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Direito ao devido processo legal

Direito ao devido processo legal

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O devido processo legal pressupõe uma imputação acusatória certa e determinada, permitindo que o réu, conhecendo perfeita e detalhadamente a acusação que se lhe pesa, possa exercitar a sua defesa plena.

1. INTRODUÇÃO

O direito ao devido processo legal vem consagrado pela Constituição Federal no art. 5º., LIV e LV, ao estabelecer que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal e ao garantir a qualquer acusado em processo judicial o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Além destes dois incisos outros há que também compõem o leque de garantias judiciais estabelecidas na Carta Magna, a saber: "ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante", "inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra, da casa, da correspondência, das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas e da imagem das pessoas", "não haverá juízo ou tribunal de exceção", "não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal", "a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu", "nenhuma pena passará da pessoa do acusado", "individualização da pena", "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente", "inadmissibilidade, no processo, das provas obtidas por meio ilícitos", "não culpabilidade até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória", "publicidade dos atos processuais", "direito ao silêncio", etc.

Todas estas garantias estão estabelecidas taxativamente no texto constitucional, algumas com ressalvas, evidentemente.

Assim, do ponto de vista da Constituição Federal, o devido processo legal pressupõe o contraditório (paridade de armas, a defesa se pronunciar sempre depois da acusação, etc), a garantia da ampla defesa (defesa técnica e autodefesa), o duplo grau de jurisdição, a proibição das provas ilícitas, etc., etc., etc.


2. O CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

Por sua vez, o nosso velho Código de Processo Penal, em que pese estar absolutamente ultrapassado, mesmo porque concebido sob uma ótica não democrática e com sérios resquícios de inquisitoriedade, de toda maneira, ali e acolá, traz algo garantidor, por assim dizer. A propósito, os arts. 233 ("as cartas particulares, interceptadas ou obtidas por meios criminosos, não serão admitidas em juízo"), 261 ("nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor"), 194/262 ("curador ao réu menor"), 310 ("liberdade provisória"), 366 ("impossibilidade de julgamento à revelia de réu citado por edital"), 381 ("motivação das sentenças", em conformidade com o art. 93, IX da Constituição), etc.

Aliás, não se pode mesmo esperar algo melhor do nosso Código de Processo Penal, pois sendo do ano de 1941, e tendo sofrido ao longo desse período poucas alterações, não acompanhou as mudanças sociais ocorridas no País, bem como a nova ordem constitucional vigente.

O seu surgimento, em pleno Estado-Novo 1, traduziu de certa forma a ideologia de então, mesmo porque "las leyes son e deben ser la expresión más exacta de las necesidades actuales del pueblo, habida consideración del conjunto de las contingencias históricas, en medio de las cuales fueron promulgadas" (grifo nosso). 2

À época tínhamos em cada Estado da Federação um Código de Processo Penal, pois desde a Constituição Republicana a unidade do sistema processual penal brasileiro fora cindida, cabendo a cada Estado da Federação a competência para legislar sobre processo, civil e penal, além da sua organização judiciária.

Como notara o mestre Frederico Marques, "o golpe dado na unidade processual não trouxe vantagem alguma para nossas instituições jurídicas; ao contrário, essa fragmentação contribuiu para que se estabelecesse acentuada diversidade de sistemas, o que, sem dúvida alguma, prejudicou a aplicação da lei penal." 3

Até que em 03 de outubro de 1941 promulgou-se o Decreto-Lei nº. 3.689, que entraria em vigor a partir de 1º. de janeiro do ano seguinte; para resolver principalmente questões de natureza de direito intertemporal, promulgou-se, também, o Decreto-Lei nº. 3.931/41, a Lei de Introdução ao Código de Processo Penal.

Este Código, elaborado, portanto, sob a égide e "os influxos autoritários do Estado Novo", decididamente não é, como já não era "um estatuto moderno, à altura das reais necessidades de nossa Justiça Criminal", como dizia Frederico Marques. Segundo o genial mestre paulista, "continuamos presos, na esfera do processo penal, aos arcaicos princípios procedimentalistas do sistema escrito (...) O resultado de trabalho legislativo tão defeituoso e arcaico está na crise tremenda por que atravessa hoje a Justiça Criminal, em todos os Estados Brasileiros. (...) A exemplo do que se fizera na Itália fascista, esqueceram os nossos legisladores do papel relevante das formas procedimentais no processo penal e, sob o pretexto de por cobro a formalismos prejudiciais, estruturou as nulidades sob princípios não condizentes com as garantias necessárias ao acusado, além de o ter feito com um lamentável confusionismo e absoluta falta de técnica." 4

Assim, se o velho Código de Processo Penal teve a vantagem de proporcionar a homogeneidade do processo penal brasileiro, trouxe consigo, até por questões históricas, o ranço de um regime totalitário e contaminado pelo fascismo, ao contrário do que escreveu na exposição de motivos o Dr. Francisco Campos, in verbis: "Se ele (o Código) não transige com as sistemáticas restrições ao poder público, não o inspira, entretanto, o espírito de um incondicional autoritarismo do Estado ou de uma sistemática prevenção contra os direitos e garantias individuais."

É bem verdade que ao longo dos seus 60 anos de existência, algumas mudanças pontuais foram marcantes e alvissareiras como, por exemplo, o fim da prisão preventiva obrigatória com a edição das Leis de nºs. 5.349/67, 8.884/94, 6.416/77 e 5.349/67; a impossibilidade de julgamento do réu revel citado por edital que não constituiu advogado (Lei nº. 9.271/96); a revogação do seu art. 35, segundo o qual a mulher casada não poderia exercer o direito de queixa sem o consentimento do marido, salvo quando estivesse separada dele ou quando a queixa contra ele se dirigisse (Lei nº. 9.520/97); modificações no que concerne à prova pericial (Lei nº. 8.862/94); a possibilidade de apelar sem a necessidade de recolhimento prévio à prisão (Lei nº. 5.941/73); a revogação dos artigos atinentes ao recurso extraordinário (Lei nº. 3.396/58), etc.

Por outro lado, leis extravagantes procuraram aperfeiçoar o nosso sistema processual penal, podendo citar as que instituíram os Juizados Especiais Criminais (Leis nºs. 9.099/95 e 10.259/01), e que constituem, indiscutivelmente, o maior avanço já produzido em nosso sistema jurídico processual, desde a edição do Código de 1941. Há, ainda, a que disciplinou a identificação criminal (Lei nº. 10.054/00); a proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas (Lei nº. 9.807/99); a que possibilitou a utilização de sistema de transmissão de dados para a prática de atos processuais (Lei nº. 9.800/99); a lei de interceptações telefônicas (Lei nº. 9.296/96); a Lei nº 8.038/90, que disciplina os procedimentos nos Tribunais, e tantas outras, algumas das quais, é bem verdade, de duvidosa constitucionalidade.

Este é o quadro atual. Além de algumas alterações pontuais, seja no próprio texto consolidado, seja por intermédio de leis esparsas, nada mais foi feito para modernizar o nosso diploma processual penal, mesmo após a nova ordem constitucional consagrada pela promulgação da Carta Política de 1988.

E, assim, o atual código continua com os vícios de 60 anos atrás, maculando em muitos dos seus dispositivos o sistema acusatório, o devido processo legal, não tutelando satisfatoriamente direitos e garantias fundamentais do acusado (vide o seu art. 594, a título de exemplo), olvidando-se da vítima, refém de um excessivo formalismo (que chega a lembrar o velho procedimentalismo), assistemático e confuso em alguns dos seus títulos e capítulos (bastando citar a disciplina das nulidades 5).

Atento a esta realidade, o então Ministro da Justiça, Dr. José Carlos Dias, ao assumir o Ministério, editou o Aviso nº. 1.151/99, convidando o Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP, do qual somos membros, a apresentar uma proposta de reforma do nosso Código de Processo Penal. Este mesmo Ministro, agora por via da Portaria nº. 61/00 constituiu uma Comissão para o trabalho de reforma, tendo como membros os juristas Ada Pellegrini Grinover (Presidente), Petrônio Calmon Filho (Secretário), Antônio Magalhães Gomes Filho, Antônio Scarance Fernandes, Luiz Flávio Gomes, Miguel Reale Júnior, Nilzardo Carneiro Leão, René Ariel Dotti (que mais tarde saiu, sendo substituído por Rui Stoco), Rogério Lauria Tucci e Sidnei Beneti.

Com a inesperada e lamentável saída do Ministro Dias o novo titular da Pasta, Dr. José Gregori, pela Portaria nº. 371/00 confirmou a Comissão anteriormente formada, com a substituição já referida.

Ao final dos trabalhos, a Comissão de juristas entregou ao Ministério da Justiça, no dia 06 de dezembro de 2000, sete anteprojetos (todos acompanhados de uma exposição de motivos) que, por sua vez, originaram os seguintes projetos de lei:

  1. Projeto de lei nº. 4.209/01: investigação criminal;

  2. Projeto de lei nº. 4.207/01: suspensão do processo/procedimentos;

  3. Projeto de lei nº. 4.205/01: provas;

  4. Projeto de lei nº. 4.204/01: interrogatório/defesa legítima;

  5. Projeto de lei nº. 4.208/01: prisão/medidas cautelares e liberdade;

  6. Projeto de lei nº. 4.203/01: júri;

  7. Projeto de lei nº. 4.206/01: recursos e ações de impugnação.

Estes projetos originários da referida Comissão (pois já há outros, absolutamente inaceitáveis e retrógrados) têm como finalidades precípuas a modernização do velho código e a sua adaptação ao modelo acusatório, com os seus consectários lógicos, tais como a distinção nítida entre o julgador, o acusador e o acusado, a publicidade, a oralidade, o contraditório, etc.

