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O direito autoral de textos e a proteção jurídica de imagens diante das novas tecnologias

O direito autoral de textos e a proteção jurídica de imagens diante das novas tecnologias

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Há uma colisão de direitos constitucionais: de um lado, o direito de ver assegurada a imagem e intimidade dela decorrente, e de noutro pólo a liberdade de informação e o direito coletivo à informação.

Sumário: 1. Introdução: demarcação histórica – 2. A Personalidade Jurídica – 3. A Proteção Jurídica do Direito Autoral de Textos – 4. Limitações ao Direito Autoral e Sanções à Violação do Direito Autoral – 5. A Proteção Jurídica da Imagem – 6. Limitações ao Direito à Imagem – 7. Responsabilização dos Provedores de Internet – 8. Jurisdição e Competência: foro de responsabilização no âmbito virtual – Referências.


1. Introdução: demarcação histórica

Antes de destacarmos a questão dos direitos autorais de textos e a proteção jurídica da imagem, é salutar resgatar, embora muito superficialmente, qual a origem e a raiz destes direitos e proteções na ciência jurídica.

Ao voltarmos nossos olhares para o mundo grego e a Antigüidade, observamos que, conquanto os gregos possuíssem grande consideração com a produção intelectual, estes reservaram pouca "importância para os direitos de autor, em comparação ao que assistimos hoje em dia."1

No entanto, a mitologia grega informa um fato jurídico que tem sido destacado como um dos primeiros momentos em que a imagem fora observada com relevância jurídica. Trata-se do julgamento de Frinéia, "uma bela cortesã que viveu no século IV a. C."2 e que teria sido "levada a julgamento, sob a acusação de ter praticado o crime de impiedade. No tribunal, Hipérides, seu defensor, antevendo que a condenação seria inevitável, providenciou para que sua cliente se desnudasse. A beleza física de Frinéia, nua perante os juízes, acabou por convence-los de sua inocência. E ela foi absolvida." Segundo relatos, "mais tarde, a bela cortesã serviu de modelo para que Praxíteles, de quem era amante, fizesse as estátuas de Afrodite, considerada a deusa da beleza e do amor, nascida das espumas das ondas do mar."3

Contudo, foi apenas entre os séculos XVIII e XIX que os direitos do autor passaram a receber tratamento jurídico. E o fato possui razões práticas, é que fora apenas a partir do século XVIII que a imprensa passou a circular de forma comercial com maior amplitude, antes exercida de forma manual. É de destacar também, que nesta época não eram muitos as pessoas letradas com condições econômicas de adquirir obras, sejam livros ou jornais. Situação bem diversa da que vivemos, em que há um crescente número de leitores consumidores e o custo das obras é baixo, em proporção à épocas pretéritas. Hoje ainda temos novas tecnologias que permitem a disseminação de textos e imagens de forma universal, tais como o baixo custo de alguns programas em CDs e a própria Internet.

Atualmente várias Constituições, Códigos Civis e legislações esparsas do mundo inteiro protegem os direitos intelectuais e a integridade das pessoas ao protegerem os direitos da personalidade. Assim é com a Constituição Federal brasileira, alemã, portuguesa, espanhola, norte-americana, e os Códigos Civis brasileiro, italiano, argentino, dentre outros.


2. A Personalidade Jurídica

Hoje quando se pretende discutir os direitos do autor, a proteção dos textos e da imagem, as responsabilizações por piratarias, contrafações e outras implicações jurídicas, antes de tudo é imprescindível ter uma noção mínima do que seja a personalidade jurídica, pois é esta que dá a guarida aos direitos do autor e a proteção aos textos e às imagens.

Porém, há uma divergência significativa para a conceituação do que seja a personalidade jurídica. Mas mesmo dentro das discordâncias é possível destacar que a personalidade jurídica, em síntese, consiste no direito privado de se resguardar a dignidade da pessoa humana de outras pessoas e do próprio Estado.

Também a classificação da personalidade jurídica encontra uma desarmonia. No entanto, a classificação do professor Rubens Limongi França, em meio aos desencontros, tem merecido boa aceitação. Leciona o professor que há três aspectos dos direitos de personalidade: a) quanto à integridade física; b) quanto à integridade intelectual, e c) quanto à integridade moral.

A integridade física consiste no direito que toda pessoa tem à vida, aos alimentos e sobre o próprio corpo, inclusive o direito de decisão ao tratamento médico e cirúrgico. Daí surgirem discussões, por exemplo, sobre a recusa de determinadas religiões ou seitas em realizarem transplantes ou transfusão de sangue, ou mesmo questões sobre a eutanásia e o direito a não prosseguir com tratamento médico.

A integridade intelectual consiste no direito à liberdade de pensamento, o direito pessoal do autor científico, artístico, do inventor, etc. É na integridade intelectual que se sedimenta a proteção dos textos, eis que a criação e elaboração dos textos são fruto do intelecto humano.

