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O valor moral da indenização por dano moral no ordenamento jurídico brasileiro.

A comprovação intersubjetiva do dano moral

O valor moral da indenização por dano moral no ordenamento jurídico brasileiro. A comprovação intersubjetiva do dano moral

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Por ser moral o patrimônio danificado, a identificação do dano moral tem necessariamente o caráter moral e a comprovação ocorrerá de modo intersubjetivo.

1 - INTRODUÇÃO

O presente estudo se propõe a abordar os fundamentos teóricos doutrinários e jurisprudenciais utilizados para a fixação dos valores de indenização por danos morais, nos moldes adotados majoritariamente pela magistratura que dicotomiza o assunto como punição/compensação, limitando-se ao aspecto material.

O trabalho pretende ainda buscar e analisar elementos que fundamentem uma abordagem ao aspecto moral do bem danificado e do dano causado, por ser o seu âmago, com o fim de utilizá-lo como parâmetro de fixação dos valores de indenização.

A existência do dano moral é hoje pacificamente aceita no Ordenamento Jurídico Brasileiro, consagrada que é a sua indenização, pela Constituição da República, no art. 5°, V, X(1) e regulamentada pelos, arts. 12, 186 e 927 do Código Civil(2) e os arts. 14 e seguintes do Código de Defesa do Consumidor(3).

A despeito dessa aceitação, ainda se constata alguma dificuldade em se alcançar a efetividade desse instituto jurídico, o que só será possível quando se lhe conferir praticidade, admitindo-se que tendo existência própria, é causa e efeito de atos, fatos e circunstancias nos planos individual e coletivo da sociedade.

A praticidade de um instituto jurídico se traduz não só na constatação de sua existência, através de seus elementos constituintes e no conceito com que é identificado, mas também na constatação dos fatores que lhe dão causa, dos meios de sua identificação e dos efeitos que ele gera.

Como efeito do dano moral, pode-se identificar a necessidade e o modo de reparação que ele enseja, pois é o que mais se destaca aos olhos dos doutrinadores, o que reflete nas decisões judiciais, como se vê com fartura na jurisprudência.

Para que seja objeto de interesse, observação e análise jurídica, a causa geradora do dano moral será sempre externa, vinda de alguém que se torna agressor, ao cometer ato cujo efeito atinge negativamente a intimidade do individuo que, por ter o seu patrimônio moral danificado, torna-se vítima.

Essa trama pode se configurar em ambiente contratual ou extracontratual, sendo fator fundamental para a sua configuração a existência do nexo entre o ato do gerador da agressão e o dano constatado no patrimônio da outra parte.

Atualmente, a reparação é identificada no pagamento de algum valor financeiro a ser feito pelo agressor à vítima, à guisa indenização da moral danificada.


2 - PENSAMENTO DOUTRINÁRIO

A Doutrina e a Jurisprudência, ao abordarem o tema, são unânimes quanto ao entendimento de que a indenização deve se dar via pagamento de valor financeiro. O “nó górdio” está na fixação de valor que indenize a moral danificada.

Para Fabio Ulhoa Coelho, a existência de dano é condição essencial para a responsabilidade civil, subjetiva ou objetiva. Entende ele que “se quem pleiteia a responsabilidade não sofreu dano de nenhuma espécie, mas meros desconfortos ou riscos, não tem direito a nenhuma indenização”(4) Afirma ainda esse autor que “danos patrimoniais são os que reduzem o valor ou inutilizam por completo bens do credor da indenização. Implicam sempre diminuição do patrimônio da vitima. Extrapatrimoniais, por sua vez, são os relacionados à dor pela vítima experimentada. Não repercutem no patrimônio do credor da obrigação de indenizar, e são chamados, também, de danos morais.” Idem, ibidem, p. 289.(5)

Para o Prof. J. J. Calmon de Passos, “o elemento central do conceito de dano é a existência de um prejuízo, da perda ou desfalque de algo que ao sujeito é passível de ser integrado, quer em termos de patrimônio, quer por inerente ao seu corpo ou a sua personalidade.”(6)

Entende aquele professor baiano, que, “... há danos, contudo, que não afetam nosso patrimônio nem nosso corpo. Eles representam perda naquela dimensão do existir especificamente humano, todo ele constituído do sentido e da significação que emprestamos ao nosso agir, algo que se situa não nas coisas nem na materialidade de nosso corpo, porém na dimensão de nossa subjetividade. Por falta de um nome adequado, ou pela inconveniência de denomina-los por exclusão, denominamo-los de danos morais, ao invés de simplesmente serem considerados como danos não-materiais. Porque insuscetíveis de avaliação e dada a necessidade de também serem materializados, devem ser estimados em termos monetários.”(7)

Yussef Said Cahali, em sua renomada obra, ensina que “segundo entendimento generalizado na doutrina, e de resto consagrado nas legislações, é possível distinguir, no âmbito dos danos, a categoria dos danos patrimoniais, de um lado, dos danos extrapatrimoniais, ou morais, de outro; respectivamente, o verdadeiro e próprio prejuízo econômico, o sofrimento psíquico ou moral, as dores, as angústias e as frustrações infligidas ao ofendido”.(8) (Dano Moral, Ed. Revista dos Tribunais 3ª edição 2005. 1.2, pags.20/21).

