de Orlando Ribeiro, a coisa julgada in utilibus é uma espécie secundum eventum litis, sendo reservada exclusivamente aos interesses individuais homogêneos, ocorrendo, apenas, quando é julgada procedente a demanda.

Com efeito, tal princípio encontra-se expresso nos parágrafos 3º e 4º do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor.

Discorrendo a respeito do parágrafo 3º do dispositivo acima mencionado, nos afirma Ada Pellegrini Grinover que tal artigo inova profundamente com relação aos princípios processuais sobre a coisa julgada porquanto, inspirado no princípio da economia processual e nos critérios da coisa julgada secundum eventum litis, bem como na ampliação ope legis do objeto do processo, expressamente autoriza o transporte, in utilibus, da coisa julgada resultante de sentença proferida na ação civil pública para as ações individuais de indenização por danos pessoalmente sofridos.

Isso significa que, sendo procedente a ação civil pública, o Código de Defesa do Consumidor, por economia processual, autoriza a extensão dos limites da coisa julgada a todas as vítimas e seus sucessores, sem que haja a necessidade de nova sentença.

Devemos frisar ainda, que além de estenderem-se as eficácias da coisa julgada às vítimas, ocorre também uma ampliação do pedido, pois o parágrafo 3º refere-se a ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, o que indica que, em caso de acolhimento da ação civil pública, o pedido de indenização exarado pelas vítimas em outras demandas, passa a integrar a ação coletiva.

Ada Pellegrini Grinover exemplifica a questão dizendo que, se, por exemplo, a ação civil pública que tenda à obrigação de retirar do mercado um produto nocivo à saúde pública for julgada procedente, reconhecendo a sentença os danos, reais ou potenciais, pelo fato do produto, poderão as vítimas, sem necessidade de novo processo de conhecimento, alcançar a reparação dos prejuízos pessoalmente sofridos, mediante liquidação e execução da sentença coletiva, nos termos do art. 97 do Código.

Analisado o aproveitamento da ação civil pública às ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, em caso de procedência da ação, devemos também verificar o que ocorre quando o pleito é rejeitado.

Sendo julgada improcedente a ação civil pública, tal como é regra nos processos coletivos, os substituídos não são atingidos pela coisa julgada, podendo ajuizar suas próprias ações indenizatórias.

Em relação ao parágrafo 4º do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor, este dispositivo repete a norma do parágrafo 3º vista acima, aplicando à sentença penal condenatória a mesma regra válida para a ação civil pública.

Logo, a coisa julgada penal é passível de ser transportada às ações individuais reparatórias em caso de procedência do pedido, bem como ficam imunes os substituídos se não for acolhida a demanda.

Devemos ressaltar que o Código de Defesa do Consumidor, nessa seara, não foi muito inovador, pois regramento similar já existe no Código de Processo Penal, permitindo que, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, o ofendido, seu representante legal ou herdeiros, possam promover a execução da referida decisão no juízo cível.

Todavia, ainda assim há uma grande diferença entre o sistema tradicional de cunho individualista e o sistema coletivo trazido no CDC. Segundo Antônio Gidi, no direito individual comum, regido pelo CPC e CPP, o legitimado ativo para a propositura da execução é, tão-somente, o "ofendido". No caso do CDC, entretanto, o espectro subjetivo fica aumentado, tendo em vista que, ainda quando a ação penal tenha sido promovida por crime cometido contra um só consumidor, todas as vítimas da conduta ilícita do fornecedor passam a ser titulares ativos da pretensão executiva.

Por fim, cumpre relatarmos que a coisa julgada in utilibus também está presente no inciso III do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor, o qual preconiza que os limites subjetivos da sentença trânsita em julgado somente atingirão a todos os interessados em caso de procedência do pedido.

Mas, como já afirmamos anteriormente que nas ações coletivas para a defesa de direitos individuais homogêneos não temos substituídos e sim litisconsortes, não iremos adentrar novamente no tema, bastando gizar que para a doutrina, o inciso III traz exemplo de coisa julgada in utilibus, na medida em que as eficácias da sentença aproveitam aos demais interessados em caso de acolhimento da demanda.

4.2.3 Litispendência: verificação necessária

A litispendência está conceituada no § 3º do artigo 301 do Código de Processo Civil, verificando-se a sua ocorrência quando nos deparamos com duas ações com identidade de partes, pedido e causa de pedir.

Sempre que estiver caracterizada a litispendência, a segunda ação deve ser extinta, sem julgamento de mérito, por tratar-se, assim como a coisa julgada, de exceção processual peremptória, que não admite qualquer sanação.

Contudo, devemos frisar que só a citação válida induz litispendência, de modo que, como lembra Voltaire de Lima Moraes, para caracterização desse instituto no segundo processo, onde haveria a repetição de ação que está em curso, é preciso que no anterior tenha sido feita a citação, pois do contrário ela não terá ocorrido.

Devemos concluir, destarte, que para haver litispendência são necessários dois elementos: a identidade de ações (iguais partes, pedido e causa de pedir) e a citação válida nas duas demandas.