Sobre o sistema acusatório, assim escreveu Vitu:

"Ce système procédural se retrouve à l’origine des diverses civilisations méditerranéennes et occidentales: en Grèce, à Rome vers la fin de la Republique, dans le droit germanique, à l’époque franque et dans la procédure féodale.

"Ce système, qui ne distingue pás la procédure criminelle de la procédure, se caractérise par des traits qu’on retrouve dans les différents pays qui l’ont consacré.

"Dans l’organisation de la justice, la procédure accusatoire suppose une complète égalité entre l’accusation et la défense." 6

Para Afrânio Silva Jardim, "o devido processo legal está vinculado diretamente à depuração do sistema acusatório, mormente quando conjugado com a regra do art. 129, I do novo texto constitucional, bem como com as demais normas que sistematizam e asseguram a independência do Poder Judiciário, em prol de sua imparcialidade e neutralidade na prestação jurisdicional e aquelas outras que, igualmente, tutelam a autonomia e independência funcional dos órgãos do Ministério Público." 7

Esta reforma está mais ou menos consentânea com os princípios estabelecidos pelo Projeto de Código Processual Penal-Tipo para Ibero América. Neste Código-Modelo há alguns princípios básicos, a saber:

  1. "O julgamento e decisão das causas penais será feito por juízes imparciais e independentes dos poderes do Estado, apenas sujeitos à lei." (art. 2º.).

  2. "O imputado ou acusado deve ser tratado como inocente durante o procedimento, até que uma sentença irrecorrível lhe imponha uma pena ou uma medida de segurança." (art. 3º.).

  3. "A dúvida favorece o imputado". (idem).

  4. "É inviolável a defesa no procedimento." (art. 5º.).

Tais idéias serviram também de base para outras reformas feitas (ou por serem realizadas) em outros países, como a Argentina, Guatemala, Costa Rica, El Salvador, Chile, Venezuela, Bolívia, Paraguai, Honduras, Equador, Itália e Portugal. 8

Aliás, "el Derecho procesal penal de los países latinoamericanos, observado como conjunto, ingresó, a partir de la década del’80, en un período de reformas totales, que, para el lector europeo, puede compararse con la transformación que sufrió el Derecho procesal penal de Europa continental durante el siglo XIX. No se trata, así, de modificaciones parciales a un sistema ya adquirido y vigente, sino, por lo contrario, de una modificación del sistema según otra concepción del proceso penal. Descrito sintéticamente, se puede decir que este proceso de reformas consiste en derogar los códigos antiguos, todavía tributarios de los últimos ejemplos de la Inquisición – recibida con la conquista y la colonización del continente -, para sancionar, en más o en menos, leyes procesales penales conformes al Estado de Derecho, con la aspiración de recibir en ellas la elaboración cumplida en la materia durante el siglo XX." 9

Pode-se, portanto, inferir que as reformas processuais penais já levadas a cabo em vários países da América Latina e por virem em tantos outros, são frutos, na verdade, de modificações no sistema político destes países que foram, paulatinamente, saindo de períodos autoritários para regimes democráticos. É como se a redemocratização impulsionasse o sistema processual do tipo inquisitivo para o sistema acusatório. Aliás, é inquestionável a estreita ligação entre o sistema processual penal de um país e o seu sistema político. Um país democrático [10 evidentemente deve possuir, até porque a sua Constituição assim o obriga, um Código de Processo Penal que adote o sistema acusatório, eminentemente garantidor. Ao contrário, em um sistema autoritário, o processo penal, a serviço do Poder, olvida os direitos e garantias individuais básicos, privilegiando o sistema inquisitivo, caracterizado, como genialmente escreveu Ferrajoli, por "una confianza tendencialmente ilimitada en la bondad del poder y en su capacidad de alcanzar la verdad". O sistema inquisitivo, portanto, "confía no sólo la verdad sino también la tutela del inocente a las presuntas virtudes del poder que juzga". 11

Assim, a "uniformidade legislativa latino-americana – na verdade compreendendo agora a comunidade cultural de fala luso-espanhola – apoiada em bases comuns e sem prejuízo das características próprias de cada região, é uma velha aspiração de muitos juristas do nosso continente. Além disso, ela foi o sonho de alguns grandes homens, fundadores de nossos países ou de nossas sociedades políticas. (...)

"Em nossos países, geralmente, a justiça penal tem funcionado como uma ‘caixa-preta’, afastada do controle popular e da transparência democrática. O apego aos rituais antigos; As fórmulas inquisitivas, que na cultura universal já constituem curiosidades históricas; a falta de respeito à dignidade humana; a delegação das funções judiciais; o segredo; a falta de imediação; enfim, um atraso político e cultural já insuportável, tornam imperioso começar um profundo movimento de reforma em todo o continente." 12

É evidente que o ideal seria uma reforma total, completa, que propiciasse uma harmonia absoluta no sistema processual penal, com a garantia absoluta do devido processo legal, mas, como sabemos, se assim o fosse as dificuldades que já existem hoje, seriam ainda maiores. Preferiu-se, de outro modo, uma reforma que, se não chega a ser total (o que seria de difícil aprovação, à vista das evidentes dificuldades de natureza legislativa que todos nós conhecemos), também não chega a ser simplesmente pontual, até porque, como esclarece Ada, não incide "apenas sobre alguns dispositivos, mas toma por base institutos processuais inteiros, de forma a remodelá-los completamente, em harmonia com os outros." Não é, portanto, uma reforma isolada, mas "tópica". 13

Este movimento reformista não se limita à América Latina. Na Europa também se encontram em franco desenvolvimento reformas no sistema processual penal. A título de exemplo, podemos referir a Alemanha, onde "también el Derecho procesal penal há sido modificado en varias ocasiones entre 1997-2000" 14, a Itália 15 e a Polônia, país que "desde hace 12 años se realizan reformas en la legislación, relacionadas con el cambio de régimen político, económico y social, que tuvo lugar en 1989 y también con la necesidad de adaptar las soluciones jurídicas polacas a las soluciones aceptadas en la Unión Europea. (...) Las reformas de la legislación penal e procesal penal constituyen una parte esencial del ‘movimiento legislativo reformador’, segundo nos informa a Drª. Barbara Kunicka-Michalska, do Instituto de Ciências Jurídicas da Academia de Ciências da Polônia, em Varsóvia. 16


3. OS PACTOS INTERNACIONAIS

Por outro lado, além do texto constitucional e do Código de Processo Penal, devemos nos referir aos pactos internacionais subscritos e adotados pelo nosso Direito Positivo.

Assim, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos firmado em Nova York, em 19 de dezembro de 1966 e promulgado pelo Governo brasileiro através do Decreto nº. 592/92, estabelece em suas cláusulas alguns preceitos garantidores e reveladores de um devido processo legal, assim como o Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969, promulgado entre nós pelo Decreto nº. 678/92.

Nestes documentos, verbi gratia, encontramos o direito à não auto-incriminação, à "presunção de inocência", a um julgamento sem dilações indevidas (ver adiante), à ampla defesa (idem), à publicidade do processo, dentre outras.


4. A AMPLA DEFESA

A ampla defesa compõe-se da defesa técnica e da autodefesa. O defensor exerce a defesa técnica, específica, profissional ou processual, que exige a capacidade postulatória e o conhecimento técnico. O acusado, por sua vez, exercita ao longo do processo (quando, por exemplo, é interrogado) a denominada autodefesa ou defesa material ou genérica. Ambas, juntas, compõem a ampla defesa.

A propósito, veja-se a definição do jurista espanhol Miguel Fenech:

"Se entiende por defensa genérica aquella que lleva a cabo la propia parte por sí mediante actos constituídos por acciones u omisiones, encaminados a hacer prosperar o a impedir que prospere la actuación de la pretensión.. No se halla regulada por el derecho con normas cogentes, sino con la concesión de determinados derechos inspirados en el conocimientode la naturaleza humana, mediante la prohibición del empleo de medios coactivos, tales como el juramento – cuando se trata de la parte acusada – y cualquier otro género de coacciones destinadas a obtener por fuerza y contra la voluntad del sujeto una declaración de conocimiento que ha de repercutir en contra suya".

Para ele, diferencia-se esta autodefesa da defesa técnica, por ele chamada de específica, processual ou profissional, "que se lleva a cabo no ya por la parte misma, sino por personas peritas que tienen como profesión el ejercicio de esta función técnico-jurídica de defensa de las partes que actuán en el processo penal para poner de relieve sus derechos y contribuir con su conocimiento a la orientación y dirección en orden a la consecusión de los fines que cada parte persigue en el proceso y, en definitiva, facilitar los fines del mismo". 17

Ressalte-se que o defensor não é parte, nem sujeito processual, nem, tampouco, substituto processual, agindo apenas como um representante técnico da parte; neste mister, parece-nos que cabe a este profissional exercitar a sua defesa mesmo contra a vontade do réu, até porque o direito de defesa é indisponível: "En interés del hallazgo de la verdad y de una defensa efectiva, puede, sin duda, actuar también en contra de la voluntad del inculpado, por ejemplo, interponer una solicitud para que se examine su estado mental". 18

Admite-se, por exemplo, a interposição de recurso mesmo contra a vontade do réu, pois "deve, como regra geral, prevalecer a vontade de recorrer, só se admitindo solução diversa quando, por ausência do interesse-utilidade, não seja possível vislumbrar, em face de circunstâncias do caso, vantagem prática para o acusado." Isto ocorre por que a regra da disponibilidade dos recursos "sofre exceções no processo penal, em que a relação jurídica de direito material controvertida é de natureza indisponível, havendo limitações à disponibilidade dos recursos quando estejam em jogo os direitos de acusar e de defender." Assim, "havendo conflito de vontades entre o réu e o advogado, a opinião mais coerente com as garantias da defesa é a de que deve prevalecer a vontade do defensor, que recorreu, não só em razão de seus conhecimentos técnicos, mas sobretudo para melhor garantia do direito de defesa." 19

A respeito deste tema, recentemente decidiu o STJ no sentido do texto:

"Em homenagem ao princípio constitucional da ampla defesa, na hipótese de conflito entre o réu, que renunciou ao direito de recorrer da sentença condenatória, e seu defensor, prevalece a vontade da defesa técnica, com idoneidade para avaliar as conseqüências da não impugnação da decisão condenatória."