A integridade moral consiste no direito à liberdade civil, política e religiosa; no direito à honra, ao recato, ao segredo pessoal, doméstico e profissional, no direito à imagem, à identidade pessoal, familiar e social. Como se percebe, aqui está a proteção tanto da imagem-retrato, quanto da imagem-atributo, ou seja, tanto da fotografia, quanto da reputação do indivíduo.4


3. A Proteção Jurídica do Direito Autoral de Textos

A conquista de novas tecnologias é um fato crescente em nossos dias. E os Estados já passam a serem vislumbrados como desenvolvidos, subdesenvolvidos e emergentes segundo o seu potencial de conquista na área tecnológica. A tecnologia representa hoje um sinônimo de desenvolvimento. Contudo, o avanço das novas tecnologias tem atingido também os direitos autorais. Segundo o então juiz do Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, Carlos Alberto Bittar: "o uso indiscriminado de máquinas e processos tecnológicos tem suscitado graves problemas no seio do Direito do Autor (...)"5 e exemplifica que estes problemas têm se dado com:

a) a reprografia – reprodução, por meios mecânicos, de textos e de obras protegidas pelo Direito de Autor – por máquinas de xerox, microfilmagem, fitas e outros; b) a reprodução, em satélites de comunicação, de obras intelectuais protegidas, suscitando ambas a questão da retribuição patrimonial do autor, como direito fundamental garantido, entre nós, em nível constitucional.6

Muito embora várias violações dos direitos autorais, em especial de textos, representem uma questão cultural e econômica, no sentido de que é um célebre hábito tirar fotocópias de parte ou o todo de uma obra em vez de se buscar a sua leitura integral ou a construção de uma biblioteca particular, destacando-se, ainda, que o fator econômico com o alto custo de livros técnicos ainda estimulem tal cultura, certo é que as novas tecnologias estão sempre um passe adiante das previsões legais, possibilitando a multiplicação de textos sem o respeito aos direitos autorais.

E segundo o professor Paulo Sá Elias "daí a necessidade de adequação da legislação aos avanços da tecnologia que dia-a-dia causa maiores embaraços para autores e criadores".7 E com o espírito focado na Convenção de Berna de 1886, o legislador brasileiro instituiu a Lei dos Direitos Autorais, n.º 9.610/98, que em seu artigo 7º apresenta um rol não taxativo de várias obras intelectuais em que se protege os direitos autorais como: a) os textos de obras literárias, artísticas ou científicas (inc. I); b) as conferências, alocuções, sermões e outras obras de mesma natureza (inc. II); c) as obras audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive cinematográficas (inc. VI); d) as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia (inc. VII); e) os programas de computador (inc. XII), dentre outras.

O elenco trazido no artigo 7º da Lei n.º 9.610/98 é extenso e queremos crer que nenhuma obra fruto do intelecto humano esteja fora de suas previsões. No entanto, ainda que assim houvesse, é de se ressaltar o contido no "caput" do art. 7º: "São obras intelectuais protegidas as criações de espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro (...)". Como se verifica da leitura do referido "caput", são protegidas as obras intelectuais "expressas por qualquer meio", inclusive "intangível", e mesmo as que se "invente no futuro".

Desta forma, é lógico concluir que as obras intelectuais, mesmo quando publicadas, veiculadas, distribuídas ou fraudadas, com ou pelas novas tecnologias, como a internet, ainda guardarão proteção e amparo legal. E a tecnologia já assombra o direito autoral, principalmente com a contrafação (a pirataria). Segundo o professor Elias "a reprodução de obras protegidas pelos direitos autorais em razão das novas tecnologias, especialmente com o desenvolvimento da telemáticas, atinge escalas extremamente preocupantes".8

Segundo ainda o douto professor:

Enquanto o Poder Judiciário se depara com ações relacionadas a multiplicação de ‘CDs’ falsos (cópias não autorizadas de discos de música (sem tocar no assunto do ‘software’ ilegal/’pirata’) – e as autoridades policiais diligenciem à procura dos referidos ‘CDs’, a distribuição das referidas músicas é realizada de forma muito mais moderna, barata, ilícita, ilimitada e assustadoramente através de MP3 pela internet.9

A internet de fato representa o ápice das ilicitudes praticadas em face dos direitos autorais. Como já salientava David Nimmer "a Internet é uma gigantesca máquina copiadora".10 Não há praticamente nada que não se encontre com as palavras certas no Google ou Yahoo, dois dos maiores sites de busca do mundo. Sílvia Regina Dain Gandelman enfatiza que

A tecnologia digital permite cópias perfeitas, enquanto que a Internet, sem fronteiras, propicia rápida disseminação das cópias, sem custo de distribuição. Um simples aperto de teclas tem o dom de colocar a obra copiada ao alcance de centenas de pessoas.11

A proteção do intelecto humano resta comprometido em uma era tecnológica em que até dissertações de mestrado são alvo de plágios em trabalhos de conclusão de cursos de graduação. E é salutar frisar ainda, segundo Paulo Sá Elias:

Que a discussão do momento é a utilização da ‘arquitetura ‘peer-to-peer’ (entre colegas/ponto a ponto)’ para a troca de documentos, músicas, imagens, programas de computador, filmes, enfim, os mais diversos tipos de obras protegidas pelos direitos autorais.12

Este intercâmbio de informações, não raras vezes com o envio de obras ou trechos de livros e músicas e imagens obtidas ilegalmente tornou-se prática cotidiana entre a juventude. Outrossim, é certo dizer que esta arquitetura ponto a ponto nem sempre envolve materiais obtidos ilicitamente, demonstrando-se em tais casos o inegável proveito cultural, social e científico trazido pela internet. Daí também a lição do professor Elias de que "lutar juridicamente contra o ‘peer-to-peer’ é lutar contra esta imensa força tecnológica que impele alterações profundas (de diversas naturezas) nos modelos até então conhecidos. É buscar pela ‘paz podre’, é cultuar a estagnação".13

Mas a indagação que se levanta é: até onde tudo é possível pela internet? Em vários Estados em que a Internet conta com elevado e crescente número de usuários, como no Brasil, já se faz uma distinção no tocante a reprodução de textos. Segundo Gandelman:

