Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/7724
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Contribuição assistencial

(in)exigibilidade quando da oposição do empregado

Contribuição assistencial: (in)exigibilidade quando da oposição do empregado

Publicado em . Elaborado em .

É inequívoca a obrigatoriedade de prévio assentimento pessoal para o desconto ou recolhimento da contribuição assistencial, em respeito ao direito constitucional de livre associação.

A presente abordagem visa aprofundar o estudo sobre a contribuição assistencial e sua cobrança quando da oposição do empregado, temática irresistível, demonstrando-se uma matéria de extrema relevância no Direito Coletivo do Trabalho.

O assunto é atraente e pertinente, pois tem aplicabilidade prática, uma vez que questionada de forma constante no exercício diário das empresas e sempre merece profundas discussões jurídicas.

Para tanto, convém salientar que a categoria sindical pertence a todos os trabalhadores, filiados ou não, associados e não-associados e, desta forma, não se podem excluir dos benefícios das normas coletivas os trabalhadores não sindicalizados, como em algumas vezes tem-se questionado. [01]

Por conseguinte, para que seja possível alcançar o objetivo proposto, primeiramente é necessário esclarecer que o artigo 513 da Consolidação das Leis do Trabalho [02] possibilita ao sindicato a impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas, que serão descontadas pelos empregadores nas folhas de pagamento dos trabalhadores. Assim, o Sindicato dispõe das fontes de receitas elencadas no artigo 548 da Consolidação das Leis do Trabalho sendo que, no que pertine as contribuições, estas se dividem basicamente em quatro tipos, quais sejam: sindical, confederativa, assistencial e associativa. Contudo, o artigo 545 do mesmo diploma legal [03] impõe que devem ser devidamente autorizados, exceto a contribuição sindical, pois decorrente de Lei do que transcorre a contenda.

Deste modo, visando obter o intento alvitrado, divide-se o artigo em quatro partes: Na primeira serão apresentadas considerações acerca das conceituações de contribuição assistencial, associado e filiado. Na segunda, serão ponderadas, especificadamente, através de uma visão sistêmica analisar-se-á a posição do empregador e do sindicato em confronto com o artigo 545 da Consolidação das Leis do Trabalho [04], o artigo 2º da Convenção n. 87 da OIT [05] e o Precedente normativo n. 119 do Tribunal Superior do Trabalho [06] e, ainda, complementando esta idéia, no terceiro tópico será abordado sobre a liberdade sindical. Finalmente, na quarta parte, serão lançadas as notas conclusivas do artigo, firmando-se posicionamento no sentido de que não seria obrigatória a exigência do pagamento da contribuição dos funcionários que se opuserem ao desconto.

Através da apreciação bibliográfica e jurisprudencial, partindo-se de materiais já publicados, constituídos principalmente de livros e artigos de periódicos, bem como de exame de jurisprudencial, busca-se obter os resultados almejados, explanando-se a matéria de maneira a propor ao leitor o convencimento de que quando o empregado se opuser ao desconto é ilegal qualquer tipo de cobrança de contribuição assistencial. Esta escolha se deve ao fato de que a abordagem científica proporciona o conhecimento necessário para a formulação de uma conclusão condizente com a realidade.

1. CONCEITOS E FUNDAMENTOS

A contribuição assistencial pode ser entendida como um pagamento efetuado pelo trabalhador de uma categoria profissional ou econômica ao respectivo sindicato da categoria em virtude de participação deste nas negociações coletivas, em caráter espontâneo e não obrigatório. A sua previsão de pagamento é estabelecida através de convenções coletivas, acordos coletivos ou em sentenças normativas, para o custeio de atividades assistenciais dos Sindicatos, as colônias de férias, ambulatórios, hospitais e obras semelhantes.

Sérgio Pinto Martins entende que a contribuição assistencial é:

A prestação pecuniária, voluntária, feita pela pessoa pertencente à categoria profissional ou econômica ao sindicato da respectiva categoria, em virtude de este ter participado das negociações coletivas, de ter incorrido em custos para esse fim, ou para pagar determinadas despesas assistenciais realizadas pela agremiação. [07]

De igual forma é o bem lançado voto do Juiz Aldon do Vale Taglialegna, senão vejamos:

Visa a contribuição assistencial dotar o sindicato de recursos financeiros para custear a defesa de direitos e interesses profissionais, além de propiciar melhores condições de vida aos trabalhadores e seus familiares, na medida em que programas de assistência social podem ser implementados através dessa fonte de custeio. [...] Daí é que surgiu o entendimento de que tal contribuição somente poderia ser imposta aos empregados filiados aos sindicatos, não alcançando os não-filiados; bem como a tese de que cláusulas de contribuição assistencial e confederativa não poderiam ser objeto de exame pelos Tribunais Trabalhistas, sob o fundamento de que constituíam matéria inerente à negociação direta entre sindicatos e empresas. [08]

Délio Maranhão, por sua vez, entende que "se a contribuição assistencial for autorizada pelo empregado corresponderá a doação pelo fato da natureza compulsória desta" [09] e, como foi dito anteriormente, esta constitui a prestação pecuniária, espontânea, paga pelo associado ao sindicato em benefício de sua filiação à corporação.