Pois é justamente o primeiro elemento para a verificação do instituto em exame que pode suscitar alguma dúvida em relação às demandas coletivas.

Como visto anteriormente, os parágrafos 1º e 2º do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor permitem que os integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe ingressem com ações individuais, a despeito de estar em trâmite uma ação coletiva.

Desse modo, concluiríamos que o réu na ação coletiva, o qual também figura como requerido na demanda individual poderia alegar, preliminarmente em sua contestação, a ocorrência de duas ações idênticas, requerendo a extinção sem julgamento do mérito de uma delas.

Todavia, tal possibilidade tornaria despicienda quase todas as peculiaridades da coisa julgada no processo coletivo, principalmente os princípios da coisa julgada in utilibus e secundum eventum litis.

No intuito de evitar tal ocorrência, portanto, os autores do Código de Defesa do Consumidor inseriram o artigo 104, esclarecendo que as ações coletivas não induzem litispendência para as ações individuais.

Antes de adentrarmos na análise do referido artigo, devemos esclarecer que houve um equívoco do legislador ao afirmar que não induzem litispendência para as ações individuais as demandas coletivas previstas nos incisos I e II do parágrafo único do artigo 81. Na verdade, não há razões para que os processos que versem sobre direitos individuais homogêneos também não estejam abarcados pela norma do artigo 104.

Assim, onde se lê "previstas nos incs. I e II do parágrafo único do art. 81", leia-se "previstas nos incs. I, II e III do parágrafo único do art. 81".

De outra banda, também devemos entender por equivocada a segunda remissão prevista no artigo 104, porquanto o dispositivo, quando menciona os efeitos da coisa julgada, refere-se tão-somente aos incisos II e II do artigo 103 do CDC. Na verdade, o inciso I deveria também estar aí incluído.

Desse modo, comungamos da opinião de Ada Pellegrini Grinover, quando afirma que a referência do dispositivo aos "efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incs. II e III do artigo anterior" deve ser corrigida como sendo à coisa julgada "a que aludem os incs. I, II e III do artigo anterior".

Esclarecidos os equívocos do legislador na redação do artigo 104, passemos à análise do conteúdo desse dispositivo e verificamos que não ocorre litispendência entre uma ação coletiva e uma individual porque, como nos esclarece Ada Pellegrini Grinover, o pedido dos processos é inquestionavelmente diverso. Segundo a autora, enquanto as ações coletivas visam a reparação ao bem indivisivelmente considerado ou a obrigação de fazer ou não fazer, as ações individuais tendem ao ressarcimento pessoal.

Ademais, não haverá identidade de partes, pois em uma demanda individual será parte apenas quem teve seu direito violado em sua esfera jurídica individual, ao contrário da ação coletiva, em que todos os lesados figuram no pólo ativo, não obstante substituídos no processo pelos entes legitimados para a propositura da ação.

Porém, se comprovada a exclusão da possibilidade de litispendência entre demandas coletivas e individuais, o mesmo não podemos afirmar entre duas ações coletivas, já que é possível haver duas ações coletivas com as mesmas partes, pedido e causa de pedir.

Contudo, para que o afirmado acima ocorra, é mister tratarem-se da mesma espécie de interesses, ou seja, deve haver duas ações defendendo o mesmo direito individual homogêneo, difuso ou coletivo strictu sensu. Caso contrário, não haverá litispendência, embora possa se constatar a necessidade de conexão dos processos, como adverte Antônio Gidi. Por fim, o artigo 104 refere-se à suspensão do processo individual em até 30 dias após a constatação do ajuizamento da ação coletiva, a fim de que as eficácias (o artigo 104 refere-se a "efeitos’) da coisa julgada beneficiem os autores das demandas coletivas.

Logo, se o autor individual tomar ciência do ajuizamento de uma ação coletiva, pela regra insculpida no artigo em análise, terá o mesmo duas opções: prosseguir em sua demanda, abdicando da extensão subjetiva da sentença que vier a ser proferida no processo coletivo, ou requerer a suspensão de sua ação individual.

Nesse último caso, o demandante individual, se não for favorecido com o resultado da sentença coletiva (improcedente), poderá retomar seu processo individual, em nome dos princípios da coisa julgada in utilibus e secundum eventum litis.

Mas, é necessário frisarmos que no caso no parágrafo 2º do artigo 103, se o autor individual habilitar-se como litisconsorte, a coisa julgada formar-se-á para ele e, assim, não será permitido ao mesmo prosseguir com sua demanda individual.

4.3 A limitação territorial trazida pela Lei 9.494/97

As demandas coletivas referentes às relações de consumo são ajuizadas em um ou outro foro, de acordo com o alcance do dano que tais relações lhes causa, em conformidade com o artigo 93 do Código de Defesa do Consumidor.

A questão disciplinada acima parecia ser incontroversa, não suscitando maiores indagações doutrinárias. Contudo, a partir de 10 de setembro de 1997, com a publicação da Lei 9.494, resultante da Medida Provisória n.º 1570-4, a pacificação de conceitos acerca dos limites subjetivos da coisa julgada nas ações referentes a direitos metaindividuais foi alterada por completo, sendo a referida lei responsável por inúmeras indagações sobre a matéria.