A legislação atual dos direitos autorais distingue a reprodução para uso público (quando é necessária autorização e pagamento) daquela para uso privado, em pequena escala para uso privado, em pequena escala, em locais reservados, como bibliotecas ou no recesso do lar. A estas poucas exceções a doutrina americana dá o nome de ‘fair use’.14

O "fair use" é "justificável em relação ao interesse social",15 ou seja, não objetiva a circulação mas o conhecimento pessoal ou de determinado grupo social que tenha através deste uso justo do texto copiado um interesse social válido. A questão é polêmica. Gandelman destaca o cerne da discussão ao lecionar que "com a utilização da gigantesca copiadora que é a Internet, qualquer indivíduo pode gravar em seu computador a cópia perfeita de um banco de dados completo ou de um clip de vídeo inteiro. Será isto ainda ‘fair use’?".16 Como se pode notar a questão ganha ou pode apresentar diversos contextos, todos envoltos às novas tecnologias e os direitos autorais. Recorremo-nos, pois, à lei para espiar respostas possíveis.

Já destacamos que o artigo 7º da Lei n.º 9.610/98 apresenta extenso rol de obras intelectuais que possuem proteção dos direitos autorais. O artigo 18 da referida Lei dos Direitos Autorais disciplina que "a proteção aos direitos de que trata esta Lei independe de registro", o que desde já fica patente que os titulares dos textos, imagens e sons disponibilizados na Internet possuem o amparo legal da autoria de suas obras intelectuais.17 O artigo 22 estabelece que "pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou", podendo, por vias administrativas ou judiciais reprimir tantos quantos violarem seus direitos. As obras anônimas ou com pseudônimos também são protegidas, sendo que, segundo o artigo 40 da Lei Autoral, "caberá a quem publicá-la o exercício dos direitos patrimoniais do autor". Os artigos 41 e 96 estatuem que "os direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos contados de 1º de janeiro do ano subseqüente ao de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil", assim como os direitos conexos.

Desta forma, verifica-se que é indiscutível a proteção que assiste aos autores de obras intelectuais, independente do meio em que esta obra esteja sendo divulgada, isto é, ainda que seja pela Internet, por e-books ou outros meios. Gandelman ainda destaca que:

Qualquer modalidade de reprodução na era digital torna-se imediatamente uma distribuição, já que, pelo simples fato de estar na tela do computador ou de vários simultaneamente, já está sendo multiplicada e copiada, ocorrendo a violação dos direitos autorais.18

Faz-se imperativo, portanto, que o emprego de quaisquer obras intelectuais sejam precedidas da respectiva autorização do autor. O artigo 29 da Lei dos Direitos Autorais exige a "autorização prévia e expressa do autor" para que se reproduza parcial ou integralmente uma obra, ou para que se faça edições, adaptações, traduções, inclusões, distribuição e outras modalidades de transformação. Também as obras teatrais (art. 68), as de arte plástica (art. 78), audiovisuais (art. 81), e fonográficas (art. 91) exigem prévia e expressa autorização.


4. Limitações ao Direito Autoral e Sanções à Violação do Direito Autoral

No entanto, nem toda reprodução de uma obra intelectual consiste numa ofensa aos direitos autorais. Há, pois, certas limitações aos direitos autorais. O artigo 46 da lei 9.610/98 estabelece algumas exceções à responsabilização pela reprodução ou qualquer meio de utilização de obras intelectuais merecendo integral transcrição:

Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais:

I - a reprodução:

a) na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos;

b) em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em reuniões públicas de qualquer natureza;

c) de retratos, ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob encomenda, quando realizada pelo proprietário do objeto encomendado, não havendo a oposição da pessoa neles representada ou de seus herdeiros;

d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários;

II - a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro;

III - a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra;

IV - o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aqueles a quem elas se dirigem, vedada sua publicação, integral ou parcial, sem autorização prévia e expressa de quem as ministrou;

V - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas, fonogramas e transmissão de rádio e televisão em estabelecimentos comerciais, exclusivamente para demonstração à clientela, desde que esses estabelecimentos comercializem os suportes ou equipamentos que permitam a sua utilização;

VI - a representação teatral e a execução musical, quando realizadas no recesso familiar ou, para fias exclusivamente didáticos, nos estabelecimentos de ensino, não havendo em qualquer caso intuito de lucro;

VII - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas para produzir prova judiciária ou administrativa;

VIII - a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores.

Destarte, uma vez informada a fonte, autoria ou coletada em reuniões públicas, ou empregada transcrições para uso pessoal, sem fins lucrativos ou com intuito didático e sem intuito de lucro, não se estará ofendendo os direitos autorais. Daí a relevância do conhecimento e emprego das normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas-ABNT, eis que além de permitirem uma padronização e rigor científico, corroboram tais normas para que os direitos autorais sejam respeitados, com as corretas e devidas indicações das autorias e fontes citadas, ao mesmo passo respeitando os autores e titulares das obras e promovendo o enobrecimento destes com o uso de suas obras como subsídio para outros trabalhos e criações intelectuais.

É de se ressaltar ainda, que o uso sem autorização e sem a observância do disposto no artigo 46 acima, importará numa violação aos direitos autorais e na prática de um ato ilícito. O artigo 186 do Código Civil, que regula as relações privadas da sociedade, é claro ao afirmar que: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".