Deste modo, como não há fundamento legal expresso para este pagamento, a contribuição assistencial é obrigatória apenas para os associados do sindicato, que deve cumprir as deliberações das assembléias de sua entidade, e não para todos os integrantes da categoria. [10] A não ser, portanto, a liberdade individual de filiar-se ou não a sindicato seria violada por via oblíqua, pois o não associado sofreria as conseqüências das mesmas obrigações impostas aos coligados. Assim ocorre, em respeito ao princípio da liberdade sindical, agasalhado na Constituição Federal, Orientação Jurisprudencial nº 17 da SDC do TST [11] e o Precedente Normativo nº 119 da SDC do Tribunal Superior do Trabalho. [12]

Além de não se fundar em lei, segundo a jurisprudência majoritária [13], trata-se de contribuição que obriga tão somente os associados ao sindicato. Esta ajuda seria uma prestação pecuniária voluntária feita pelo membro da categoria profissional ou econômica ao sindicato, com o objetivo de custear a participação da entidade nas negociações coletivas ou propiciar a prestação de assistência jurídica, médica, dentária, entre outras, enfim, a receita arrecadada será aplicada em serviços de interesse do sindicato e no patrimônio do sindicato, com a devida aprovação em Assembléia. Com efeito,

O sindicato, para realização de seus fins, pode estabelecer, para seus associados, a contribuição que bem entender, desde que instituída de acordo com seus estatutos e com a lei, mas não pode sua assembléia impor obrigação a terceiros que dela não participaram e nem podem participar, por não terem a condição de associados, porque a ninguém é lícito se apropriar de bens e interesses de terceiro, se não houver anuência dele ou fundamento em lei. [14]

Neste sentido, Orlando Gomes define que toda obrigação é uma relação jurídica, e complementa dizendo:

A obrigação é uma relação jurídica. Como tal, sua fonte há de ser, necessariamente, a lei. É o Direito, em última análise, que empresta significação jurídica às relações de caráter pessoal e patrimonial que os homens travam na sua vida social. [15]

Salienta-se que a cobrança de contribuições dos não-associados dependeria de prévia autorização de Lei conforme mencionado no artigo 5º, II, da Constituição Federal de 1988 [16]. Convém, ainda, proferir que a Carta Magna prevê expressamente que ninguém poderá ser compelido a se associar ou a se manter associado (Constituição Federal, art. 5º, XX [17]). Noutro momento declara que ninguém será obrigado a se filiar ou se manter filiado a sindicato (CF, art. 8º, VI [18]).

Convém salientar que associado é o trabalhador devidamente cadastrado e inscrito no sindicato ao qual livremente decidiu aderir por com ele se identificar, respeitados os limites de sua atividade profissional. Este participa das atividades sociais e administrativas, inclusive convenções e dissídios. Este, por sua vez, enquanto permanecer neste enquadramento, deverá autorizar o desconto em folha da contribuição em benefício daquele sindicato.

De outro lado, filiado é o trabalhador que pertence a uma categoria de classe por força de exercer uma atividade profissional para a qual foi fundado um sindicato.

Deste modo, apenas pela análise dos conceitos acima mencionados já podemos concluir que é indevida a cobrança de contribuição assistencial. [19] No entanto, competem ainda alguns esclarecimentos.

2. O PODER DE TRIBUTAR E A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA CONTRIBUIÇÃO

A observância do principio da hierarquia das normas determina que a superveniência de uma Ordem Constitucional implica não só a recepção no mundo jurídico, mas a revogação das disposições infraconstitucionais que sejam incompatíveis. Desta forma, a alínea "e" do artigo 513 da Consolidação das Leis do Trabalho, quando alude ao poder dos sindicatos em "impor contribuições", faz referência, única e exclusivamente, ao "sindical" e não a um poder ilimitado de imposição de contribuições.

Assim, após a Carta Magna de 1988, o núcleo normativo [20], no que se refere aos sindicatos, está contido no seu art. 8º, que tem esta redação, in verbis:

Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;

II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;

III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;

V - ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;

VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;

VII - o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais;

VIII - é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei.

Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer.

