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Febre aftosa.

Cabe ação judicial contra os governos federal e estaduais?

Febre aftosa. Cabe ação judicial contra os governos federal e estaduais?

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O país foi afetado por um surto da infecção animal ‘febre aftosa’, doença que prejudica o gado, mas, sobretudo, é um flagelo para as exportações de carnes. Sendo o Brasil o maior exportador de carnes bovinas do mundo, o surto atual atingiu em cheio esse setor, havendo, até o momento, bloqueio sanitário à importação de carnes bovinas por parte de nossos maiores compradores, acarretando aos produtores gigantesco prejuízo financeiro/material, moral e sem dúvida prejudicando a retomada das exportações do setor mesmo após a suspensão das importações pelo surto atual, configurando lucros cessantes.

O objetivo deste artigo é avaliar se cabe ou não ação de perdas e danos e lucros cessantes, assim como reparação por danos morais dos produtores contra o Governo Federal e/ou os Governos Estaduais.


Pressupostos:

Como é sabido de todos, para aventar-se responsabilidade civil há que se falar em dano efetivo (e não dano potencial), ação ou omissão do agente e nexo causal entre ambos. Sendo a responsabilidade do tipo objetivo, carece-se de analisar se há culpa lato sensu ou não, o que será necessário perquirir caso trate-se de responsabilidade do tipo subjetivo.

a) dano efetivo: os produtores afetados ou não diretamente pelo surto atual de febre aftosa indubitavelmente estão sofrendo prejuízos reais com o bloqueio à importação imposto pelos países consumidores, assim como com o bloqueio de outros estados brasileiros ao trânsito e comercialização internas de seus produtos. Isso é fato. Veja-se para tanto o noticiário político e econômico dos principais jornais e TVs do país nas últimas semanas. Mesmo estados não afetados pelo surto atual estão sofrendo boicotes internacionais, como é o caso de São Paulo, maior produtor de carnes bovinas do país, que sofre bloqueio da União Européia, o qual será mantido contra os estados do Paraná (afetado), Mato Grosso do Sul (afetado) e São Paulo (não afetado) por um mínimo de 7 meses antes de uma nova avaliação (O Globo, 28 de outubro de 2005, página 24, "Governo foi Alertado sobre Risco de Aftosa"). O montante deste prejuízo somente poderá ser avaliado, objetivamente, após alguns meses do boicote internacional, entretanto é enorme, haja vista os imensos investimentos feitos neste mercado nos últimos anos. Enorme será também a dificuldade do produtor em retomar a confiança dos importadores estrangeiros após a suspensão do boicote, principalmente frente aos produtos de outros países concorrentes do Brasil (Argentina, Austrália, EUA) livres há vários anos da praga da febre aftosa. Sendo o mercado internacional um mercado de difícil penetração, qualquer perda de posições por inépcia ou restrições sanitárias leva a um quadro de descrédito imenso, tomando vários meses ou anos, assim como custos elevados em propaganda, feiras e outras formas de convencimento, para reposicionamento dos exportadores novamente nos mercados perdidos.

Importante deixar claro que, até o momento, analisamos apenas se houve dano. Logo, não podemos excluir da análise aqueles produtores que não vacinaram seu gado. Embora possam ter concorrido (para tanto veja-se discussão no próximo tópico) para seu próprio prejuízo, não nos cabe afastar que também eles tiveram prejuízo, perda do gado, perda de mercados, boicote. Prejuízo houve para todos, tenham ou não vacinado seu gado. E, conforme argumentado, a extensão do prejuízo sofrido não se limita apenas às cabeças de gado que deixarão de ser abatidas e vendidas nos meses vindouros (que podem ser calculadas em função de médias históricas) em função do boicote atual, mas também da diminuição das vendas nos anos por vir pela perda de mercados (danos emergentes – também calculáveis através de relatos históricos e da análise de contratos cancelados ou suspensos), assim como podem ser computados como danos os gastos a serem despendidos com a reconquista dos mercados e da confiança dos importadores estrangeiros, não limitados aos Estados afetados, mas abarcando todo o país e todos os produtores de carnes bovinas – ou outras – atingidos pela situação de boicote externo.

b) Ação ou Omissão: Quem, por comissão ou omissão, deu ensejo à crise atual? O produtor? O Governo? Ambos?

