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A influência da religião na celebração de negócios jurídicos

A influência da religião na celebração de negócios jurídicos

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Este artigo diz respeito aos negócios jurídicos firmados sob a influência de grupos religiosos sobre os indivíduos envolvidos, bem como os negócios jurídicos firmados entre fiéis e as instituições religiosas a quem estão vinculados.

1. INTRODUÇÃO

O Poder Judiciário vem se deparando com uma série de ações que têm como pedido a anulação de doações realizadas em prol de instituições religiosas, com a alegação de vícios de vontade.

A priori, quando analisados externamente os casos, não há que se falar em anulação, uma vez que a pessoa doou por ato de sua vontade. Contudo, realizando-se uma análise do estado emocional, psicológico desta pessoa tem-se a presença de alguns problemas graves e que merecem atenção, que são a alienação religiosa e a coação.

E é com base nesses conceitos que a discussão neste artigo será travada, objetivando fazer uma análise sobre negócios jurídicos, em especial o instituto da doação, alienação religiosa, liberdade de consciência e de crença e, por fim, haverá a análise de alguns casos concretos para assim chegar a uma conclusão a respeito do tema alienação religiosa e negócios jurídicos.


2. CONSIDERAÇÕES SOBRE A LIBERDADE RELIGIOSA

Desde épocas a religião está presente nas civilizações. Não havendo como precisar uma época exata de como tudo começou, apenas que é um dos fenômenos mais antigos da humanidade, que se expressa através das diversas crenças e culturas de um povo. No entanto, o conceito de liberdade religiosa só foi mencionado pela primeira vez no Bill of Rights, documento que veio ao público após a Revolução Inglesa, no ano de 1689 e que afirmava sobre a liberdade igualitária e independência de toda uma nação.

Mesmo diante desse avanço o Brasil só se posicionou sobre a liberdade religiosa, no ano de 1890, após a Proclamação da República, por meio do Decreto nº 119-A.

Foi a partir daí que um tempo depois o Brasil veio se tornar, oficialmente, um País laico, tendo como consequência o surgimento de um novo conceito na nação acerca da liberdade religiosa.

Antes de se chegar ao conceito de liberdade religiosa é preciso realizar um estudo sobre qual seria a definição de liberdade que, por sua vez, para ser obtido é necessário a observância de dois elementos essenciais a este.

O primeiro elemento presente no conceito é o “estado de livre”, no qual, o indivíduo agiria conforme suas próprias determinações, isto é, sua ação seria guiada a partir do que acreditasse. Contudo, em uma sociedade que tem como objetivo atender ao interesse coletivo, se cada um agir conforme suas vontades acabaria por ensejar diversos problemas que prejudicariam a harmonia e bem estar do grupo. Por esse motivo, tem-se um segundo elemento que é a limitação, em que, essa ação voluntária e com discricionariedade própria seria realizada, mas, conforme os limites que a Lei impusesse a fim de salvaguardar os interesses coletivos, uma vez que, “a liberdade individual está subordinada à vontade estatal.” 1

Portanto, o conceito de liberdade é o seguinte: Trata-se da faculdade que o indivíduo tem de agir conforme suas próprias determinações, mas respeitando as regras que a lei impor.

A partir dessa análise pode-se formular o significado de liberdade religiosa, que por sua vez, engloba vários elementos, tornando-se assim, um conceito extremamente amplo, em que, deverão ser analisados três aspectos básicos. Sendo eles: liberdade de crença, liberdade de culto e liberdade de organização religiosa. Todos estes previstos no artigo 5° VI da Constituição Federal de 1988 que possui a seguinte redação:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.[1]

Entende-se por liberdade de crença um direito de escolha, que se desdobra-se em duas opções, sendo elas: escolha de uma religião ou crença e mudança de crença ou religião. Trata-se, portanto, de um conceito restrito, pois não é observado o foro individual, pelo contrário, foca-se apenas na dimensão social. O que não se evidencia na liberdade de consciência, no qual, esta tem um conceito mais amplo, pois observa o particular e concede a este o direito de crer e o de não crer.

Nos dizeres de Alexandre de Moraes tem-se o seguinte:

A liberdade de consciência constitui o núcleo básico de onde derivam as demais liberdades do pensamento, é nela que reside o fundamento de toda atividade político-partidária, cujo exercício regular não pode gerar restrição aos direitos de seu titular.[2]

Consoante a isto, ensina Celso Ribeiro Bastos:

“Tais conceitos são inconfundíveis porque uma consciência livre pode determinar-se no sentido de não crença alguma. Deflui, pois, da liberdade de consciência a uma proteção jurídica que inclui os próprios ateus e os agnósticos.” [3]

Outro elemento que formará o conceito de liberdade religiosa é a liberdade de culto, que por sua vez é extremamente interligado à liberdade de crença, sendo que este é manifestado através desse.

A questão da liberdade de culto é uma garantia para o social e também para a própria religião, uma vez, que a interferência estatal está vedada, mas assim como no conceito de liberdade haverá uma limitação, que através da leitura no art. 5°, VI percebe-se se tratar de uma condição, no qual o Estado não intervirá na manifestação religiosa desde que a lei seja diariamente observada.