Isso porque a Lei 9.494/97 modificou a redação do artigo 16 da Lei 7.347/85, Lei da Ação Civil Pública, passando a haver, portanto, uma limitação à extensão subjetiva do julgado nas demandas coletivas, já que, pela nova redação conferida ao artigo, as eficácias da sentença somente atingem aqueles substituídos domiciliados no órgão prolator da decisão.

Posteriormente, uma outra Medida Provisória, a MP 2180-35, de 24 de agosto de 2001, incluiu novo dispositivo à Lei 9.494/97, o artigo 2º - A, estabelecendo que a sentença civil prolatada em demanda coletiva abrange apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator.

Tal norma também gerou limitação à extensão subjetiva da sentença trânsita em julgado, o que levou alguns juristas, inclusive, a taxar os dois artigos – 16 da Lei 7.347/85 e 2º- A, da Lei 9.494/97 – como inconstitucionais e ineficazes.

Adiante, trazemos as principais críticas ao cabimento das medidas tomadas pela Lei 9.494/97.

4.3.1 (Des)Cabimento: críticas à alteração do artigo 16 da Lei 7.347/85

Ao instituir limites territoriais à extensão subjetiva da coisa julgada, o legislador foi de encontro a todo o regramento já existente acerca da tutela de direitos metaindividuais, bem como desconsiderou todo o objetivo da defesa desses direitos, que é proteção aos direitos de toda uma coletividade lesada, de modo molecular e não atomizado.

A criação da lei em comento, segundo nossa percepção, contribuiu para o que o jurista Luigi Ferrajoli denomina de "inflação legislativa", em que a cada dia são editadas normas em total dissonância com os princípios constitucionais vigentes.

Frisamos que normas como a Lei 9.494/97, as quais vêm contribuir para o retrocesso da efetividade da tutela jurisdicional coletiva, levam alguns operadores do direito a referirem-se à crise do Estado Social, embora a maioria da doutrina entenda como descabida tal posição.

Sobre o tema, vale transcrevermos a posição de Sílvio Dobrowski, à qual aderimos de pronto, principalmente por sermos defensores da perpetuidade do Estado do Bem-Estar Social:

A constatação de que as instituições não funcionam com a eficácia desejável, de modo algum justifica, que se pense em descartá-las, na linha sugerida pelas propostas sistêmica e neoliberal. Isso equivale a desprezar a experiência duramente acumulada no curso da História [...]. Os equívocos da razão não bastam para afastá-los da direção das relações humanas. Ao contrário, é preciso reconhecer os erros e tentar corrigi-los [...]. É preciso aperfeiçoar a ordem jurídica, mondar os excessos e reparar as falhas do Estado Social, e proceder, ainda, à adaptação da Constituição às realidades da nossa época, preservando a sua força regulatória.

Para nós, portanto, o problema não está com o paradigma estatal existente, e sim com determinados problemas criados ao seu redor, como a Lei 9.494/97, que se afasta do modelo social e desnatura a tutela coletiva de direitos. Mas, também devemos lembrar que, como o mundo jurídico ainda se adapta ao Estado Social, algumas falhas são compreensíveis, embora caiba aos estudiosos do direito apontá-las, a fim de corrigi-las.

Assim, além das críticas já exaradas, cumpre gizar que, segundo Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, a nova redação dada ao artigo 16 pela Lei 9.494/97 é inconstitucional e ineficaz. Inconstitucional por ferir os princípios do direito de ação (art. 5º, inciso XXXV), da razoabilidade e da proporcionalidade e porque o Presidente da República a editou por meio de medida provisória, sem que houvesse autorização constitucional para tanto, pois não havia urgência, nem relevância, requisitos exigidos pelo artigo 62 da Constituição Federal de 1988. É ainda ineficaz o novo artigo 16 porque a alteração, segundo os autores, ficou capenga, já que o artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor incide nas ações coletivas ajuizadas com fundamento na Lei da Ação Civil Pública, por força do artigo 21 deste diploma e do artigo 90 do Código de Defesa do Consumidor.

Diverge do pensamento acima, porém, o Desembargador Federal Amir José Finocchiaro Sarti, quando alega que a Lei 9.494/97, na parte em que alterou o artigo 16 da Lei 7.347/85, não peca por inconstitucionalidade, apesar de todos os seus inegáveis defeitos. Expondo sua tese, sustenta esse autor que, conforme se observa da leitura do artigo 5º, inciso XXXVI, a regra nele insculpida se dirige ao legislador ordinário, ou seja, ao legislar, é interdito ao Poder legiferante "prejudicar a coisa julgada", sendo esta a única regra sobre a matéria que adquiriu foro constitucional. Afirma o Desembargador que a Constituição não visa à proteção da amplitude do instituto da coisa julgada, pois caso isso ocorresse, a ação rescisória seria inconstitucional.

