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Decadência em matéria tributária

Decadência em matéria tributária

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O instituto da decadência em matéria tributária trata-se de tema extremamente polêmico, em especial nos casos de tributos sujeitos ao lançamento por homologação. Analisa-se a aplicação dos artigos 173 e 150 do CTN.

Introdução

Tema extremamente polêmico na doutrina e na jurisprudência é o referente à decadência em âmbito de matéria tributária, em especial nos casos de tributos sujeitos ao lançamento por homologação.

Com o presente artigo, em um primeiro momento, pretende-se fazer uma breve análise conceitual de institutos, tais como: tributo; lançamento e suas modalidades; constituição de crédito tributário; e decadência.

Já em um segundo momento, discorrer-se-á acerca dos artigos 173 e 150, ambos do Código Tributário Nacional, bem como sua aplicabilidade nos casos de tributos sujeitos ao lançamento por homologação.


1 Do Lançamento

1.1 Conceito e Natureza

Nos termos do artigo 3º do Código Tributário Nacional, “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”.

Da leitura de tal dispositivo, percebe-se que a cobrança de um tributo se dará mediante atividade administrativa plenamente vinculada, vale dizer, os agentes públicos encarregados da fiscalização e arrecadação dos tributos não têm margem de discricionariedade quanto a forma de agir, a qual está regulamentada em lei[1].

Essa atividade administrativa plenamente vinculada e privativa de autoridade administrativa, prevista no artigo 142 do Código Tributário Nacional, consiste no chamado lançamento tributário, por meio do qual um fato jurídico tributário que deu origem a uma obrigação tributária será formalmente apurado e quantificado.

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.

Importante esclarecer que, nas palavras de Luís Eduardo Schoueri[2], “o Código Tributário Nacional distingue dois momentos na relação jurídico-tributária. O primeiro, que surge com o fato jurídico tributário, é denominado ‘obrigação tributária’. Quando esta é determinada e quantificada, o Código Tributário Nacional passa a referir-se ao ‘crédito tributário’. Entre um e outro fenômeno, está o lançamento.”.

Dessa forma, é possível perceber que o crédito tributário é constituído quando a obrigação tributária é quantificada e qualificada mediante lançamento, passando, assim, a ser exigível do sujeito passivo.

Vale ressaltar que o lançamento apenas será formalizado e concluído quando o sujeito passivo da obrigação tributária for notificado do mesmo, de forma que sem notificação não há que se falar em lançamento.

Interessante aqui apontarmos o artigo 144 do Código Tributário Nacional, o qual nos mostra que o lançamento está totalmente vinculado à obrigação que lhe deu origem, de forma que o crédito deverá ser calculado e apurado com base na legislação em vigor no momento do fato jurídico tributário[3]:

Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada.

 § 1º Aplica-se ao lançamento a legislação que, posteriormente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros.

 § 2º O disposto neste artigo não se aplica aos impostos lançados por períodos certos de tempo, desde que a respectiva lei fixe expressamente a data em que o fato gerador se considera ocorrido. (g.n.).

1.2 Modalidades de Lançamento

Conforme se verá a seguir, o Código Tributário Nacional prevê três modalidades de lançamento: (I) lançamento de ofício; (II) lançamento por declaração; (III) lançamento por homologação.

1.2.1 Lançamento de Ofício

Previsto no artigo 149 do Código Tributário Nacional, o chamado lançamento de ofício ou lançamento direto é aquele realizado pela autoridade administrativa sem que haja qualquer participação do sujeito passivo:

Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:

 I - quando a lei assim o determine;

 II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;

III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;

IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;

V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;

VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;

VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;

VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;

IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.

Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.

Dessa forma, competem à Administração Pública todas as providências para a formalização da obrigação tributária, bem como sua apresentação em um documento formal e a notificação do sujeito passivo[4].

A título exemplificativo temos o Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana (IPTU).

1.2.2 Lançamento por Declaração

Previsto no artigo 147, do Código Tributário Nacional, o chamado lançamento por declaração, também conhecido pela doutrina como “lançamento misto”, é aquele em que tanto o sujeito passivo como a autoridade administrativa agem para que o lançamento seja considerado válido:

Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.

§ 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.

§ 2º Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela.

Nessa modalidade, em decorrência do disposto em lei, cabe ao sujeito passivo ou a terceiro prestar ao Fisco informações fáticas, devendo o agente público, com base nas informações prestadas, formalizar a obrigação tributária.

Importante ressaltar que, conforme descrito no artigo acima, caso o contribuinte seja omisso ou preste declarações falsas, caberá à autoridade administrativa, de ofício, rever o lançamento e realizar um novo.

À título exemplificativo temos parte dos Impostos sobre Importação e Exportação[5].

1.2.3 Lançamento por Homologação

Previsto no artigo 150 do Código Tributário Nacional, o lançamento por homologação, também conhecido como “autolançamento” é aquele em que o próprio sujeito passivo tem a obrigação de calcular o valor devido e recolhe-lo, independentemente de qualquer manifestação do Fisco.

Dessa forma, à autoridade administrativa cabe apenas a fiscalização da exatidão do valor pago, sendo que, quando o devedor for omisso ou quando for incorreto o valor recolhido, será necessário que o Fisco realize o lançamento, o qual será acompanhado de encargos legais por descumprimento de dever legal.