Vejamos o que diz Aldir Guedes Soriano:

Conforme prescreve o art. 5º, inciso VI, da Constituição Federal de 1988, "é assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, proteção aos locais de culto e a suas liturgias". Destarte, o Estado não pode embaraçar as manifestações religiosas, desde que, organizadas na forma da Lei. Além do mais, cabe ao próprio Estado garantir a proteção aos locais de culto, mediante o exercício do poder de polícia. Por outro lado, o Estado não pode subsidiar a religião, tampouco pode estabelecer cultos. Também lhe é vedado embaraçar as manifestações religiosas, conforme o disposto no art.19, inciso I, da Magna Carta.[4]

Vale ressaltar que a liberdade de organização religiosa é regida pela lei civil e penal. Isto é, além de ter que obedecer aos requisitos necessários para a sua existência como pessoa jurídica, a organização religiosa também está sujeita às penalidades, caso pratique algum ilícito.

Um último elemento visa conferir ao grupo ou a uma determinada pessoa “o direito de criar segmento religioso.”[5]  E é justamente nesta composição do conceito que se encontrará o ponto central do debate proposto neste artigo, que será travada no próximo capítulo, bastando por enquanto esclarecer que esse elemento confere liberdade para que qualquer pessoa crie uma religião e busque fiéis.

Enfim, com base em todos esses conceitos apresentados acima é possível conceituar a liberdade religiosa como uma garantia ao cidadão de poder criar uma religião, de poder escolher qual seguir e se quiser mudá-la; é também uma garantia dada aos indivíduos de não crer em nada, uma vez que não se pode lhes impor nenhum tipo de religião ou de crença.

Caso o indivíduo escolha seguir uma religião a sua manifestação se dará através de cultos que devem se organizar conforme a Lei, sendo assim não haverá a necessidade da interferência do Estado, cabendo a este apenas o dever de dar proteção aos locais onde estiver ocorrendo o culto.

Tem-se aí então o conceito de liberdade religiosa.


3. A INFLUÊNCIA DA RELIGIÃO NA CELEBRAÇÃO DE CONTRATOS DE DOAÇÃO

Foi mencionado nos capítulos introdutórios o elemento organização religiosa e neste capítulo serão estudadas as consequências que isto pode trazer para o mundo do dever-ser.

A partir do momento que uma religião pode ser criada por qualquer pessoa tem-se um problema, pois algumas destas podem querer se aproveitar da situação a fim de receber alguns valores, denominados pelas instituições religiosas de contribuições ou dízimos.

O mundo jurídico, por sua vez denomina esses valores dados às Instituições de doações.

Como observado na afirmação acima, os dízimos e contribuições são classificados como doações; quanto há isto não tem o que se contra argumentar, pois na definição de Gustavo Castro Afonso e Pablo Ricardo Guimarães esses consistem em “atos de disposição voluntária, praticados pelos fiéis, e voltados à colaboração com o templo religioso de que participam”.[6] Isto é, são atos eivados de vontade que se encaixam perfeitamente com o que dispõe o art. 538 do Código Civil de 2002, verbis:

“Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.“ [7]

De acordo com o conceito e outras disposições presentes no atual Código Civil, pode-se identificar algumas características referentes à doação, são elas: Gratuidade, unilateralidade, formalidade, objeto, capacidade e consentimento.

A gratuidade dos contratos de doação está baseada no “animus donandi”, que consiste na liberalidade, em que, o doador doa ao donatário algo, pois assim deseja, e não exige nenhuma contraprestação, logo apenas este ira aferir benefícios e vantagens. Enquanto isto a outra parte, o doador, ficará apenas com o encargo de cumprir sua obrigação.

Trata-se também de um contrato unilateral, porque cria uma obrigação somente para quem quer doar, no caso o doador.

É um contrato formal por própria previsão legal, verbis art. 541 do Código Civil de 2002:

Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular.

Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.[8]

A regra geral é que os contratos de doação serão válidos a partir do momento em que se o faz por escritura pública ou instrumento particular, sendo que a exceção se encontra no parágrafo único, no qual estas serão dispensadas se a doação for de bens móveis e de pequeno valor em que se verificar a tradição no momento da entrega.

O objeto desses contratos, assim como todos outros, tem que ser lícito, possível, determinado ou pelo menos determinável. Isto é, deve estar de acordo com a lei, com os bons costumes e com a ordem pública. Além do que, esse precisa ser previamente individualizado ou pelos menos poder ser, no futuro, determinado.

A possibilidade deve ser analisada através da impossibilidade que por sua vez pode ser jurídica ou física. Um exemplo a ser citado sobre negócios jurídicos impossíveis é o contrato que versa sobre herança de pessoa viva.

A capacidade nos contratos de doação se subdivide em capacidade ativa e capacidade passiva. Essa se refere a quem pode doar e, como regra geral, não há nenhum empecilho, apenas as limitações normais aos contratos de doações, que serão mencionadas abaixo. Um único detalhe que deve ser observado é que menores não podem realizar doações, salvo se o fizerem no pacto antenupcial a outro nubente, com autorização do representante legal. Este detalhe está previsto no art. 1654 do Código Civil de 2002.

A capacidade passiva está relacionada com aquele que pode receber desde que aceite. Tem-se aí a importância do consentimento, pois apenas com este tem-se o aperfeiçoamento da doação, podendo ser expressa, tácita ou presumida. Neste último a previsão é legal e se encontra disposta nos artigos 539, 543 e 546 do atual Código Civil.

Trata-se de um negócio jurídico e como todos, é indispensável a vontade das partes e junto  dela vem a limitação estatal a fim de garantir a proteção das partes de terceiros, devido a isto, o Código Civil dispõe em seus artigos 548, 549, 550 e o 158 algumas limitações que não serão objetos desta discussão.