Afirma que “a caracterização do dano extrapatrimonial tem sido deduzida na doutrina de forma negativa, na sua contraposição ao dano patrimonial”. (idem ibidem, pag. 21)(9)

Yussef Cahali cita Carlos Alberto Bittar, para quem “qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)”.   In Reparação Civil Por Danos Morais) - Apud. P. 22(10)

Lorena Pinheiro Barros e Danielle Borgholm, em seus artigo “O princípio da razoabilidade como parâmetro de mensuração do dano moral”, citam Carlos Roberto Gonçalves que, em seu  Responsabilidade Civil, p 548 afirma  que O dano moral não vem a ser a angústia, a aflição ou a humilhação vivida pela vítima com o evento danoso, como muitos pensam, e sim as consequências que esses estados trazem à vítima. O dano moral é a privação de um bem tutelado e reconhecido juridicamente a todos os cidadãos.” (11)

Essas mesmas autoras citam também Maria Helena Diniz, para quem o dano moral situa-se fora do patrimônio de seu titular, dizendo que "o dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo".- DINIZ, 2002: p. 8 (Apud Barros & Borgholm.)(12)

Há quem sugira a criação de lei que estabeleça teto para os arbitramentos judiciais de valores de indenizações por danos morais, como o então Pós-Graduando Caio Rogerio da Costa Brandão, que sob a denominação de “estimativa legal do quantum indenizatório”, argumenta “que tal norma não comprometeria o livre convencimento do magistrado, não comprometeria o livre convencimento do magistrado, pois o quantum variaria do mínimo até um máximo permitido em lei, sendo que a quantificação dentro dessa estimativa dependeria do arbítrio exercido pelo julgador, assim como possibilitaria ao juiz que mensurasse a indenização acima do valor máximo permitido em lei para se fazer valer o caráter disciplinador da condenação (nos casos de o ofensor ser possuidor de elevado poderio econômico que comprometa a própria efetividade da condenação), porém este valor excedente não se destinaria ao ofendido, mas sim para um fundo social, o que desta feita, levaria o Estado, através da sua função jurisdicional, corresponder tanto à necessidade da pretensão do direito privado quanto no resguardo do interesse público.”(13)

A pretensão do mencionado autor é que tal hipótese por ele aventada viesse a se tornar uma versão moderna e melhorada de parte do Código de Hamurabi, de priscas eras.

Para o Ministro do STJ – Superior Tribunal de Justiça, Raul Araújo Filho, “... na aferição do valor da reparação do dano moral, deve, pois, o magistrado, seguindo os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, levar em consideração o bem jurídico lesado e as condições econômico-financeiras do ofensor e do ofendido, sem perder de vista o grau de reprovabilidade da conduta do causador do dano no meio social e a gravidade do ato ilícito”.(14)

“De fato, adotada com razoabilidade e proporcionalidade, a aplicação da doutrina do Punitive Damages não se mostra ofensiva à Constituição da República. As garantias tratadas nos incisos V e X do art. 5º têm por destinatário o titular do direito à honra, à imagem e à privacidade, expressões do direito fundamental à dignidade humana e dos direitos da personalidade, a quem, em caso de violação, a Carta Magna assegura indenização por dano moral e material. Mas, ao assegurar a indenização, com total ressarcimento do dano sofrido, não proíbe seja também proporcionada à vítima reparação, pelo ofensor, considerando-se o aspecto punitivo-pedagógico com majoração do valor reparatório”. (14)

“Nesse contexto, a reparação punitiva deverá ser aplicada quando a conduta do agente que ocasionou o dano for considerada extremamente reprovável, caracterizando-se como dolosa ou praticada com culpa grave, o que exclui a sua aplicação para os casos, em que, embora configurado o dano moral, a conduta do agente não tiver gravidade ou reprovabilidade”. (Punitive Damages e Sua Aplicabilidade No Brasil -  (http://www.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/Dout25anos/article/view/1117/1051). Consultado em 05/02/2018. (14)

Na Jurisprudência, vê-se que a Magistratura nacional tem dado acolhida à teoria doutrinária do “Punitive Damage”, também denominada Teoria do Valor do Desestímulo, assim como aquela que defende a aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade,

Ambas as correntes doutrinárias apresentam úteis instrumentos de orientação ao raciocínio do magistrado, no estabelecimento de parâmetros objetivos para fixação do valor numérico da indenização, cuja existência já foi afirmada pelo próprio magistrado.

Alguns exemplos podem ser citados

S.T.J. Recurso Especial 210.101/PR, a Quarta Turma CIVIL. E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO COM VÍTIMA FATAL. ESPOSO E PAI DAS AUTORAS. IRRELEVÂNCIA DA IDADE OU ESTADO CIVIL DAS FILHAS DA VÍTIMA PARA FINS INDENIZATÓRIOS. LEGITIMIDADE ATIVA. QUANTUM

DA INDENIZAÇÃO - VALOR IRRISÓRIO – MAJORAÇÃO - POSSIBILIDADE. DESPESAS DE FUNERAL - FATO CERTO - MODICIDADE DA VERBA - PROTEÇÃO À DIGNIDADE HUMANA - DESNECESSIDADE DE PROVA DA SUA REALIZAÇÃO.