Portanto, em sendo empregado um texto de outrem, sem a sua autorização ou sem a observância do exposto no artigo 46 supra, estar-se-á ferindo um direito personalíssimo, violando um direito autoral, independente de trazer algum prejuízo material para o seu titular, e por conseguinte, praticando um ato ilícito. E o caput do artigo 927 do referido Codex determina que: "Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo." Assim, o direito autoral possui ampla e total proteção jurídica, não importando onde e de que forma tenha ocorrido o ato ilícito. Significa dizer que a violação do direito autoral por quaisquer tecnologias existentes ou ainda a serem pensadas estarão sujeitas à reparação e à indenização aos seus titulares, além de outras medidas.

Nesta senda, a reprodução sem o consentimento do titular do texto, ou de seus herdeiros, representa uma violação que poderá ser reprimida judicialmente. E esta reprimenda pode consistir na busca e apreensão de textos ou na suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível, conforme autoriza o artigo 102 da Lei n.º 9.610/98. E respondem pela indevida reprodução, nos termos do artigo 104 da referida Lei, tanto quem reproduziu, como quem vende, oculta, distribui, adquire, mantém em depósito ou a utiliza com o objetivo de algum proveito, mesmo que a divulgação tenha ocorrido no exterior.

Destaque-se ainda, que as sanções não são apenas civis, mas também penais. O artigo 184 do Código Penal estabelece que a violação dos "direitos de autor e os que lhe são conexos" importa numa pena de detenção de "3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa". E o seu parágrafo primeiro é mais severo ao ditar que:

Se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com o intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem o represente:

Pena: reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Também são apenados pelo mesmo artigo quem vende, distribui, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em depósito (§ 2º), assim como quem oferece ao público, mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema permita o usuário receber em tempo e lugar previamente determinado obra intelectual sem a devida autorização (§ 3º). Estão ressalvados de tais imposições penais quem estiver reproduzindo uma obra intelectual conforme as limitações dos direitos autorais (§ 4º).

Ao observarmos, pois, as disposições legais acima, somos categóricos em afirmar que o ordenamento jurídico brasileiro possui instrumentos e dispositivos legais suficientes e capazes de responsabilizar quem violar o direito autoral de outrem, seja este ato ilícito praticado por meios físicos ou virtuais como a Internet.


5. A Proteção Jurídica da Imagem19

Até o século retrasado, a "imagem da pessoa não era merecedora de proteção jurídica. Não se vislumbrava a hipótese – como hoje freqüente – de utiliza-la como meio de obtenção de vantangens".20 Mas segundo Pontes de Miranda: "Aos poucos foi-se revelando que a negação do direito de personalidade à própria imagem era atitude impertinente; mais: que se insistia em manter o direito debaixo do nível de cultura do nosso tempo".21

Com a sedimentação do conceito de que há um legítimo direito à imagem a doutrina passou a tentar demonstrar qual seria "a verdadeira natureza jurídica deste direito".22 Assim é que surgiram algumas teorias explicativas que informavam que a imagem deveria ser juridicamente protegida com base na:

a) teoria do direito à propriedade; b) teoria do direito à intimidade; c) teoria do direito do autor; d) teoria do direito à honra; e) teoria do direito à identidade pessoal; f) teoria do patrimônio moral da pessoa; g) teoria da autonomia do direito à imagem.23

A teoria do direito da propriedade entendia que "a pessoa, por ser proprietária do seu corpo, tinha o direito de ser proprietária de sua própria imagem, pois esta nada mais seria do que uma manifestação do corpo".24 Para a teoria do direito à intimidade, a imagem deve ser protegida porque representa "na proteção dada à vida íntima das pessoas, diante das indiscrições e intromissões alheias".25 Com este entendimento o direito à imagem fortaleceu-se ganhando a teoria do direito à intimidade boa recepção doutrinária e jurisprudencial.

Para a teoria do direito do autor, "o direito à imagem e o direito de autor são semelhantes. E, justamente por conta desta semelhança, na proteção à imagem tem sido aplicadas as regras jurídicas dos direitos autorais".26 No entanto esta teoria está superada por considerar como imagem passível de proteção aquela criada pelo intelecto humano, daí de pronto perceber-se que o Homem e a Natureza não são criações humanas, o que impediria a sua proteção como similares aos direitos autorais, vez que "a ninguém se atribui um poder jurídico autoral sobre a própria imagem".27 É de se ressalvar, contudo, que a mesma legislação que dá guarida aos direitos autorais, a Lei n.º 9.610/98, também ampara os direitos à imagem, pelo que particularmente entendemos válida a presente teoria.

Outra teoria que ganhou destaque fora a da teoria do direito à honra. Para esta teoria protegia-se o "direito à imagem como derivação do direito à honra, pois aquele estava inserido neste".28 Segundo Ferreira da Silva "em certas situações, o uso indevido da imagem serve de instrumento para ofender a honra".29

Já a teoria do direito à identidade pessoal não prosperou. O seu fundamento era de que "a imagem é um direito que identifica a pessoa. Assim, a publicação ou divulgação da imagem da pessoa resultaria no dever de indenizar, porque estaria violando o direito à identificação pessoal".30 Contudo, a diferença entre identificação e individuação sepulcraram a ampliação desta teoria.

A teoria do patrimônio moral da pessoa "considera que toda pessoa tem um patrimônio jurídico formado por bens patrimoniais e não patrimoniais. A imagem faz parte do patrimônio moral da pessoa e, por isso, requer proteção jurídica".31 Porém, assim como outras teorias que tomam o direito à imagem como um segmento de outro, também esta teoria não vingou no seio doutrinário.