Assim, conclui Amir Sarti que a solução não está na inconstitucionalidade do dispositivo em questão, nem muito menos na sua pura e simples desconsideração, porque o juiz tem o dever de aplicar normas legais, mas, sim, na interpretação razoável de uma regra que só pode ser adequadamente aplicada em harmonia com o sistema no qual está inserida.

Todavia, discordamos do jurista, por entender que, mesmo que o artigo 5º, inciso XXXVI da Carta Magna, atinente à coisa julgada, possibilite mais de uma interpretação, ao menos sob o aspecto formal, é nítida a inconstitucionalidade da alteração trazida pela Lei 9.494/97, pois com certeza, não estavam presentes os requisitos de urgência e relevância que justificassem a edição da Medida Provisória n.º 1570-4.

Discorrendo acerca dos requisitos autorizadores da edição de medidas provisórias, Flávio Barbosa Quinaud Pedron afirma que a relevância deve ser entendida como insuperável e a urgência como inadiável.

Segundo o autor a relevância seria a categoria que possa levar à exceção do processo legislativo que ocorreria em casos de extrema necessidade, onde a falta de um comando legal pudesse levar a uma situação caótica, de desgoverno ou de grave abalo à paz social ou econômica, ou mesmo que pudesse comprometer os fundamentos do Estado, como a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.

Quanto à urgência, entendemos, com fundamento na posição do Juiz José Anselmo de Oliveira, citado por Flávio Barbosa Quinaud Pedron, que para ser editada uma medida provisória com base nesse requisito, devem estar presentes o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, pressupostos atinentes às ações cautelares que a esse conceito são emprestados.

Vale também mencionarmos o que diz Sílvio Dobrowolski acerca da enormidade de medidas provisórias que têm sido editadas em nosso ordenamento jurídico, sem que estejam atendidos os requisitos que autorizem a sua elaboração:

O Congresso é relegado a papel secundário – e, pior, se acomoda a essa situação – vindo a legislação a ser produzida por meio de medidas provisórias, interminavelmente repetidas, denotando, evidente desprezo pelo sentido razoável do Texto Maior, que só autoriza sua edição, em situações especiais.

Posto de lado o debate em torno da constitucionalidade do artigo 16 da Lei 7.347/85, depois da alteração trazida pela Lei 9.494/97, devemos registrar que não divergem os juristas quanto à sua ineficácia.

Efetivamente, tanto o artigo 21 da Lei da Ação Civil Pública, quanto o artigo 90 do Código de Defesa do Consumidor prevêem uma interação entre os dois diplomas, o que indica que tais regramentos devem ser lidos em conjunto, até porque as eficácias da coisa julgada em cada tipo de tutela de interesse transindividual somente podem ser entendidas a partir da leitura do comentado artigo 103 da Lei 8.078/90.

Portanto, como sustenta Ibraim Rocha, a viabilidade desta alteração do sistema somente poderia ocorrer também com a mudança do artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor, o que ainda não foi feito pelo legislador pátrio. Desse modo, concluímos que o artigo 16 da Lei 7.347/85 continuará sendo ineficaz até que o Código de Defesa do Consumidor sofra as alterações necessárias.

Aos argumentos acima expostos, sobre a inconstitucionalidade e ineficácia do artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública, agregam-se ainda, outras críticas.

A principal censura em relação às modificações trazidas pela Lei 9.494/97 está no fato de tal diploma legal confundir jurisdição e competência com limites subjetivos da coisa julgada.

Como expõem Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:

[...] o Presidente da República confundiu limites subjetivos da coisa julgada, matéria tratada na norma, com jurisdição e competência, como se, v.g., a sentença de divórcio proferida por juiz de São Paulo não pudesse valer no Rio de Janeiro e nesta última comarca o casal continuasse casado! O que importa é quem foi atingido pela coisa julgada material. [...] Confundir jurisdição e competência com limites subjetivos da coisa julgada é, no mínimo, desconhecer a ciência do direito. Portanto, se o juiz que proferiu a sentença na ação coletiva tout court, quer verse sobre direitos difusos, quer coletivos ou individuais homogêneos, for competente, sua sentença produzirá efeitos erga omnes ou ultra partes, conforme o caso [...] em todo território - e também no exterior [...]

Sobre o pronunciamento dos autores acima, Rodolfo de Camargo Mancuso tece alguns comentários, os quais ilustram nitidamente a questão. Segundo o autor, na medida que, pelas regras de competência o órgão julgador seja competente, parece-nos que não será possível mitigar a projeção dos limites subjetivos da coisa julgada, invocando-se elementos de ordem geográfica ou de organização judiciária. Como a coisa julgada não é uma substância, e sim uma qualidade que se agrega ao comando do julgado, a expansão subjetiva dessa coisa julgada dar-se-á até onde se encontre o interesse que constitui objeto da demanda coletiva, e bem assim em face de todos os sujeitos concernentes a esse interesse.

