Classificação da competência tributária

28/05/2016 às 18:27
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O presente artigo analisa as repartições da competência tributária sob a ótica da Constituição Federal de 1988.

A competência tributária pode ser definida como o poder dado ao ente político para instituir tributo, por meio de lei própria, observando os ditames constitucionais, bem como as normas gerais de Direito Tributário. Sua definição e características já foram objeto de artigo publicado (Competência tributária: conceito e características), cabendo aqui a análise específica quanto a sua classificação.


Repartição da competência tributária

A competência tributária pode ser classificada ou repartida em seis espécies, são elas: privativa, comum, cumulativa, especial, residual e extraordinária, as quais detalharemos a seguir.

1. Competência privativA

Em que pese o posicionamento dos constitucionalistas ao distinguirem a competência privativa da competência exclusiva, afirmando ainda que a primeira seria passível de delegação, quando a segunda não, remeteria à conclusão forçosa, de que a competência tributária seria, a rigor, exclusiva, em face da indelegabilidade.

Entretanto, a terminologia se consagrou na doutrina, de modo que a competência tributária conferida constitucionalmente a determinado ente denomina-se privativa.

Diz-se privativa, pois a própria Constituição determina o rol de impostos inerentes a cada ente tributante, em que pese o artigo 153 da Carta Maior enumerar os impostos federais, de competência privativa da União, o qual, a título de exemplo, vale transcrever em sua literalidade:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

I - importação de produtos estrangeiros;

II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados;

III - renda e proventos de qualquer natureza;

IV - produtos industrializados;

V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;

VI - propriedade territorial rural;

VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.

Igualmente, prevê o artigo 155 da Constituição Federal os impostos estaduais de competência privativa dos Estados e do Distrito Federal, bem como os artigos 156 e 147, parte final, ambos da Carta Magna, enumeram os impostos municipais, de competência dos Municípios e do Distrito Federal.

No tocante aos Estados, Distrito Federal e Municípios, as previsões normativas dos artigos acima citados são exaustivas, ou seja, não poderão estes entes instituir impostos diversos dos que lhe forem deferidos constitucionalmente.

O que não ocorre para a União, vez que esta possuí competência para instituir, mediante lei complementar, novos impostos, não cumulativos e de fato gerador ou base de cálculo diversos dos descriminados na Constituição, consoante disposto no artigo 154, I, do Texto Constitucional[1]. Ainda, poderá a União, na iminência ou no caso de guerra externa, criar impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, conforme dispõe o inciso II[2] do mesmo dispositivo constitucional.

Podem ainda ser denominadas de privativas as competências para instituir tributos diversos de impostos.

Destacando-se para a União a competência para instituir o Empréstimo Compulsório (artigo 148, CF) e as Contribuições Especiais (artigo 149, “caput”, CF), para os Estados e o Distrito Federal a competência privativa para instituir as contribuições previdenciárias dos seus servidores, esta que é privativa em cada esfera, conforme declina o artigo 149, § 1º da Constituição Federal, já na esfera de competência dos Municípios e também Distrito Federal, tem-se a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (artigo 149-A, CF).

2. Competência comum

A competência comum refere-se aos tributos chamados vinculados, ou seja, taxas e contribuições de melhoria, que por sua natureza são oriundos de atividades do Estado. Dize-se competência comum em virtude de poder ser exercida pelas quatro pessoas jurídicas de direito público, União, Estados, o Distrito Federal e os Municípios.

Frise-se que para exercer tal competência, deve haver uma contra prestação estatal da pessoa política respectiva, vez que a competência comum vincula-se a um serviço público específico e divisível, ou ainda, ao exercício do poder de polícia, prestado por determinado ente, o qual poderá cobrar a respectiva taxa. E ainda, caberá ao ente responsável pela realização de obra pública, da qual decorra valorização de imóvel particular, instituir a contribuição de melhoria decorrente da obra pública.

Cabe aqui a transcrição literal do artigo 145 da Constituição Federal que dispõe:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...]

