Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/7046
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

A assistência judiciária e a justiça gratuita no processo de conhecimento

A assistência judiciária e a justiça gratuita no processo de conhecimento

Publicado em . Atualizado em .

SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Histórico - 3. Requisitos para a obtenção do Benefício - 4. A Assistência Judiciária e a Justiça Gratuita no Processo de Conhecimento - 5. O Papel das Instituições de Ensino Superior e da Defensoria Pública no Acesso à Justiça - 6. Do Cabimento do Benefício às Pessoas Jurídicas - 7. As Taxas Judiciárias - 8. Os Honorários Advocatícios e de Perito - 9. Da Revogação do Benefício - 10. Da Cessação da Exigibilidade - 11. Conclusão.


1. Introdução

O presente estudo destina-se a indigitar a funcionalidade dos institutos da assistência judiciária e da justiça gratuita no processo civil brasileiro, bem como o grau de relevância no processo de conhecimento, em particular.

A desigualdade social que assola nosso país representa entrave ao acesso à Justiça. Um cidadão não pode depender de sua situação financeira para ingressar em Juízo buscando a tutela jurisdicional, conforme rezam os princípios e ditames constitucionais. A parte necessitada poderá, então, recorrer à assistência judiciária gratuita, decorrência do Estado Democrático de Direito, passando a constituir Defensor Público e obtendo dispensa das custas processuais, auferindo a gratuidade da Justiça, instituto de direito pré-processual.

Ao mesmo tempo em que é condição primordial para o exercício da cidadania, o acesso à Justiça também constitui preliminar lógica do exercício de todos os demais direitos, provendo sustentação à dignidade que o conceito de ser humano necessariamente envolve. (KNOERR).

No parecer de alguns doutrinadores, a expressão "assistência judiciária" é mais abrangente que "justiça gratuita". (ZANON, 1990, p. 26). Muito oportuna se apresenta a lição do Prof. Nehemias Domingos de Melo (2004):

A Assistência Judiciária, enquanto instituto de direito administrativo, é posta à disposição do hipossuficiente como condição primeira para seu ingresso no judiciário, quando então, lhe é fornecido além das isenções de custas e atos processuais, defensor público. De menor abrangência, o benefício da justiça gratuita é instrumento eminentemente processual que pode ser solicitado ao juiz da causa tanto no momento inaugural da ação quanto no curso da mesma, significando dizer que a dispensa das despesas processuais é provisória e condicionada à manutenção do estado de pobreza do postulante, podendo ser revogada a qualquer tempo.

Na prática, infelizmente nem tudo corre às mil maravilhas, conforme idealiza a Constituição Federal pátria. Alguns Juízes sequer dão importância a esse louvável instituto, muitas vezes deixando de analisar o pedido do benefício ou criando óbices para a sua concessão. Conforme bem observa J. J. Calmon de Passos (2002), os processos sob a égide do favor, adquirem maior lentidão, comparados aos demais:

E se não pretendermos fazer de conta que ignoramos a realidade, sabemos perfeitamente que os processos em que os litigantes gozam do beneficio da assistência judiciária gratuita andam mais lentos que a tartaruga da fábula, sem contar com a vantagem que ela teve de o coelho cochilar à sombra da árvore, o que jamais acontece com os litigantes abonados em relação a seus adversários beneficiários da assistência judiciária gratuita.


2. HISTÓRICO

Não se pode precisar ao certo quando surgiram os primeiros traços dos serviços de assistência judiciária à população carente.

O Código de Hamurabi, Rei da Babilônia, datado do séc. XXI a.C., com seu texto de 3.600 linhas, distribuídos em 282 artigos, já contemplava os denominados decretos de eqüidade. (ALTAVILA, 1995, p. 37-38). Historiadores o apontam como primeiro documento realmente preocupado em evitar a discriminação nos julgamentos. (ROCHA). Outros registros remontam à fundação de Roma (séc. VIII a.C.), onde aos patronos (poderosos do povo), caberia a "proteção" dos menos favorecidos (os clientes), explicando-lhes as leis, inclusive defendendo-os em Juízo. (PLUTARCO, 1991, p. 64).

Em Atenas, coube ao legislador Sólon (séc. VI/VII a.C.) abolir as Leis de Draco, instituindo o julgamento popular, onde os magistrados apenas o presidiam e o povo era quem manifestava sua decisão, através de seixos brancos ou negros. Foi um marco na evolução do direito de defesa, mas a preocupação com o acesso à justiça permanecia em debate entre os filósofos gregos. A partir desse período, há registros seguros do recolhimento de taxas visando à manutenção dos Juízos. (ROCHA).

O advento do Cristianismo permitiu que se fizesse uma distinção entre as esferas política e religiosa. (FERRAZ JR., 2001, p. 61). Sob essa influência, o Imperador Constantino (séc. III/IV d.C.) promulgou o Edito de Milão, que proibia a perseguição dos cristãos, bem como dava início ao processo de implantação do Cristianismo como religião do Império. Teria sido o primeiro documento a determinar que os pobres estavam isentos do pagamento de custas e seriam defendidos gratuitamente. Reconhecidamente, surge o embrião da assistência judiciária gratuita com o intuito de garantir ao necessitado o acesso à Justiça. Entretanto, somente mais tarde foi criada a assistência judiciária gratuita. (ROCHA).

A consolidação do Direito Romano deu-se com Justiniano (séc. V/VI d.C.), com o Digesto ou Pandectas e as suas Institutas, passando à Idade Média como Corpus Juris Civilis. E foi Justiniano quem incorporou definitivamente ao Direito Romano a prática de dar advogado às partes que não o tivessem, transformando a assistência judiciária em um dever do Estado. (ROCHA). Direito justinianeu, portanto, é o decorrente do Corpus Juris Civilis, representando a fase terminal do Direito de Roma, à qual se prendem as transformações posteriores. (CRETELLA JÚNIOR, 2002, p. 12).