(STJ, HC 18.400-SP, Rel.: Min. VICENTE LEAL, DJU de 06/05/2002, p. 321).

Consta do voto do Relator:

"Examinando-se a hipótese «sub examen», é de se reconhecer a procedência do pedido. Ora, em homenagem ao princípio constitucional da ampla defesa, na hipótese de conflito entre o réu, que renunciou ao direito de recorrer da sentença condenatória, e seu defensor, prevalece a vontade da defesa técnica, com idoneidade e conhecimento para avaliar as conseqüências da não impugnação da decisão condenatória. É o que bem ressalta a ilustre Subprocuradora-Geral da República em seu parecer, «verbis»: «De fato, embora o réu seja o legítimo titular do direito de recorrer, a defesa técnica há de preponderar sobre a autodefesa, no que tange ao recurso, tendo em vista que o profissional especializado possui melhores condições de avaliar a conveniência ou não das medidas legais a serem utilizadas, para um patrocínio o mais eficaz possível, dos interesses do outorgante. Para reforçar ainda mais a tese da ilustre Procuradora de Estado impetrante - que, ressalte-se, apesar de toda a sobrecarga notoriamente conhecida no âmbito das Defensorias Públicas, vem, «in casu» zelar firmemente pelos interesses de um paciente que renunciou ao seu direito -, vê-se que, apesar de o Termo de Renúncia ao Direito de Recurso haver sido assinado por Ademilton Messias Rosa (fl. 14), não existe, mesmo, naquele ato, qualquer indício de haver sido o paciente assistido por um defensor." (fls. 93/94).

Vejamos outros julgados do mesmo STJ a respeito da matéria, citados, inclusive, nesta decisão unânime:

"Processual penal. «Habeas corpus». Extorsão. Apelação. Divergência entre réu e defensor. Havendo conflito entre o réu, que renunciou ao direito de recorrer da sentença condenatória, e o seu defensor, que interpôs apelação, deve prevalecer a manifestação deste, tendo em vista que, por ter conhecimentos técnicos, em tese, está em melhores condições para avaliar a necessidade da impugnação.«Habeas corpus» deferido."

(HC 15.983, Quinta Turma, Rel. em. Min. Félix Fischer, DJ 20/08/2001).

"Criminal. HC. Roubo tentado. Recurso de apelação. Conflito entre as vontades do réu e de seu defensor. Preponderância da vontade do defensor. Conhecimento técnico. Apelo em liberdade. Demora não-razoável no julgamento do recurso. Constrangimento ilegal. Ordem concedida.

I. Na hipótese de conflito entre a vontade do réu e a de seu defensor, no que se refere à interposição de recurso, tendo em vista a renúncia do acusado ao direito de recorrer, prevalece a vontade do defensor, constituído ou nomeado, em razão do conhecimento técnico para avaliar as conseqüências da não impugnação da decisão penal condenatória.

II.(...)

III. Ordem concedida para determinar que o e. Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo proceda ao julgamento do mérito do recurso de apelação interposto em favor de Edgar Santos Pereira, permitindo-se-lhe aguardar em liberdade tal desfecho."

(HC 15.693/SP, Quinta Turma, rel. em. Min. Gilson Dipp, DJ 27/08/2001).

"Processo penal. Direito irrenunciável do réu de recorrer. 1. Pode o defensor interpor recurso, embora o réu tenha se manifestado em sentido contrário, posto que irrenunciável o seu direito de recorrer, em face do princípio da ampla defesa, devendo aquele decidir sobre a conveniência ou não do exercício da faculdade de apelar.

2. Recurso do MP não conhecido."

(REsp 120.170/DF, Sexta Turma, Rel. em. Min. Fernando Gonçalves, DJ 30/06/97).

É evidente que todo acusado deve obrigatoriamente ser defendido por um profissional do Direito, a fim de que se estabeleça íntegra a ampla defesa, sendo imperioso destacar que o direito de defesa no Processo Penal deve ser rigorosamente obedecido, sob pena de nulidade:

"Para que haya un proceso penal propio de un Estado de Derecho es irrenunciable que el inculpado pueda tomar posición frente a los reproches formulados en su contra, y que se considere en la obtención de la sentencia los puntos de vista sometidos a discusión". 20

Mesmo para o réu ausente ou foragido é indispensável, sob pena de nulidade absoluta, que se lhe nomeie um defensor; se menor de 21 anos, além do defensor, necessário se faz a presença também de um curador, ressalvando a súmula 352 do STF.

O defensor nomeado ou dativo será obrigado a aceitar a defesa, sob pena de responder por infração disciplinar (art. 34, XII, do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil). Se, porém, o acusado para o qual o Juiz nomeou um defensor na realidade não for pobre, será obrigado a pagar os honorários advocatícios arbitrados pelo Juiz (art. 263, parágrafo único, CPP).

A constituição de advogado no processo penal pode ser feita por procuração ou por indicação verbal quando da realização do interrogatório, dispensando-se, neste último caso, a juntada do instrumento procuratório. Ainda que inicialmente tenha sido nomeado um defensor dativo, pode o acusado a qualquer momento constituir um profissional de sua confiança (art. 263, caput).

Aliás, em razão de entendermos que a ampla defesa pressupõe necessariamente a autodefesa e a defesa técnica é que pugnamos pela necessidade da presença do advogado no interrogatório, sob pena de se ferir o devido processo legal.

É bem verdade que se discute na doutrina se, nesta fase, é necessária a presença de advogado. Boa parte entende que sim tendo em vista o disposto nos arts. 261 e 263 do CPP. Neste sentido, Tourinho Filho, Frederico Marques e Espínola Filho. Há quem entenda, porém, a sua desnecessidade por se tratar de um momento processual típico da autodefesa (e não defesa técnica), podendo, ademais, haver retratação a qualquer instante. A jurisprudência claramente se inclina neste segundo sentido, a ponto do próprio Tourinho Filho observar que "nunca se anulou qualquer processo pelo não-comparecimento do Advogado ao ato do interrogatório". 21

Mirabete, por exemplo, acompanhando esta corrente jurisprudencial majoritária, sustenta que "a presença do defensor no interrogatório é apenas facultativa, já que não pode normalmente intervir nesse ato processual, razão por que a sua ausência não constitui nulidade no processo (RT 600/369, 610/407, JTACrSP 59/340)".

Em posição contrária, defende Ferrajoli "el derecho del imputado a la asistencia y, en todo caso, a la presencia de su defensor en el interrogatorio, para impedir abusos o cualesquiera violaciones de las garantias procesales". 22

Recentemente, porém, a Suprema Corte, através de um dos seus mais destacados Ministros, Celso de Mello, através de liminar concedida em Mandado de Segurança (acima referido) deixou assentado que "cabe reconhecer, por isso mesmo, que a presença do advogado em qualquer procedimento estatal, independentemente do domínio institucional em que esse mesmo procedimento tenha sido instaurado, constitui fator inequívoco de certeza de que os órgãos do Poder Público (Legislativo, Judiciário e Executivo) não transgredirão os limites delineados pelo ordenamento positivo da República, respeitando-se, em conseqüência, como se impõe aos membros e aos agentes do aparelho estatal, o regime das liberdades públicas e os direitos subjetivos constitucionalmente assegurados às pessoas em geral, inclusive àquelas eventualmente sujeitas, qualquer que seja o motivo, a investigação parlamentar, ou a inquérito policial, ou, ainda, a processo judicial". Esperamos que tal decisão seja confirmada no mérito, assentando-se definitivamente em nossa práxis forense a necessidade do defensor no ato de interrogatório do réu, como ocorreu no julgamento a seguir descrito:

"NULIDADE. INTERROGATÓRIO. AUSÊNCIA DE ADVOGADO. Nulo é o processo em que o acusado é interrogado sem a presença de advogado defensor. Agressão aos princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º., LV, da Constituição Federal). Nulidade decretada a partir, inclusive, do interrogatório."

(Apelação Criminal nº. 70001997402 – TJRGS – 5ª. Câmara Criminal – Rel. Des. Amilton Bueno de Carvalho – j. 14/02/01).

A propósito, observamos que o acima referido Projeto de Lei nº. 4.204/01 estabelece a obrigatoriedade da presença de advogado, nomeado ou constituído, quando do interrogatório do acusado, pois a nova redação do art. 185 assim prescreve: "O acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado."


5. O CONTRADITÓRIO

Não há devido processo legal sem o contraditório, que vem a ser, em linhas gerais, a garantia de que para toda ação haja uma correspondente reação, garantindo-se, assim, a plena igualdade de oportunidades processuais.

O contraditório, por exemplo, obriga que a defesa fale sempre depois da acusação. Assim, no Processo Penal as testemunhas arroladas na peça acusatória são inquiridas em primeiro lugar (art. 396, CPP), as alegações finais do réu são oferecidas também anteriormente as do acusador (art. 500), e assim por diante...

Questão que se mostra polêmica é o parecer do Ministério Público na segunda instância.

Como se sabe, na segunda instância o Ministério Público, por intermédio de um Procurador de Justiça, exara um parecer escrito antes do respectivo processo criminal ser encaminhado para julgamento. É um privilégio que parece ferir alguns princípios basilares e algumas regras orientadoras do processo penal, como tentaremos mostrar a seguir.