Após essa breve análise sobre o instituto da doação pode-se concluir que o indivíduo ao ofertar parte de seus bens ou rendimentos ao templo que professa sua fé está constatada a doação, geralmente verbal, em que tem-se o elemento fundamental e essencial a esta espécies de contrato que é a liberalidade (animus donandi).

Esse animus donandi consiste, como mencionado anteriormente, na vontade de doar sem exigir uma contraprestação. Contudo, em alguns casos, como os que serão analisados em um capítulo seguinte, encontra-se um vício nessa vontade.

Antes de se aprofundar neste assunto, deve-se ser lembrando alguns vícios que podem conter os negócios jurídicos e que, via de regra, têm o condão de gerar a anulabilidade de um contrato ou até sua nulidade. Valendo ressaltar que há diferenças entre anulabilidade e nulidade, em que esta pode ser alegada por qualquer interessado, pois o ato é inválido desde sua constituição. Isto é, no mundo jurídico este sequer existiu, por este motivo não dependem de confirmação e nem convalescem pelo decurso do tempo (Art. 169 do CC/02).

Por outro lado o ato jurídico anulável poderá ser confirmado pelas partes quando não gerar prejuízo a direito de terceiros, sendo que, existe um prazo decadencial para o pedido de anulação do ato, que por sua vez não pode ser declarada de ofício, devendo ser peticionada pela parte interessada.

Tendo em mente esta distinção pode-se voltar à análise dos vícios que são os seguintes: erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra credores. No que tange à simulação o Código Civil em seu art. 167 a trata como um negócio jurídico nulo.

Apesar da apresentação de todos os defeitos que podem conter um contrato é necessário o enfoque apenas na coação, pois esta é essencial a este artigo.

A coação, nas palavras de Tito Fulgêncio citado por Paulo Nader e, respectivamente:

Consiste na pressão de ordem moral, psicológica, que se faz mediante ameaça de mal sério e grave, que poderá atingir ao agente, a membro de sua família ou à pessoa a ele ligada ou, ainda, ao patrimônio, para que a pessoa pratique determinado negócio jurídico.[9]

Em termos simples; é constrangimento injusto para obtenção de um ato.[10]

A coação se subdivide em coação vis absoluta e vis relativa, no qual Silvio de Salvo Venosa conceitua esta como sendo aquela em que “a vítima da coação não fica reduzida à condição de puro autômato, uma vez que pode deixar de emitir a  declaração pretendida, optando  por  resistir ao mal cominado” [11], enquanto essa é

conceituada pelo mesmo renomado autor como aquela em que “não há vontade ou se quisermos, existe, se tanto, apenas vontade aparente. Trata-se de violência física que não concede escolha ao coacto.”[12]

Esse defeito, mais especificamente a coação vis relativa, pode ser visto nos contratos de doação realizados em prol da Igreja, uma vez que o donatário ou um terceiro age diretamente no ânimo do doador a ponto de implantar-lhe a ideia de que é obrigatório realizar a doação à Igreja, sob pena de sofrimento ou penalidades, e esse sujeito irá doar, devido à pressão.

Vale ressaltar que essa pressão está acompanhada de um fator interno ao sujeito que contribui significativamente para a celebração do contrato, trata-se da alienação religiosa, que será estudada especificamente em um próximo capítulo, bastando saber por enquanto que ela interfere diretamente na vontade do sujeito assim como a coação.

Voltando-se a coação vis relativa, também denominada de coação moral irresistível, há que se notar que a pessoa coagida moralmente não exerce efetivamente seu livre-arbítrio, uma vez que ela não tem uma “opção” entre realizar ou não determinado ato, a violência psicológica é tanta que anula, a racionalidade e a manifestação da vontade.

De acordo com isto Paulo Nader também dispara que: “Tal animus inquina o ato negocial de vício de consentimento, tornando-o anulável, uma vez que a vontade declarada não corresponde à vontade real ou verdadeira.”[13]

É observado assim o que dispõe o art. 151 do Código Civil de 2002, no qual segundo este“a coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.”[14]  Pois, essa coação realizada pela Igreja causa tanto medo injustificado na vítima que ela perde completamente a “espontaneidade do querer”e celebra o contrato de doação, porque não há possibilidades de resistência, o doador tem receios de sofrer as sanções religiosas de seu credo e isso, juntamente com a alienação religiosa basta para que ele pratique este ato.


4. ALIENAÇÃO RELIGIOSA

Atualmente vivemos em uma sociedade visivelmente alienada, fator este preocupante. Assim dispõe o trecho citado abaixo:

Vivemos numa sociedade em grande parte influenciável, onde meios de comunicação, politicagem, falsas promessas, propagandas enganosas, sensacionalismo estão deixando de certo modo o nosso povo alienado e vazio de significado.[15]

Com isso, trabalhar-se-á, primeiramente, o conceito de alienação.

Etimologicamente falando a palavra alienar descende do latim, dos termos “alienus” e “alius”, que significam a transferência de algo ou poder para um terceiro ou para alguma coisa.