Segundo há notícias incessantes na mídia, o Governo Federal, responsável pela fiscalização de fronteiras (CF/88, artigo 21, XXII) e pelo fornecimento de vacinas e financiamento das campanhas de vacinação, assim como pela fiscalização (portaria 121/93 do Ministério da Agricultura, artigo 14), e os Governos Estaduais, concorrentemente, pela Vigilância Sanitária (CF/88, artigo 25, § 1º), foram fortemente omissos nas suas responsabilidades. A Fiscalização de Fronteiras secas entre o Estado do Mato Grosso do Sul e o Paraguai, até o momento imputado pelo próprio governo brasileiro como origem da doença na crise atual, deveria ser feita pelo Governo Federal. Para tanto foi realizado convênio com o Exército Brasileiro em 2001, mantido em 2002 e 2003, tendo sido, então, suspenso por este por falta liberação de verbas para sua continuidade. Ou seja, a fiscalização de uma ampla faixa de fronteira seca entre o Brasil e o Paraguai deixou de ser feita por seu responsável legal por falta de dinheiro há aproximadamente 2 anos. Como boa parte das fazendas fronteiriças no lado paraguaio pertence a produtores brasileiros, há um grande trânsito de gado entre as regiões, sem qualquer controle de zoonoses ou fiscalização sanitária, inclusive quanto à vacinação.

Além de fiscalizar o gado que entre e sai do país, também cabe ao Governo Federal fiscalizar, conjuntamente com os governos estaduais, se a vacinação do gado está ocorrendo conforme as regras da Vigilância Sanitária (ver a mencionada portaria 121/93, específica sobre o assunto). Além disso, cabe ao governo central a liberação de verbas para os programas de vacinação e fiscalização. Segundo informes vinculados na mídia nos últimos dias, o contingenciamento dessas verbas (de mais de trinta milhões de reais para míseros milhares de reais) não permitiu uma efetiva cobertura vacinal e tampouco uma correta fiscalização.

Mais, segundo notícia vinculada no jornal O Globo de 28 de outubro de 2005, no artigo acima mencionado, o Governo Federal teria sido avisado pelo governo do Estado do Mato Grosso do Sul sobre a tragédia iminente, inclusive sugerindo medidas preventivas. E nada foi feito! Não bastasse isso, o Ministro da Agricultura alardeou aos quatro ventos a desgraça vindoura, inclusive ao Ministro da Fazenda (veja coluna Miriam Leitão, O Globo, 28/10/05), sem que providências reais e efetivas fossem tomadas. Apenas as desculpas de sempre!

Portanto, indubitavelmente o Governo Federal foi omisso nas suas tarefas de Vigilância Epidemiológica e Sanitária, assim como foi omisso quanto à vigilância de fronteiras. Os Governos Estaduais também foram omissos em suas atividades de Vigilância Epidemiológica e Sanitária.

E os produtores? Quanto a isso o raciocínio é mais rebuscado. Vejamos:

Fácil concluir que os produtores que puderem comprovar que adquiriram a vacina, que tiverem os certificados de vacinação ou testemunhas de que efetivamente o fizeram (em fazendas de grandes produtores há veterinários contratados que costumam orientar na realização desses serviços), enfim, que tomaram as medidas sanitárias dentro da ordem legal estão sendo prejudicados por atos ou fatos de terceiros. Não atuaram com omissão ou comissão. Cumpriram suas obrigações e mesmo assim estão sofrendo danos.

Os produtores que, por outro lado, apenas compraram as vacinas e não puderem efetivamente provar que as utilizaram (prática relativamente comum, segundo informações de pessoas que lidam no campo) estão em situação menos favorável. Entretanto, milita em seu favor a presunção de inocência e, dependendo da modalidade de responsabilidade (objetiva ou subjetiva), a inversão do ônus da prova, ou seja, deverá aquele que alegar que os produtores apenas compraram as vacinas e não as utilizaram provar o alegado, e não os produtores provarem que efetivamente fizeram uso das vacinas compradas.

Em extremo oposto, os produtores que não adquiriram vacinas para o seu gado e, como decorrência não vacinaram o seu rebanho, não têm como alegar terem sofrido danos por culpa alheia. Logo, por omissão deram causa ao problema, certo? ERRADO!