Deste modo, como mencionado anteriormente, a contribuição assistencial não tem respaldo legal para ser cobrada daquele funcionário que não é associado ao sindicato. Ainda, ressalta-se que a competência para criar contribuições sociais ou as de interesse das categorias econômicas ou profissionais, conforme prevê o art. 149 da Constituição Federal de 1988 [21] é privativa da União, por meio de Lei Complementar. De outro modo, inexiste, na vigência da atual Constituição, do critério da parafiscalidade, com a única exceção, talvez da "contribuição confederativa" (CF, art. 149, c/c art. 8º, IV) [22]. Edgar Troppmair, complementa a idéia afirmando que "a taxa assistencial não encontra qualquer amparo legal para ser criada e exigida, o que a torna ilegal". [23] Amauri Mascaro Nascimento, por sua vez, entende que:

É fácil observar que a contribuição assistencial é de fonte convencional, e facultativa. É convencional porque o instrumento jurídico de que resulta é a convenção coletiva de trabalho, e é não-obrigatória, mas facultativa, diante da necessidade de autorização do trabalhador interessado para que seja efetuado o seu desconto. [24]

Se ainda restavam dúvidas sobre a revogação da alínea "e" do art. 513 da Consolidação das Leis do Trabalho desde a Constituição de 1946, após a Constituição de 1988, foi explícita ao comandar que apenas dois tipos de "contribuições" corporativas podem existir: a confederativa e a sindical (art. 8º, IV [25] da Carta Magna), não havendo mais lugar para nenhuma outra, nem sob o pálio de "contribuição social", "assistencial", "de interesse das categorias profissionais ou econômicas", ou algo equivalente.

3. DA LIBERDADE SINDICAL

A imposição da contribuição a todos os empregados da categoria, indistintamente, inclusive ao não associado, afronta o princípio constitucional da liberdade de filiação sindical [26], que constitui cânone do direito internacional do trabalho [27], bem como vulnera o princípio da irredutibilidade do salário. [28]

Tomamos o conceito de Liberdade Sindical criado por Magano:

Liberdade sindical é o direito dos trabalhadores e empregadores de não sofrerem interferência nem dos poderes públicos nem uns em relação aos outros, no processo de se organizarem, bem como o de promoverem interesses próprios ou dos grupos a que pertençam [29].

José Cláudio Monteiro de Brito Filho ensina que:

Liberdade sindical consiste no direito de trabalhadores (em sentido genérico) e empregadores de constituir as organizações sindicais que reputarem convenientes, na forma que desejarem, ditando suas regras de funcionamento e ações que devam ser empreendidas, podendo nelas ingressar ou não, permanecendo enquanto for sua vontade. [30]

Sobre a liberdade de filiação sindical, ensina Amauri Mascaro Nascimento:

Ninguém pode ser obrigado a ingressar ou a não ingressar num sindicato. Eis, de modo simples, o enunciado do princípio da liberdade de filiação sindical. Sua formulação envolve uma diretriz genérica de amplitude tal que possa valer como regra fundamental de liberdade individual dos trabalhadores, sem qualquer tipo de especificação (...) As relações entre o sindicato e os seus filiados são amplas, e envolvem um problema de autoridade do grupo sobre os seus membros e de liberdade dos membros perante os poderes do sindicato. Interpretando o direito da França, Verdier sustenta que a autoridade do sindicato sobre os seus membros é destinada a assegurar a disciplina sindical e o respeito dos seus membros às suas obrigações. Assim, é admitido o poder disciplinar do sindicato sobre os seus membros e reconhecidos limites à autoridade do sindicato, segundo os princípios da especialidade e da subordinação. De acordo com o primeiro princípio, o grupo não pode usar o seu poder senão para atender aos seus fins, isto é, a defesa dos interesses profissionais; desse modo, o sindicato não pode imiscuir-se na vida privada ou religiosa dos seus aderentes. De acordo com o segundo princípio, o poder interno do grupo, uma ordem sindical, não pode ferir os direitos individuais de seus membros (...) A liberdade de filiação sindical envolve, igualmente, o direito do trabalhador de não ingressar em um sindicato, ou seja, a liberdade de não se filiar, garantida por nossas leis. [31]

Assim, como se vê por todo o exposto, sob a égide da atual carta política, a única concepção possível de categoria é a voluntarista, o que, inclusive, se harmoniza com convenção sobre a liberdade sindical e a proteção do direito sindical (Convenção nº 87, da organização internacional do trabalho, art. 2º).