Cumpre aqui esclarecer que a autoridade fiscal tem o prazo de cinco anos para homologar a apuração do lançamento realizado pelo contribuinte. Tal homologação extingue o crédito tributário, podendo ser de forma expressa (por escrito, dentro do prazo de cinco anos) ou de forma tácita (passados cinco anos sem qualquer manifestação por parte da autoridade fiscal).

Importante ressaltar que, nos termos da Súmula 436 do Superior Tribunal de Justiça, “a entrega de declaração pelo contribuinte, reconhecendo o débito fiscal, constitui o crédito tributário, dispensada qualquer providencia por parte do Fisco”. Dessa forma, quando o sujeito passivo declara o imposto devido, porém não o paga, diz-se que o crédito tributário foi constituído, sem necessidade de que haja homologação por parte das autoridades fiscais[6].

A título exemplificativo, temos o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o Imposto de Renda (IR).


2 Da Extinção do Crédito Tributário

Conforme previsto no artigo 156 do Código Tributário Nacional, o crédito tributário pode ser extinto por meio de (I) pagamento; (II) compensação; (III) transação; (IV) remissão; (V) decadência; (VI) prescrição; (VII) conversão de depósito em renda; (VIII) pagamento antecipado e homologação do lançamento; (IX) consignação em pagamento; (X) decisão administrativa irreformável; (XI) decisão judicial passada em julgado; e (XII) dação em pagamento de bens imóveis.

2.1 Decadência

Em prol da segurança jurídica, o instituto da decadência está previsto como uma das causas de extinção do crédito tributário, em razão do decurso do tempo, conforme artigo 173 do Código Tributário Nacional.

Pode-se dizer que a decadência extingue o direito de lançar, ou seja, o direito de constituir o crédito tributário, atingindo-se, assim, o próprio direito material[7].

Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:

I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;

II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.

Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. (g.n.)

Da leitura do dispositivo acima, percebe-se que, no caso do inciso I, a contagem do prazo decadencial de cinco anos inicia-se a partir do ano seguinte ao que o lançamento poderia ser efetuado. À título exemplificativo temos fato gerador de imposto sobre propriedade territorial urbana, em 01/01/2015, de forma que o prazo decadencial tem início em 01/01/2016 e término em 31/12/2020.

Já no caso do inciso II, a contagem do prazo inicia-se na data em que se tornar definitiva a decisão que anular o lançamento anterior, em razão de vício formal.

Importante ressaltar que, conforme será demonstrado abaixo, o mencionado artigo 173 se aplica apenas aos casos de lançamentos de ofício e por declaração, não sendo aplicável aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, hipótese em que a apuração do crédito tributário é feita pelo próprio contribuinte.

2.2 Decadência – Lançamento por Homologação

Nos casos de lançamento por homologação não se aplica o disposto no artigo 173 do Código Tributário Nacional, mas sim o disposto no § 4º do artigo 150 de mencionado diploma legal:

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.

§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.

§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.

§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.

§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. (g.n.)

Da leitura do dispositivo acima, percebe-se que o prazo decadencial inicia-se na data do fato gerador do tributo a que se refere o lançamento.

Todavia, devemos lembrar que, em que pese o disposto acima, o § 4º do artigo 150 apenas será aplicado nos casos em que haja algum pagamento a ser homologado e desde que não haja dolo, fraude ou simulação por parte do contribuinte. Caso contrário, será realizado lançamento de ofício pelas autoridades administrativas, aplicando-se, dessa forma, o disposto no artigo 173, I, do Código Tributário Nacional.


3 Conclusão

Ante o exposto, podemos resumir a aplicação dos artigos 150 e 173 do Código Tributário Nacional da seguinte forma:

Declaração e Pagamento

Artigo Aplicável

Contribuinte declara o imposto devido e realiza o pagamento

Artigo 150, § 4º, CTN

Contribuinte não declara o imposto devido e não realiza o pagamento

Artigo 173, I, CTN

Contribuinte declara o imposto devido e não realiza o pagamento

Não há nada a ser constituído pelo Fisco

Contribuinte declara o imposto devido, mas realiza o pagamento em montante inferior

Não há nada a ser constituído pelo Fisco


Notas

[1] BARTINE, Caio. Direito Tributário. 3.ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. (Coleção elementos do direito; v. 3. Coordenação Marco Antonio Araujo Jr., Darlan Barroso), p. 163.

[2] SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 581.

[3] SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 588.

[4] BARTINE, Caio. Direito Tributário. 3.ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. (Coleção elementos do direito; v. 3. Coordenação Marco Antonio Araujo Jr., Darlan Barroso), p. 227-228.

[5] BARTINE, Caio. Direito Tributário. 3.ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. (Coleção elementos do direito; v. 3. Coordenação Marco Antonio Araujo Jr., Darlan Barroso), p. 228.

[6] Ibid., p. 228-229.

[7] MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional, volume III. São Paulo: Atlas, 2005, p. 305.



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERA, Barbara Weg. Decadência em matéria tributária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4434, 22 ago. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/41990. Acesso em: 19 abr. 2024.