Entretanto, de todas as teorias acima destacadas, a que mais tem despertado interesse e se sedimentado na doutrina é a teoria da autonomia do direito à imagem. Para esta teoria o direito à imagem possui autonomia. "Existe, por si só, sendo independente dos outros direitos da personalidade".32 O professor Fachin cita Notaroberto Barbosa que leciona que:

No atual estágio, não mais se permite o enquadramento do direito à imagem, de forma simplista, no âmbito de outros direitos da personalidade. Ao contrário, deve-se enquadrar o direito à imagem como direito autônomo, merecedor de disciplina própria.33

Esta teoria é relevante, eis que ao se considerar a autonomia do direito à imagem está-se impondo deveres de responsabilidade também independentes, ou seja, como leciona o douto constitucionalista "o dever de indenizar impõe-se pelo simples fato de ter sido violado o direito à imagem".34 E para exemplificar esta autonomia o professor Zulmar Fachin destaca um célebre julgamento do Superior Tribunal de Justiça em que jogadores de futebol, da seleção do tricampeonato ajuizaram ações de indenização por terem suas imagens estampadas em álbum de figurinhas intitulado "Heróis do Tri", lançado pela Editora Abril S/A e Confederação Brasileira de Futebol-CBF. O relator do processo, Min. Ruy Rosado de Aguiar, entendeu, juntamente com os demais pares à unanimidade, que foram violados os direitos à imagem dos jogadores, eis que não teriam autorizado a edição de suas imagens no álbum e este fora editado com o intuito comercial.35

Sabe-se pela imprensa36 que as indenizações foram vultosas: US$800 mil ao Pelé, US$100 mil para Didi, US$50 mil para Garrincha, Carlos Alberto Torres, Brito, Jairzinho, dentre outros.37 Verifica-se, pois, a sedimentação da autonomia do direito à imagem, que também possui amparo nos artigos 5º, V e X da Constituição Federal, sendo que este último inciso é cristalino ao ditar que: "São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".

Esta autonomia e a consagração do direito à imagem como um direito fundamental tem autorizada até mesmo atenuações de sanções penais quando na legítima defesa da própria imagem. O professor Fachin traz uma ementa jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que assim decidiu:

"Responsabilidade civil – Fotografia tirada contra a vontade do interessado e com fim visivelmente malicioso – reação excessiva determinando a concorrência de culpa de ambas as partes – Indenização ao proprietário somente pela metade. O retrato é uma emanação da pessoa, a sua representação por meio físico ou mecânico. Ninguém pode ser fotografado contra sua vontade, especialmente para ser pivô de escândalos".38

Observa-se, ainda, que também as crianças e adolescentes possuem particular proteção ao seu direito à imagem. O artigo 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao tratar do respeito à dignidade como pessoa humana das crianças e adolescentes estabelece que: "O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais." E o parágrafo único do artigo 143 ainda dita que: "Qualquer notícia do fato não poderá identificar a criança ou adolescente, vedando-se fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco e residência."

Segundo Fachin,

As normas insertas no artigo 143 e parágrafo único, bem como a do art. 17, são de ordem pública. Não podem ser derrogadas pela vontade dos particulares. Deste modo, a autorização fornecida pelos pais ou responsáveis é nula, mesmo que tenha sido fornecida mediante pagamento. O pacto firmado entre particulares não tem o condão de afastar o preceito legal e, face à imperatividade da norma de ordem pública, não se impõe a vontade das partes declarada em sentido contrário.39

O artigo 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente ainda preconiza que produzir, dirigir ou contracenar cenas de sexo explícito com crianças e adolescentes enseja em pena de reclusão de um a quatro anos. E o artigo 241 dita que: "Fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfico envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão, de um a quatro anos."

A imagem também guarda proteção no âmbito comercial. A lei n.º 9.279/96 que trata da propriedade industrial, em seu artigo 124, inciso III estatui que:

Não são registráveis como marca: III – expressão, figura, desenho ou qualquer outro sinal contrário à moral e aos bons costumes ou que ofenda a honra ou a imagem de pessoas ou atente contra a liberdade de consciência, crença, culto religioso ou idéia e sentimento dignos de respeito e veneração.

Cumpre ressaltar, ainda que, assim como no tocante a utilização sem autorização de obras intelectuais, também a imagem obtida, reproduzida ou utilizada por qualquer forma sem autorização enseja indenização, dado que representa um ato ilícito nos termos do artigo 186 do Código Civil, e que importa num dever de indenizar conforme o caput do artigo 927 do referido Codex já transcrito acima. Nesta senda, a reprodução sem o consentimento do titular da imagem representa uma violação que poderá ser reprimida judicialmente. E esta reprimenda pode consistir na busca e apreensão de textos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível, conforme autoriza o artigo 102 da Lei n.º 9.610/98. E também respondem pela indevida reprodução, nos termos do artigo 104 da referida Lei, tanto quem reproduziu, como quem vende, oculta, distribui, adquire, mantém em depósito ou a utiliza com o objetivo de algum proveito, mesmo que a divulgação tenha ocorrido no exterior. Também as sanções do artigo 184 do Código Penal são aplicáveis ao direito à imagem, punindo-se os infratores que utilizarem imagem sem a devida autorização.


6. Limitações ao Direito à Imagem

Assim como ocorre com as obras intelectuais escritas, que circulam na forma de textos, também a imagem possui restrições. Segundo Fachin o direito à imagem possui algumas restrições segundo as seguintes hipóteses:

a) no interesse da segurança nacional; b) no interesse da investigação criminal; c) no interesse da História; d) no interesse da saúde pública; e) no interesse sobre figuras públicas; f) no interesse sobre eventos públicos; g) no interesse da informação; h) pelo consentimento do interessado.