1. É presumível a ocorrência de dano moral aos filhos pelo falecimento de seus pais, sendo irrelevante, para fins de reparação pelo referido dano, a idade ou estado civil dos primeiros no momento em que ocorrido o evento danoso (Precedente: REsp n.º 330.288/SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJU de 26/08/2002).

2. Há, como bastante sabido, na ressarcibilidade do dano moral, de um lado, uma expiação do culpado e, de outro, uma satisfação à vítima.

3. O critério que vem sendo utilizado por essa Corte Superior

4. O critério que vem sendo utilizado por esta Corte Superior, na fixação do valor da indenização por danos morais, considera as condições pessoais e econômicas das partes, devendo o arbitramento operar-se com moderação e razoabilidade, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de forma a não haver o enriquecimento indevido do ofendido, bem como que sirva para desestimular o ofensor a repetir o ato ilícito.

4. Ressalte-se que a aplicação irrestrita das “punitive damages” encontra óbice regulador no ordenamento jurídico pátrio que, anteriormente à entrada do Código Civil de 2002, vedava o enriquecimento sem causa como princípio informador do direito e após a novel codificação civilista, passou a prescrevê-la expressamente, mais especificamente, no art. 884 do Código Civil de 2002.

5. Assim, cabe a alteração do quantum indenizatório quando este se revelar como valor exorbitante ou ínfimo, consoante iterativa jurisprudência desta Corte Superior de Justiça.

6. In casu, o tribunal a quo condenou os recorridos ao pagamento de indenização no valor de 10 salários mínimos a cada uma das litisconsortes, pela morte do pai e esposo das mesmas que foi vítima fatal de atropelamento pela imprudência de motorista que transitava em excesso de velocidade pelo acostamento de rodovia, o que, considerando os critérios utilizados por este STJ, se revela extremamente ínfimo.

7. Dessa forma, considerando-se as peculiaridades do caso, bem como os padrões adotados por esta Corte na fixação do quantum indenizatório a título de danos morais, impõe-se a majoração da indenização total para o valor de R$100.000,00 (cem mil reais), o que corresponde a R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais) por autora.

8. Encontra-se sedimentada a orientação desta Turma no sentido de que inexigível a prova da realização de despesas de funeral, em razão, primeiramente, da certeza do fato do sepultamento; em segundo, pela insignificância no contexto da lide, quando limitada ao mínimo previsto na legislação previdenciária; e, em terceiro, pelo relevo da verba e sua natureza social, de proteção à dignidade humana (Precedentes: REsp. n.º 625.161/RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJU de 17/12/2007; e REsp n.º 95.367/RJ, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJU de 03/02/1997)15)

T.J.M.G. Apelação Cível Nº 1.0672.12.026845-9/001 -EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. AGRESSÕES FÍSICA E VERBAL. COMPROVAÇÃO. ATO ILÍCITO CARACTERIZADO. OFENSA MORAL CONFIGURADA. INDENIZAÇÃO DEVIDA. ‘QUANTUM INDENIZATÓRIO’.  RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. I - O dever de indenizar pressupõe a confluência de três requisitos: a prática de uma conduta antijurídica, comissiva ou omissiva, a existência de um dano, bem como o nexo de causalidade entre esses dois primeiros elementos, conforme previsão dos arts. 186 e 927 do Código Civil. II - Pratica ato ilícito aquele que de forma injusta e desnecessária, em local público, agride física e verbalmente pessoa que reclamou pelos danos materiais causados pelo agressor aos seus instrumentos de trabalho. III – Tem direito à reparação por danos morais a vítima de agressões física e verbal. IV - No arbitramento do dano moral, o julgador deve levar em conta o caráter reparatório e pedagógico da condenação, cuidando para não permitir o lucro fácil do ofendido, mas também não reduzir a indenização a valor irrisório, sempre atento aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como às nuances do caso concreto.

Apelação Cível Nº 1.0672.12.026845-9/001 - COMARCA DE Sete Lagoas - Apelante(s): JOSÉ GERALDO TEIXEIRA - Apelado(a)(s): JOSE CESAR ALVES ACÓRDÃO -  Vistos etc., acorda, em Turma, a 10ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO -.

DES. VICENTE DE OLIVEIRA SILVA Relator

VOTO

 “Passo à análise da pretensão recursal versando sobre o quantum indenizatório, cuja finalidade se assenta tanto no efeito repressivo-pedagógico do agente, como também na satisfação da vítima, sem, contudo, representar um enriquecimento sem causa.

Sobre o tema, Rui Stoco, em sua obra Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, Ed. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 1997, p. 564, sustenta:

"(...) o eventual dano moral que ainda se possa interferir, isolada ou cumulativamente, há de merecer arbitramento tarifado, atribuindo-se valor fixo e único para compensar a ofensa moral perpetrada". 