Assim, não pode a sentença ficar limitada a uma área geográfica, caso os limites subjetivos da coisa julgada atinjam substituídos que se encontrem além da jurisdição do magistrado responsável pela prolatação do julgado, inclusive porque tal situação geraria decisões conflituosas sobre a mesma causa de pedir.

Nesse sentido também se manifesta Hugo Nigro Mazzilli sustentando não ser possível confundir a competência do juiz que julga a causa com os efeitos que uma sentença pode produzir fora da comarca em que foi proferida. Exemplificando a questão, o autor menciona que, uma sentença que proíba a fabricação de um produto nocivo que vinha sendo produzido e vendido em todo o País, ou uma sentença que proíba o lançamento de dejetos tóxicos num rio que banhe vários Estados – essas sentenças produzirão efeitos em todo o País, mas isso não se confunde com a competência para proferi-las, que deverá ser de um único juiz, e não de cada um dos milhares de juizes brasileiros.

Segundo o autor, admitir solução diversa levaria a inúmeras sentenças contraditórias, exatamente contra os fundamentos e finalidades da defesa coletiva de interesses metaindividuais.

Outra crítica à modificação do artigo 16 pela Lei 9.494/97 está no fato de não existir solução expressa para os casos nos quais o dano for regional e, portanto, de competência de mais de órgão prolator.

Outrossim, clara está a incoerência da lei ao limitar as eficácias de sentença trânsita em julgado a determinado território, não obstante o julgado refira-se a interesses indivisíveis, como são caracterizados os interesses metaindividuais.

Críticas à parte, as quais, como vimos, são inúmeras e todas com fundamento jurídico, importa sabermos que o artigo 16, embora ineficaz, continua a ter vigência, situação que, ao que tudo indica, se perpetrará, até que a Lei da Ação Civil Pública e o Código de Defesa do Consumidor sejam modificados.

Devemos, porém ressaltar, que, como sustenta Luigi Ferrajoli, "vigência" e "validade" não se confundem.

Segundo o jurista peninsular, existem, no mundo jurídico, normas formais sobre competência ou sobre o procedimento de criação de leis, e normas substanciais, como o princípio da igualdade e os direitos fundamentais. Por tal razão, pode ocorrer de uma norma ser formalmente vigente, mas ser inválida e, como tal, suscetível de anulação.

Sintetizando seu pensamento, Luigi Ferrajoli afirma:

Todos os direitos fundamentais – e não só os direitos sociais e os deveres positivos por ele impostos ao Estado, mas também os direitos de liberdade e as correspondentes proibições negativas que limitam a intervenção daquele – equivalem a vínculos de substância e não de forma, que condicionam a validade substancial das normas produzidas e exprimem, ao mesmo tempo, os fins para que está orientado esse moderno artifício que é o Estado Constitucional de Direito.

4.3.2 Análise crítica à inserção do artigo 2º - A

Assim como a nova redação do artigo 16 da Lei 7.347/85 causou polêmica entre os juristas, também a inserção do artigo 2º - A, na Lei 9.494/97, incluído pela Medida Provisória 2180 – 35, de 24 de agosto de 2001, foi alvo de inúmeras críticas porquanto, seguindo a idéia instituída no artigo 16, também estabeleceu limites territoriais à extensão subjetiva da coisa julgada nas demandas coletivas.

Com efeito, da leitura do artigo 2º - A extraímos que apenas aqueles lesados que tenham domicílio fixado no âmbito da competência do órgão prolator, na data da propositura da ação, serão atingidos pela coisa julgada, criando-se, desse modo, uma nova regra a respeito dos limites subjetivos da coisa julgada, a qual nos parece completamente inválido e ineficaz, ao espelho do artigo 16 comentado alhures.

Segundo a maioria dos juristas, dentre eles Renato Rocha Braga, o referido dispositivo sofre de flagrante inconstitucionalidade, ao ter criado critério totalmente absurdo para a extensão subjetiva da coisa julgada, violador dos mesmos preceitos apontados nos comentários ao artigo 16. Para o autor, essa medida provisória apenas veio a limitar os direitos dos lesados, fato não autorizado pelo constituinte.

O autor acima mencionado, ainda referindo-se ao absurdo criado pelo legislador através da Medida Provisória 2180-35, ilustra seu posicionamento com algumas considerações práticas. De acordo com Renato Rocha Braga, esse critério, a par de ser cientificamente insustentável, gera vários inconvenientes e exemplifica:

[...] Tício é empregado de determinada fábrica por 20 anos, tendo domicílio na comarca de sua sede (Rio de Janeiro) por igual tempo, se aposentando em 05/06/99, mudando no dia seguinte, com sua família, para São Paulo; Caio é um funcionário novo, tendo sido admitido em 01/06/99; é intentada uma demanda em face desta fábrica, em 11/06/99, por violação aos direitos trabalhistas de seus empregados, violações estas que remontam há mais de 15 anos. Pela lógica da medida provisória, Tício não será abarcado pela sentença, pois deixou de ter domicílio na comarca do órgão julgador cinco dias antes da demanda ser proposta. já Caio, que sofreu poucas lesões, em virtude do exíguo tempo em que está empregado, será beneficiado.