II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;

III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.

Portanto, a competência comum é aquela atribuída, “de modo comum”[3], aos entes políticos, para que estes instituam os mesmos tributos contraprestacionais, respeitando o vínculo entre o serviço prestado ou a atividade exercida por cada ente, dentro de sua esfera de atuação administrativa.

3. Competência cumulativa

A competência cumulativa adstringe-se à União e ao Distrito Federal, outorgada a estes pela Constituição Federal no artigo 147: "Competem à União, em Território Federal, os impostos estaduais e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais; ao Distrito Federal cabem os impostos municipais".

O dispositivo é bastante esclarecedor, de modo que a simples leitura já seria suficiente para a elucidação do tema. Todavia, importante assinalar a peculiaridade do Distrito Federal no tocante ao dispositivo em tela, vez que consoante o artigo 32 da CF, não poderá ser dividido em Municípios, razão pela qual acumula as competências tributárias dos Estados e dos Municípios.

Logo, tem o Distrito Federal competência para instituir seis impostos, sendo três estaduais e três municipais, previstos nos artigos 155 e 156 da Constituição da Federal.

No tocante aos Territórios Federais, se faz indispensável dizer que atualmente não existem em nosso país, entretanto, sua criação ainda é possível e prevista na Carta Magna de nossa nação no artigo 18, §2º.

Apesar de inexistentes, importante dizer que esta regra de competência se aplica aos Territórios, em razão destes não possuírem status de membros da Federação, razão pela qual os impostos estaduais e municipais, caso o Território não se subdividam em Municípios, serão de competência da União.

4. Competência especial

A competência especial se refere à instituição dos empréstimos compulsórios e contribuições especiais, previstos nos artigos 148 e 149 da Constituição Federal respectivamente. Tal nomenclatura classificatória foi dada em razão da discussão doutrinária a respeito da natureza tributária destas duas receitas[4]

Os empréstimos compulsórios são tributos autônomos, instituídos pela União, em virtude de três situações específicas, calamidade pública, guerra externa e investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, e ainda, com cláusula de restituição[5].

Igualmente peculiar, se mostra a natureza das contribuições especiais, que na esfera federal, subdividem-se em profissionais ou corporativas, interventivas ou CIDEs, e ainda contribuições social-previdenciárias, prevista no artigo 195 da Constituição Federal. Já em âmbito estadual e municipal existem as contribuições sociais para os servidores públicos dos Estados, Distrito Federal e Municípios, consoante artigo 149, §1º da Magna Carta.

Cumpre mencionar ainda, a Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP ou COSIP), a cargo dos Municípios e Distrito Federal, conforme prevê o artigo 149-A da Constituição Federal.

Diante da natureza tributária dos empréstimos compulsórios e das contribuições especiais, convencionou-se doutrinariamente, após largo período de discussões a respeito do tema, classificar o poder para instituir tais tributos, de competência especial.

5. Competência residual

A competência residual surge da possibilidade dada pelo constituinte originário à União de instituir imposto diverso dos já existentes e previstos na Constituição Federal, tal competência encontra endosso no artigo 154, I do Texto Maior, o qual vale citar:

Art. 154. A União poderá instituir:

I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição; [...]

Nas palavras do professor Luciano Amaro, “diz-se residual a competência (atribuída a União) atinente aos outros impostos que podem ser instituídos sobre situações não previstas” [6].

Ao atribuir tal competência à União, o constituinte também impôs limitações ao exercício de tal poder, devendo o citado ente político atentar para a necessidade de lei complementar, respeitando ainda o princípio da não cumulatividade, bem como a proibição de coincidência entre o fato gerador ou a base de cálculo do novo imposto com o de outros impostos já discriminados na Constituição.

Cabe mencionar ainda, a competência residual da União para instituição de contribuições para a seguridade social, com previsão no artigo 195, § 4º, da Constituição Federal, dispositivo este de citação indispensável, o qual prevê:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: [...]

§ 4º - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I.