Com efeito, sempre nos pareceu que este pronunciamento do Procurador de Justiça na segunda instância, ainda que na condição de custos legis, soava estranho, mesmo porque fiscal da lei também é o Promotor de Justiça atuante junto à primeira instância e, no entanto, nunca se dispensou a ouvida da defesa... Para nós, este privilégio fere o contraditório (ação versus reação), a isonomia (paridade de armas), o devido processo legal (a defesa fala por último) e a ampla defesa (direito do acusado de ser informado também por último).

A propósito, ouçamos a boa doutrina, capitaneada por Frederico Marques:

"Bem de ver é, porém, que na Justiça criminal, se apresenta algo esdrúxula essa função consultiva do procurador-geral, uma vez que o Ministério Público está constituído, precipuamente, como órgão da ação penal e da pretensão punitiva do Estado. Além disso, não se compadece muito com a estrutura contraditória do processo penal pátrio, e com as garantias de defesa plena do réu, que fale em último lugar um órgão investido de funções nitidamente persecutórias. Daí se nos afigurar errônea e infeliz a disposição contida no art. 610 do CPP, sobre a abertura de vista ao procurador-geral." 23

Vejamos agora outro grande processualista, Tourinho Filho:

"Mal saídos de uma fatigante atividade combativa, assumem função completamente imparcial, própria dos fiscais da lei e, muitas vezes, com várias e honrosas exceções, o custos legis é traído pelo Acusador, quebrando, assim, uma regra decorrente do devido processo legal, segundo a qual a Defesa fala por último... Ademais, o Procurador de Justiça, membro que é do Ministério Público, não pode ficar eqüidistante das partes. Entranhada e psicologicamente tem laços com uma delas. É difícil o corte desse cordão umbilical. E, para evitar essas traições, a nosso ver, deveria o Ministério Público, na segunda instância, limitar-se à análise dos processos sob o aspecto formal, deixando a apreciação do mérito aos Tribunais." 24

Então, pergunta-se: "no processo penal, quando o processo atinge o grau recursal qual das partes fala por último? O réu ou o Ministério Público? Os arts. 610 e 613 do Código de Processo Penal nos dão a resposta: o Ministério Público manifesta-se depois da defesa e, ordinariamente, a defesa sequer tem vista do que foi oficiado pelo MP – a não ser que requeira vista dos autos e se lhe for concedida. Alguns autores fundamentam tais incompreensíveis dispositivos legais com a função de fiscal da lei que o MP desempenharia nos recursos criminais. Ora, não se pode confundir a função de parte com a de fiscal da lei. No processo criminal por ação de iniciativa pública é o MP, uno e indivisível, quem oferece denúncia; é ele quem postula a aplicação da sanção penal; e é ele quem, mesmo em grau de recurso, tem legitimidade para sustentar oralmente o recurso do promotor, visando, até, à majoração da pena. Então, não se pode falar que o mesmo órgão publico, o mesmo órgão do Estado, possa ser, ao mesmo tempo, fiscal da lei e parte, ao ponto de, na instância recursal, desaparecer a parte, permanecendo apenas o fiscal da lei, em uma estranha ação penal sem autor." 25

Veja-se este recente julgado do Superior Tribunal de Justiça:

"Ministério Público. Atuação. Parte. A Turma, por maioria, concedeu a ordem para anular o processo a partir do julgamento, por entender que, na hipótese, o Ministério Público, além de atuar como fiscal da lei, era também parte, e como tal, à luz da Constituição vigente, não pode proferir sustentação oral depois da defesa.

(HC 18.166-SP, Rel. originário Min. Fernando Gonçalves, Rel. para o acórdão Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 19/02/2002).

Observa-se que é possível, ainda que em grau de recurso, haja a feitura de diligências ordenadas pelo relator, por força do art. 616 do Código de Processo Penal. Nesta hipótese, perguntamos quem estaria representando o Ministério Público nesta nova instrução. Evidentemente que se a diligência (uma acareação, por exemplo) fosse realizada no próprio Tribunal somente um Procurador de Justiça poderia atuar, o que vem a corroborar o fato de que, além de fiscal da lei, continua ele como representante da parte acusadora. Neste aspecto, veja-se a lição de Ada, Scarance e Gomes Filho: "o tribunal poderá livremente apreciar, no recurso, aspectos que não foram suscitados pelas partes. Se o entender conveniente, converterá o julgamento em diligência para a produção de novas provas, destinadas à formação do convencimento de seus membros e poderá excluir as que considerar ilícitas do material probatório; se o considerar oportuno, poderá reinquirir o réu e será livre para levantar novas teses jurídicas. Apenas, deverá garantir que tudo isso seja feito em contraditório, na presença das partes, dando a estas a oportunidade de contradizer, inclusive provando. O contraditório, na melhor doutrina, não se limita às questões de fato, devendo abranger as questões de direito que o juiz levantar de ofício (Tarzia)." 26

Por outro lado, simplesmente suprimir o parecer ministerial não é possível, sob pena de se incorrer em nulidade absoluta, tendo em vista o disposto no art. 564, III, d do Código de Processo Penal. 27


6. O DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

O devido processo legal deve igualmente garantir a possibilidade de revisão dos julgados. A falibilidade humana e o natural inconformismo de quem perde estão a exigir o reexame de uma matéria decidida em primeira instância, a ser feito por juízes coletivos e magistrados mais experientes.

A Constituição Federal prevê o duplo grau de jurisdição, não somente no já referido art. 5º., LV, como também no seu art. 93, III ("acesso aos tribunais de segundo grau") e pressupõe, evidentemente, uma decisão judicial e a sucumbência (prejuízo). Ademais, para recorrer deve-se atentar para pressupostos de natureza subjetiva, a saber: o interesse e a legitimidade.

Há mais de vinte anos, o jurista baiano Calmon de Passos mostrava a sua preocupação com "a tendência, bem visível entre nós, em virtude da grave crise que atinge o Judiciário, de se restringir a admissibilidade de recursos, de modo assistemático e simplório, em detrimento do que entendemos como garantia do devido processo legal, incluída entre as que são asseguradas pela nossa Constituição."

Neste mesmo trabalho, nota o eminente Mestre que "o estudo do duplo grau como garantia constitucional desmereceu, da parte dos estudiosos, em nosso meio, considerações maiores. Ou ele é simplesmente negado como tal ou, embora considerado como ínsito ao sistema, fica sem fundamentação mais acurada, em que pese ao alto saber dos que o afirmam, certamente por força da larga admissibilidade dos recursos em nosso sistema processual, tradicionalmente, sem esquecer sua multiplicidade." 28

Tal garantia se encontra também estabelecida na Convenção América de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), no seu art. 8º., 2, "h".


7. O JUIZ E O PROMOTOR NATURAL

Questão importante, e que se prende intimamente ao devido processo legal, é o princípio do Promotor Natural 29 que pressupõe a independência funcional do membro do Ministério Público (art. 127, § 1º., CF), a sua inamovibilidade (art. 128, § 5º., I, b), a investidura por concurso público e a determinação legal e anterior de suas atribuições.

A independência e a autonomia funcionais, ambas consagradas no art. 127, §§ 1º. e 2º. da Constituição Federal, são princípios que compõem a figura do Promotor Natural, advertindo-se, desde logo, que a "autonomia funcional atinge o Ministério Público enquanto instituição, e a cada um dos seus membros, enquanto agentes políticos." 30

Sobre o assunto, o velho Bento de Faria já escrevia:

"O Ministério Público, como fiel fiscal da lei, não poderia ficar constrangido a abdicar das suas convicções, quando devidamente justificadas. Do contrário seria um instrumento servil da vontade alheia." 31

O grande Roberto Lyra já afirmava que "nem o Procurador-Geral, investido de ascendência hierárquica, tem o direito de violentar, por qualquer forma, a consciência do Promotor Público, impondo os seus pontos de vista e as suas opiniões, além do terreno técnico ou administrativo."

Para este autor (que dedicou toda a sua vida ao estudo do Direito Criminal e ao Ministério Público, a ponto de ser chamado por Evandro Lins e Silva de o "Príncipe dos Promotores Públicos brasileiros") "quanto ao elemento intrínseco, subjetivo, dos atos oficiais, na complexidade, na sutileza, na variedade de seus desdobramentos, como a apreciação da prova, para a denúncia, a pronúncia, o pedido de condenação, a apelação, a liberdade provisória ou a prisão preventiva, é na sua consciência livre e esclarecida, elevada a um plano inacessível a quaisquer injunções ou tendências, que o Promotor Público encontra inspiração", concluindo "que a disciplina do Ministério Público está afeta ao Procurador-Geral. No entanto, esse não intervem na consciência do subordinado." 32

O saudoso Esmeraldino Bandeira já escrevia que o Promotor de Justiça na "sua palavra é absolutamente livre e independente, e em suas requisições não atende senão à sua consciência." 33

Ainda a propósito, certa vez um antigo Promotor de Justiça do Distrito Federal, Dr. Murillo Fontainha, ao recusar determinação do Procurador-Geral de oferecer denúncia em um caso, escreveu:

"No exercício das suas elevadas funções, o Ministério Público ‘só recebe instruções da sua consciência e da lei’ (Sentença do saudoso Magistrado Raul Martins, D. Oficial de 10 de outubro de 1914, p. 10.844) e ‘as ordens que o Chefe do Ministério Público tem o direito de impor aos seus inferiores são ordens que não afetem à consciência dos mesmos. E o Promotor, que fugindo aos impulsos da sua convicção, deixar-se sugestionar pelas imposições extrínsecas, é um que homem ultraja à sua consciência e um Magistrado que prostitui a lei. Vê, pois, V. Exª., que nas funções em que entra a convicção do Promotor, como elemento principal, a ordem do Chefe do Ministério Público não pode ter o caráter de preceito imperativo obrigatório’ (Auto Fontes, Questões Criminais p. 75-6)."