Continuando sua explanação, Renato Rocha Braga menciona outro inconveniente possível de ocorrer com a aplicação do artigo 2º - A Segundo o doutrinador, nas mesmas condições de tempo e lugar do exemplo anterior, se tivéssemos um trabalhador com dezenove anos de idade, domiciliado na comarca do órgão julgador ao tempo da propositura da ação, mas com pais residentes em outra Comarca (São Paulo), o referido trabalhador não seria beneficiado pela coisa julgada, pois, em conformidade com o artigo 26, caput, do Código Civil, os incapazes têm por domicílio o de seus representantes.

Como vemos, portanto, gritantes são os inconvenientes gerados pela aplicação do artigo 2º - A, trazido pela Medida Provisória 2180 – 35.

Ademais, outras questões ficam sem solução se aplicarmos o artigo supramencionado, como a possibilidade de pluralidade de domicílios, prevista no artigo 72, parágrafo único, do novo Código Civil e ainda, a falta dos requisitos de relevância e urgência exigidos para a edição de uma medida provisória.

Por fim, devemos gizar que o parágrafo único do artigo 2º - A também traz outra aberração legislativa, censurada pela doutrina e pelo Supremo Tribunal Federal, não obstante, segundo afirma Hely Lopes Meirelles, o Superior Tribunal de Justiça venha considerando tal norma aplicável aos mandados de segurança coletivos.

Como as demandas coletivas são caracterizadas pela substituição processual – legitimação extraordinária – é totalmente descabido falarmos em autorização da entidade associativa e relação nominal e endereços dos associados.

Na argumentação de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery as exigências do parágrafo único do artigo 2º - A somente se justificariam se estivéssemos diante de hipótese de representação processual. Segundo os autores, quando a associação "representa" seus associados, agindo em nome deles e não em nome próprio, deve estar expressamente autorizada e mencionar, nominalmente, quais os associados que estão sendo representados. Quando, ao contrário, propõe ação em nome próprio, está na condição de legitimado ativo para a condução do processo, sendo dispensáveis a autorização e a relação nominal com endereços.

Como vemos, portanto, a Lei 9.494/97 marcou o cenário jurídico pátrio com algumas inovações totalmente descabidas e impertinentes, conflitando com entendimentos já pacíficos sobre limites subjetivos da coisa julgada nas demandas coletivas e desnaturando a própria tutela coletiva.


CONCLUSÃO

Este estudo não teve a pretensão de esgotar a matéria acerca dos limites subjetivos da coisa julgada em demandas destinadas à defesa de direitos transindividuais, mas apenas contribuir com uma visão atual a respeito da coisa julgada na tutela de direitos coletivos e ampliar alguns pontos, como o estudo do fenômeno da coisa julgada no processo civil tradicional, o que, sob nosso enfoque, é passo fundamental para a compreensão do tema proposto.

Verificamos assim, que os interesses transindividuais são considerados uma categoria intermediária entre interesses públicos e privados e apresentam uma estrutura tripartida, dividindo-se em: interesses individuais homogêneos, interesses coletivos e interesses difusos.

Os interesses individuais homogêneos são representados por um conjunto de vontades individuais e foram denominados de "acidentalmente coletivos" porque apenas o que os diferencia dos direitos individuais é o fato de possuírem a mesma origem em relação aos fatos geradores, proporcionando, desse modo, a sua defesa conjunta.

Os interesses coletivos possuem natureza indivisível e pertencem a um grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si por uma relação jurídica base.

Os interesses difusos são também de natureza indivisível, porém pertencentes a pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

Quanto à expressão "ações coletivas", resta claro que há divergências doutrinárias acerca dessa designação. Porém, preferimos utilizar a referida nomenclatura para denominar demandas que se refiram a direitos coletivos, diferenciando-as, assim, das ações de cunho individual.

Entendemos como demandas coletivas não só o mandado de segurança coletivo, a ação civil pública e a ação popular, mas também as ações coletivas de consumo e verificamos que os legitimados para a propositura de ações coletivas possuem legitimidade extraordinária para a causa, tratando-se de caso de substituição processual.

Com relação à coisa julgada, aderimos à idéia de Enrico Tullio Liebman, o qual sustenta que o referido instituto é uma qualidade que se agrega à sentença, tornando-a imutável.

Verificamos que eficácia e efeito não se confundem e que as eficácias tornam-se indiscutíveis na sentença, exceto quando estivermos diante de direitos indisponíveis, porque tais direitos não são passíveis de renúncia.

Com isso, novamente aderimos a Liebman e sustentamos que todas as cargas de um decisum são também indiscutíveis, e não apenas a carga declaratória, como defende o processualista gaúcho Ovídio Araújo Baptista da Silva.

Outra importante constatação refere-se aos limites subjetivos da coisa julgada nas ações individuais, os quais operam-se inter partes e não erga omnes, atingindo apenas os participantes da relação jurídica processual.