O raciocínio para instituição de novas contribuições para custeio da seguridade social segue praticamente os mesmos parâmetros sobreditos, vez que o próprio dispositivo aduz que a matéria deverá respeitar o comando descrito no artigo 154, I, da Constituição Federal.

Logo, deverá ser instituída por lei complementar, respeitando também o princípio da não cumulatividade, e a proibição de coincidência da base de cálculo ou do fato gerador com o de outras contribuições, e não de impostos, como aduz o artigo 154, I, do Texto Magno.

Abrindo-se aqui um parêntese específico, para frisar que tal entendimento decorre da adaptação feita pelo Supremo Tribunal Federal à norma supracitada, de modo que o fato gerador ou a base de cálculo não poderão coincidir com o fato gerador ou a base de cálculo de outras contribuições.

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Nessa esteira o posicionamento posto por Eduardo Sabbag que diz:

Esta “adaptação” adveio de exegese insculpida no STF, para o qual “não se aplica às contribuições sociais novas a segunda parte do inciso I do artigo 154 da Carta Magna, ou seja, que elas não devam ter fato gerador ou bases de cálculo próprios de impostos discriminados na Constituição”. Trata-se, pois, de uma inovação estrutural, quanto às demais contribuições, e não quanto aos impostos propriamente ditos[7].

Ademais, há que enfatizar que a competência residual exercida para os impostos ou a contribuição para a seguridade social, deve sempre observar a reserva de lei complementar, obstando seu exercício por medida provisória, nos moldes do artigo 62, § 1º, III, da Carta da República[8].

6. Competência extraordinária

A competência extraordinária é o poder outorgado à União para instituir o imposto extraordinário de guerra (IEG), por meio de lei ordinária, consoante disposto no art. 154, II, da Carta Maior c/c o artigo 76 do Código Tributário Nacional:

Constituição Federal:

Art. 154. A União poderá instituir: [...]

II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.

Código Tributário Nacional:

Art. 76. Na iminência ou no caso de guerra externa, a União pode instituir, temporariamente, impostos extraordinários compreendidos ou não entre os referidos nesta Lei, suprimidos, gradativamente, no prazo máximo de cinco anos, contados da celebração da paz.

Importante mencionar, que diferentemente do que ocorre com o Empréstimo Compulsório, o Imposto Extraordinário de Guerra pode ser instituído por medida provisória, pois, como já mencionado acima, a instituição por medida provisória somente é vedada para os casos de reserva de lei complementar.

Ademais, não é restituível e não tem sua receita vinculada a determinada despesa que o fundamentou[9], o que também se mostra divergente do Empréstimo Compulsório, que tem receita afetada à despesa que o fundamentou e é restituível.


REFERÊNCIAS

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 6. ed. são Paulo: Método, 2012.

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BORBA, Cláudio. Direito Tributário. 22ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

BRASIL. Código Tributário Nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172.htm>. Acesso em 20. out. 2012.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 10. out. 2012.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional.  São Paulo: Saraiva, 2009.

DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Manual de Direito Tributário. 4ed. Ed. Saraiva: 2008.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 30.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009.

MARCELO, Alexandrino de. Direito Constitucional. 15. Ed. São Paulo: Atlas, 2004.

NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de direito tributário, 14. ed. São Paulo: Saraiva.

PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado.  9. Ed. – São Paulo: Método, 2012.

SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 26. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.


NOTAS

[1] Art. 154. A União poderá instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição;

[2] Art. 154. [...] II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.

[3] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 344.

[4] BORBA, Cláudio. Direito Tributário. 22ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. p. 75.

[5] Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, "b". Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.

[6] AMARO, Luciano. Direito Tributário. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 95.

[7] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 349.

[8] Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. § 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: [...] III – reservada a lei complementar;

[9] Art. 167. São vedados: [...] IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo; 

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Sobre o autor
William Moraes

Bacharel em Direito, Pós-graduado em Direito Tributário. Professor de cursos de graduação e pós-graduação.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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