E continua adiante:

"Todas essas explanações evidenciam que nas hipóteses em que o Ministério Público tem que opinar da sua conduta no caso que lhe for concluso, quer de oportunidade ou cabimento de recurso legal a interpor, quer de apreciação sobre elementos para denúncias ou arquivamento de processos, só deve receber instruções da sua íntima convicção, de sua consciência. Nessa esfera, as instruções do Chefe do Ministério Público não podem penetrar, porque é a própria lei em vigor que o diz quando terminantemente dispõe que incumbe aos Promotores Públicos oferecer denúncia quando se convençam da existência de crimes de sua competência." (grifo nosso). 34

Em resposta, eis o que decidiu o Procurador-Geral de Justiça:

"Entende o Procurador-Geral que, na espécie, existem fartos elementos para instauração da ação penal, e, não podendo determinar ao Dr. 1º Promotor Público que ofereça denúncia, sujeitando-se às sanções legais, em caso de recusa, por haver cessado a sua competência no juízo da 4ª Vara Criminal, recomendo ao seu substituto ofereça denúncia contra aqueles indiciados." 35 (grifo nosso).

Encerremos, então, com mais esta lição do grande Lyra:

"Decairia de sua própria independência moral o Promotor Publico se ficasse sujeito, em matéria opinativa, às injunções, quer dos juizes, quer dos chefes, esses funcionários da confiança do Governo. Ocorreria ainda o perigo de, indiretamente, submeter-se o Promotor Público ao arbítrio oficial no desempenho de uma tarefa de sutilíssima subjetividade." (p. 176).

Ao lado do Promotor Natural, fundamental que tenhamos, também, o Juiz Natural, figura consagrada no art. 5º., XXXVII e LIII da Constituição, bem como nos arts. 8º. e 10º. da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

O Juiz Natural é aquele constitucional, legal e previamente competente para julgar determinada causa criminal, imparcial e independente, garantindo-se-lhe a inamovibilidade (arts. 95, II e 93, VIII, CF/88), a irredutibilidade de vencimentos (art. 95, III, CF/88) e a vitaliciedade (art. 95, I, CF/88).


8. O DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE

Compõe também o devido processo legal a possibilidade de se aguardar em liberdade o recurso interposto contra uma sentença condenatória penal.

É bem verdade que pela regra imposta no art. 594 do Código de Processo Penal, "o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime que se livre solto."

Assim, em relação ao condenado que não seja primário e não tenha bons antecedentes, dois ônus a ele se impõem por força de lei: a prisão automática decorrente da sentença condenatória (salvo se se livrar solto ou prestar fiança, sendo esta cabível) e a impossibilidade de recorrer se não for recolhido à prisão.

Na verdade, se nos limitarmos a interpretar literalmente este artigo chegaremos forçosamente à conclusão que ele afronta a Constituição (e, portanto, é inválido) em pelo menos duas oportunidades: 1ª.) quando o texto constitucional garante a presunção de inocência 36) e 2ª.) quando assegura a ampla defesa, com os recursos a ela inerentes.

Ora, se o art. 5º., LVII, da Constituição proclama que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória", é de todo inadmissível que alguém seja preso antes de definitivamente julgado, salvo a hipótese desta prisão provisória se revestir de caráter cautelar, independentemente de primariedade e de bons antecedentes. Soa, portanto, estranho alguém ser presumivelmente considerado não culpado (pois, ainda não foi condenado definitivamente) e, ao mesmo tempo, ser obrigado a se recolher à prisão, mesmo não representando a sua liberdade nenhum risco seja para a sociedade, seja para o processo, seja para a aplicação da lei penal. Mais estranho se nos afigura ao atentarmos que aquela presunção foi declarada constitucionalmente.

Desta forma, esta prisão provisória, anterior a uma decisão transitada em julgado, só se revestirá de legitimidade caso seja devidamente fundamentada (art. 5º., LXI, CF/88) e reste demonstrada a sua necessidade (periculum libertatis) 37.

No mesmo passo, há a segunda questão: se a Constituição também assegura aos acusados em geral a ampla defesa com os recursos a ela inerentes, parece-nos também claro que uma lei infraconstitucional não poderia condicionar este direito de recorrer àquele que não tem bons antecedentes e não é primário, ao recolhimento à prisão. Observa-se que esta regra legal está complementada no artigo seguinte, segundo o qual "se o réu condenado fugir depois de haver apelado, será declarada deserta a apelação." (art. 595, CPP).

Da mesma forma, agora igualmente soa estranho para nós não se permitir ao acusado o acesso ao duplo grau de jurisdição, quando não seja primário e não tenha bons antecedentes.

Não esqueçamos que a "adoção do duplo grau de jurisdição deixa de ser uma escolha eminentemente técnica e jurídica e passa a ser, num primeiro instante, uma opção política do legislador." 38

Apesar do texto constitucional não conter expressamente a garantia do duplo grau de jurisdição (como ocorre com a presunção de inocência), é indiscutível o seu caráter de norma materialmente constitucional, mormente porque o Brasil ratificou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) que prevê em seu art. 8º., 2, h, que todo acusado de delito tem "direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior", e tendo-se em vista o estatuído no § 2º., do art. 5º., da CF/88, segundo o qual "os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte." Ratificamos, também, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque que no seu art. 14, 5, estatui que "toda pessoa declarada culpada por um delito terá o direito de recorrer da sentença condenatória e da pena a uma instância superior, em conformidade com a lei."

É bem verdade que a doutrina se debate a respeito da posição hierárquica que ocupam as normas advindas de tratado internacional. Parte dela entende que caso a norma internacional trate de garantia individual, terá ela status constitucional, até por força do referido § 2º.

Fábio Comparato, por exemplo, informa que "a tendência predominante, hoje, é no sentido de se considerar que as normas internacionais de direitos humanos, pelo fato de expressarem de certa forma a consciência ética universal, estão acima do ordenamento jurídico de cada Estado. (...) Seja como for, vai-se afirmando hoje na doutrina a tese de que, na hipótese de conflitos entre regras internacionais e internas, em matéria de direitos humanos, há de prevalecer sempre a regra mais favorável ao sujeito de direito, pois a proteção da dignidade da pessoa humana é a finalidade última e a razão de ser de todo o sistema jurídico" 39: é o chamado princípio da prevalência da norma mais favorável. 40

Ada, Dinamarco e Araújo Cintra, após admitirem a indiscutível natureza política do princípio do duplo grau de jurisdição ("nenhum ato estatal pode ficar imune aos necessários controles") e que ele "não é garantido constitucionalmente de modo expresso, entre nós, desde a República", lembram, no entanto, que a atual Constituição "incumbe-se de atribuir a competência recursal a vários órgãos da jurisdição (art. 102, II; art. 105, II; art. 108, II), prevendo expressamente, sob a denominação de tribunais, órgãos judiciários de segundo grau ( v.g. , art. 93, III)." 41

Resta-nos, então, já que legem habemus, interpretar este dispositivo legal (infraconstitucional e fruto de uma lei de 1973) à luz da Constituição Federal, a fim de que possamos entendê-lo ainda como válido, fazendo, porém, uma leitura efetivamente garantidora.

Ora, se temos a garantia constitucional da presunção de inocência, é evidente que não pode ser efeito de uma sentença condenatória recorrível, pura e simplesmente, um decreto prisional, sem que se perquira quanto à necessidade do encarceramento.

Como sabemos, entre nós, cabível será a prisão preventiva sempre que se tratar de garantir a ordem pública, a ordem econômica, ou por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. São estes os requisitos da prisão preventiva e que configuram exatamente o periculum libertatis. Estes requisitos, portanto, representam a necessidade da prisão preventiva, que não é outra coisa senão uma medida de natureza flagrantemente cautelar, pois visa a resguardar, em última análise, a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal (há, ainda, os pressupostos desta prisão, que não nos interessam no presente estudo).

Se assim o é, fácil é interpretar este artigo 594 da seguinte forma e nos seguintes termos: a prisão será uma decorrência de uma sentença condenatória recorrível sempre que, in casu, fosse cabível a prisão preventiva contra o réu, independentemente de sua condição pessoal de primário e de ter bons antecedentes; ou seja, o que definirá se o acusado aguardará preso ou em liberdade o julgamento final do processo é a comprovação da presença de um daqueles requisitos acima referidos.

Conclui-se que a necessidade é o fator determinante para alguém aguardar preso o julgamento final do seu processo, já que a Constituição garante que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória."

Por outro lado, como a ampla defesa (e no seu bojo a garantia do duplo grau de jurisdição) também está absolutamente tutelada pela Carta Magna, o artigo ora analisado não pode ser interpretado literalmente, porém, mais uma vez, em conformidade com aquele Diploma, lendo-o da seguinte forma: não se pode condicionar a admissibilidade da apelação ao recolhimento do réu à prisão, mesmo que ele não seja primário e não tenha bons antecedentes. Aqui, vamos, inclusive, mais além: mesmo que a prisão seja necessária (e se revista, portanto, da cautelaridade típica da prisão provisória), ainda assim, admitir-se-á o recurso, mesmo que não tenha sido preso o acusado, ou que, após ser preso, venha a fugir.

Observa-se que, agora, mesmo sendo cabível o encarceramento provisório (por ser, repita-se, necessário), o não recolhimento do acusado não pode ser obstáculo à interposição de eventual recurso da defesa, e se recurso houver, a fuga posterior não lhe obstará o regular andamento (não pode ser considerado deserto).