Embora pareça claro o raciocínio de que quem não vacinou conforme as regras da Vigilância Sanitária causou o problema em sua maior parte, sendo possível até mesmo imputar-lhe toda a culpa por sua omissão, esse raciocínio é equivocado. Uma pequena análise de como funciona a cobertura vacinal será necessária e por isso peço desculpas ao leitor, mas esse ponto é essencial para avaliar até que ponto a omissão desses produtores levou ao problema:

Quando se faz campanhas de vacinação, seja em gente, seja em animais, o objetivo não é apenas a proteção isolada daquele animal ou pessoa. O objetivo maior é fazer-se o que se chama bloqueio vacinal. Isso quer dizer que se tenta bloquear a penetração do vírus em questão na região onde se está fazendo a vacinação. Assim, tendo atingido um certo percentual de pessoas ou animais vacinados, o bloqueio vacinal será dado por feito e os efeitos, teoricamente, atingidos. E qual percentual é esse? Noventa e cinco porcento. Atingido esse percentual, tem-se como feito o bloqueio, isto é, determinado vírus não deverá penetrar naquela área por estarem imunizados os seres susceptíveis de infecção. Animais ou pessoas individuais poderão até mesmo contrair a doença uma vez que pode haver imigração de seres não vacinados e as vacinas não dão imunidade em 100% dos casos (algumas garantem imunidade bem abaixo disso, diga-se de passagem), mas o objetivo precípuo da vacinação será atingido, qual seja, não haverá disseminação da doença. Assim, em uma população de um milhão de pessoas (ou de cabeças de gado), se vacinados 950.000, a cobertura vacinal estará completa.

Por isso a ação ou omissão do produtor, que lhe impôs a perda de mercados ou mesmo do seu rebanho porque não vacinou seu gado, deverá ser mais bem analisada. Afinal, a garantia de vacinação individual de seu gado não implica eficiência da cobertura vacinal. Acaso a cobertura tivesse sido de 95% conforme preconizam os organismos internacionais, e estava a cargo dos Governos Federal e Estaduais garantir isso, mesmo o produtor eventual que não tivesse vacinado seu rebanho (na margem de 5%) estaria garantido.

c) do nexo causal: há nexo causal quando há liame entre a ação ou omissão e o resultado efetivamente acontecido.

No caso em tela, pode-se concluir que da omissão do Governo Federal, dos Governos Estaduais e dos produtores de carne bovina resultou o efeito epidemia de febre aftosa e suas conseqüências (boicote internacional, perda de credibilidade do exportador brasileiro, perda de mercados)?

Primeiro, foi a epidemia de febre aftosa que ocasionou o boicote internacional à produção de alguns estados brasileiros de carne bovina? Não há dúvidas disso. O mercado internacional está carente de carne bovina, estando, inclusive, o produto em alta internacional em virtude de sua escassez relativa. O Brasil vem amealhando mercados anteriormente fechados a nós desde a epidemia de "doença da vaca louca", da qual passamos incólumes devido à forma como criamos nosso gado vacuum, qual seja, extensivamente, sem o uso de alimentos à base de derivados animais – o chamado gado verde, isto é, alimentado exclusivamente com produtos vegetais. Com isso superamos a Argentina, a Austrália e os EUA nos mercados internacionais, abrindo novas fronteiras para o comércio de carne bovina nos últimos 5 a 10 anos. Ou seja, as perspectivas eram de melhora, não de piora nesse mercado, revelando ganhos crescentes, daí os investimentos também crescentes, inclusive especulativos, aumentando, agora, os prejuízos e sua extensão.

O liame entre a omissão do governo central e dos governos das unidades federadas e o resultado nos parece óbvio. Responsável por garantir as fronteiras contra a entrada de gado susceptível de doenças e pestes, responsável maior pela vigilância epidemiológica, ao omitir-se, permitiu o Governo Federal que produtores inescrupulosos trouxessem gado estrangeiro não vacinado e portador da doença através de fronteiras secas, assim como não garantiu que houvesse efetivo bloqueio vacinal, que, se estivesse sendo cumprido, limitaria o impacto da doença a alguns poucos animais, não sendo isso suficiente para impor ao Brasil boicote tão severo e extenso. Os Estados também não realizaram sua tarefa de Vigilância, permitindo que existisse gado em seu território que não dispunha de certificados de vacinação, principalmente por serem as zonas de fronteira (região do foco inicial) zonas de alto risco, onde a vacinação é obrigatória.