Trazendo esse conceito ao âmbito que nos interessa, no caso a religião, obtém-se o conceito de alienação religiosa, que seria a transferência da consciência humana por parte de um indivíduo para uma entidade religiosa, no qual esta resolveria todas suas aflições e problemas, enquanto esse ficaria encarregado de agradá-la, agradecê-la, realizar algum sacrifício, em prol do que foi recebido. Consoante a esta definição tem-se:

Por isso na religião o homem coloca necessariamente a sua essência fora de si, coloca a sua essência como uma outra essência, necessariamente porque a essência da teoria está fora dele, porque toda a sua essência consciente se converge para a subjetividade prática. Deus é o seu outro eu, sua outra metade perdida; em deus ele se completa; só em deus é ele um homem total. Deus é para ele uma necessidade; falta-lhe algo sem que saiba o que lhe falta - deus é este algo que falta, deus é indispensável para ele; Deus pertence à sua essência. O mundo não é nada para a religião - o mundo que nada mais é que a cerne da realidade, só é revelado em sua impotência pela teoria: os prazeres teoréticos são os mais belos prazeres espirituais da vida, mas a religião nada sabe dos prazeres do pensador, nada sabe dos prazeres do naturalista, nada sabe dos prazeres dos artistas. Falta a ela a contemplação do universo,a consciência do infinito real, a consciência do gênero. Somente em deus supre ela a falta da vida, a falta de um conteúdo consistente que oferece à contemplação para o mundo perdido - deus é para ela a contemplação pura, a vida da teoria.[16]

Pode-se retirar do conceito e da citação acima ligação existente entre a coação e alienação religiosa, mas antes de estudá-la é necessária a análise das fases desta, para assim tornar mais visível o vínculo.

Na primeira fase encontra-se um sujeito completamente “perdido”, cheio de temores e problemas cotidianos, e que por algum motivo passa a buscar apoio na religião. Trata-se de um fato, cujo Leandro Beguoci disse o seguinte:

Várias razões explicam essa expansão. Em boa parte das áreas pobres do Brasil, as Igrejas evangélicas são as únicas instituições presentes. Não há Estado ou outra organização comunitária. Em várias favelas, como mostram os estudos do antropólogo Ronaldo de Almeida, da Unicamp, igrejas são centros comunitários, áreas de lazer e centros de assistência social. Elas oferecem tanto consolo espiritual quanto benefício terrenos. As igrejas fazem até papel de Tinder, ajudando os fiéis a encontrar seu par. Nos momentos de dificuldade, pastores e religiosos atuam como terapeutas e psicanalistas. [17]

Fato também já constatado por Ludwig Feuerbach, vide:

Os cristãos mais verdadeiros e mais profundos disseram que a felicidade terrena separa o homem de Deus e que, por outro lado, as infelicidades, sofrimentos e doenças terrenas reconduzem o homem para Deus e por isso só elas são devidas aos cristãos. Por quê? Porque na infelicidade ele só se relaciona com o que é necessário, na infelicidade Deus é sentido como necessidade do homem. [18]

Percebe-se então, diante dos citados acima, a fragilidade do sujeito que busca a religião.

A partir daí dá-se início a segunda fase, no qual, com o passar dos tempos o indivíduo começa a se entregar completamente a religião e esta, por sua vez, passa a explicar tudo, pois como já mencionava Feuerbach, “a religião nega, condena o acaso ao fazer com que tudo dependa de Deus”,[19]  ou seja, o que acontece ao redor de seus seguidores e terceiros, encontra satisfações na crença ou na religião.

Na terceira fase começam-se os pedidos e se caso concretizados a entidade causadora de tal feito deve ser retribuída e é nesta retribuição que encontra-se a quarta e última fase, em que as “explicações” obtidas na segunda fase e as graças alcançadas na iter anterior a essa devem ser agradecidas. A partir daí inicia-se a pressão psicológica séria (coação) para que o indivíduo realize algo para que ele ou sua família não sofram nenhum “castigo” por ingratidão e assim, conforme o que fez Abraão, o sujeito realiza um sacrifício e este costuma ser em dinheiro ou algum bem que possa ser revertido em pecúlio.

A coação, acima mencionada, já era bem conhecida por Feurbach que relatou:

A religião associa a suas doutrinas maldição e bênção, condenação e felicidade. Feliz é aquele que crê. Portanto, ela não faz apelo à razão, mas à afetividade, ao instinto de ser feliz, aos sentimentos de medo e esperança. Não está no estagio teórico, caso contrário deveria ter a liberdade de expressar as suas doutrinas sem associar a elas as consequências práticas, sem de certa forma forçar a sua crença; pois quando se diz: estou condenada se não creio, é isto uma sutil coação da consciência para a que se creia; o medo do inferno me obriga a crer. Mesmo que a minha fé devesse ser livre quanto à sua origem, o medo sempre se mistura com ela; a minha afetiva está sempre presa; a dúvida, o princípio da liberdade teórica, me aparece como um delito. Mas o conceito mais elevado, a essência mais elevada da religião é Deus: o supremo delito é, portanto, a dúvida em Deus ou a dúvida s, se existe Deus. No entanto aquilo de que eu não ouso duvidar, não posso duvidar sem me sentir intranquilo em meu espírito, sem atrair para mim uma culpa, não é uma questão de teoria, mas de consciência, não pé uma entidade da razão, mas da afetividade.[20]

Dessa citação fica claro a coação realizada a fim de fazer com que o indivíduo doe evitando-se assim uma suposta condenação.

