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Benefício assistencial ao idoso e ao deficiente

um breve estudo sobre o Benefício de Prestação Continuada (BPC) da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS)

Benefício assistencial ao idoso e ao deficiente; um breve estudo sobre o Benefício de Prestação Continuada (BPC) da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS)

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O benefício de prestação continuada (BPC) é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família.

O LOAS é disciplinado no art. 203, V da Constituição Federal, nos arts. 20 a 21-A pela Lei 8.742/93 e regulamentado em nível infralegal pelo Decreto 6.214/07.

O BPC é um benefício assistencial que, embora seja gerido e pago pelo INSS, não tem natureza previdenciária. É assistencial, logo, não contributivo e os recursos para custeio desse benefício provêm do orçamento da União, conforme dispõe o art. 29, parágrafo único da Lei 8.742/93.

Art. 29. Os recursos de responsabilidade da União destinados à assistência social serão automaticamente repassados ao Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), à medida que se forem realizando as receitas.

Parágrafo único. Os recursos de responsabilidade da União destinados ao financiamento dos benefícios de prestação continuada, previstos no art. 20, poderão ser repassados pelo Ministério da Previdência e Assistência Social diretamente ao INSS, órgão responsável pela sua execução e manutenção.

O BPC consiste em uma garantia de pagamento de um salário mínimo à pessoa idosa ou à pessoa deficiente que seja miserável, isto é, que não tenha condições de sustento e nem de ter esse sustento provido pela sua família. O idoso e o deficiente em condição de miserabilidade são amparados com a garantia constitucional de um benefício de caráter assistencial não contributivo de um salário mínimo.

Vamos ver, de forma detalhada, os requisitos desse benefício.

Para receber esse benefício é necessário: ser IDOSO ou DEFICIENTE + IMPOSSIBILIDADE DE SUSTENTO por si só (miserabilidade) ou pela sua família.

O idoso para efeito do BPC é aquele com 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou mais, prevalecendo a disposição especial da Lei Orgânica da Assistência Social, 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou mais. Por mais que o conceito de idoso no Estatuto do Idoso (art. 1º da Lei 10.741/03) considere a pessoa com 60 (sessenta) anos de idade ou mais, para fins de percepção do benefício assistencial, a idade a ser considerada continua a ser 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou mais, independentemente do gênero, homem ou mulher, ambos devem observar 65 (sessenta e cinco) anos de idade.

Já com relação ao deficiente, importante destacar que o conceito de deficiente é próprio e previsto na lei, não tendo relação com a invalidez laboral nem com a incapacidade civil. É um conceito próprio e distinto.

Deficiente é qualquer pessoa que seja portadora de impedimentos de LONGO PRAZO de natureza física, mental, intelectual ou sensorial. Tais impedimentos, em interação com diversas barreiras (socioculturais ou ambientais), obstruem sua participação na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Longo prazo, para efeito da LOAS, é aos menos 2 (dois) anos. Portanto, é possível que a deficiência não seja vitalícia, imutável, para o resto da vida, podendo haver situação de deficiência temporária, desde que seja de ao menos 2 (dois) anos.

É possível haver um LOAS temporário. É possível que o deficiente receba o benefício apenas pelo tempo que perdurar a sua condição de deficiente.

A miserabilidade é a impossibilidade de sustento por si ou por sua família.

A LOAS traz o seu conceito próprio de família no art. 20, §1º colacionado abaixo.

§1º. Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

Para a LOAS, família são as pessoas que VIVEM SOB O MESMO TETO.

As pessoas que compõem o conceito de família para a LOAS são: o requerente do benefício; o seu cônjuge ou companheiro, e inclui-se o cônjuge ou companheiro homoafetivo, sem qualquer divergência, mesmo na via administrativa; pais, incluindo o padrasto ou a madrasta; irmãos solteiros; filhos ou enteados solteiros e os menores tutelados.

