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Cultivo de maconha para uso próprio

Cultivo de maconha para uso próprio

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Configura crime descrito no art. 12, § 1.º, II, da Lei n. 6.368, de 21 de outubro de 1976, manter plantação de maconha para uso próprio?

Há três orientações na jurisprudência:

1.ª) Tendo em vista que a Lei n. 6.368/76 não define expressamente a ação de semear, cultivar ou fazer a colheita de substância destinada à preparação de entorpecente para uso próprio [1], o fato subsume-se na figura do art. 16 (porte para uso próprio) e não no 12, § 1.º, II (cultivo para uso próprio) [2]. Essa corrente jurisprudencial, amplamente vencedora, aplica, segundo seus fundamentos, a analogia in bonam partem [3].

2.ª) O fato se enquadra no art. 12, § 1.º, II, da Lei n. 6.368/76 [4]. Para essa orientação, a "lei não distingue se o agente semeia, planta e colhe para seu uso ou para terceiros" [5].

3.ª) O fato é atípico. Para os partidários dessa posição, o juiz não pode lançar mão da analogia para criar delito que não esteja expressamente previsto em lei. Não está descrita na lei penal a conduta de cultivar maconha etc., para uso próprio, por isso não há crime [6].

Para nós, a conduta de semear, cultivar ou fazer a colheita, para uso próprio, de substância destinada à preparação de entorpecente, como a maconha, não está tipicamente definida como crime no art. 12 da Lei Especial. É atípica [7]. E não há crime sem lei que o defina (CF, art. 5.º, XXXIX; CP, art. 1º). Além disso, não se pode enquadrá-la no art. 16 por analogia in bonam partem. A analogia empregada não é in bonam mas sim in malam partem. Sendo atípico o fato, enquadrá-lo no art. 16 por semelhança é prejudicial. E a analogia não pode ser empregada para prejudicar o autor de crime. Ademais, havendo dúvida, deve ser adotada a interpretação mais favorável ao agente.


Notas

01. RJTJSP 109/456.

02. No sentido dessa corrente: RT 515/386, 520/399 e 408, 527/410, 544/422, 556/375, 558/295, 560/322, 565/298, 572/300, 578/326, 582/388, 598/321, 610/410, 623/291, 635/353, 672/300 e 693/332; RJTJSP 88/351, 93/418, 103/465, 109/452, 115/245, 126/513 e 130/491; JTACrimSP 52/29; RBCC 2/229; RF 272/304; RJTJRS 156/116.

03. Nesse sentido: RT 515/386, 598/321 e 623/291; RJTJSP 109/452 e 456.

04. Nesse sentido: TJSP, ACrim n. 8.544, RT 555/324; TJPR, ACrim n. 10.455, RT 668/303; RT 693/333; RJTJRS 150/219; PJ 34/208.

05. TJSP, ACrim n. 8.544, RT 555/324; TJPR, ACrim n. 10.455, RT 668/303; RJTJRS 83/84.

06. Nesse sentido: RJTJSP 93/421, 109/452 e 653/353 (votos vencidos); RT 667/280, rel. Juiz Márcio Bártoli; RT 693/334 (voto vencido do Juiz Márcio Bártoli).

07. Vide nosso Lei Antitóxico anotada. 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 49.


Autor

  • Damásio E. de Jesus

    Damásio E. de Jesus

    advogado em São Paulo, autor de diversas obras, presidente do Complexo Jurídico Damásio de Jesus

    atuou durante 26 anos no Ministério Público do Estado de São Paulo, tendo se aposentado em 1988 como Procurador de Justiça. Teve papel significativo em trabalhos importantes realizados para o Ministério da Justiça, a Prefeitura da Cidade de São Paulo, a Câmara dos Deputados, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e a Secretaria da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo. Com vasto reconhecimento internacional, atuou também como representante brasileiro nas várias sessões organizadas pela Organização das Nações Unidas (ONU) em todo o mundo, onde já discutiu variados temas, a maioria abordando a prevenção ao crime e a justiça penal, os crimes de corrupção nas transações comerciais internacionais, o controle de porte e uso de armas de fogo, entre outros.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JESUS, Damásio E. de. Cultivo de maconha para uso próprio. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 101, 12 out. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4241. Acesso em: 10 maio 2024.