Das fases da alienação percebe-se claramente a ligação existente entre a coação e a alienação é o medo, pois este tem o condão de levar o indivíduo a buscar a religião e o que o faz celebrar o contrato de doação também é o temor extremo. E ainda pode-se concluir mais, a coação não é um fator separado da alienação, elas estão bem mais que vinculadas, uma vez que, com a terceira fase percebe-se que a coação encontra-se dentro da alienação, sendo-lhe então elemento essencial.

A fim de comprovar essas alegações realizadas aqui serão analisados alguns casos que demonstram bem toda a discussão deste trabalho.


5.CASOS CONCRETOS

Ao analisar os casos é possível identificar uma série de fatores em comum em todos os eles.

O primeiro ponto semelhante está ligado ao emocional do sujeito, o qual, chega parecer que seria até um padrão, pois todos aqueles atuantes no polo passivo dos casos estudado sempre estão com problemas familiares, financeiros ou fragilizados devido a algum acontecimento. Isto é, os indivíduos que buscam consolo nas instituições religiosas encontram-se sempre vulneráveis, descrentes da vida, tornando-se assim um alvo fácil para a alienação religiosa e seus aliados.

O seguinte fator em comum diz respeito à influência daqueles que pregam os “ideais de Deus”, em que, sempre se observa que estes agem de uma forma um tanto quanto rude e cativante, pois fazem com que os fiéis acreditem que há um dever em doar, para assim receber as dádivas divinas, sendo que do contrário jamais irão recebê-las e ainda serão castigados, tanto na terra “quanto no céu”.

Os problemas advindos das doações também são pontos em comum, uma vez, que muitas vezes os fiéis realizam a oferta escondido de seus familiares, a pedido da própria instituição religiosa, e quando descoberta a doação tem-se mais discórdias e sofrimentos naquele âmbito familiar.

Quanto à ação o pedido costuma sempre ser de danos morais. Fato este que só comprova o grande prejuízo que essa doação traz para o sujeito e sua família.

Na contestação observa-se sempre a mesma defesa, a qual, a igreja alega que suas condutas estão protegidas constitucionalmente não podendo o Estado intervir, e que na doação há apenas a livre manifestação de vontade dos fiéis sem coação.

E por fim, nos casos em análise o judiciário tomou a mesma decisão de não aceitar os recursos interpostos pelas instituições religiosas e manter a sentença que é: Anulação da doação devido à coação moral irresistível e a concessão de danos morais.

As conclusões mencionadas acima foram retiradas dos seguintes casos: Apelação Cível Nº 1.063.110-2, do foro regional de São José dos Pinhas da Comarca da região metropolitana de Curitiba – 2º Vara cível; apelação cível Nº 70039957287 da nona câmara cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e apelação cível Nº 70051621894 da nona câmara cível, da comarca de Lajedo, do Estado do Rio Grande do Sul.

Através dos casos analisados, além dos fatores mencionados nos parágrafos anteriores, consegue-se perceber um fator que a priori está recôndito, mas observando-se bem os fatos consegue-se percebê-lo, que é a alienação religiosa, mencionada no capítulo anterior a este.

Para demonstrar a presença da alienação nesses negócios jurídicos será trabalhado pequenos trechos dos casos concretos que comprovarão a existência deste perigoso elemento nos contratos firmados em prol de instituições financeiras. Tem-se então o seguinte:

O autor se deixou dominar pela pregação e, ao aceitar o desafio da fé, perdeu seu único patrimônio.  A entrega do autor ao evento de fé denominado “Fogueira Santa”, restrito a fiéis que demonstram desapego dos bens materiais, com oferta de valores aos desígnios evangélicos, é prova do seu estado de espírito abalado, que levou a proceder a busca de uma razão religiosa que soluciona-se seus problemas.(Grifo próprio). [21]

Ambos os trecho foram retirados de um caso de grande notoriedade ocorrido no Estado do Paraná, com o seguinte registro: Apelação cível N° 1.063.110-2, do foro regional de São José dos Pinhais da comarca da região metropolitana de Curitiba – 2ª vara cível.

A partir da análise de dois verbos presentes no trecho já é possível notar a alienação religiosa, são eles: dominar e entregar.

No segundo trecho temos exatamente o conceito de alienação apresentado no capítulo IV deste artigo, que é a transferência de algo para um terceiro e vemos exatamente isto, o fiel se entregou, transferiu sua consciência para a fé deixando que esta fosse a sua guia, ou seja, ele se deixou dominar pela crença pregada pela instituição religiosa e passou a reger-se pelas diretrizes desta, no qual, a sua vontade não era patrimônio seu e sim de sua fé; “[...] não se oferta dinheiro e sim o seu coração a sua vida, que Ele vai mudar a sua vida [...] a requerente foi procurar ajuda junto à demanda em razão dos problemas financeiros que ela e seu esposo vinham sofrendo.” [22]

Os trechos acima foram retirados da Apelação Cível N° 70051621894 do Tribunal do Rio Grande do Sul, o qual, novamente, percebe-se a presença da alienação, pois o sujeito, extremamente vulnerável, procura a Igreja para se fortalecer, e ao chegar lá obtêm a seguinte resposta: “ofertarás sua vida” É um tanto quanto absurdo isto, pois o que o sujeito deseja é um alento, uma “ajuda” de como encontrar motivação e seguir sua vida e não transferir esta a um terceiro para obter alguma dádiva decorrente disto, fora que essa “doação da vida” não bastaria por si só, uma vez que, esta sempre estaria acompanhada de outras doações.