Não concordamos, outrossim, que a exigência da prisão para recorrer seja uma "regra procedimental condicionante do processamento da apelação", como pensa Mirabete 42, pois, como contrapõe Luiz Flávio Gomes, "se não ofende a presunção de inocência ou a ampla defesa, indiscutivelmente ofende o princípio da necessidade de fundamentação da prisão, inscrito no art. 5º., LXI." 43

Vê-se que não optamos pela interpretação literal do art. 594, o que seria desastroso, tendo em vista as garantias constitucionais acima vistas. Por outro lado, utilizamo-nos do critério da interpretação conforme a Constituição, procurando adequar o texto legal com o Texto Maior e evitando negar vigência ao dispositivo, mas, antes, admitindo-o válido a partir de uma interpretação garantidora e em consonância com a Constituição.

Afinal de contas, como já escreveu Cappelletti, "a conformidade da lei com a Constituição é o lastro causal que a torna válida perante todas." 44

Devemos atentar que o presente artigo foi inserido em nosso código processual penal pela Lei nº. 5.941/73, época em que vigiam em nosso País a Constituição anterior a 1988 (que não trazia o princípio da presunção de inocência) e um regime político não democrático.

Naquele contexto histórico, portanto, fácil era entender que uma lei ordinária viesse a dificultar o direito ao recurso e a prever a prisão automática decorrente de sentença condenatória recorrível. Bastava a sentença condenatória e a prisão impunha-se automaticamente, por força de lei, presumindo-se a culpabilidade ou a periculosidade do réu. 45

Ocorre que desde 1988 temos outra Constituição, com outros princípios, muitos dos quais expressamente previstos (o que não impede a existência de princípios constitucionais implícitos, como, v.g., o da proporcionalidade). A lei anterior, então, tem que ser interpretada segundo este critério, ou seja, em conformidade com a nova ordem constitucional (sob pena de ser considerada não recepcionada e, logo, inválida), evidentemente sem ultrapassar o seu sentido literal, apenas conformando-a com a Constituição.

Como dissemos, no tempo em que foi inserida em nosso sistema jurídico, a lei traduzia, em verdade, o momento histórico em que vivia o País, cabendo, por isso mesmo, atentarmos, agora, para o elemento histórico-teleológico (concepção subjetivista da interpretação, ou teoria da vontade), segundo o qual a lei obedece ao tempo em que foi intencionalmente (finalisticamente) concebida, devendo ser interpretada preferencialmente em conformidade com aquela realidade.

James Goldshimidt já afirmava no clássico "Problemas Jurídicos e Políticos del Proceso Penal" que a estrutura do processo penal de um país indica a força de seus elementos autoritários e liberais. 46

Devemos, então, buscar abrigo neste elemento histórico, acomodando a lei às "novas circunstâncias não previstas pelo legislador", especialmente aos "princípios elevados a nível constitucional". 47

Só poderíamos interpretar este artigo literalmente se este modo interpretativo fosse possível à luz da Constituição. Por outro lado, não entendemos ser o caso de, simplesmente, reconhecer inválida a norma insculpida naquele artigo de lei. A nós nos parece ser possível interpretá-la em conformidade com o texto constitucional, sem que se o declare inválido e sem "ultrapassar os limites que resultam do sentido literal e do contexto significativo da lei." 48

Se verdade é que "por detrás da lei está uma determinada intenção reguladora, estão valorações, aspirações e reflexões substantivas, que nela acharam expressão mais ou menos clara", também é certo que "uma lei, logo que seja aplicada, irradia uma acção que lhe é peculiar, que transcende aquilo que o legislador tinha intentado. A lei intervém em relações da vida diversas e em mutação, cujo conjunto o legislador não podia ter abrangido e dá resposta a questões que o legislador ainda não tinha colocado a si próprio. Adquire, com o decurso do tempo, cada vez mais como que uma vida própria e afasta-se, deste modo, das idéias dos seus autores." (grifo nosso): teoria objetivista ou teoria da interpretação imanente à lei. 49

Portanto, não se pode ler o artigo 594 e inferir, hoje, o que se traduz gramaticalmente desta leitura. A interpretação literal efetivamente deve ser o início do trabalho, mas não o completa satisfatoriamente. 50

Em reforço à tese ora esboçada, ilustra-se dizendo que o projeto de lei de reforma do Código de Processo Penal, expressamente, revoga os arts. 594 e 595 do atual CPP. Na respectiva exposição de motivos, justifica-se a revogação afirmando que teve "como objetivo definir que toda prisão antes do trânsito em julgado final somente pode ter o caráter cautelar. A execução ‘antecipada’ não se coaduna com os princípios e garantias do Estado Constitucional e Democrático de Direito." São os novos tempos...

Vê-se que "las leyes son e deben ser la expresión más exacta de las necesidades actuales del pueblo, habida consideración del conjunto de las contingencias históricas, en medio de las cuales fueron promulgadas." (grifo nosso) 51

Ademais, atentando-se, outrossim, para o sistema jurídico e fazendo uma interpretação sistemática do dispositivo 52, assinalamos que, posteriormente a ele, surgiu no cenário jurídico brasileiro a Lei nº. 8.072/90 (Crimes Hediondos), dispondo que "em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade." (art. 2º., § 2º., com grifo nosso). 53

Atenta-se, com Maximiliano, que o "Direito objetivo não é um conglomerado caótico de preceitos; constitui vasta unidade, organismo regular, sistema, conjunto harmônico de normas coordenadas, em interdependência metódica, embora fixada cada uma no seu lugar próprio." 54

Veja-se a propósito a seguinte decisão do STJ:

DIREITO PROCESSUAL Penal. TRAFICO DE ENTORPECENTE. CONDENAÇÃO. DENEGAÇÃO DO APELO EM LIBERDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.

1. Permanece o entendimento anterior da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, quanto à exigência de fundamentação da negativa do apelo em liberdade de réu condenado por tráfico de entorpecente, em processo a que respondeu solto, não bastando a simples referência ao artigo 35 da Lei de Tóxicos (parágrafo 2° do artigo 2° da Lei 8.072/90).

2. Ordem concedida.

(HABEAS CORPUS Nº 11.738 – PE [1999/0120892-0), DJU 24.09.01, SEÇÃO 1, P. 346, J. 23.05.01, RELATOR: MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO)

Para finalizar, recorremos, mais uma vez, a Larenz:

"Mediante a interpretação ‘faz-se falar’ o sentido disposto no texto, quer dizer, ele é enunciado com outras palavras, expressado de modo mais claro e preciso, e tornado comunicável. A esse propósito, o que caracteriza o processo de interpretação é que o intérprete só quer fazer falar o texto, sem acrescentar ou omitir o que quer que seja. Evidentemente que nós sabemos que o intérprete nunca se comporta aí de modo puramente passivo." 55


9. O EXCESSO PRAZAL

O devido processo legal pressupõe, outrossim, um procedimento sem dilações indevidas. O excesso prazal macula o processo e obriga a soltura do réu preso, ainda que presentes os requisitos da prisão cautelar.

É lição antiga da doutrina que tal situação processual é absolutamente inadmissível, ainda mais se tratando de acusado preso.

Ary Franco, por exemplo, já pontificava há tempos:

"A questão relativa ao prazo de encerramento da instrução criminal sempre foi preocupação máxima dos poderes públicos, por isso mesmo que é mister acautelar os interesses do réu, que não pode nem deve, como elemento da sociedade, ficar indefinidamente à espera de que os órgãos da sociedade que integram o Poder Judiciário ultimem a sua situação de acusado, para declará-lo inocente, ou não." 56

Outro antigo processualista, Câmara Leal, já indicava como causa justificadora para a concessão de habeas corpus "quando, estando o réu preso em flagrante ou preventivamente, não é o processo julgado dentro do prazo legal, exceto se ocorrer legítimo impedimento." 57

Vicente de Azevedo, outro saudoso jurista, enfrentando esta mesma questão, alertava que acaso não concedido, em tais hipóteses, o habeas corpus acabaria "o réu cumprindo a pena cominada em abstrato na lei penal antes de julgado" 58...

A doutrina mais recente, por sua vez, é uníssona, bastando ser citados, por todos, Frederico Marques e Tourinho Filho, respectivamente:

"A manutenção do réu sob carcer ad custodiam não pode, em regra, exceder o prazo legal. (...) No Direito inglês é observado, com sumo rigor, o preceito que veda manter-se preso o réu, demoradamente, sem julgamento definitivo. Entre nós, isso nem sempre acontece, o que é injusto e iníquo." 59

É o que vimos neste processo.

"Se o réu não pode ser culpado pela inobservância do prazo, é o habeas corpus o meio idôneo para pôr cobro à coação cautelar, por não se conter esta nos limites temporais em que a lei permite a vulneração da incoercibilidade no âmbito da liberdade de ir e vir." 60

Não esqueçamos que há entendimento jurisprudencial solidamente firmado no sentido de que a instrução criminal no processo de rito ordinário deve se encerrar em um prazo máximo de 81 dias se o réu estiver preso (se solto, não necessariamente). Este prazo é contado individuadamente e não conglobadamente, não se podendo compensar o atraso em uma fase com a agilização em uma posterior (há quem prefira a contagem global). Ex.: as testemunhas arroladas pela acusação devem ser ouvidas em vinte dias se o réu estiver preso; se este prazo não for obedecido, não se compensa o atraso com um posterior adiantamento da fase seguinte e assim por diante... O constrangimento ilegal pela demora no término do respectivo ato processual surge imediatamente, independentemente do ato subseqüente.

Acompanhando este entendimento pretoriano, a Lei nº. 9.034/95, que disciplina o combate às ações praticadas por organizações criminosas, estabeleceu expressamente o prazo de 81 dias para o encerramento da instrução criminal em caso de réu preso e de 120 dias se solto ele estiver (art. 8º.).