Quando se está diante da tutela coletiva de direitos, porém, os limites subjetivos da coisa julgada adquirem contornos diferenciados. Não obstante o disposto no artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor, que se refere à coisa julgada erga omnes (para direitos difusos e individuais homogêneos) e ultrapartes (para direitos coletivos), concordamos com Márcio Mafra Leal, que substitui as duas expressões pelo aforismo extra partes.

O fato de a autoridade da coisa julgada ser proferida além das partes atuantes na relação processual deve-se em razão do próprio objetivo da tutela coletiva que é atingir a todas as pessoas lesadas.

Verificamos que, em ações coletivas, poderemos ter alterado o rol de pessoas atingidas pelas coisa julgada, dependendo do resultado da ação e de sua fundamentação, em razão de uma peculiaridade do instituto, que é ser secundum eventum litis (segundo o evento da lide).

Por outro lado, em razão do próprio fim da tutela coletiva, que é molecularizar o direito, a coisa julgada, em regra, somente atinge àqueles que não participaram da relação jurídica em caso de procedência da ação (coisa julgada in utilibus).

Ainda, mesmo que esteja em andamento uma ação coletiva, nada obsta a propositura de ações individuais, não ocorrendo litispendência entre as mesmas, embora, para que o sujeito seja beneficiado pela ação coletiva em caso de sua procedência, tenha que pedir a suspensão do processo individual.

No tocante à imposição de limites territoriais à coisa julgada, trazida pela Lei 9.494/97, além de considerarmos a referida lei inconstitucional e ineficaz, comungamos das idéias de Luigi Ferrajoli e entendemos que estamos diante de norma vigente, porém inválida, por contrariar normas substanciais, assim, consideradas aquelas referentes a direitos fundamentais.

A partir de todas as questões aqui apontadas, frisamos que o regime trazido pelo Código de Processo Civil pátrio não se adapta, em muitos aspectos, ao novo paradigma processual estatal existente, o Estado Social, que se preocupa não apenas com o indivíduo e seus direitos subjetivos, mas também com o grupo, com a sociedade como um todo.

Percebemos que, se inserirmos os direitos transindividuais aqui estudados em uma teoria geral do processo coletivo, muitos conceitos poderão ser firmados, pois estaremos abandonando de vez seu atrelamento com a teoria geral do processo civil de cunho individualista. Nesse contexto, aderimos a Ibraim Rocha e conclamamos os juristas à criação de uma teoria da tutela coletiva, a partir dos conceitos específicos que têm surgido sobre o tema.

Queremos assim consignar que, afora todos os posicionamentos aqui apresentados, se ficar registrada a importância de repensar o direito, entendendo-o como uma ciência palpitante, que deve acompanhar a evolução social, já teremos atingido nossa principal meta.

Por fim, deixamos as sábias palavras de Adroaldo Furtado Fabrício, apud Antônio Gidi, as quais, segundo nosso entendimento, bastariam nesta conclusão: "Quando o agigantamento do usuário faz romper o tecido e rebentar as costuras já não é o caso para remendos ou ajustes: a roupa tem de ser substituída".


BIBLIOGRAFIA

ALVIM, Arruda et al. Código do Consumidor Comentado e legislação correlata. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991.

ARAÚJO FILHO, Luiz Paulo da Silva. Ações Coletivas: a tutela jurisdicional dos direitos individuais homogêneos. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

BRAGA, Renato Rocha. A Coisa Julgada nas Demandas Coletivas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000.

BRASIL. Decreto-Lei 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Diário Oficial [da União], Brasília, DF, 13 out.1941, p. 019699.

BRASIL. Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial [da União], Brasília, DF, 05 jan.1916, p. 000133.

BRASIL. Lei 4.717, de 29 de junho de 1965. Regula a ação popular. Diário Oficial [da União]. Brasília, DF, 05 jul.1965, n. 18, p. 000001.

BRASIL. Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Diário Oficial [da União]. Brasília, DF, 17 jan.1973, n. 012, p. 000003.

BRASIL. Lei 7.347, de 24 de julho de 1985. Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (vetado) e dá outras providências. Diário Oficial [da União], Brasília, DF, 25 jul.1985, p. 010649.

BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1991. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Diário Oficial [da União], Brasília, DF, 12 set.1991, suplemento ao n. 176.

BRASIL. Lei 9.494, de 10 de setembro de 1997. Disciplina a aplicação da tutela antecipada contra a Fazenda Pública, altera a Lei 7.347, de 24 de julho de 1985 e dá outras providências. Diário Oficial [da União], Brasília, DF, 11 set.1997, p. 020158.

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial [da União], Brasília, DF, 11 jan.2002, p. 000001.

BRASIL. Medida Provisória n. 1570-4, de 21 de agosto de 1997. Disciplina a aplicação da tutela antecipada contra a Fazenda Pública, altera a Lei 7.347, de 24 de julho de 1985, e dá outras providências. Diário Oficial [da União], Brasília, DF, 22 agos.1997, p. 018238.