Durante o período medieval, praticamente nenhuma evolução significativa foi registrada desde Justiniano. Na Inglaterra feudal (século XIII) surge a Magna Carta, verdadeira linha divisória na história dos direitos e garantias individuais e, portanto, do acesso à Justiça. Mais tarde, as idéias de Locke, Rousseau, Montesquieu e outros filósofos europeus ganharam força mundial. (ROCHA).

Na Declaração de Direitos da Virgínia, em data de 12 de junho de 1776, antecipando a Revolução Francesa, os norte-americanos afirmaram que "Todos os homens nascem igualmente livres e independentes" e que "Toda autoridade pertence ao povo". (ALTAVILA, 1995, p. 251). A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, em seu art. 3º, aduzia que "O princípio de toda soberania reside essencialmente na nação", tendo análoga importância histórica. (FERRAZ JR., 2001, p. 73).

A Revolução Francesa de 1789 é outro marco consagrado na evolução dos direitos humanos. Porém, a assimilação da assistência judiciária como garantia fundamental de acesso à Justiça só ocorreu em 1791, ou seja, posteriormente à Constituição Americana. Somente em 22 de janeiro de 1851 foi publicado, na França, o primeiro Código de Assistência Judiciária, oficializando essa denominação ao serviço público de assistência jurídica ao cidadão. (ROCHA).

No Brasil, para o constitucionalista Celso Ribeiro Bastos (1989, p. 374-375), a assistência judiciária tem suas raízes nas Ordenações Filipinas, diploma de suma importância na história do Brasil porque, por força da Lei de 20 de outubro de 1823, vigorou por estas terras até 1916, advento do Código Civil.

A Constituição de 1934, em seu art. 113, nº 32, instituiu a concessão da assistência judiciária aos cidadãos necessitados, criando órgãos especiais e garantindo a isenção de emolumentos [01], custas e taxas. (ROSAS, 1999, p. 47).

Em 1935 houve a implantação do primeiro serviço de assistência judiciária promovido pelo governo brasileiro, no Estado de São Paulo e, em seguida, no Rio Grande do Sul e Minas Gerais. (CAMPO, 2002, p. 7-8).

A Constituição de 1937, dita "Polaca", restou silente quanto à matéria, que somente foi disciplinada pelo Código de Processo Civil de 1939. Sete anos depois, o art. 141, § 35, da Constituição Federal de 1946 restabelecia a garantia constitucional. Até o surgimento da Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, que estabelece normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados, fazia-se uma interpretação sistemática entre a Constituição vigente e o CPC de 1939. Não houve maiores modificações na CF de 1967, com a Emenda Constitucional nº 01/69, haja vista que o benefício continuava a ser concedido aos necessitados. (CAMPO, 2002, p. 8-9).

O Professor Luís Roberto Barroso (2001, p. 98), com a maestria que lhe é peculiar, leciona que o artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal de 1988, prevê, entre os direitos e garantias fundamentais, a assistência judiciária integral e gratuita, proporcionada pelo Estado àqueles que comprovarem insuficiência de recursos. Entretanto, visando facilitar o amplo acesso ao Poder Judiciário (inciso XXXV), o ente estatal poderá conceder assistência judiciária gratuita, mediante presunção juris tantum de pobreza, decorrente de asserção da parte de que não possui condições de pagar as custas do processo e os honorários advocatícios sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família.

O supracitado dispositivo é complementado pelo inciso LXXVII: "São gratuitas as ações de habeas corpus, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania".


3. REQUISITOS para a obtenção do benefício

O benefício da assistência judiciária gratuita será concedido tão-somente aos que preencham os requisitos legais, com fulcro no art. 5º, inciso LXXIV da CF/88 e na Lei nº 1.060/50 [02] (Lei de Assistência Jurídica ou LAJ).

Na exegese do art. 10, da LAJ, os benefícios são individuais (direito personalíssimo). A concessão a um cônjuge, por exemplo, não é estendida em favor do outro, nem se transfere a herdeiros e sucessores, havendo necessidade de serem concedidos benefícios em casa caso ocorrente. Ainda, o deferimento em prol de uma parte em um processo, não a exonera das custas e despesas em outro. (VIDIGAL, 2000, p. 67).

O artigo 2º da Lei de Assistência Jurídica estabelece o seguinte:

Art. 2º - Gozarão dos benefícios desta lei os nacionais ou estrangeiros residentes no País que necessitarem recorrer à justiça penal, civil, militar, ou do trabalho.

Parágrafo único. Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

A lei prevê a concessão do benefício a estrangeiros, desde que residentes no Brasil [03]. Brasileiros têm direito ao favor, mesmo residindo no exterior. (VIDIGAL, 2000, p. 23).

O conceito de necessitado está presente no parágrafo único do art. 2º. Não importa se o requerente possui patrimônio, rendimentos, se constituiu advogado particular ou está na absoluta miséria, para que seja beneficiário da justiça gratuita. Mister se faz que, no momento, não possua condições de arcar com as custas e os honorários, sem prejuízo próprio ou de sua família. Com efeito, preleciona Yussef Said Cahali (1997, p. 155) que:

O beneficiário da gratuidade não consiste na isenção absoluta de custas e honorários, mas na desobrigação de pagá-los enquanto persistir o estado de carência, durante o qual ficará suspensa a exigibilidade do crédito até a fluência do prazo de cinco anos, a contar da sentença final.