Estas pessoas, desde que vivam sob o mesmo teto, compõem o conceito de família para a LOAS. Atentem-se que, os irmãos ou filhos/enteados devem ser solteiros. Entende a LOAS, se não forem solteiros, passarão a integrar núcleo familiar próprio estando excluído do conceito de família do requerente, logo, não serão computados como família do requerente para fins de verificação da miserabilidade.

O que seria uma família em condição de miserabilidade?

A LOAS prevê no art. 20, §3º o conceito objetivo de miserabilidade:

§3º. Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.

Considera-se, por este preceito normativo, a pessoa ou a família cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ de salário mínimo, esse é o critério legal objetivo.

Observe-se que pela lei a família deve ter uma renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo.

OBSERVAÇÃO: Esse critério é constitucional? Tal discussão foi submetida ao STF em 2001, ADI 1.232. Nessa ocasião, o STF considerou o critério válido, constitucional. Posteriormente, no RE 567.985 e 580.963 (2013), o STF reanalisou a constitucionalidade do critério legal objetivo e, nesse segundo momento, em 2013, o STF considerou o critério defasado diante da evolução dos fatos sociais, o STF entendeu que houve um processo de inconstitucionalização do critério. No entanto, não houve pronúncia de nulidade, de forma que o critério continua figurando na lei, mas, resta claro, de acordo com o posicionamento do STF, que este critério, por estar defasado, não poderá ser o único a orientar o administrador e o julgador. Outros critérios podem ser somados a este para consideração da condição miserabilidade.

Diante disso, o legislador reformou a LOAS, a Lei 13.146/15, acrescentando o §11 ao art. 20, positivando o entendimento do STF:

§11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.

Ainda dentro dessa noção de miserabilidade, temos algumas previsões legais de rendimentos que são excluídos ou pela lei ou pela jurisprudência da renda familiar.

Na hora de aferir a miserabilidade, verificaremos quem é o membro da família e quanto ganha, somamos todos os rendimentos e dividimos pelo número de membros da família.

A lei e a jurisprudência dizem que algumas verbas recebidas por esses membros da família são excluídas, não são computadas no conceito de renda familiar.

O parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso diz que é excluído do cálculo da renda familiar o LOAS recebido por idoso pertencente a essa família.

Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social – Loas.      

Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput NÃO SERÁ COMPUTADO para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas.

Na família do requerente há a figura de um idoso que recebe LOAS, como o LOAS é personalíssimo e voltado para o sustento desse idoso, o valor desse benefício não é computado no cálculo da renda familiar.

Por isonomia com essa situação do idoso, o STF entendeu que um LOAS recebido por um deficiente membro da família também não é computado. Extensão por isonomia, LOAS recebido por um deficiente membro da família também está fora.

O STF e STJ, também prosseguindo nessa lógica da isonomia, primeiro o STF, depois o STJ em REsp Rep 1.355.052, entenderam que o benefício previdenciário no valor de um salário mínimo, recebido por idoso ou deficiente da família, também está excluído.

Ademais, a própria LOAS exclui do conceito de renda familiar o rendimento de estágio supervisionado e de aprendizagem.

A pensão especial também não é computada de natureza indenizatória e os benefícios de assistência médica.

Atente-se para a pensão especial de natureza indenizatória e benefícios de assistência médica, pois a própria LOAS os definem como benefícios cumuláveis com o BPC/LOAS. Os rendimentos desses benefícios estariam excluídos do cálculo da renda mensal e estes benefícios podem ser cumulados até pelo titular do BPC, são benefícios acumuláveis com o BPC por força da própria lei.

Frisa-se que a pensão especial de natureza indenizatória e benefícios de assistência médica, além da exclusão no cálculo da renda familiar, podem ser acumulados pelo próprio titular do BPC.