A doutrina e a jurisprudência têm procurado estabelecer parâmetros para o arbitramento do valor da indenização, traduzidos, por exemplo, nas circunstâncias do fato, bem como nas condições do autor do ilícito e do ofendido, devendo a condenação corresponder a uma sanção ao responsável para que não volte a cometê-lo.

Também há de se levar em consideração que o valor da indenização não deve ser excessivo a ponto de constituir-se em fonte de enriquecimento do ofendido, nem apresentar-se irrisório, como observa Maria Helena Diniz:

"Na reparação do dano moral, o juiz determina, por equidade, levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e não ser equivalente, por ser impossível, tal equivalência. A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e satisfação compensatória. Não se pode negar sua função: penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor; e compensatória, sendo uma satisfação que atenue a ofensa causada, proporcionando uma vantagem ao ofendido, que poderá, com a soma de dinheiro recebida, procurar atender a necessidades materiais ou ideais que repute convenientes, diminuindo, assim, seu sofrimento" ("A Responsabilidade Civil por Dano Moral", in Revista Literária de Direito, ano II, nº 9, jan./fev. de 1996, p. 9).(16)

Pode-se ver nos exemplos citados, a adoção da Teoria do Valor do Desestímulo ou “Teoria do Punitive Damage” como parâmetro de sustentação da fixação do valor definido.  Mas com a clara intenção de afastar do Brasil a repetição do fenômeno que ocorre nos Estados Unidos onde essa teoria é utilizada como justificativa para a fixação de quantias vultosas nas condenações ao pagamento de indenização por dano moral, a justiça brasileira vem adotando a aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade como forma de arrefecer os ânimos à busca pelos jurisdicionados desses valores, assim como à fixação dos mesmos pelos magistrados, vistos tais valores como desproporcionais aos fatos descritos na demanda, bem como às realidades das partes, permitindo que haja a fixação ou correção de valores irrisórios para o mesmo fim.

Ocorre que, ao adotarem essa orientação, tais decisões enquadram-se nos dispositivos do parágrafo primeiro do art. 489 NCPC(17), que tratam da ausência de fundamentação da decisão. A tão só menção à teoria e aos princípios, sem a explicação da relação existente entre os pensamentos doutrinários invocados e a demanda posta, faz com que tais decisões deixem de ser as efetivas respostas às demandas dos jurisdicionados

Luís Roberto Barroso, em seu Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, examinando os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, ensina “que são dois conceitos intercambiáveis entre si, pois, enquanto a doutrina alemã decompôs o Principio da Proporcionalidade em três subprincípios, quais sejam, adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, de outro lado, Humberto Ávila com o seu Teoria dos Princípios é referencia do autor, ao atribuir três sentidos ao conceito de Razoabilidade que são: equidade que é exigência de harmonia da norma geral com o caso individual, congruência que é exigência de harmonia da norma com as condições externas de aplicação e equivalência e, equivalência entre a medida adotada e o critério que a dimensiona”. (p.296)

  Luís Roberto Barroso vê identidade entre os subprincípios da proporcionalidade decompostos pela doutrina alemã e os sentidos atribuídos por Humberto Ávila ao Principio da Razoabilidade do ato, com a denominação de Razoabilidade interna que diz respeito à existência de uma relação racional e proporcional entre os motivos, meios e fins, cunhando a expressão Razoabilidade Técnica.(p.296)(18)

De fato, a razoabilidade e proporcionalidade são termos que podem ser tomados por equivalentes. Entretanto, para que sejam verificadas é necessário que a relação motivo-meio-fim se efetive, o que ocorrerá se os três fatores estiverem presentes.  

 Em se tratando da definição do valor da indenização por causa do dano moral, tem-se que o motivo da indenização é o dano sofrido pelo agredido; o meio é a aplicação da indenização e o fim punição do agressor e compensação do agredido.

Dois fatores são conhecidos: o fim e o meio.  O terceiro fator, o dano moral, somente poderá ser conhecido adentrando-se à sua natureza.


3 - O BEM MORAL

As referencias doutrinárias e jurisprudenciais adotadas, mostram claramente uma orientação negatória da possibilidade da identificação do dano moral em sua própria natureza, de modo a mensurá-lo e tornar possível a estipulação do valor da indenização, cuja função tem dupla face.

É pacífico o entendimento de que para o titular do bem danificado (a vítima), a função da indenização é promover a reconstituição de seu bem, ao ponto de torná-lo “sem dano” ou, tanto quando possível, aproximar  ao máximo desse patamar de reconstituição, à mercê da satisfação do titular ou do juiz do processo, quando levada à decisão judicial.

Já para o agente do ato ou responsável pelo fato gerador do dano, a indenização tem o duplo papel, punitivo/pedagógico. Nisso concorda a grande maioria dos doutrinadores.