Neste sentido, oportuna a transcrição dos seguintes julgados:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – A concessão de Assistência Judiciária Gratuita independe da condição econômica de pobreza ou miserabilidade da parte, importando sim a demonstração de carência financeira, nem que seja ela momentânea, conforme se depreende do art. 2º, § único da Lei 1.060/50 e artigo 5º, LXXIV da CF. Agravo de instrumento. Decisão monocrática dando provimento. (TJRS – AGI 70006492433 – 12ª C.Cív. – Rel. Des. Marcelo Cezar Muller – J. 04.06.2003) (grifos nossos)

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA – PRESENÇA DE REQUISITOS – CONCESSÃO – RECURSO PROVIDO – Apresentando a requerente os requisitos constantes no artigo 4º da Lei 1.060/50, impõe- se-lhe o deferimento dos benefícios da gratuidade judiciária; não justificando, a sua denegação, o fato de ter a solicitante constituído advogado particular. (TJMG – AG 000.297.725-4/00 – 8ª C.Cív. – Rel. Des. Sérgio Braga – J. 10.02.2003) (grifos nossos)

O art. 5º, inciso LXXIV, da Carta Magna, preceitua que:

LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;

Destarte, há decisões de nossos Tribunais no sentido de que o requerente deverá comprovar a insuficiência de recursos, através da uma declaração de pobreza (na acepção jurídica da palavra):

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – PESSOA JURÍDICA – CONCESSÃO – A parte gozara dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários advocatícios, sem prejuízo do sustento próprio. Por sua vez, o juiz, se não tiver fundadas razões para indeferir o pedido, deverá julgá-lo de plano, no sentido do deferimento. Concessão, também, a pessoa jurídica, em face do contexto social e das sérias repercussões, inclusive, de subsistência familiar, por eventual impedimento do acesso ao Judiciário, por razões apenas econômicas. Princípio constitucional de livre acesso a Justiça. Aplicação dos arts. 2º, parágrafo único, 4º, 5º e 6º, da Lei nº 1.060/50, em consonância com o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. Agravo provido. (TJRS – AGI 70006161657 – 5ª C.Cív. – Rel. Des. Leo Lima – J. 08.05.2003) (grifos nossos)

Outras entendem que o advogado poderá fazê-la em nome de seu cliente, desde que possua poderes para tal:

PROCESSO CIVIL – JUSTIÇA GRATUITA – DECLARAÇÃO DE POBREZA AFIRMADA – Pelo advogado. O pedido para ser contemplado com os benefícios da justiça gratuita pode ter fincas em declaração de pobreza firmada pelo advogado com poderes para o foro em geral, dispensada a exigência de poderes específicos, e pode ser formulado em qualquer fase do processo, inclusive na apelação. Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido em parte. (STJ – RESP 543023 – SP – Rel. Min. Cesar Asfor Rocha – DJU 01.12.2003 – p. 00365) (grifos nossos)

As conseqüências da falsa declaração de pobreza estão previstas no art. 4º, § 1º, da Lei de Assistência Jurídica, ou seja, multa de dez vezes o valor das custas, valor que quase nunca é aplicado, mesmo nos casos de revogação do benefício. Ressalte-se que não é devida a multa em caso de cessação do estado de miserabilidade do beneficiário, sendo razoável quando caracterizada a má-fé da parte ou desejo inequívoco de iludir o Juiz a respeito de suas condições financeiras. (VIDIGAL, 2000, p. 39).


4. A assistência judiciária e a justiça gratuita no Processo de Conhecimento

Como não há limitação legal no Código de Processo Civil nem na Lei de Assistência Jurídica, a jurisprudência tem esclarecido que a assistência judiciária tem cabimento em todo e qualquer processo, sem exceção, desde que observados os pressupostos para a sua concessão. (ZANON, 1990, p. 33).

O processo de conhecimento, basicamente se desenvolve entre a petição inicial e a sentença. Tem como finalidade a composição de uma lide por meio de uma sentença do órgão jurisdicional, tomando, na generalidade dos casos, um procedimento típico, padrão. Tais são as fases lógicas do processo de conhecimento: postulatória, probatória e decisória. Está compreendido, no Código de Processo Civil, do artigo 1º ao 565. (PROCESSO, 2004). O objeto do processo de conhecimento é a pretensão ao provimento denominada de sentença de mérito. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2003, p. 302).

Ainda, conforme lecionam Maria da Glória Colucci e José Maurício Pinto de Almeida (2000, p. 129): "Se no processo se objetiva a declaração da vontade da lei ao caso concreto (sentença de mérito), diz-se que o processo é de conhecimento".

O art. 19, do Código de Processo Civil, dispõe acerca das custas processuais, necessárias à Administração da Justiça:

Art. 19 - Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até sentença final; e bem ainda, na execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença.

§ 1º - O pagamento de que trata este artigo será feito por ocasião de cada ato processual.

§ 2º - Compete ao autor adiantar as despesas relativas a atos, cuja realização o juiz determinar de ofício ou a requerimento do Ministério Público.

Em nosso ordenamento jurídico não há a possibilidade de recolhimento tardio das custas, cabendo à parte, ou efetuar o preparo, conforme disposto no supracitado artigo, ou requerer assistência judiciária, consoante lhe permite a Lei nº 1.060/50. (TJRS – AGI 70006589543 – 10ª C.Cív. – Rel. Des. Luiz Ary Vessini de Lima – J. 18.06.2003).

O art. 4º, da Lei nº 1.060/50 preceitua que o autor deverá postular o benefício na petição inicial. No art. 6º, do mesmo diploma legal, abre-se uma exceção a essa regra, permitindo a qualquer das partes formular idêntico pedido, mesmo com a ação em curso, evitando que causas supervenientes possam implicar na insuficiência de recursos para fazer frente às despesas processuais, como por exemplo, a elevação do valor da causa. (CAMPO, 2002, p. 68).