Com relação à cessação do benefício, importante mencionar que a lei não prevê prazo máximo de duração do benefício. Ele pode durar desde a concepção até o falecimento do beneficiário, porém, não há impedimento que o BPC também seja temporário, ou seja, superadas as condições de sua concessão, o benefício pode ser cessado a qualquer tempo. Desta forma, o BPC pode ser vitalício ou BPC temporário.

As condições de concessão do BPC podem variar ao longo do tempo. A pessoa pode deixar de ser deficiente ou a pessoa que estava em condição de miserabilidade pode superar esse quadro e deixar de ser considerada miserável.

Em razão dessa mudança dos fatos ao longo do tempo, a LOAS prevê a possibilidade ou o dever do INSS fiscalizar a manutenção das condições do benefício.  Prevê a lei em seu artigo 21 que a cada dois anos deve haver avaliação da continuidade das condições que deram origem ao benefício.

L. 8472/93, Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. (Vide Lei nº 9.720, de 30.11.1998) 

Importante observar que, em matéria de cessação do benefício, não incide o princípio do paralelismo de formas. Isso significa que o benefício concedido judicialmente pode ser cessado pelo INSS, em uma revisão administrativa da manutenção das condições.

Ainda sobre a cessação do BPC, há algumas situações peculiares quando se trata do BPC recebido pelo deficiente que venha a exercer algum tipo de atividade remunerada. Seguem situações abaixo:

SITUAÇÃO 1.: (i) Deficiente que está recebendo LOAS, se vier a exercer qualquer que tipo de atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor individual. Prevê a lei que o benefício não será cancelado, será apenas suspenso, uma vez extinta essa atividade laboral, o beneficiário pode pleitear a continuidade do pagamento do LOAS, independentemente da realização de uma nova perícia. É claro que a lei ressalva que, se nesse meio tempo o indivíduo adquirir o direito a um benefício previdenciário mais vantajoso, não poderá haver acumulação de benefícios, sendo o LOAS efetivamente cancelado e o beneficiário passará a usufruir do seu benefício previdenciário mais vantajoso. Mas, se não houver o direito adquirido a um benefício previdenciário mais vantajoso, cessada a atividade laboral, poderá requerer a continuidade do LOAS que estava suspenso e volta a receber esse benefício, independentemente de nova perícia.

(ii) Por outro lado, em se tratando de pensionista deficiente que venha a exercer atividade laboral, a lei previdenciária não prevê suspensão, bem como não impede a concessão e a manutenção da pensão com o exercício dessa atividade remunerada pelo pensionista deficiente. Essa distinção decorre de que a assistência social é mais restritiva, no sentido de tutelar apenas necessidades básicas/essenciais, então, havendo um trabalho que garanta ainda que minimamente o sustento, não há razão para o pagamento concomitante do benefício assistencial, nessa lógica.

SITUAÇÃO 2.: (i) Se o titular do LOAS deficiente passar a exercer uma atividade remunerada especificamente na condição de APRENDIZ, há uma regra bastante peculiar, no sentido de que o contrato de aprendizagem não acarreta nem mesmo a suspensão do pagamento do LOAS, desde que limitado esse pagamento concomitante de LOAS e contrato de aprendizagem a 2 anos. Então, se a atividade remunerada for como aprendiz, o titular do LOAS poderá cumular o LOAS com a remuneração do contrato de aprendizagem por até dois anos de recebimento concomitante. Superados esses dois anos, caímos na regra tabela anterior, pela qual o LOAS será suspenso e após o fim da atividade remunerada ou ele adquire o direito ao benefício previdenciário ou requer o restabelecimento do LOAS sem nova perícia

(ii) Já a pensão, assim como na atividade remunerada que não impede a concessão e a manutenção da pensão, da mesma maneira, o contrato de aprendizagem celebrado pelo pensionista deficiente não impede nem a concessão, nem a manutenção da pensão.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Camila. Benefício assistencial ao idoso e ao deficiente; um breve estudo sobre o Benefício de Prestação Continuada (BPC) da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5833, 21 jun. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68934. Acesso em: 24 abr. 2024.