Antes de a Constituição Federal consagrar em seu art. 5°, V e X, o direito à indenização por dano moral, houve longa e intensa controvérsia quanto à existência desse dano. Após essa consagração, com a perda do objeto da discussão, os doutrinadores contrários a essa existência voltaram-se para o conteúdo do instituto jurídico, tentando retirar-lhe substancia, com expressões como “mero dissabor do cotidiano”, ou semelhantes. Como o faz Ademir Buitoni, in “Revisão do Dano Moral”, ao invocar o seguinte pensamento do desembargador Sérgio Cavalieri Filho segundo o qual, “... só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos."(19) Assim, buscam desqualificar a sensibilidade inerente à natureza humana. Para tanto, utilizam-se do instituto do Enriquecimento Sem Causa, previsto no art. art. 884 do código civil(20), equivocadamente, à mingua de melhores argumentos.

Ainda nos dias atuais, referem-se ao dano moral como sendo extrapatrimonial. Como se patrimônio devesse ser constituído tão somente de bens materiais, desconsiderando o fato de que a expressão “bem material” tem como elemento essencial o termo “bem” que designa afeição, interesse; desconsiderando ainda que o termo “material” é apenas um complemento do elemento essencial, identificando o objeto da afeição ou interesse.

O pensamento majoritário vigente mostra a sua atenção voltada exclusivamente aos valores das indenizações. É relegado ao mais completo esquecimento o fato de que o objeto da demanda é essencialmente a reação do indivíduo agredido contra a agressão, que é um ato injusto, indevido ou ilegal, cuja consequência é danosa e enseja reparo que se dá por meio da indenização como natural consequência.

Não é sem razão que adoção da Teoria do Valor do Desestímulo –Punitive Damage- no Sistema Jurídico brasileiro, tem se dado com a restrição o que visa ao impedimento de que sejam fixados altos valores de indenizações, com magnitudes semelhantes às que ocorrem nos Estados Unidos, país onde essa teoria tornou-se notória.

Em muitos julgados, tem sido utilizada a referencia aos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, para demonstrar a modicidade contida no valor fixado, muitas vezes com o esquecimento de se demonstrar que esse valor é teor da responsabilização atribuída pelo magistrado ao responsável pela agressão.

As abordagens doutrinária e jurisprudencial feitas na busca de fundamentos para a fixação de valores da indenização por dano moral não se aprofundam o bastante de modo a alcançarem a natureza do dano ocorrido sobre a moral daquele que foi agredido e cuja indenidade é necessitada e pretendida. Os doutrinadores, que se dedicam a esse tema, em sua grande maioria, fazem-no observando-o como um objeto estranho à sua realidade, considerada exclusivamente material.

Todo esforço feito para fixar o valor numérico da indenização por dano moral, visando suprimir o dano moral, cuja existência não é verificada  mas presumida, por não ser material, resulta em admissão tácita da imprescindibilidade da efetiva identificação do dano moral, que leva à necessidade de ser identificado o “bem moral danificado” que, por sua vez, será detectado por meio moral e entendido através de perspectiva moral.

Mas antes de ser discutido o significado da expressão “bem moral”, é necessário que buscar o entendimento sobre o que seja “moral”. Para isso tomo a enciclopédia eletrônica Wikipédia como referencia de informação do significado do termo “moral”

Para Wikipedia, “... E assim, a palavra moral não traduz por completo, a palavra grega originária. É que êthica possuía, para os gregos, dois sentidos complementares: o primeiro derivava de êthos e significava, numa palavra, a interioridade do ato humano, ou seja, aquilo que gera uma ação genuinamente humana e que brota a partir de dentro do sujeito moral, ou seja, êthos remete-nos para o âmago do agir, para a intenção. Por outro lado, êthica significava também éthos, remetendo-nos para a questão dos hábitos, costumes, usos e regras, o que se materializa na assimilação social dos valores.[1]“

“A tradução latina do termo êthica para mores "esqueceu" o sentido de êthos (a dimensão pessoal do ato humano), privilegiando o sentido comunitário da atitude valorativa. Dessa tradução incompleta resulta a confusão que muitos, hoje, fazem entre os termos ética e moral.” Idem, ibidem Wikipedia, consulta em 24/02/2018(21)

A despeito de tantos conceitos do termo moral, voltados para diversos propósitos, pode-se deduzir que o valor moral é o que anima o indivíduo intimamente, não sendo acessível aos outros, senão quando verbalizado ou demonstrado de forma intersubjetiva, em contraposição ao valor material que é demonstrado de forma objetiva.

O fenômeno denominado “Dano Moral” é de todos conhecido  por todos reconhecido, mas considerado desmerecedor de maior atenção da Ciência Jurídica como objeto de estudo.

Entretanto, a evolução das relações sociais, impulsionada pelo avanço tecnológico que, ao dar acesso a grande número de pessoas aos meios de comunicação e, consequentemente, maior acesso a informações e à intelectualização, proporcionando ainda o estreitamento de relacionamentos pessoais que, em razão da distancia física e os contatos esporádicos e simultaneamente, distanciando as pessoas próximas e de contatos presenciais frequentes, proporcionadores de constrangimentos. Ambas as situações eram envolvidas em regras de etiqueta social, preservavam os indivíduos dos atritos de personalidade, característicos da natureza humana.

A mesma rede social que aproxima os distantes e distancia os próximos, permite que cada um experimente o ímpeto de sinceridade e autenticidade, pois, estando fisicamente só, sente-se próximo dos distantes e distante dos próximos, a um só tempo.