Para os pedidos formulados antes da propositura da ação, o Juiz deverá nomear advogado que represente o necessitado, segundo disposição expressa dos parágrafos 1º a 4º do art. 5º, da LAJ. Se requerido na inicial, será apreciado de plano pelo Juiz, caso não tenha razões para indeferi-lo (caput do supracitado artigo). Se a ação estiver em trâmite, a petição com o requerimento será autuada em apartado, a fim de que não seja suspenso o andamento do processo (art. 6º do referido diploma legal).

A decisão que concede ou nega o benefício ao requerente é interlocutória, portanto cabe agravo de instrumento. De acordo com o art. 17, da Lei nº 1.060/50, se for concedido ou negado o benefício no curso da ação, ou mesmo antes de sua proposição, caberá interposição do recurso de apelação, bem como da decisão que julga a impugnação do direito à assistência judiciária, disposta no art. 4º, § 2º, da mesma lei.

Nos termos do art. 9º da Lei de Assistência Jurídica, como o benefício se estende por todo o curso do processo, inclusive perante qualquer Juízo e Tribunal, e abrange todo e qualquer ato necessário para o bom exercício da defesa, se o favor for concedido no processo de conhecimento, persistirá nos processos de liquidação e de execução, a não ser que seja revogado o benefício (VIDIGAL, 2000, p. 65):

Art. 9º - Os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos do processo até a decisão final do litígio, em todas as instâncias.

Neste contexto, o seguinte julgado:

PROCESSUAL CIVIL – ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – ABRANGÊNCIA – 1. A Assistência Judiciária Gratuita concedida no processo de conhecimento abrange todos os atos até o final do litígio, nos termos do art. 9º da Lei nº 1.060/50, inclusive os embargos à execução. Precedente. 2. Agravo de instrumento improvido. (TRF 4ª R. – AI 2003.04.01.047845-1 – RS – 6ª T. – Rel. Des. Fed. Nylson Paim de Abreu – DJU 07.01.2004 – p. 386) (grifos nossos)

Corroborando esse entendimento, a Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná, através do Ofício Circular nº 185/01, de 5 de novembro de 2001 (publicado no Diário da Justiça de 20 de novembro de 2001), veiculou aos Magistrados:

Levo ao conhecimento de Vossa Excelência, para as medidas que se fizerem necessárias, que os atos judiciais derivados de processos onde existe parte beneficiária da justiça gratuita (Lei nº 1.060/50) e no interesse desta, ainda que seja para surtir efeitos no foro extrajudicial, são isentos de custas e emolumentos.


5. O PAPEL Das Instituições de Ensino Superior e da defensoria pública no acesso à justiça

Os Escritórios Modelo ou Núcleos de Prática Jurídica das Universidades e Faculdades de todo o Brasil vêm prestando assistência jurídica gratuita à população carente. Contando com a colaboração de profissionais e estagiários dos cursos de Direito e Serviço Social, o rol de serviços, nas áreas cível, criminal e trabalhista, vai desde uma simples orientação até o ajuizamento de ações pertinentes aos casos trazidos a lume.

A experiência prática objetiva, também, apresentar aos alunos do curso de Direito o efetivo exercício profissional, dando oportunidade para que conheçam as diversas atividades jurídicas existentes e tenham contato com a experiência dos profissionais de Direito. Mister frisar que somente a parceria teoria-prática é capaz de formar cidadãos e profissionais competentes, aptos para um trabalho digno do papel que desempenharão na sociedade.

O legislador constituinte se preocupou em disciplinar, no art. 134, da CF/88, que a Defensoria Pública é o órgão do Estado cuja incumbência é a de prestar assistência jurídica aos necessitados (CAMPO, 2002, p. 109):

Para De Plácido e Silva (2004, p. 151), Defensoria Pública é a "instituição que se encarrega de promover a concessão da justiça gratuita e costuma fazer a indicação do advogado que funcionará no pleito".

Maurício Vidigal (2000, p. 6) entende que, enquanto a Defensoria Pública não estiver totalmente organizada em todos os Estados, os serviços de assistência jurídica integral [04] deverão ser prestados por Procuradores dos Estados, advogados conveniados ou mesmo contratados para tal.


6. do cabimento do benefício às Pessoas Jurídicas

Os Tribunais têm reconhecido a litigância sob o manto do auxílio legal, mas somente em casos onde figuram entidades pias e beneficentes sem fins lucrativos, o que não responde à altura aos reclamos da doutrina, que reconhece na pessoa jurídica a possibilidade de obtenção do benefício. (CAMPO, 2002, p. 60-61).

Como se verifica das decisões a seguir, a jurisprudência majoritária é firme na manutenção de que não se estende o benefício da assistência jurídica gratuita às pessoas jurídicas:

Via de regra, o benefício da assistência judiciária gratuita não se estende às pessoas jurídicas, por se tratar de benefício individual, que se extingue com a morte do beneficiário (Lei nº 1.060. de 1950, Arts. 2º, parágrafo único, 4º, 10 e 12). (Ap. 188.011.399, 23.3.88, 3ª CC TARS, Rel. Juiz CELESTE VICENTE ROVANI, in JTARS 66-394. em.) (grifos nossos)

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA – Pedido. Requerimento por pessoa jurídica. Inadmissibilidade. Benefício que só pode ser concedido à pessoa física. Observância do disposto no artigo 2º e parágrafo único da Lei nº 1.060/50. Recurso improvido. (1º TACSP – AI 1057289-5 – (40867) – Mogi das Cruzes – 8ª C. – Rel. Juiz Carlos Alberto Lopes – J. 07.11.2001) (grifos nossos)