Destas restrições algumas merecem destaque. O Estado para fins de segurança nacional poderá restringir os direitos à imagem. Assim, "no interesse da segurança nacional, também é admissível a invasão da privacidade, quer pela obtenção da imagem, quer pela colheita de elementos de prova por meios acústicos ou de outra natureza".40 Por razões de interesse da saúde pública também é admissível limitar o direito à imagem como:

No caso hipotético de um indivíduo que sofre doença transmissível gravíssima, e da qual ele não tem conhecimento, pondo em risco toda a sociedade. Neste caso ele não pode impedir ou pretender indenização se o órgão de saúde pública afixar cartazes noticiando tal fato.41

As pessoas públicas também possuem uma diminuição no excessivo amparo à sua imagem. Citando Silma Mendes Berti o professor Fachin esclarece que:

Às pessoas públicas não é dado o poder de exercer rígido controle de sua imagem, que, em princípio, pode ser livremente captada e reproduzida. Deve-se, porém, considerar que a imagem doméstica, ou seja, captada em recinto privado, como o domicílio do sujeito, ou seu local de trabalho, depende, para a lícita publicação, do consentimento do retratado.42

Já quanto ao interesse sobre eventos, há de ser considerado o contexto em que a imagem é focada. Para Fachin:

Pode haver a divulgação da imagem de pessoa, sem que exsurja o direito à indenização. Se o que predominou foi a divulgação de evento público e a imagem da pessoa fazia parte dos fatos e não houve interesse comercial na divulgação, tudo foi legítimo.43

Por fim, o interesse da informação representa em verdadeiro colisão de direitos constitucionais, de um lado o direito de ver assegurada a imagem e intimidade dela decorrente, e de noutro pólo a liberdade de informação e o direito coletivo à informação. Em tais casos, assim como direta ou indiretamente em todos os demais, deve prevalecer o interesse público e coletivo, dada a relevância da informação para a democracia. A Constituição Federal, no artigo 220 e seu parágrafo primeiro assim estabelecem:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§1º. Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

Como se verifica constam os incisos V e X do artigo 5º que estabelecem a proteção da imagem como direito a ser observado diante da liberdade de informação jornalística. Em todos os casos será o bom senso, a proporcionalidade e razoabilidade que decidirão onde está o direito e o abuso do direito.


7. Responsabilização dos Provedores de Internet

As potentes ilicitudes praticadas na internet clamam pelo respaldo legal do ordenamento jurídico pátrio para que se possa imputar sanções criminais, civis e administrativas a todos quanto lesarem o direito do autor. Como não há legislação específica para a matéria, o nosso legislador previu a seguinte hipótese para tais casos, segundo dispõe a Lei de Introdução ao Código Civil em seu artigo 4º: "Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito".

No mesmo sentido o nosso Estatuto Processual Civil disciplina, em seus artigos 126 e 335, assim disciplinam, respectivamente: "Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide, caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito", e "Art. 335. Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial."

Considerando tais determinações legais temos, analogicamente, que a Lei de Imprensa se presta como subsídio legal dada as similitudes dos direitos envolvidos e mesmo de algumas práticas operacionais.

Por certo uma plausível defesa dos provedores será a assertiva de que estes não podem ser responsabilizados pelo que divulgam, pois não possuem ou exercem crivos editoriais, mas agem como meros prestadores de serviços, tais como os jornais impressos, rádios e televisão aberto a todo tipo de anunciante, ressalvadas às limitações legais.

O doutor Oliveira afirma que "o provedor de acesso é um intermediário técnico. Não é editor. Assim sendo, a priori, não é responsável pelo conteúdo do que se encontra em rede".44 Neste diapasão temos que nos atentar então ao que dispõe a lei n.º 5.250/67, que de fato abre grande margem para os meios de manifestação de pensamento e informação. Inclusive o seu artigo 1º engloba a divulgação pela internet, conseqüentemente os seus provedores ao afirmar que: "É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um, nos termos da Lei, pelos abusos que cometer".

Mas no seu capítulo VI, "Da Responsabilização Civil", o mesmo texto legal, no parágrafo 2º do artigo 49, ministra que:

Se a violação de direito ou prejuízo ocorre mediante publicação ou transmissão em jornal, periódico, ou serviço de radiodifusão, ou de agência noticiosa, responde pela reparação do dano a pessoa natural ou jurídica que explora o meio de informação ou divulgação (artigo 50).

Como estamos em sede da analogia, lícito induzir que tal disposição também se aplique ao mundo virtual. E mais, o artigo 50 da referida disposição legislativa é muito clara em prescrever que:

A empresa que explora o meio de informação ou divulgação terá ação regressiva para haver do autor do escrito, transmissão ou notícia, ou do responsável por usa divulgação, a indenização que pagar em virtude da responsabilidade prevista nesta Lei.

Ora, se haverá direito à ação regressiva, evidente que a própria lei é explicita em dizer que o jornal, a rádio, os periódicos, a agência noticiosa,... ou analogicamente, o provedor de internet são solidariamente responsáveis pelo prejuízo que cometerem aos direitos do autor. Neste escólio Bernardo Rucker afirma que "parece que por tal visão responde o provedor de internet pelo conteúdo ali disponibilizado por seus clientes, considerando ainda que possui o controle sobre a locação de seu espaço e seu material publicitário",45 mas enfatiza que:

Se admitirmos com total frieza a aplicação de citada norma, teremos uma responsabilidade sem limites imputada ao provedor, sob todos os produtos e serviços negociados, ainda que sem sua participação direta, condição que poderia tornar impraticável a atividade.46

E o bom senso clama para que a questão seja averiguada com clareza. De fato não é lógico imputar a responsabilidade a um provedor que apenas possibilita o acesso do usuário à rede mundial de computadores, onde, uma vez na rede, o internauta poderá realizar inúmeras atividades lícitas ou ilícitas sem o controle do provedor. Nem mesmo os conteúdos dos e-mails são alvo de censura editorial pelos provedores. Desta forma, somos pela isenção de responsabilidade daquele provedor que apenas dá acesso ao usuário à rede mundial de computadores.