O afloramento dessa natureza humana rompeu as etiquetas sociais e nos dias atuais brindam as redes sociais com eventos e espetáculos inusitados que ganham proporções surpreendentes.

Esses fatores reunidos nos últimos 30 (trinta) anos, período de consolidação do Direito Constitucional Brasileiro, tendo os princípios ganho maior atenção como normas autoaplicáveis e, considerando ainda que o estudo do direito já não está mais circunscrito a quem a ele se dedica, mas a todos que por ele se interessarem, com os mais diversos modos de interpretação, para os mais diversos fins, compõem a realidade de uma sociedade cujos interesses, o conhecimento do direito, coletiva e individualmente.

Essa realidade está a clamar pelo reconhecimento daqueles que se acham na posição de pensar, ditar e distribuir a justiça.

Verifica-se perplexidade tanto da doutrina quanto do Poder judiciário o que impede a visão translúcida para a realidade a fim de vê-la tal qual é.

No clamor social podem ser identificados diversos elementos, dentre eles o Bem Moral que está na essência de todos os valores que a humanidade considera, embora seja ignorado como fator essencial a vivencia individual e coletiva.

O Bem Moral é o conjunto de valores que constitui o sustentáculo da existência equilibrada emocional e racionalmente do individuo humano.

Para o Filósofo romano Sêneca, “... O Bem Moral é o bem absoluto, no qual se realiza totalmente a felicidade, e graças ao contato dele todas as outras coisas se podem tomar formas de bem. Exemplificando: há coisas que em si nem são boas nem são más, tais como o serviço militar, a carreira diplomática, a jurisprudência. Se estas tarefas forem realizadas conformemente ao bem moral, começam a tornar-se bens e passam, de indiferentes, para a categoria do bem. O bem, em geral, depende de estar ou não associado ao bem moral; o bem moral é em si mesmo o bem; o bem em geral está dependente do bem moral, enquanto o bem moral depende apenas de si. Tudo quanto é simplesmente um bem poderia ter sido um mal; o bem moral, pelo contrário, nunca poderia deixar de ter sido um bem.” (Séneca, in 'Cartas a Lucílio')(22)

O caráter emocional do bem moral é a expressão (movimento) do sentimento do individuo quando em contato com algum aspecto da realidade externa que o estimula de modo confortável ou desconfortável. Já o caráter racional do bem moral se dá no exercício da ponderação, da avaliação e do julgamento desse encontro da intimidade individual com a realidade externa. “Razão é a capacidade da mente humana que permite chegar a conclusões a partir de suposições ou premissas. É, entre outros, um dos meios pelo qual os seres racionais propõem razões ou explicações para causa e efeito. A razão é particularmente associada à natureza humana, ao que é único e definidor do ser humano” (23).

O Bem Moral permanece sempre intacto quando, por sua própria iniciativa, o individuo entra em contato com a realidade externa que lhe oferecerá elementos de estímulos, de modo a tocar-lhe o sentimento que acionará a razão para a avaliação do efeito da provocação, momento em que a sua emoção é levada a responder ao estimulo externo. Essa resposta será positiva se o sentimento for interpretado pela razão como de conforto, ou negativa se sentimento for interpretado pela razão como de desconforto. Independente de qual seja o sentido da avaliação racional, esta terá como justificativa a iniciativa do contato, invalidando qualquer rejeição emocional no momento de desconforto.

Por outro lado, quando o contato com a realidade externa não decorre de iniciativa do individuo, mas sim de elementos circunstanciais que adentram a sua intimidade, provocando-lhe sensação que será agradável ou desagradável, de acordo com a avaliação racional, o Bem Moral sofrerá alteração positiva ou negativa.

A alteração tida por positiva é aquela sentida como carinho, elogio, geradora de prazer ou satisfação. Já a alteração tida por negativa é aquela sentida como dor, humilhação, maltrato, perda, agressão; enfim, geradora de um desconforto.

A intensidade ou profundidade dessa alteração é inversamente proporcional à intensidade da alteração ou à sensibilidade do individuo. Se de um lado, a alteração positiva pode ser de tal ordem que surta efeito inebriante no individuo. De outro lado a alteração negativa pode gerar efeito devastador no ânimo dessa mesma pessoa.

É nesse contexto que surge como dano moral juridicamente considerado. A alteração do estado emocional negativa do indivíduo, provocada por circunstancia ou fatores externos a essa pessoa, alheias à vontade e iniciativa dela.

A Constituição Federal em seu art. 5°, V - assegura o direito (...) da indenização por dano material, moral (...) e no inc. X declara invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano (...) moral decorrente de sua violação.

A regulamentação da norma constitucional acha-se no código civil, cujo art. 186, confere ilegalidade ao ato gerador de dano moral, ao dispor que Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

O legislador infraconstitucional houve por bem estender a mesma ilicitude ao ato cometido pelo titular direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. É o que dispõe o art. 187 do código civil.

A consequência dessas duas ocorrências legalmente prevista está disposta no art. 927 e seu parágrafo único, levando-as à conta de Responsabilidade Civil, para impor ao autor do comportamento ilícito a obrigação de indenizar aquele que sofre os efeitos de seu comportamento. 