Todavia, em contrária senda, manifestaram-se assim os Tribunais:

PROCESSUAL – ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA – JUSTIÇA GRATUITA – LEI Nº 1.060/50 (ART. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO) – As pessoas jurídicas necessitadas também podem ser beneficiárias de assistência judiciária. (STJ – RESP 321997 – MG – 1ª T. – Rel. Min. Humberto Gomes de Barros – DJU 16.09.2002)

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA – PEDIDO – Requerimento por pessoa jurídica. Admissibilidade. Observância do disposto no artigo 2º e parágrafo único da Lei nº 1.060/50. Recurso provido. (1º TACSP – AI 1.130.503-8 – São Paulo – 8ª C. – Rel. Juiz Carlos Alberto Lopes – J. 18.09.2002)


7. As taxas judiciárias

No escólio de Humberto Theodoro Júnior (2004, p. 84), taxas ou custas judiciárias "são as verbas pagas aos serventuários da Justiça e aos cofres públicos, pela prática do ato processual conforme a tabela da lei ou regimento adequado. Pertencem ao gênero dos tributos, por representarem remuneração de serviço público". O art. 3º, da LAJ, elenca as taxas judiciárias que o beneficiário da assistência jurídica gratuita estará isento de recolher:

Art. 3º - A assistência judiciária compreende as seguintes isenções:

I - das taxas judiciárias e dos selos;

II - dos emolumentos e custas devidos aos Juízes, órgãos do Ministério Público e serventuários da justiça;

III - das despesas com as publicações indispensáveis no jornal encarregado da divulgação dos atos oficiais;

IV - das indenizações devidas às testemunhas que, quando empregados, receberão do empregador salário integral, como se em serviço estivessem, ressalvado o direito regressivo contra o poder público federal, no Distrito Federal e nos Territórios; ou contra o poder público estadual, nos Estados;

V - dos honorários de advogado e peritos.

VI – das despesas com a realização do exame de código genético – DNA que for requisitado pela autoridade judiciária nas ações de investigação de paternidade ou maternidade. (Inciso incluído pela Lei nº 10.317, de 6.12.2001)

Parágrafo único. A publicação de edital em jornal encarregado de divulgação de atos oficiais, na forma do inciso III, dispensa a publicação em outro jornal. (Incluído pela Lei nº 7.288, de 18/12/84)

Cabe ressaltar que, nos termos das disposições constitucionais do art. 95, parágrafo único, II e do art. 128, § 5º, II, "a", Juízes e membros do Ministério Público não podem receber custas e emolumentos. (VIDIGAL, 2000, p. 28).


8. OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS e de perito

Yussef Said Cahali (1997, p. 226), elucida muito bem a questão dos honorários advocatícios, citando clássica lição de Giuseppe Chiovenda:

Cabe à parte beneficiada pela assistência a defesa gratuita a defesa gratuita, como função honorífica e obrigatória da classe dos advogados e procuradores, salva a estes a repetição dos honorários pela parte contrária condenada nas custas e despesas (e pelo próprio constituinte, quando, por vitória da causa, ou por outras circunstâncias, venha a cessar o seu estado de pobreza).

O advogado nomeado pela assistência judiciária para representar o necessitado não poderá exigir quantia em dinheiro ou mesmo qualquer outro benefício do mesmo, pois tal ato é ilícito. Terá direito, entretanto, aos honorários previstos no art. 22, § 1º, da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da OAB) e aos oriundos da sucumbência, caso seu cliente seja vencedor da causa (art. 23). Assim, o advogado constituído pelo requerente da assistência judiciária, poderá receber dele os honorários contratados. A questão relativa aos honorários da parte vencedora é tratada no art. 11, da LAJ. (VIDIGAL, 2000, p. 30).

Art. 11 - Os honorários de advogados e peritos, as custas do processo, as taxas e selos judiciários serão pagos pelo vencido, quando o beneficiário de assistência for vencedor na causa.

§ 1º. Os honorários do advogado serão arbitrados pelo juiz até o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o líquido apurado na execução da sentença.

§ 2º. A parte vencida poderá acionar a vencedora para reaver as despesas do processo, inclusive honorários do advogado, desde que prove ter a última perdido a condição legal de necessitada.

Parte da jurisprudência tem entendido que, em consonância com o § 2º do art. 11 e art. 12, da LAJ, a parte vencida, beneficiária da assistência judiciária gratuita, deverá ser condenada em honorários, porém essa verba só poderá ser exigida caso o vencido perder a condição de necessitado no prazo de cinco anos (ARRUDA, 1998). A respeito, citem-se os seguintes julgados:

O benefício da assistência judiciária abrange apenas as despesas e honorários de advogado do próprio beneficiário, não o isentando, quando vencido na demanda das despesas processuais e honorários suportados pela parte contrária. (Ap. 215.491-2, 22.3.88, 8ª C 2º TACSP, Rel. Juiz MARTINS COSTA, in RT 629-188.)

O beneficiário da Justiça gratuita vencido suporta a sucumbência, observada, porém, a ressalva do art. 12 da Lei 1.060: se não puder pagar durante cinco anos a contar da sentença final, a obrigação ficará prescrita. (Ap. 1.067-89, 11.12.89, 1º CC TJRJ, Rel. DORESTE BAPTISTA, in ADV JUR. 1990. p. 237. v. 48749.)

Diante deste quadro, Ridalvo Machado de Arruda (1998) assevera: "Ora, a se admitir tal entendimento, seria impor ao pobre a esdrúxula condição de ficar na miserabilidade até que se completassem os cinco anos, só para não ter que pagar os honorários advocatícios do vencedor".