BRASIL. Medida Provisória n. 2180-35, de 24 de agosto de 2001. Acresce e altera dispositivos das Leis 8.437, de 30 de junho de 1992, 9.028, de 12 de abril de 1995, 9.494, de 10 de setembro de 1997, 7.347, de 24 de julho de 1985, 8.429, de 2 de junho de 1992, 9.074, de 17 de novembro de 1998, do Decreto-Lei 5.452, de 1 de maior de 1943, das Leis 5.869, de 11 de janeiro de 1973, 4.348, de 26 de junho de 1964, e dá outras providências. Diário Oficial [da União], Brasília, DF, 27 agos.2001, p. 000044.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Direitos e Interesses Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos. Ação Civil Pública. Legitimidade ativa do Ministério Público. Recurso Especial nº 163.231-SP. Ministério Público de São Paulo e Associação Notre-Dame de Educação e Cultura. Relator: Ministro Maurício Corrêa. 12 de março de 1997. In: Informativo, n. 62, Brasília. 03 a 07 mar.1997.

Disponível em:<http://www.mp.pe.gov.br/caops/caop_consumidor/doutrina/dir_difusos.html>

Acesso em: 04 ago. 2002.

BULOS, Uadi Lamêgo. Mandado de Segurança Coletivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996.

CALAMANDREI, Piero. Direito Processual Civil: estudos sobre o processo civil. Traduzido por Luiz Abezia e Sandra Drina Fernandez. Campinas: Bookseller, 1999.

CARNEIRO, Athos Gusmão. Intervenção de Terceiros. 12.ed. São Paulo Saraiva, 2001.

DOBROWOLSKI, Sílvio. O Poder Judiciário e a Constituição. REVISTA SEQÜÊNCIA. ESTUDOS JURÍDICOS E POLÍTICOS, Florianópolis, n. 35, p. 31-41, dez/1997.

FERRAJOLI, Luigi. O Direito como sistema de garantias. In: OLIVEIRA JÚNIOR, José Alcebíades de. (Org.). O novo em direito e política. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997.

GIDI, Antônio. Coisa Julgada e Litispendência em ações coletivas. São Paulo: Saraiva, 1995.

GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos autores do anteprojeto. 5.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998.

LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e Autoridade da Sentença. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984.

MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Interesses Difusos. Conceito e Legitimação para agir. 5.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

______. Manual do Consumidor em Juízo. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

MARQUES, José Frederico. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. II, Campinas: Millennium, 2000.

______. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. III. Campinas: Millennium, 2000.

______. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. IV, Campinas: Millennium, 2000.

MAZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor e outros interesses difusos e coletivos. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 26.ed. São Paulo: Malheiros, 2001.

______. Mandado de Segurança. 24.ed. São Paulo: Malheiros, 2002.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 9.ed. São Paulo: Atlas, 2001.

MORAES, Paulo Valério Dal Pai. Conteúdo Interno da Sentença. Eficácia e Coisa Julgada. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997.

MORAIS, José Luis Bolzan. Do direito social aos interesses transindividuais. O Estado e o direito na ordem contemporânea. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996.

NERY JUNIOR, Nelson e Rosa Maria de Andrade Nery. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante em Vigor. 6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

PEDRON, Flávio Barbosa Quinaud. Da medida provisória. In: Jus Navigandi, n. 43, jul. 2000. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=176>. Acesso em 12 nov.2002.

PORTO, Sérgio Gilberto. Coisa Julgada Civil. Análise, Crítica e Atualização. 2.ed. Rio de Janeiro: AIDE, 1998.

RIBEIRO, Orlando. Coisa Julgada nas Ações Coletivas. São Paulo: LTr, 1999.

ROCHA, Ibraim. Litisconsórcio, Efeitos da Sentença e Coisa Julgada na Tutela Coletiva. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

SARTI, Amir José Finochiaro. Ação Civil Pública. Questões processuais. Revista Tribunal Regional da 4ª Região, Porto Alegre, n. 38, p. 155-176, jun/2000.

SIDOU, J. M. Habeas corpus, mandado de segurança, mandado de injunção, habeas data, ação popular – As garantias dos direitos coletivos. 5.ed. Rio de Janeiro: 2000.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 15.ed. São Paulo: Malheiros, 1998.

SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Sentença e Coisa Julgada. 2.ed. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988.

SMANIO. Gianpaolo Poggio. Interesses difusos e coletivos. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2001.

TESHEINER, José Maria. Eficácia da Sentença e Coisa Julgada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

VIGLIAR, Marcelo Menezes de. Ação Civil Pública ou Ação Coletiva? In: MILARÉ, Edis (coord.). Ação Civil Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

ZAVASCKI, Teori Albino. Defesa de Direitos Coletivos e Defesa Coletiva de Direitos. REVISTA JURIS SÍNTESE, n. 212, p. 16, jun/1995.

______. Ministério Público e Ação Civil Pública. REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, Porto Alegre, n. 32, p. 117-123, 1994.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GRANTHAM, Silvia Resmini. Os limites subjetivos da coisa julgada nas demandas coletivas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 66, 1 jun. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4186. Acesso em: 24 abr. 2024.