Depreende-se de todos os dispositivos legais citados o fato de o dano moral cogitado pelo legislador receber deste a mesma consideração que o dano material e de imagem, desautorizando qualquer dúvida quanto à existência do patrimônio moral, assim como se tem como certa a existência do patrimônio material. Se assim não fora, o ato danificador não receberia tal qualificativo, tampouco adviria o dano como consequência.

Portanto, não assiste razão àqueles que insistem em caracterizar o dano moral como sendo de natureza extrapatrimonial, como que restringindo a ser parte do patrimônio somente aqueles bens que podem ser denominados materiais.


4 - A Constatação do Dano Moral

De um lado, não se pode pretender constatar o dano moral, evento de natureza imaterial utilizando-se meios e modos materiais, na expectativa de que o resultado seja material, de constatação objetiva. Essa orientação conduziu muitos estudiosos à negação da existência do Dano Moral, até a consagração constitucional por meio da norma que prevê a Indenização por Dano Moral.

De outro lado, o fato de o evento ser consequência de agressão aos valores sentimentais da vítima tornando-o de constatação subjetiva, isso não é razão para que esses valores sejam considerados extrapatrimoniais, como ainda é o entendimento majoritário dos doutrinadores, tampouco que sejam desmerecedores da consideração de quem tem por oficio reconhece-los, ninguém menos que os membros do Poder Judiciário.

O fato de expressão material é de fácil constatação objetiva, enquanto os sentimentos que são fatos de expressão moral, são de fácil constatação subjetiva, por parte de quem os tem e de possível verificação intersubjetiva por parte de quem deles tem noticia.

A verificação intersubjetiva ocorre no processo judicial para o magistrado quando ele recebe o testemunho do Autor que teve o seu patrimônio moral danificado informando as características dos sentimentos por ele experimentados, informando e comprovando as circunstancias ensejadoras de  tais sentimentos.

O magistrado, usando de sua alta qualificação intelectual e moral, valorará em seu subjetivismo a razoabilidade e a proporcionalidade dos males enfrentados pelo titular do bem moral danificado. Essa valoração expressará o sentimento do magistrado diante da comprovação objetiva das  circunstancias vivenciadas pelo autor da ação.

Inúmeros são os institutos jurídicos de natureza imaterial e cujas verificações ocorrem de maneira intersubjetiva. No Direito Penal, o dolo e a culpa são verificados de intersubjetivamente, a partir da comprovação objetiva das circunstancias, colhida no inquérito policial. O Ministério Público  afirma a culpa ou dolo do réu, pedindo a sua condenação.

No Direito Empresarial, a Afeccio Societatis assim como a sua ruptura também são verificadas de maneira intersubjetiva, por meio da comprovação objetiva das circunstancias.

A análise do magistrado tem guarida constitucionalmente prevista no art. 5°, Caput da CF, segundo o qual, “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, ...”. Essa igualdade está na humanidade que é característica essencial de ambos (juiz e autor)

O Principio da Legalidade fundamenta e justifica a oportunidade que o magistrado tem de avaliar em si mesmo o dano sofrido pelo Autor em seu patrimônio moral, ao ser submetido a todas essas agruras descritas, podendo aquilatar de maneira precisa o dano moral levado ao seu conhecimento.

O sistema jurídico brasileiro, já contempla esse posicionamento, quando no seu art. 112 o Código Civil dá prevalência ao aspecto moral, em detrimento do material da declaração de vontade.

Art. 112 CC - Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.(24)

Por essa razão não tem qualquer sentido ou fundamento estabelecer como parâmetro para fixação do valor da indenização por dano moral a posição sócio-econômica daquele que sofreu o dano moral, nem tampouco como fator de afastamento da ideia do enriquecimento sem causa, como querem alguns doutrinadores.

Sendo o dano moral, a sua avaliação deve ser de cunho moral, sofrendo, posteriormente, conversão para a realidade financeira do réu, para que este a receba como penalidade pela ilegalidade, ilegitimidade e agressividade de seu ato que danificou o patrimônio moral do agredido.


5 - A Conversão do Valor Moral em Valor Financeiro

O pagamento do valor da indenização estipulado pelo titular do bem moral danificado pelo mal sofrido não o torna indene, por não ter o condão de apagar de sua memoria a lembrança da agressão, assim como os sentimentos experimentados.

A recuperação do agredido ocorre quando ele mesmo se decide pela busca da superação dos efeitos da agressão, iniciando por dar continuidade à sua vivencia apesar do trauma, fortalecendo-se em seguida, até alcançar plena recuperação emocional.

Entre a decisão e o alcance da recuperação emocional, há o intervalo de tempo e uma gama de esforços a serem feitos pelo agredido que em sua condição humana carece de auxilio externo para ultimar a recuperação. Auxilio que pode ser dado pelo agressor, espontaneamente ou compelido pelo Poder Público.