Contudo, alguns Tribunais, em contrário rumo, já decidiram:

A concessão do benefício da justiça gratuita importa tanto da isenção do pagamento de custas pelo assistido e de honorários ao assistente judiciário, quanto na isenção de reembolso de custas e honorários de advogado da parte contrária, quando vencido o beneficiário da assistência judiciária. A exceção, relativa à purga da mora em despejo por falta de pagamento, decorre de texto expresso de lei posterior, derrogatório da isenção geral instituída no Art. 3º da Lei n. 1.060-50). (Ap. 187.009.238, 10.6.87, 3ª CC TARS, Rel, Juiz ÉLVIO SCHUCH PINTO, in JTARS 63-366, em.)

Benefício que isenta o vencido beneficiário do pagamento de honorários advocatícios do vencedor, a menos que este, por ação própria provoque a revogação do benefício, e suspende a exigência das custas processuais, por ele, beneficiário, devidas, por cinco anos. Aplicação no Art. 12 da Lei nº 1.060-50. (Ap. 187.037.543, 1.9.87, 2ª CC TARS, Rel. Juiz WALDEMAR LUIZ DE FREITAS FILHO, in JTARS 64-330.)

O parágrafo 1º, do art. 11, estabelece limitação ao valor dos honorários advocatícios, até o máximo de quinze por cento sobre o líquido apurado na execução da sentença. Materializa-se o entendimento nos seguintes julgados:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – NECESSIDADE DE INTEGRAÇÃO – 1. Apontando a parte embargante que houve condenação em honorários fora dos limites do art. 11, § 1º, da Lei nº 1.060/50, dele não cuidando o Acórdão recorrido, impõe-se a integração, ainda mais considerando a divergência jurisprudencial que existe sobre o ponto. 2. Recurso especial conhecido e provido. (STJ – REsp – 297716 – MG – 3ª T. – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito – DJU 01.10.2001 – p. 00211)

EMBARGOS DECLARATÓRIOS – AJG – VERBA ADVOCATÍCIA FIXADA EM PERCENTUAL QUE EXCEDE À LIMITAÇÃO DA LEI 1.060/50 – PREQUESTIONAMENTO – Equívoco na fixação dos honorários de advogado em 20% do valor da condenação. Afronta ao art. 11, § 1º da Lei 1.060/50. Limitação ao percentual de 15% que se impõe. Ausência de omissão substancial na apreciação da controvérsia jurídica central, segundo estabelece o art. 535, II do CPC. (TJRS – EDcl 70005256284 – 9ª C.Cív. – Rel. Des. Paulo de Tarso Vieira Sanseverino – J. 27.11.2002)

Doutrina, a propósito, Artemio Zanon (1990, p. 58-59), que "O beneficiário da assistência judiciária é isentado de depositar e de pagar quaisquer despesas processuais, inclusive honorários de perícia no curso do processo de conhecimento". Observa, ainda, que se o beneficiário for impelido a pagar, parcial ou totalmente, os honorários do Perito e do Assistente Técnico, poderá lançar mão do agravo de instrumento, o qual tem logrado êxito isentante.

A jurisprudência de nossos Tribunais trilha o mesmo entendimento, decidindo que:

A assistência judiciária compreende isenção dos honorários de perito (Lei nº 1.060-50, art. 3º - V): é integral e gratuita. Desse modo, o seu beneficiário não se acha obrigado a depositar quantia alguma, respondendo pela remuneração a não-beneficiário, se vencido, ou o Estado, ao qual incumbe a prestação da assistência. Recurso especial conhecido e provido. (REsp. 5.529, 11.2.92, 3ª T STJ, Rel. Min. NILSON NAVES, in DJU 9.3.92, p. 2578) (grifos nossos)


9. Da revogação do benefício

A Lei de Assistência Judiciária a prevê a revogação do benefício da assistência judiciária ou da justiça gratuita, por provocação da parte ou ex officio (arts. 7º e 8º), nos casos em que não mais residam os requisitos legais que permitiram a sua concessão.

Art. 7º - A parte contrária poderá, em qualquer fase da lide, requerer a revogação dos benefícios de assistência, desde que prove a inexistência ou o desaparecimento dos requisitos essenciais à sua concessão.

Parágrafo único. Tal requerimento não suspenderá o curso da ação e se processará pela forma estabelecida no final do artigo 6º desta lei.

Art. 8º - Ocorrendo as circunstâncias mencionadas no artigo anterior, poderá o juiz ex officio, decretar a revogação dos benefícios, ouvida a parte interessada dentro de 48 (quarenta e oito) horas improrrogáveis.

A parte contrária, pretendente à revogação, deverá ilustrar o pedido, a qualquer tempo, formando-se uma espécie de incidente, processado na forma do art. 6º, segunda parte, da LAJ, ou seja, em apartado. (ZANON, 1990, p. 140).

A expressão "parte contrária" deve ser interpretada de forma ampla, compreendendo qualquer interessado que integre a lide, inclusive o Ministério Público, na qualidade de fiscal da lei. (VIDIGAL, 2000, p. 57).