E por fim tem-se os seguinte trechos retirado do último caso analisado de registro N° 70039957287 do Estado do Rio Grande do Sul, no qual temos:

Percebo que a autora não manifestou sua vontade de forma natural porque sofreu interferência do discurso religioso, o qual, nesses anos todos de culto maníaco, adquiriu aptidão para lhe incutir temor legítimo de sofrer as consequências nefastas pelos pastores.[23]

[...] tu vai e vende as tuas roupas, tu vendes o que não tem, o que dá, tira tudo que você tem e dá pra Deus. Quanto mais tu te desfizeres, mais rápido e com certeza tu vais alcançar teu objetivo, que vai ser dado por Deus.[24]

Novamente é possível ver a alienação religiosa, pois nenhum ser humano em prefeitas condições se sujeitara a vender até o que não tem para dar a Deus, mesmo que sob um discurso maníaco.

Um sujeito não alienado conseguiria limitar a sua fé e resistir aos discursos religiosos, mas um alienado e desesperado para solucionar seus problemas com ajuda divina doaria até o que não tem. 


6.ANULAÇÃO DOS CONTRATOS DE DOAÇÃO

Como apontado nos capítulos anteriores os contratos de doação firmados entre particular e instituição religiosa que contenham os vícios da coação e alienação religiosa podem ser anulados sim. Contudo, o único defeito apto a ensejar isto é a coação, uma vez, que a alienação não é vista como capaz de anular um negócio jurídico. 

O art. 171 do Código Civil de 2002 dispõe:

Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:

I - por incapacidade relativa do agente;

II - por vício resultante de erro, dolo, COAÇÃO, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.(Grifo próprio).[25]

Diante disso conclui-se que constatada a coação nos contratos pode-se sim pleitear a anulação dos mesmos. A questão gira em torno de quem são as pessoas capazes a realizar este feito.

De acordo com o art. 177 do Código Civil de 2002:

[...] anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de solidariedade ou indivisibilidade.[26]

Isto é, em tese, por disposição expressa, só aquele que quis doar e aquele que aceitou poderiam pleitear a anulação do contrato como forma de expressão das vontades. Assim, também dispõe o art. 560 do Código Civil de 2002, vide: “O pedido de revogação de doação é ato personalíssimo e somente pode ser requerido pelo próprio doador, mas seus herdeiros podem dar continuidade à ação.” [27]

Entretanto, em muitos casos as pessoas que doaram nem sempre optam pela anulabilidade, pois o medo de algum “castigo divino ou social” a perseguem, então cogita-se a possibilidade do familiar do doador pleitear essa anulação.

A priori isso seria impossível, pois é ato de disposição voluntaria de quem doou, logo apenas este poderia requerer a anulação. Porém, deve-se levar em conta alguns aspectos; primeiro, aquele indivíduo encontra-se extremamente alienado, segundo, essa doação exagerada com certeza atingiu significativamente o patrimônio familiar, logo atingiu, pelo menos, as expectativas de direito de sua família. E por último o Estado tem o dever constitucional de proteger os cidadãos de eventuais abusos.

Como foi abordado no capítulo anterior, na maioria dos casos concretos estudados encontram-se indivíduos completamente alienados, colocando uma divindade hipotética acima da própria razão. Por este motivo fazer com que eles enxerguem o erro que estão cometendo é difícil, ainda mais quando o temor de um sanção está presente. Logo, fazer com que estes pleiteiem a anulação e enxerguem o malefício que este contrato lhes trouxe é uma atividade árdua. Devido a isto haveria a possibilidade do familiar pedir a anulação desse contrato vem à tona, mas a regra geral é clara, só os “interessados podem alegar a anulabilidade”. Contudo, há que se fazer uma análise dessa regra geral levando-se em conta o princípio da função social.

De acordo com este princípio os contratos devem ser vistos como uma relação social e não como uma relação individual.

Os contratos de doação firmados entre o particular e a Instituição religiosa não fogem a esta regra, a doação não atinge apenas e exclusivamente o patrimônio daquele que doou e àquele que recebeu afeta diretamente todos que convivem com eles - a família. Devido a isto negar a possibilidade do familiar de requerer a anulação é por um lado querer negar a função social do contrato é dizer que os interessados são apenas as partes do contrato, e isto não é verdade. As partes do contrato, nesses casos, são todos aqueles que sofrerão a repercussão da diminuição patrimonial, logo a família. Então a ideia de que só aquele quem doou, no caso o alienado, que pode pleitear a anulação contratual é um tanto quanto ultrapassada, levado-se em conta o contexto que este se encontra de total incapacidade racional e o próprio princípio da função social.

Dentro desse contexto, há uma medida excepcional que os familiares podem tomar a fim de salvaguardar o patrimônio do indivíduo afeto pela alienação religiosa. Trata-se da curatela que se dá através da ação de interdição.

Dispõe o art. 747, inciso II do Código de Processo Civil de 2015 que os parentes têm legitimidade para propor a ação de interdição desde que comprovada por documentos que o sujeito não está na sua plena capacidade de agir. Esta incapacidade deve ser demonstrada de forma a ficar claro que esse indivíduo ora denominado de interditando não pode administrar seus bens e em alguns casos atos da vida civil. Assim prevê o artigo 749 do mesmo diploma legal supracitado.