O valor da indenização é a expressão da atenção e do reconhecimento que o titular do bem danificado recebe do Poder Público Judicante que demonstra a sua autoridade de mantenedor da ordem justiça social proporcionando meios para alcançar reequilíbrio do relacionamento entre as partes, o que se dá com a recuperação do patrimônio moral do agredido, para qual deve contribuir agressor, cuja responsabilização contém os dois sentidos da palavra punição, quais sejam sofrimento e o corretivo. Ambos têm o propósito de educar o agressor, estimulando-o à reflexão sobre o seu comportamento desrespeitoso.

É como regula o art. 12 do Código Civil) :

Art. 12 CC - Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.(25)

Como responsável pelo dano ao bem moral, o agressor deve ser levado a contribuir para o desfazimento do dano. Mas não é da natureza do bem moral danificado, ser emendado, remendado, reposto, trocado, substituído; como ocorre ao bem material, que admite troca ou substituição por outro da mesma espécie.

O dinheiro, que em principio é o elemento socialmente eleito como meio de troca de bens e serviços, veio se tornando, ao longo do tempo e da historia da humanidade, fator de medição do grau de consideração social e daí o medidor da moralidade individual a que todos se submetem sem maiores questionamentos. Por essa razão, a justa indenização por dano moral pressupõe o reconhecimento do bem moral, seu valor moral e, por fim, a conversão desse valor moral para financeiro, a fim de alcançar a sensibilidade e o entendimento do agressor, cuja percepção de valor mostra-se limitada ao aspecto material e à perspectiva financeira.

Portanto, estando objetivamente comprovados os fatos, o nexo de causalidade, assim como a responsabilidade do individuo apontado como agressor, a verificação do dano moral ocorrerá intersubjetivamente e, com o auxílio da Teoria do Valor do Desestímulo ou da doutrina do Punitive Damages e aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, estará o Magistrado de posse dos elementos necessários não só para a constatação do dano moral cometido pelo agressor à vítima, mas podendo também avaliar a sua intensidade e seus reflexos, transformando essa avaliação moral em avaliação financeira.

A seu turno, ao agressor é dada oportunidade de entender e compreender o bem moral e o seu valor para a vida individual e coletiva.


REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

01 – Constituição da República Federativa do Brasil, art. 5°, V e X;

02 – Lei no 10.406, de 10/01/2002. Código Civil – arts. 186 e 927

03 - Código de Defesa do Consumidor – arts. 14 e segs.

04 – Coelho, Fabio Ulhoa - Curso de Direito Civil – Obrigações. Responsabilidade Civil 2, Saraiva, 2009 p.287

05 – Idem, ibidem, p. 289.

06 –  PASSOS, José Joaquim Calmon de. O imoral nas indenizações por dano moral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. item 10 - Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/2989>. Acesso em: 12 de agosto de 2017.

07 – Idem, ibidem –

08 – Cahali, Yussef Said - Dano Moral, Ed. Revista dos Tribunais 3ª edição 2005. 1.2, pags.20/21

09 – idem,ibidem, p. 21;

10 – Apud Cahali, Yussef Said - Dano Moral, Ed. Revista dos Tribunais 3ª edição 2005. P. 22

11 – Barros, Lorena Pinheiro e Borgholm,  Danielle, in O princípio da razoabilidade como parâmetro de mensuração do dano moral . Disponível em http://www.lfg.com.br. Consultado em 13/01/2018.

12 – idem, ibidem,

13 - BRANDÃO, Caio Rogério da Costa. Dano Moral: valoração do quantum e razoabilidade objetiva. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, no 129. Disponível em: <https://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=659> Acesso em: 16 jan. 2018.

14 - Araújo Filho, Raul,  Ministro do STJ - Punitive Damages e Sua Aplicabilidade No Brasil

(http://www.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/Dout25anos/article/view/1117/1051

15 – STJ – Superior Tribunal de Justiça - Recurso especial provido. (REsp 210.101/PR, Rel. Ministro CARLOS FERNANDO MATHIAS, QUARTA TURMA, julgado em 20/11/2008, DJe de 9/12/2008

16 - T.J.M.G. Apelação Cível Nº 1.0672.12.026845-9/001 – Rel. Des. Vicente de Oliveira Silva

17 – Novo Código de Processo Civil, no art. 489, § 1°, incs. II e III

18 – Barroso, Luís Roberto, Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, Saraiva, 6ª ed, p. 296

19 – BUITONI, Ademir. Revisão do dano moral. Por que reparar só em dinheiro?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1832, 7 jul. 2008. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/11416>. Acesso em: 21 julho 2017.

20 – Código Civil – art. 884

21 – Enciclopédia Eletrônica Wikipédia, consulta em 24/02/2018

22  - Sêneca, Lucius, Séneca, in 'Cartas a Lucílio’

23 – Conceito de Razão - Enciclopédia Eletrônica Wikipédia – consulta em 10/10/2017, 00,30h

24 – Código Civil, art. 112

25 – idem, art. 12


Autor

  • MARCELO CORREA

    Há 30 anos sou advogado, pos-graduado em advocacia cível, com atuações no direito administrativo, direito de trânsito, direito civil. Há 20 anos, como empregado da BHTRANS, empresa de transportes e trânsito de Belo Horizonte.

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