Neste diapasão, os Tribunais já decidiram:

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA – REVOGAÇÃO – PROVA – ARTIGOS 4º E 7º, DA LEI Nº 1.060/50 – A Assistência Judiciária Gratuita será deferida mediante simples declaração da parte de que não está em condições de arcar com as despesas do processo, sem prejuízo próprio ou de sua família, gozando referida afirmação de presunção juris tantum de veracidade. Incumbe à parte adversa demonstrar, através de prova concreta e robusta, que o beneficiário da gratuidade judiciária tem perfeitas condições de suportar os gastos do processo, sem comprometimento de seus compromissos habituais. (TJMG – APCV 000.307.102-4/00 – 8ª C.Cív. – Rel. Des. Silas Vieira – J. 18.11.2002) (grifos nossos)

APELAÇÃO CIVIL – IMPUGNAÇÃO A ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – TEMPESTIVIDADE – APLICAÇÃO DO ART. 7º DA LEI Nº 1.060/50 – De acordo com o art. 7º da Lei nº 1.060/50, a parte pode requer a revogação da Assistência Judiciária Gratuita em qualquer fase da lide, não sendo necessário que a impugnação seja ajuizada concomitantemente com a resposta. Recurso provido. (TJRS – APC 70006415699 – 16ª C.Cív. – Rel. Des. Claudir Fidelis Faccenda – J. 18.06.2003) (grifos nossos)


10. da cessação da exigibilidade

Não se pode olvidar, conforme lição de Artemio Zanon (1990, p. 180), que "a justiça gratuita isenta, poder-se-ia assentar dispensa, a parte do ônus e demais encargos processuais em qualquer instância, mas o favor não é definitivo".

Segundo dispõe o art. 12, in fine, da Lei nº 1.060/50, a exigibilidade cessa em definitivo, decorridos cinco anos a partir da sentença final:

Art. 12 - A parte beneficiada pela isenção do pagamento das custas ficará obrigada a pagá-las, desde que possa fazê-lo sem prejuízo do sustento próprio ou da família. Se, dentro de 5 (cinco) anos, a contar da sentença final, o assistido não puder satisfazer tal pagamento, a obrigação ficará prescrita.

Maurício Vidigal (2000, p. 75-76) observa que a lei não esclarece a natureza da perda do direito de exigir o pagamento dos ônus da sucumbência. O fato de ela mencionar que a obrigação ficará prescrita, não significa que estamos diante de prazo prescricional, porque a perda da exigibilidade não depende da inércia do titular do direito; nem de decadência, pois o direito não é exercitável e ela constitui perda de direito que não pode ser exercido. Por derradeiro, assevera que:

Somente haverá obrigação de pagamento se verificada a condição, isto é, se em cinco anos houver perda da impossibilidade de arcar com o pagamento. O prazo, assim, não se suspende ou interrompe por ato do credor conservativo do direito: passados cinco anos do trânsito em julgado, a obrigação fica extinta sem jamais ter sido exigível.

Assevere-se, por oportuno, que, na opinião de Arruda (1998):

O § 2º, do art. 11 e o art. 12, da Lei 1.060/50, não podem ser aplicados, sob pena de ferirem os princípios constitucionais de acesso à justiça e da isonomia processual. O direito de acesso à justiça e de defesa está garantido na nossa Constituição e não pode ser obstaculizado pela falta de recursos financeiros daquele que foi reconhecido pobre na forma da lei.

Eis o entendimento de nossos Tribunais acerca da cessação da exigibilidade:

PROCESSO CIVIL – DESISTÊNCIA DA AÇÃO – AUTOR BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA – CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCOS – CABIMENTO – 1 - Pedida a desistência do feito, é correta a decisão que a homologa, condenando, ainda, a parte autora no pagamento dos honorários advocatícios, ainda que seja ela beneficiária da justiça gratuita; 2 - Não tem o beneficiário da justiça gratuita isenção da condenação ao pagamento das verbas sucumbências, ficando, porém, tais verbas inexigíveis enquanto permanecerem a situação de pobreza da parte, até o prazo máximo de 05 anos, quando tais valores prescrevem, conforme preceitua o art. 12, da Lei nº 1060/50; 3 - Apelação improvida. (TRF 5ª R. – AC 305852 – (2000.81.00.001356-7) – CE – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Gadelha – DJU 03.09.2003 – p. 865) (grifos nossos)

APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO PROVIDOS PARCIALMENTE – CONDENAÇÃO COM EFEITOS DE SUCUMBÊNCIA – INCIDÊNCIA DO ART. 12 DA LEI Nº 1.060/50 – RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE – Estando a parte sucumbente amparada pelo benefício da assistência judiciária, ocorrerá a condenação, ficando sobrestado a cobrança pelo prazo de cinco anos, conforme hipótese do artigo 12 da Lei nº 1.060/50, provendo-se o recurso parcialmente. (TJES – AC 035000151304 – 3ª C.Cív. – Rel. Des. Jorge Góes Coutinho – J. 18.11.2003) (grifos nossos)


11. Conclusão

Nos espetáculos culturais há uma segregação da população que padece necessidade.

A Justiça é um grande palco onde os atores encenam trazendo os fatos ao Juiz.

Regra geral, em uma peça teatral, mediante paga, pode-se ter acesso a ela. Da mesma forma que o necessitado somente poderá assisti-la caso seja de natureza não onerosa, deverá necessariamente auferir o benefício da assistência judiciária gratuita para que possa ter seus direitos amparados pela tutela jurisdicional.

Em um País com alta porcentagem de penúria como o Brasil, tal quadro deveria ser revertido, ou melhor, invertido, caminhando na mesma esteira dos princípios constitucionais trazidos a lume pela lei fundamental e suprema de 1988.

Mesmo com o advento de uma lei ordinária específica, a nº 1.060/50, que prevê normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados, em vigor há mais de meio século, na prática ainda há muito que ser feito.

O sonho da Defensoria Pública ainda está restrito aos grandes centros.

Magistrados não dão a devida importância aos institutos da assistência judiciária e da justiça gratuita, muitas vezes deixando de acolher os pedidos, preocupados com outras matérias e formalismos processuais, deixando que muitos processos sejam autuados sem a expressa concessão do benefício.