De toda forma, a injustificada demora processual acarreta constrangimento ilegal a ser remediado via habeas corpus, salvo se o atraso foi causado exclusivamente pela defesa. Nesse sentido, a Súmula 64, do STJ, in verbis: "Não constitui constrangimento ilegal o excesso de prazo na instrução, provocado pela defesa". Este mesmo Tribunal Superior também sumulou que "encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo" (Súmula 52). Vê-se que nenhuma das duas súmulas pode ser aplicada a este caso.

É verdade que alguns motivos às vezes justificam o atraso e impedem a alegação de constrangimento ilegal. Cita-os, exemplificando, Mirabete: processo em que há vários réus envolvidos, necessidade de instauração de incidente de insanidade mental, citação editalícia, etc. 61 A doença do réu ou do seu defensor, a complexidade da causa ou outro motivo de força maior também justificam a demora (art. 403, CPP). Nada disto, porém, aconteceu na presente hipótese, tudo a corroborar o evidente constrangimento ilegal ora suportado, e desde há muito, pelo acusado.

Esta questão da demora no julgamento de um processo criminal, mormente quando se trata de réu preso, é causa de preocupações inclusive na doutrina alienígena, a ponto de estar expressamente consignado no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos firmado em Nova York, em 19 de dezembro de 1966 a seguinte cláusula:

"3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, a, pelo menos, as seguintes garantias:

(...)

"c) De ser julgado sem dilações indevidas" (art. 14, 3, c).

Igualmente lê-se no Pacto de São José da Costa Rica:

"Art. 8º. – Garantias Judiciais

"1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente..." (grifo nosso).

No mesmo sentido, confira-se a Convenção européia para salvaguarda dos direitos do homem e das liberdades fundamentais, art. 6º., 1.

Na atual Carta Magna espanhola, art. 24, 2, temos:

"Asimismo, todos tienen derecho (...) a un proceso público sin dilaciones indebidas y con todas las garantías..." (grifo nosso)

Do mesmo modo a VI Emenda à Constituição americana:

"Em todas as causas criminais, o acusado gozará do direito a um juízo rápido e público..."

É o direito ao speedy trial.

Aliás, determina o nosso Código de Processo Penal dever o Juiz consignar nos autos sempre que a instrução terminar fora do prazo (art. 402).

Muito a propósito deste processo, vejamos três julgados do STJ:

"Configura-se o excesso de prazo, autorizável do habeas corpus, quando constatada a desídia do Juízo."

(STJ – RHC – Rel. Pedro Acioli – RSTJ 51/370).

"Configurando o excesso de prazo a que não deu causa a defesa, configurado está o constrangimento ilegal. Foi a receita do legislador para que o Estado não ficasse indefinidamente com um acusado sob sua custódia, privado de liberdade, seu bem mais sagrado, sem o devido processo legal. É a maneira da Lei, denunciando a desídia dos agentes do poder público, estancar a coação ilegal que vez por outra se perpetra em nome do Estado."

(STJ – 5ª. Turma – HC 5284 – Rel. Min. Edson Vidigal – j. 04/03/97 – DJU 05/05/97, p. 17.062).

"Comprovado excesso de prazo ensejador da impetração, e restando claro que a demora na instrução criminal ocorre por culpa do Juízo processante, há que ser concedido o benefício requerido."

(STJ – RHC – Rel. Min. Edson Vidigal – RSTJ 12/138 e RT 668/345).


10. A PEÇA ACUSATÓRIA

O devido processo legal também pressupõe uma imputação acusatória certa e determinada, permitindo que o réu, conhecendo perfeita e detalhadamente a acusação que se lhe pesa, possa exercitar a sua defesa plena.

Por isso, inadmissível a aceitação da denúncia genérica no Processo Penal, bem como da chamada imputação alternativa, assim definida e aceita por Afrânio Silva Jardim: "diz-se imputação alternativa quando a peça acusatória vestibular atribui ao réu mais de uma conduta penalmente relevante, asseverando que apenas uma delas efetivamente terá sido praticada pelo imputado, embora todas se apresentem como prováveis, em face da prova do inquérito. Desta forma, fica expresso, na denúncia ou queixa, que a pretensão punitiva se lastreia nesta ou naquela ação narrada.

"Por outro lado, como veremos mais adiante, a alternatividade também pode referir-se ao sujeito ativo da infração penal, acarretando um litisconsórcio no pólo passivo da relação processual penal." 62

Para o autor carioca, a imputação alternativa, portanto, poderá ser real (objetiva) quando por mais de um fato delituoso é acusado alguém; ou pessoal (subjetiva) quando mais de uma pessoa é acusada, alternativamente. É a chamada cumulação imprópria de pedidos. 63

Entre nós poucos doutrinadores enfrentaram esta questão. Frederico Marques, ainda que sem muita fundamentação, admite-a, afirmando que não há nada que a impeça, "pois que em face de uma situação concreta, que se apresenta equívoca, pode o acusador atribuir um ou outro fato ao réu. Não será motivo de escândalo – diz Pasquale Saraceno – a citação ‘de Tício como acusado de furto ou de receptação’.

"Também Luigi Sansò admite la imputazione alternativa, uma vez que se traduza em acusação explícita, dizendo, por isso, que é perfeitamente ‘concebível a imputação alternativa do fato delituoso’. E isto quer se trate de alternativa entre um aliud e um aliud, e de alternativa entre um majus e um minus, visto que em ambos os casos há fatos diversos imputados ao réu." 64

Não admitimos qualquer imputação alternativa, pois estamos convencidos que toda acusação, seja pública, seja de iniciativa privada, deverá sempre ser determinada, especificando-se, inclusive, o mais possível, em que consistiu a conduta delituosa e a participação de cada um dos autores do fato, salvo absoluta impossibilidade. 65

Se o "quadro probatório relativamente incerto constante do inquérito policial" 66 não permite uma imputação certa, que sejam devolvidos os autos para novas e esclarecedoras diligências.

O que não podemos admitir é que o réu tenha que se defender não se sabe exatamente de que, ou que alguém tenha que enfrentar todos os percalços de um processo criminal sem que tenha sido imputado a ele, de uma maneira mais ou menos certa (a denúncia exige, no mínimo, indícios da autoria) um fato delituoso.

Ademais, nos moldes em que se dá a imputação alternativa, não poderá o acusado defender-se satisfatoriamente, já que dois fatos lhe foram imputados não cumulativamente. O réu precisa (e tem o direito) de saber qual a infração penal que se lhe atribuem, a fim de que possa, com o seu advogado, exercer a defesa em sua plenitude (defesa técnica + autodefesa).

Por tudo quanto exposto, não entendemos possível, à luz do devido processo legal, a imputação alternativa, seja a real (ou objetiva) seja a pessoal (ou subjetiva).


11. CONCLUSÃO

Estes são, em linhas gerais, os aspectos mais importantes que envolvem o direito ao devido processo legal. É evidente que há outros e muito mais poderíamos escrever. Não esquecemos, evidentemente, das provas ilícitas, do ne procedat judex ex officio, do princípio da correlação entre acusação e sentença, e tantos outros.

De toda maneira, importante extrairmos esta lição de Bobbio e o faremos a título de conclusão:

"Não é difícil prever que, no futuro, poderão emergir novas pretensões que no momento nem sequer podemos imaginar, como o direito a não portar armas contra a própria vontade, ou o direito de respeitar a vida também dos animais e não só dos homens. O que prova que não existem direitos fundamentais por natureza. O que parece fundamental numa época histórica e numa determinada civilização não é fundamental em outras épocas e em outras culturas." 67


NOTAS

  1. Período que abrange parte do governo de Getúlio Vargas (1937 – 1945) que encomendou ao jurista Francisco Campos uma nova Constituição, extra-parlamentar, revogando a então Constituição legitimamente outorgada ao País por uma Assembléia Nacional Constituinte (1934).

  2. Fiore, Pascuale, De la Irretroactividad e Interpretación de las Leyes, Madri: Reus, 1927, p. 579 (tradução do italiano para o espanhol de Enrique Aguilera de Paz).

  3. Marques, José Frederico, Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 104.

  4. Ob. cit. p. 108.

  5. Comentando a respeito do Título que trata das nulidades no processo penal, o saudoso Frederico Marques adverte que "não primou pela clareza o legislador pátrio, ao disciplinar o problema das nulidades processuais penais, pois os respectivos artigos estão prenhes de incongruências, repetições e regras obscuras, que tornam difícil a sistematização coerente de tão importante instituto. (...) Ainda aqui, dá-nos mostra o CPP dos grandes defeitos de técnica e falta de sistematização que pululam em todos os seus diversos preceitos e normas, tornando bem patente a sua tremenda mediocridade como diploma legislativo" (ob. cit., Vol. II, p. 366/367).

  6. Vitu, André, Procédure Pánale, Paris: Presses Universitaires de France, 1957, p. 13/14.

  7. Direito Processual Penal, Rio de Janeiro: Forense, 10ª. ed., 2001, p. 318.

  8. Grinover, Ada Pallegrini, "A reforma do Processo Penal", in www.direitocriminal.com.br, 15.01.2001.

  9. Maier, Julio B. J.. e Struensee, Eberhard, Las Reformas Procesales Penales en América Latina, Buenos Aires: Ad-Hoc, 2000, p. 17.

  10. Norberto Bobbio assinala, muito a propósito, que "Direitos do homem, democracia e paz são três momentos necessários do mesmo movimento histórico: sem direitos do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia; sem democracia, não existem as condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos. Em outras palavras, a democracia é a sociedade dos cidadãos, e os súditos se tornam cidadãos quando lhes são reconhecidos alguns direitos fundamentais", in A Era dos Direitos, Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992, p. 1.

  11. Ferrajoli, Luigi, Derecho y Razón, Madrid: Editorial Trotta, 3ª. ed., 1998, p. 604.

  12. Exposição de Motivos do Projeto de Código Processual Penal-Tipo para Ibero-América, com a colaboração dos Professores Ada Pellegrini Grinover e José Carlos Barbosa Moreira, in Revista de Processo, nº. 61, p. 111.