Entendemos, contudo, que em sentido diverso ocorre com os provedores hospedeiros de sites, onde sua atividade primordial não é dar acesso à rede mundial de computadores, mas sim, alocar espaço na rede para a divulgação de conteúdos de interesse do usuário, seja pessoa física ou jurídica. Este provedor, ao que nos parece, possui ampla capacidade de exercitar fiscalização do conteúdo que está sendo disseminado no espaço onerosa ou gratuitamente locado. Razão pela qual ensejará tal provedor ser responsabilizado pelas violações aos direitos autorais e ao direito à imagem.


8. Jurisdição e Competência: foro de responsabilização no âmbito virtual

A jurisdição é a função cabível ao Estado para prover a garantia e atuação do direito, com a finalidade de composição da lide a ele apresentado. O comando normativo é administrado e aplicado pelo Estado de forma a garantir a paz social. Relacionando-se esta à Internet, observa-se que há pelo menos um princípio elementar da jurisdição que se contrapõe ao direito internáutico: o da aderência ao território. Afinal, esta rede virtual não possui fronteiras e não conhece seus próprios limites.

O princípio da aderência ao território propõe que, a execução da jurisdição depende da correlação com um território. Assim, preceitua Alvim que:

Não se pode falar de jurisdição, senão enquanto correlata com determinada área territorial do Estado. Tal limite estabelece, inclusive, limite à atividade jurisdicional dos juízes, que, fora do território sujeito por lei à sua autoridade, não podem exercê-la.47

Cintra, Grinover e Dinamarco, também ministram que:

No princípio da aderência ao território manifesta-se, em primeiro lugar, a limitação da própria soberania nacional ao território do país: assim como órgãos do Poder Executivo ou do Legislativo, também os magistrados só têm autoridade nos limites territoriais do Estado.48

De outro lado, temos a competência, que nada mais é que a distribuição de atribuições, esta necessária ao completo desempenho do Estado no exercício de sua função jurisdicional. Liebman já conceituava a competência como sendo a quantidade de jurisdição cujo exercício é atribuído a cada órgão ou grupo de órgãos. Salutar também, destacar a inteligência de Varela que leciona:

A competência territorial ou competência em razão do território é a que resulta de aos vários tribunais da mesma espécie e do mesmo grau de jurisdição ser atribuída uma circunscrição, ou seja, uma área geográfica própria de competência, e de a lei focalizar as ações nas diferentes circunscrições, mediante o elemento de conexão que para esse efeito reputa decisivo.49

Após verificarmos esta breve conceituação doutrinária da jurisdição e competência, passamos a expor como ficam estes institutos perante a internet. E para isto destacamos dois pontos relativos a natureza do contrato, isto é, contratual ou extracontratual. Se a forma da relação processual entre as partes for contratual, então estaremos diante de um interesse individual, portanto privado e relativo, devendo aí ser obedecido o foro elegido pelas partes no contrato para solução de qualquer divergências advindo daquele contrato. Noutro lado, se extracontratual, ficarão as partes atreladas ao disciplinamento conforme a matéria de cada país, desde que, respeitadas as convenções firmadas.

Como a Internet possibilita o acesso a pontos de venda infinitos e até mesmo sem identidade geográfica, quando nos depararmos com uma situação em que um provedor ou infrator necessite ser responsabilizado, a melhor medida jurídica em nosso ordenamento é valer-nos do disposto no art. 9º da LICC, que assim preconiza: "Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem", e do art. 435 do novel Código Civil, que assim preceitua: "reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto." Destarte, consideramos que o disposto no artigo 88, II, do CPC melhor albergaria a proteção do autor brasileiro, in verbis: "É competente a autoridade judiciária brasileira quando: II- no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação".

De qualquer sorte, por maiores discussões que a questão suscite, indiscutível que o Estado terá o dever de conhecer todas as causas, devendo julgar e executar o direito, pois a ele cabe a missão de manter a paz social, independentemente se há ou não normas pertinentes ao âmbito virtual, devendo, logicamente, respeitar as convenções firmadas com outros países. O acesso à justiça está garantido a todos, independente de tribunal, não podendo este se negar a aceitar a lide, fato este já pacificado entre os países. O que poderá ser feito é o declínio de competência, por se achar incompetente para julgar determinada matéria, transferindo esta ao órgão considerado competente para tal.


Referências

ALVIM, J.E. Carreira. Elementos de Teoria Geral do Processo. 7. ed. Rio de Janeiro: 2000.

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 136.

ELIAS, Paulo Sá. Novas Tecnologias, Telemáticas e os Direitos Autorais. Disponível em: . Acesso em 4 out. 2005.

FACHIN, Zulmar Antônio. A Proteção Jurídica da Imagem. São Paulo: Celso Bastos: IBDC, 1999.

GANDELMAN, Sílvia Regina Dain. A Propriedade Intelectual na Era Digital a Difícil Relação entre a Internet e a Lei. Disponível em: . Acesso em 11 out. 2005.

LIEBMAN, Enrico Tullio. Manuale di Diritto Processuale Civile. 1992. Apud MENEZES, Glauco Cidrack do Vale. Questões processuais de jurisdição e competência em torno da Internet. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 61, jan.2003. Disponível em:jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=3613>. Acesso em: 31 jan. 2003.