É uma providência adequada ao caso uma vez que trata-se de uma “medida prioritariamente funcionalizada ao campo estritamente patrimonial.”[28]  Isto é, a curatela é uma medida judicial mais voltado ao campo patrimonial, seu objetivo é proteger o patrimônio daquele incapacitado de zelar por esse. E nos casos em questão o que vemos é exatamente isso, o sujeito se desfazendo de parte de seus bens em prol da Instituição religiosa a fim de receber bênçãos, ou seja, está faltando a proteção ao patrimônio próprio.

O procedimento dessa medida encontra-se disposto nos artigos 747 a 758 do Código de Processo Civil de 2015, em que após a propositura da ação o interditando será citado para comparecer em juízo o qual o juiz irá realizar com ele uma entrevista a fim de saber mais sobre a vida desse indivíduo para chegar a uma conclusão acerca de sua capacidade; podendo o pedido ser impugnado por aquele que se deseja interditar em um prazo de 15 dias, o qual decorrido este o juiz determina a produção de provas para que estas indiquem sobre quais atos da vida civil recairá a curatela. Após isso o juiz proferirá a sentença.

            Vale ressaltar que esses indivíduos alienados se encaixam no artigo 4°, inciso III do Código Civil de 2002 que teve sua redação recentemente modificada pela Lei 13.146/15, vide:

Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:             

III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade. [29]

Esses indivíduos tratam-se de pessoas que devido à alienação estão transitoriamente impedidos de exprimir sua vontade, principalmente no âmbito patrimonial.

Posto isso, vê-se que os familiares, usando dessa medida excepcional, podem interferir nos contratos. Essa interdição será cessada a qualquer momento desde que comprovado que a causa que a determinou se extinguiu (art. 756 CPC/15).

Nos casos em questão a causa da interdição pode ser afastada com acompanhamentos terapêuticos, tratamentos psicológicos e até psiquiátricos que visem reequilibrar aquele sujeito que ora se encontra dominado por uma ideologia hipotética.

Vale lembrar que trata-se de uma medida mais voltada à proteção patrimonial. Mas, no caso em que os parentes desejam uma medida mais protetiva da pessoa, seria interessante o uso de um novo instituto que nas palavras de Nelson Rosenvald “não se trata de um modelo limitador da capacidade de agir, mas de um remédio personalizado para as necessidades existenciais da pessoa”,[30] é a denominada Tomada de decisão apoiada (TDA). Seu objetivo é distinto da curatela, em que esta atenderia mais a sociedade e os familiares, uma vez que seu foco não é o indivíduo em si, e sim o seu patrimônio, seus bens, já a TDA objetiva a liberdade e dignidade da pessoa humana.

Ambas são medidas que podem e devem ser utilizadas, mas sempre observando caso a caso, uma vez que o objetivo e procedimento delas são diferentes. 

Ademais, o Ministério Público poderia também arguir a anulação, por mais que ele só possa fazê-lo diante de nulidade absoluta, ele poderia requerer isso devido à função deste órgão Público. Verbis:

Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.[31]

Deste conceito do Ministério Público retira-se que ele tem como função defender o cumprimento das leis que protegem o patrimônio nacional e os interesses sociais e individuais. Lendo-se este em diálogo com o disposto no art. 5º, XXXV em que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”[32], obtém-se o seguinte: nos contratos de doação em questão vê-se de fato um abuso das Instituições religiosas, logo, o Estado, em obediência ao art. 5º, deve prestar a função jurisdicional; então caberia àquele que  tem como função a defesa dos interesse sociais, no caso o Ministério Público, a pleitear a anulação contratual, nos casos em que o doador alienado e coagido não o fizer, os familiares não se manifestarem e esse ato estar de fato trazendo malefícios à vida digna desse sujeito.

Entretanto, tem-se, infelizmente, por disposição legal que caberia apenas àquele quem doou pleitear a anulação. Contudo, a possibilidade de intervenção de familiares e do Ministério Público não podem ser absolutamente afastadas.

O Ministério Público também tem legitimidade para propor a ação de interdição, não obstante o artigo 748 do Código de Processo Civil de 2015 afasta por completo a possibilidade de interdição nesses casos, pois sua legitimação só se dá em face de doença mental grave, o que não é o caso.


7.CONCLUSÃO

A partir de toda a análise dos casos e conceitos dispostos neste artigo, conclui-se que a forma que as Instituições Religiosas conduzem as religiões, podem ser prejudiciais ao ser humano, causando-lhe uma série de transtornos e muitas vezes tornando-o um ser alienado, sem vontade própria, sem ânimo, agindo somente pela Igreja e para a Igreja. Isto é, o sujeito deixa de viver a sua vida conforme sua vontade, uma vez que, esta já não lhe pertence.

Transferir algo que lhe é ínfimo para uma crença e passar a acreditar que esta trará melhoras para a vida terrena e também para a “vida no paraíso” é um tanto quanto preocupante para seres racionais.

Pode-se afirmar diante da análise dos casos concretos que tal fato é muito prejudicial à sociedade, tanto é que, verificando-se a influência exagerada da religião, o Judiciário pode e deve ser acionado, mesmo em se tratando de um Estado Laico protegido constitucionalmente, pois, quando há lesão ou ameaça de lesão a direito, o Estado irá intervir nas relações entre os particulares e a Igreja, uma vez que, “os atos praticados pela Igreja não estão imunes ou isentos ao controle jurisdicional”.

De qualquer forma, antes até da prestação jurisdicional tem-se o dirigismo contratual que não fere o princípio da autonomia da vontade, que ainda existe, mas, limitado e condicionado ao bem estar comum.