  13. Grinover, Ada Pallegrini, "A reforma do Processo Penal", in www.direitocriminal.com.br, 15.01.2001.

  14. Walter, Tonio, Professor da Universidade de Friburgo, in Revista Penal, "Sistemas Penales Comparados", Salamanca: La Ley, p. 133.

  15. Segundo Daniele Negri, da Universidade de Ferrara, "quizá nunca como en estos últimos cinco años había sufrido el procedimiento penal italiano transformaciones tan amplias, numerosas y frecuentes. (...) La finalidad de dotar de eficiencia a la Justicia se ha presentado como la auténtica meta de las innovaciones normativas que se han llevado a cabo en los últimos años (1997-2001).", in Revista Penal, "Sistemas Penales Comparados", Salamanca: La Ley, p. 157.

  16. Revista Penal, "Sistemas Penales Comparados", Salamanca: La Ley, p. 164.

  17. Miguel Fenech, Derecho Procesal Penal, Vol. I, 2ª. ed., Barcelona: Editorial Labor, S. A., 1952, p. 457.

  18. Klaus Tiedemann, Introducción al Derecho Penal y al Derecho Penal Procesal, Barcelona: Ariel, 1989, p. 185.

  19. Ada Pellegrini Grinover e outros, Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 3a. ed., 2001, págs. 42 e 130. Nesta matéria trava-se séria divergência jurisprudencial (veja-se na obra citada a página 79). Conferir também excelentes trabalhos de Sergio Demoro Hamilton, publicado na Revista Consulex, nº. 18, junho/1998, Afrânio Silva Jardim, Revista do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, nº. 07, 1998 e de Ana Sofia Schmidt de Oliveira, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim, nº. 48, junho/1996.

  20. Klaus Tiedemann, Introducción al Derecho Penal y al Derecho Penal Procesal, Barcelona: Ariel, 1989, p. 184.

  21. Ob. cit., p. 273.

  22. Ob. cit., p. 608.

  23. Elementos de Direito Processual Penal, Vol. IV, 1ª. ed., 2ª. tiragem, Campinas: Bookseller, 1998, p. 213.

  24. Código de Processo Penal comentado, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 4a. ed., 1998, p. 351.

  25. Castanho de Carvalho, Luis Gustavo Grandinetti, O Processo Penal em face da Constituição, Rio de Janeiro: Forense, 2ª. ed., 1998, p. 85. Nesta obra, em carta dirigida ao autor, Tourinho Filho reafirma a sua posição acima transcrita, nos seguintes termos: "Todos sabemos que os Procuradores eram Promotores. Como podem eles, da noite para o dia, perder a agressividade acusatória para adquirir a serenidade da toga? Com raríssimas exceções, os Procuradores quando se manifestam nas apelações e nos recursos em sentido estrito deixam entrever, com clareza, que o cordão umbilical que os liga à parte acusadora não foi cortado... Sendo assim, como podem atuar com imparcialidade? Ademais, como a defesa deve falar por último, a rigor, os autos deveriam sair da Procuradoria e ser encaminhados à OAB..." (p. 1).

  26. Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 3ª., ed, 2001, p. 52.

  27. Sobre o assunto, conferir Dóro, Tereza Nascimento Rocha / Grecco, Leonardo. O parecer acusatório do Procurador de Justiça nos autos da apelação criminal (Da notória desigualdade de armas no duelo entre promotor de justiça e advogado). Disponível na internet: https://direitocriminal.com.br, 05/10/2001.

  28. Estudos Jurídicos em Homenagem à Faculdade de Direito da Bahia, São Paulo: Saraiva, 1981, p. 88.

  29. A propósito, veja-se no STF o HC nº. 67.759, rel. Min. Celso de Mello.

  30. Hugo Nigro Mazzilli, Regime Jurídico do Ministério Público, São Paulo: Saraiva, 3ª. ed., 1996, p. 94.

  31. Código de Processo Penal, Vol. I, Rio de Janeiro: Record, 2ª. ed., 1960, 120.

  32. Teoria e Prática da Promotoria Pública, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2ª. ed., 1989, p. 158.

  33. Apud Roberto Lyra, obra citada, p. 160.

  34. Apud Roberto Lyra, obra citada, p. 164.

  35. Idem, p. 165.

  36. Tucci, respaldado pelas lições de Guglielmo Sabatini, prefere a expressão não-consideração prévia de culpabilidade, pois "l’imputato è sempre e solo imputato ai fini dello svolgimento del processo. Quindi non va considerato nè come innocente, nè come colpevole." (in Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro, São Paulo: Saraiva, 1993, p. 401). Outros autores falam em princípio da não-culpabilidade e, como Dotti, em princípio da incensurabilidade.

  37. Expressão preferida pelos italianos, ao invés do periculum in mora (cfr. Delmanto Junior, Roberto, in As Modalidades de Prisão Provisória e seu Prazo de Duração, Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 67).

  38. Moraes, Maurício Zanoide de, Interesse e Legitimação para Recorrer no Processo Penal Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 29.

  39. Apud Sylvia Helena de Figueiredo Steiner, A Convenção Americana sobre Direitos Humanos e sua Integração ao Processo Penal Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 91.

  40. "Este princípio, perseguido pelo direito internacional geral, e vigorosamente defendido por setores da doutrina brasileira, parece não haver ganho, até o presente, expressiva concreção na jurisprudência brasileira, devendo ser lembrada a questão do depositário infiel." (Bahia, Saulo José Casali, Tratados Internacionais no Direito Brasileiro, Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 116). O STF, reiteradamente, combate-o.

  41. Teoria Geral do Processo, São Paulo: Malheiros Editores, 1999, 15ª. ed., p. 74.

  42. Processo Penal, São Paulo: Atlas, 10ª. ed., 2000, p. 649.

  43. Direito de Apelar em Liberdade, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2ª. ed., p. 32.

  44. Apud José Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal, Campinas: Bookseller, 1998, Vol. I, p. 79.

  45. Ocorre que "nenhuma presunção emanada do legislador infraconstitucional pode prevalecer sobre a presunção constitucional", como diz Luiz Flávio Gomes, ob. cit., p. 26.

  46. Apud José Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 37.

  47. "Estes são, sobretudo, os princípios e decisões valorativas que encontram expressão na parte dos direitos fundamentais da Constituição, quer dizer, a prevalência da ‘dignidade da pessoa humana’ (...), a tutela geral do espaço de liberdade pessoal, com as suas concretizações (...) da Lei Fundamental." (Larenz, Karl, Metodologia da Ciência do Direito, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 3ª. ed., 1997, p. 479).

  48. Idem, p. 481

  49. idem, ibidem, p. 446.

  50. "Toda a interpretação de um texto há-de iniciar-se com o sentido literal" (idem, p. 450).

  51. Fiore, Pascuale, De la Irretroactividad e Interpretación de las Leyes, Madri: Reus, 1927, p. 579 (tradução do italiano para o espanhol de Enrique Aguilera de Paz).

  52. "Consiste o processo sistemático em comparar o dispositivo sujeito a exegese, com outros do mesmo repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto", segundo nos ensina Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, Rio de Janeiro: Freitas Bastos S/A, 1961, 7ª. ed., p. 164.

  53. Infelizmente já houve um retrocesso, pois a nova lei de tóxicos (Lei nº. 10.409/02, art. 46, § 12), estabelece que terão apenas efeito devolutivo os recursos interpostos contra as decisões proferidas no curso do respectivo procedimento, o que é lamentável.

  54. Idem, p. 165.

  55. Ob. cit., p. 441.

  56. Código de Processo Penal, Vol. II, Rio de Janeiro: Forense, 7ª. ed., 1960, p. 157.

  57. Comentários ao Código de Processo Penal Brasileiro, Vol. IV, 1943, p. 178.

  58. Curso de Direito Judiciário Penal, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 1958, p. 377.

  59. Elementos de Direito Processual Penal, Vol. IV, Campinas: Bookseller, 1ª. ed., 1998, págs. 370/371.

  60. Código de Processo Penal Comentado, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 6ª. ed., 2001, p. 460.

  61. Ob. cit., p. 476.

  62. Direito Processual Penal, Rio de Janeiro: Forense, 10ª. Ed., 2001, 149.

  63. A cumulação própria existe normalmente no Direito Processual Penal, seja nos casos de co-autoria, seja na hipótese de concurso de crimes.

  64. Elementos de Direito Processual Penal, Vol. II, Campinas: Bookseller, 1998, p. 153/154.

  65. Admitimos a chamada denúncia genérica, excepcionalmente, no caso, por exemplo, de um roubo praticado por várias pessoas, em concurso, sem que se possa estabelecer exatamente que Fulano se dirigiu ao caixa, Sicrano imobilizou o vigilante, Beltrano subtraiu o dinheiro dos caixas, etc.

  66. Afrânio, idem.

  67. A Era dos Direitos, Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992, p. 18.


Autor

  • Rômulo de Andrade Moreira

    Procurador-Geral de Justiça Adjunto para Assuntos Jurídicos do Ministério Público do Estado da Bahia. Foi Assessor Especial da Procuradoria Geral de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex- Procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador - UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador - UNIFACS (Curso então coordenado pelo Jurista J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais, do Instituto Brasileiro de Direito Processual e Membro fundador do Instituto Baiano de Direito Processual Penal (atualmente exercendo a função de Secretário). Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Integrante, por quatro vezes, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor convidado dos cursos de pós-graduação dos Cursos JusPodivm (BA), Praetorium (MG) e IELF (SP). Participante em várias obras coletivas. Palestrante em diversos eventos realizados no Brasil.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOREIRA, Rômulo de Andrade. Direito ao devido processo legal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 335, 1 jun. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5223. Acesso em: 4 maio 2024.