OLIVEIRA, Mauricio Lopes de. Internet: a responsabilidade civil do fornecedor de acesso. In: Revista Jurídica Consulex, ano II, n.º 19, 31.01.1998.

RUCKER, Bernardo. Responsabilidade do provedor de internet frente ao Código do Consumidor. Disponível em: <http:// www.faroljuridico.adv.br/novo_site/ article.php?sid=363&modethreaded&order=0>. Acesso em: 24 nov. 2002.

VARELA, Antunes; NORA, J. Miguel Bezerra e Sampaio. Manual de Processo Civil. 2. ed. Coimbra: Coimbra. 1985.


Notas

1 ELIAS, Paulo Sá. Novas Tecnologias, Telemáticas e os Direitos Autorais. Disponível em: . Acesso em 4 out. 2005.

2 FACHIN, Zulmar Antônio. A Proteção Jurídica da Imagem. São Paulo: Celso Bastos: IBDC, 1999, p. 21.

3 Ib Ibid.

4 Segundo Zulmar A. Fachin (op. cit., p. 47 seq): "Há duas imagens: a imagem-retrato e a imagem-atributo. Aquela, objetiva, é a imagem decorrente da expressão física do indivíduo; esta, subjetiva, é o conjunto de características apresentadas socialmente por determinado indivíduo".

5 BITTAR, C. A. Apud. ELIAS, Paulo Sá. Novas Tecnologias, Telemáticas e os Direitos Autorais. Disponível em: . Acesso em 4 out. 2005.

6 Cf. ELIAS, Paulo Sá. loc. cit.

7 ELIAS, Paulo Sá. loc. cit.

8 ELIAS, Paulo Sá. loc. cit.

9 Id Ibid.

10 NIMMER, D. Apud GANDELMAN, Sílvia Regina Dain. A Propriedade Intelectual na Era Digital a Difícil Relação entre a Internet e a Lei. Disponível em: . Acesso em 11 out. 2005.

11 GANDELMAN, Sílvia Regina Dain. A Propriedade Intelectual na Era Digital a Difícil Relação entre a Internet e a Lei. Disponível em: . Acesso em 11 out. 2005.

12 ELIAS, Paulo Sá. loc. cit.

13 Id Ibid.

14 GANDELMAN, Sílvia R. Daing. loc. cit.

15 ELIAS, Paulo Sá. loc. cit.

16 GANDELMAN, Sílvia R. Daing. loc. cit.

17 Segundo o artigo 17, "caput", único vigente da Lei n.º 5.988/73: "Para segurança de seus direitos, o autor da obra intelectual poderá registrá-la, conforme sua natureza na, Biblioteca Nacional, na Escola de Música, na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no Instituto Nacional de Cinema, ou no Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia."

18 GANDELMAN, Sílvia R. Daing. loc. cit.

19 Sobre a temática da proteção da imagem, é de fundamental leitura a tese de doutoramento do professor constitucionalista, Dr. Zulmar Antônio Fachin, A Proteção Jurídica da Imagem, editada pela Celso Bastos e Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, em 1999, que retrata com propriedade a imagem-retrato.

20 FACHIN, op. cit., p. 58.

21 Id Ibid.

22 Id Ibid.

23 Id Ibid.

24 FACHIN, op. cit., p. 59.

25 Ibid, p. 60.

26 Ibid, p. 61.

27 Ibid, p. 63.

28 Id Ibid.

29 Cf. FACHIN, op. cit., p. 64.

30 Id Ibid.

31 Ibid, p. 65.

32 Ibid, p. 66.

33 FACHIN, op. cit., p. 67.

34 Id Ibid.

35 Ibid, p. 67 seq.

36 Cf. FACHIN, op. cit., p. 68.

37 Ibid, p. 69.

38 Ibid, p. 87.

39 FACHIN, op. cit., p. 89.

40 FACHIN, op. cit., p. 110.

41 Ibid, p. 114.

42 Ibid, p. 114 seq.

43 FACHIN, op. cit., p. 117.

44 OLIVEIRA, Mauricio Lopes de. Internet: a responsabilidade civil do fornecedor de acesso. Revista Jurídica Consulex, ano II, n.º 19, 31 jan. 1998.

45 RUCKER, Bernardo. Responsabilidade do provedor de internet frente ao Código do Consumidor. Disponível em: <http:// www.faroljuridico.adv.br/novo_site/article.php?sid=363&modethreaded&order =0>. Acesso em: 24 nov. 2002.

46 Id Ibid.

47 ALVIM, J.E. Carreira. Elementos de Teoria Geral do Processo. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 61.

48 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 136.

49 VARELA, Antunes; NORA, J. Miguel Bezerra e Sampaio. Manual de Processo Civil. 2. ed. Coimbra: Coimbra. 1985.


Autor

  • Alexandre Sturion de Paula

    Alexandre Sturion de Paula

    advogado em Londrina (PR), especialista em Direito do Estado, mestrando em Direito Negocial pela UEL

    é autor dos livros: "O Direito Alternativo e o Novo Paradigma Jurídico" e "Exame de Ordem"; coordenador das obras: "Ensaios Constitucionais de Direitos Fundamentais" (Servanda), "Dimensões de Direito Público" (Russell) e "Estudos Avançados do Direito" (Sotese).

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAULA, Alexandre Sturion de. O direito autoral de textos e a proteção jurídica de imagens diante das novas tecnologias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 895, 15 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7702. Acesso em: 25 abr. 2024.