Sendo assim, o Estado intervirá, nos contratos em geral, por meio do dirigismo contratual, não estando as instituições religiosas isentas deste controle.

Posto isso, conclui-se que o Estado irá intervir nos contratos tanto em prol do bem comum, por meio do dirigismo contratual, quanto em benefício privado, prestando a atividade jurisdicional.


Notas

1 SORIANO, Aldir Guedes. Liberdade religiosa no direito constitucional e internacional. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.

[1] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 45.ed. atual. eampl. São Paulo: Saraiva, 2011.

[2] MORAES, Alexandre. Direito constitucional. São Paulo: Atlas, 2006.

[3] BASTOS, Celso Ribeiro apud SORIANO, Aldir Guedes. Liberdade religiosa no direito constitucional e Iiternacional. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.

[4] SCHERKERKEWITZ, Isso Chaitz. O direito de religião no Brasil. Revista ESPEGE, [201-]. Disponível em:<http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artigo5.htm>.

[5] SILVA NETO, Manoel Jorge. Proteção constitucional à liberdade religiosa. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

[6]  RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 70039957287/Esteio. Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira.  Revista de jurisprudência do TJRGS, v. 42, n. 280, p.274-294, 2011. Disponível em:<https://www.tjrs. jus.br/site/publicacoes/revista_da_jurisprudencia/>.

[7]  BRASIL. Código civil: Lei n.10.406, de janeiro de 2002. 3.ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.

[8] BRASIL. Código civil: Lei n.10.406, de janeiro de 2002. 3.ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.

[9] NADER, Paulo. Curso de direito civil: vol.1, parte geral. 9.ed.rev. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

[10] NADER, Paulo. Curso de direito civil: vol.1, parte geral. 9.ed.rev. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

[11] VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: vol.1, parte geral. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

[12] VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: vol.1, parte geral. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

[13] NADER, Paulo. Curso de direito civil: vol.1, parte geral.9.ed.rev.e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

[14] BRASIL. Código civil: Lei n.10.406, de janeiro de 2002. 3.ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.

[15] NEVES, Vanusa. Brasil: sociedade alienada. 28 julho 2013. Disponível em:<http://conexaonoticias. com/noticia/7886/brasil-sociedade-alienada.html>.

[16] FEUERBACH, Ludwig. A essência do cristianismo. Rio de Janeiro: Vozes, 2007. p.201-202.

[17] BEGUOCI, Leandro. Extremismo evangélico. Super Interessante, v.351, p. 28-35, set. 2015. Disponível em:<http://super.abril.com.br/historia/extremismo-evangelico>.

[18] FEUERBACH, Ludwig. A essência do cristianismo. Rio de Janeiro: Vozes, 2007. p.195.

[19] FEUERBACH, Ludwig. A essência do cristianismo. Rio de Janeiro: Vozes, 2007. p.195.

[20] FEUERBACH, Ludwig. A essência do cristianismo. Rio de Janeiro: Vozes, 2007. p.194.

[21]PARANÁ. Tribunal de Justiça. Carta de ordem: CO1063110201PR1063110-2/01 (Decisão Monocrática). Relator: Paulo Roberto Vasconcelos. Diário da Justiça, Curitiba, 25 jul. 2014. Disponível em:<http://tj-pr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/25234531/carta-de-ordem-co-063110201 -pr-1063110-2-01-decisao-monocratica-tjpr/inteiro-teor-134011094>.

[22] RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 70051621894/Lajeado. Relator: Tasso Caubi Soares Delabary. Revista de jurisprudência do TJRGS, v. 43, n. 289, p.257-279, 2013. Disponível em:<https://www. tjrs.jus.br/site/publicacoes/ revista_da_jurisprudencia/>.

[23] RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 70039957287/Esteio. Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira.  Revista de jurisprudência do TJRGS, v. 42, n. 280, p.274-294, 2011.  Disponível em:<https://www.tjrs. jus.br/site/publicacoes/revista_da_jurisprudencia/>.

[24] RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 70039957287/Esteio. Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira.  Revista de jurisprudência do TJRGS, v. 42, n. 280, p.274-294, 2011.  Disponível em:<https://www.tjrs. jus.br/site/publicacoes/revista_da_jurisprudencia/>.

[25] BRASIL. Código civil: Lei n.10.406, de janeiro de 2002. 3.ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.

[26] BRASIL. Código civil: Lei n.10.406, de janeiro de 2002. 3.ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.

[27] BRASIL. Código civil: Lei n.10.406, de janeiro de 2002. 3.ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.

[28] ROSENVALD, Nelson. Tomada de decisão apoiada. 16 julho 2015. Disponível em:<http://www. nelsonrosenvald.info/#!A-Tomada-de-Decis%C3%A3o-Apoiada/c21xn/55b76d1f0cf25507a8c0c8bb

[29] BRASIL. Código civil: Lei n.10.406, de janeiro de 2002. 3.ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.

[30] ROSENVALD, Nelson. Tomada de decisão apoiada. 16 julho 2015. Disponível em:< http://www. nelsonrosenvald.info/#!A-Tomada-de-Decis%C3%A3o-Apoiada/c21xn/55b76d1f0cf25507a8c0c8bb

[31] ANGHER, Anne Joyce (org.). Vade-mécum acadêmico de direito Rideel.16.ed. São Paulo: Rideel, 2013.

[32] ANGHER, Anne Joyce (org.). Vade-mécum acadêmico de direito Rideel.16.ed. São Paulo: Rideel, 2013.



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