Quanto aos produtores que vacinaram seu gado, não há liame possível. Por óbvio, não houve omissão, daí não ser possível sequer falar-se em nexo causal.

Os produtores que não vacinaram seu gado, por outro lado, pode haver liame entre sua omissão e o resultado final obtido? Conforme acima discutido, esse nexo causal é limitado. E isso se deve ao fato de que mesmo que alguns produtores individualmente não vacinassem seus rebanhos, havendo cobertura vacinal conforme preconizado nacional e internacionalmente, a extensão dos problemas seria bastante circunscrita. Com isso, apenas esses rebanhos deveriam ser afetados. Havendo bloqueio, o problema não estaria se estendendo a vários estados como parece ser o caso atual. Portanto, os produtores que efetivamente não tenham vacinado seu rebanho deram causa aos seus próprios males, mas não necessariamente aos males de outros rebanhos em outros estados. O mesmo vale para os responsáveis pela importação ilegal de gado contaminado e/ou não vacinado, se é que tal hipótese será confirmada – aliás, o Governo do Paraguai nega enfaticamente que seu gado seja portador da doença e o faz com base em declaração internacional de reconhecimento do Paraguai como país livre da febre aftosa, o que é um ótimo argumento. Ao importar gado contaminado, se for o caso, esses produtores trariam o mal para as suas próprias portas, mas não para outros Estados, caso os Governos houvessem garantido cobertura vacinal adequada, especialmente pensando-se que é obrigatório o controle nas divisas estaduais do transporte de produtos vivos ou não de origem animal, especialmente quanto aos riscos de disseminação de zoonoses. Logo, pode até haver liame entre suas ações ou omissões e os casos locais, circunscritos, mas jamais entre suas ações/omissões e casos distantes em outras unidades da Federação. Esse liame assemelha-se ao famoso caso de Direito Penal em que ao desferir um soco em Tício, Caio não pode ser responsabilizado pela eventual morte daquele em acidente de ambulância que veio socorrê-lo e bateu em um poste no transporte.

d) culpa lato sensu: antes de abordar-se esse tema, devemos diferenciar a responsabilidade civil do Estado daquela porventura existente quanto aos particulares (importadores ilegais de gado e criadores de gado que não aplicaram as vacinas exigidas por lei). Quanto a esses, necessário se faz perquirir se houve ou não culpa ou dolo. Isto porque sua responsabilidade é calcada em princípios de boa-fé subjetiva aquiliana. Quanto àquele, diferentemente, não se pode falar responsabilidade subjetiva, mas sim em responsabilidade objetiva por força de imperativos constitucional e legal.

Assim sendo, a responsabilidade do Estado (central ou federado) independe de qualquer modalidade de culpa lato sensu. Havendo dano, ação ou omissão e nexo causal entre eles, nasce o dever de indenizar. E no caso em tela, claramente, há.

Quanto ao produtor rural que não vacinou seu gado ou importou ilegalmente rezes contaminadas, deve-se observar se houve culpa stricto senso ou dolo. Esse último também deve ser aferido quanto a ser direto ou eventual, não em função de responsabilidade civil, mas em função de responsabilidade penal que acompanha paralelamente o caso em análise. Do ponto de vista civil, tanto faz se houve culpa ou dolo, basta existir qualquer um deles e em qualquer modalidade e nasce o dever de indenizar. Não há como negar que criador de gado que não vacina seus animais age com negligência. Aquele que importa animais sem controle vacinal e de forma ilegal, age com imprudência e negligência. Como os demais elementos da responsabilidade civil já haviam sido demonstrados, nasce para esses também o dever de indenizar.

Como devem agir os produtores prejudicados:

Quem são esses?

Entendemos que foram afetados os produtores que efetivamente vacinaram seu rebanho e deixaram de fazer vendas para o mercado externo como conseqüência do embargo internacional, sejam eles dos Estados afetados, sejam de Estados não afetados, mas que sofram qualquer tipo de perda com o pânico que usualmente acompanha casos como esses.