Constata-se, na prática, que os processos agraciados com o benefício têm andamento muito mais compassado que os demais, o que deveria ser exatamente o contrário.

Considerando que poucos cidadãos brasileiros têm real conhecimento de seus direitos, imagine-se acerca da possibilidade de consecução da gratuidade para o acesso à Justiça. Tal fato é decursivo de que o atendimento assistencial promovido pelas Universidades e Faculdades, bem como pela Defensoria Pública, não é suficientemente propalado em meio à comunidade carente, permanecendo restrito a uma pequena parcela da sociedade.

À luz do texto constitucional, como poderia uma pessoa pagar as taxas judiciárias, buscando a proteção do Estado para a composição da lide, enquanto outra goza da prerrogativa de isenção das mesmas? O princípio da igualdade ou da isonomia, previsto no caput do art. 5º, da CF/88, estabelece como preceito que "todos são iguais perante a lei".

Considerando-se, ainda, que o art. 5º, inciso LXXIV, da CF/88, prevê a assistência jurídica integral - que não se confunde com a assistência judiciária e justiça gratuita (previstas na Lei nº 1.060/50) - uma forma de tratar com reverência os regulamentos ditados pela Lei Suprema seria mediante a extensão do benefício da gratuidade a todos, sem qualquer distinção. Destarte, o Estado, sociedade politicamente organizada, deveria arcar com a integralidade das custas, necessárias à Administração da Justiça, o que, caso fosse colocado em prática, além de ser algo radical, certamente encontraria uma série de óbices pelo caminho.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALTAVILA, Jayme de. Origem dos direitos dos povos. 6. ed. São Paulo: Ícone, 1995.

ARRUDA, Ridalvo Machado de. Beneficiário da assistência judiciária gratuita deve ser condenado em honorários advocatícios, quando vencido?, set. 1998. Disponível em: <http://www.datavenia.net/opiniao/ridalvo2.html>. Acesso em: 29 set. 2004.

BARROSO, Luís Roberto. Constituição da república federativa do Brasil anotada. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1989, v. 2.

CAHALI, Yussef Said. Honorários advocatícios. 3. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: RT, 1997.

CALMON DE PASSOS, J. J. A crise do poder judiciário e as reformas instrumentais: avanços e retrocessos. Jus Navigandi, a. 6, n. 57, jul. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=2987>. Acesso em: 29 set. 2004.

CAMPO, Hélio Márcio. Assistência jurídica gratuita: assistência judiciária e gratuidade judiciária. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.

CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 19. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003.

COLUCCI, Maria da Glória; ALMEIDA, José Maurício Pinto de. Lições de teoria geral do processo. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2000.

CRETELLA JÚNIOR, J. Curso de direito romano: o direito romano e o direito civil brasileiro. 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2001.

KNOERR, Fernando Gustavo. A assistência judiciária gratuita: assistência judiciária gratuita nas universidades estaduais é uma realidade no Paraná. Disponível em: <http://www.rafaelgreca.org.br>. Acesso em: 29 set. 2004.

MELO, Nehemias Domingos de. A justiça gratuita como instrumento de democratização do acesso ao judiciário. Jus Navigandi, a. 8, n. 230, 23 fev. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=4877>. Acesso em: 02 out. 2004.

PLUTARCO. Vidas paralelas. São Paulo: Paumape, 1991, v. 1.

PROCESSO de conhecimento. Índice Fundamental do Direito. São Paulo: Direito & Justiça Informática Ltda., 2004. Disponível em: <http://www.dji.com.br/processo_civil/processo_de_conhecimento.htm>. Acesso em: 29 set. 2004.

ROCHA, Alexandre Lobão. A garantia fundamental de acesso do necessitado à justiça. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/defensoria/art_alexandre.htm>. Acesso em: 29 set. 2004.

ROSAS, Roberto. Direito processual constitucional: princípios constitucionais do processo civil. 3. ed. ver. atual. e amp. São Paulo: RT, 1999.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 24 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 41. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, v. 1.

VIDIGAL, Maurício. Lei de assistência judiciária interpretada (lei nº 1.060/50, de 5-2-1950). São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000.

ZANON, Artemio. Da assistência judiciária integral e gratuita: comentários à lei da assistência judiciária (lei nº 1.060, de 5-2-1950, à luz da CF de 5-10-1988). 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1990.


NOTAS

01 Para o Desembargador paulista Maurício Vidigal (2000, p. 28), os emolumentos "constituem a contraprestação pecuniária recebida por delegados do Poder Público, chamados tradicionalmente de escrivães".

02 O texto original da lei, datado de 5 de fevereiro de 1950, foi modificado várias vezes, com última alteração feita pela Lei nº 10.317, de 6 de dezembro de 2001.

03 Convenções entre o Brasil e outros países também poderão estabelecer o direito de estrangeiros não residentes em nosso País de obter o benefício da assistência jurídica gratuita.

04 A assistência jurídica integral é a prevista no inciso LXXIV do artigo 5º da Constituição Federal e não se confunde com a assistência judiciária (justiça gratuita), prevista na Lei nº 1.060/50.


Autor

  • Pedro Augusto Zaniolo

    Pedro Augusto Zaniolo

    Bacharel em Direito. Técnico Judiciário do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (Assessor de Desembargador). Perito Judicial em demandas cíveis no Foro Regional e Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. Engenheiro Eletricista com especialização em Eletrônica, Telecomunicações e Informática.

    Textos publicados pelo autor

    Fale com o autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ZANIOLO, Pedro Augusto. A assistência judiciária e a justiça gratuita no processo de conhecimento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 747, 21 jul. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7046. Acesso em: 18 abr. 2024.