No nosso entender, demonstrada cabalmente a responsabilidade civil do Estado (Federal e Estadual) em indenizar, os produtores afetados deveriam começar um levantamento dos prejuízos efetivamente sofridos, tais como: vendas canceladas; gado que deixou de ser abatido; diminuição do preço da carne no mercado interno pelo superabastecimento derivado do fechamento dos mercados externos; diminuição do valor das marcas – para aqueles que trabalhem como empresas e tenham marcas com reconhecimento nacional ou internacional –; derivados da manutenção do gado no pasto por tempo acima do necessário usualmente; para aqueles que estavam em áreas livres de vacinação, as despesas decorrentes de sua inclusão em programas de vacinação obrigatórios.

Além disso, deverá também o produtor pleitear os prejuízos derivados dos eventos futuros e certos perdidos, tais como contratos que normalmente eram realizados sazonalmente e deixarão de ser. Não cabe, entretanto, pedir indenização por eventos futuros e incertos, como expectativa de vendas. Exceto se houver como provar concretamente que a expectativa não era vaga, mas real, factível, o que não é simples de se fazer processualmente.

Poderá, ainda, pleitear, futuramente, indenização pelos valores despendidos para reconquistar a confiança dos mercados perdidos, assim como pelos custos realizados em viagens, feiras ou outros eventos NECESSARIAMENTE vinculados à febre aftosa com o intuito de refazer sua posição no mercado externo.

Como último corolário da responsabilidade civil, cabe, ainda, pedido de indenização por danos morais. Afinal, o produtor rural criador de gado teve sua honra violentamente atingida por descaso das autoridades em exercerem seu mister, sendo incomensurável o sofrimento daqueles que, por longos dias, padeceram sem saber como viriam a pagar empréstimos contraídos, fornecedores e outros que estejam pendentes, como acontece freqüentemente no agronegócio: paga-se depois da safra (ainda que seja "safra animal"). O montante será dimensionado de acordo com a intensidade do problema que se abateu sobre o produtor, sendo incomensuravelmente maior nos produtores dos Estados de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul, mas também podendo estar presente em produtores de qualquer outra unidade federada.

E o produtor que não é exportador, tem algo a reclamar? Sem dúvida. Mesmo não afetado diretamente pelo embargo internacional, creio que o produtor voltado exclusivamente para o mercado doméstico também será afetado, cedo ou tarde, por suas conseqüências indiretas. Normalmente, devido ao superabastecimento, os preços dos produtos caem vertiginosamente no mercado interno. Assim sendo, os produtores que tiveram seus lucros diminuídos como conseqüência do problema analisado também poderão pleitear indenização. Cabe, ainda, também indenização por dano moral, nos mesmos moldes discutidos acima.

E contra quem deve ser dirigida a ação?

Por ser o principal responsável pelo problema, o Governo Federal deverá ser parte na ação, cabendo ou não litisconsórcio passivo com o respectivo Governo Estadual. Não aconselhamos a inclusão dos proprietários que foram omissos em suas condutas. Isso apenas por problemas de ordem processual, tentando-se, assim, evitar o tumulto processual. Eventualmente, caso considerem possível, poderão os Governos condenados realizarem ação regressiva contra aqueles, presentes os seus pressupostos.


Conclusão:

Por omissão dos Governos Federal e Estaduais em exercerem suas funções constitucional e legalmente definidas, houve uma tragédia no agronegócio de venda de produtos de origem bovina, mercado líder mundial. Prejuízos imensos estão sendo suportados pelos produtores, fornecedores e investidores do setor.

Demonstramos estarem presentes os pressupostos da responsabilidade civil do Estado e também dos produtores faltosos com suas obrigações de zelo em vacinar, cabendo, pois, ação de indenização por danos morais e materiais contra o Estado Federal Brasileiro e os Estados Federados.

Esperemos que, ainda que ações como essas levem muitos anos para serem resolvidas, os produtores tomem o caminho do Judiciário, nem que seja para que o governantes vejam, ainda que tardiamente, o tamanho do problema que criaram com sua incompetência. Antes tarde do que nunca.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMPOS, Gustavo Lima. Febre aftosa. Cabe ação judicial contra os governos federal e estaduais?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 889, 9 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7704. Acesso em: 19 abr. 2024.