A contribuição assistencial não se confunde com a sindical, razão pela qual a autorização do empregado é condição "sine qua non" para que o empregador possa efetuar o desconto [32], conforme já decidiu a jurisprudência:

Consagrando a CF/88 o princípio da liberdade sindical (arts. 5º, inciso XX e 8º, inciso V), inexiste base legal para impor-se contribuição assistencial aos integrantes da categoria profissional ou econômica não associados do sindicato recorrente. Recurso ordinário conhecido e provido. [33]

CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL. LIBERDADE SINDICAL. A imposição de contribuição assistencial em montante diversificado, para associados e não associados revela-se como uma afronta ao princípio da liberdade de associação insculpido no artigo 8º, inciso V, da Carta Recurso Ordinário a que se nega provimento. [34]

Ressalta-se que os empregadores não se limitarem a efetuar tal desconto somente de que os autoriza, estarão desrespeitando o art. 545 da Consolidação das Leis do Trabalho.

Nesta esteira, primeiramente foi editado o Precedente nº 74, da Seção de Dissídios Coletivos. [35] Sinala-se que esse precedente foi cancelado [36] adotando-se em seu lugar o Precedente Normativo n. 119 do C. TST. Com isso, considera-se inconstitucional a cobrança de qualquer taxa assistencial de trabalhadores não filiados a sindicato. [37]

No cenário internacional podemos mencionar:

Os instrumentos, aprovados, pela Organização Internacional do Trabalho - OIT, a partir do seu documento constitutivo, propuseram a afirmação do princípio de liberdade sindical, reafirmado pela Convenção n.87, definindo-se uma diretriz amplamente garantidora do direito de organizar sindicatos, sem a necessidade de prévia autorização do Estado". [38]

Neste ínterim, o artigo segundo da Convenção n. 87 é, sem dúvida, a mais importante, senão vejamos:

Os trabalhadores e os empregadores, sem distinção de qualquer espécie, têm o direito, sem autorização prévia, de constituir organizações de sua escolha, assim como o de se filiar a estas organizações, à condição única de se conformarem com os estatutos destas últimas.

Arnaldo Sussekind, Delio Maranhão, Segadas Vianna e Lima Teixeira muito bem discorreram sobre o assunto, senão vejamos:

O grau de liberdade de que desfrutam os sindicatos para determinar e organizar sua ação depende muito de certas normas legais de caráter geral sobre o direito da livre reunião, o direito de livre expressão do pensamento e, genericamente, de todas as liberdades civis e políticas de que gozam os cidadãos do país. Daí a importância que deve atribuir aos princípios fundamentais contidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem, pois sua violação pode afetar de maneira determinante o livre exercício dos direitos sindicais’. [39]

A sumula 666 do STF também se posicionou no sentido de não ser cobrada a contribuição de não associados.

A Constituição Federal de 1988, em seus arts. 5º, XX e 8º, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados. Os descontos são, portanto, ilegais no que tange aos não associados, sendo que o art. 7º, XXVI, da CF, ao consagrar o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho, não autoriza as partes a firmarem de forma contrária a princípios outros também agasalhados pela Lei Maior.

4. DO DIREITO DE OPOSIÇÃO PELO EMPREGADO E A IMPOSSIBILIDADE DA COBRANÇA

O empregador é responsável pelos pagamentos e descontos aos seus empregados sendo vedado qualquer desconto sem a prévia autorização deste. Diz o artigo 462 da Consolidação das Leis do Trabalho:

Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamento, de dispositivo de lei ou de contrato coletivo: (...) 4º - Observado o disposto neste capítulo, é vedado às empresas limitar, por qualquer forma, a liberdade dos empregados de dispor do seu salário.

Como se vê, a legislação pertinente permite somente ao trabalhador legitimar sobre os descontos em seu salário, sob pena do empregador vir a ser responsabilizado perante a Justiça do Trabalho, por efetuar ilegal redução nos salários. O artigo 545 da Consolidação das Leis do Trabalho menciona que os empregadores ficam obrigados ao desconto das contribuições desde que autorizados pelos funcionários. Deste modo, o empregado pode se opor a cobrança e tal ato deve ser efetuado ao empregador pois este é o responsável pelo desconto no contracheque.

Neste sentido:

"I. Contribuição confederativa. Inexigibilidade para o trabalhador não associado. A contribuição confederativa, prevista no inciso IV do artigo 8º da Constituição da República, é devida apenas pelos integrantes da categoria, associados do sindicato, pena de, em sendo imposta a todos, desrespeitar o princípio da liberdade sindical individual negativa passiva, qual o do trabalhador que não quer exercer a faculdade de filiar-se a sindicato. II. Direito de oposição. O direito de oposição do empregado a que seja efetuado o desconto da contribuição para o custeio do sistema confederativo deve ser dirigido ao empregador e não ao sindicato, eis que é aquele que deve efetuar os descontos, sendo este um de seus beneficiários. [40]

Ainda, o Entendimento n. 04 da Seção de Dissídios Coletivos do TRT da Quarta Região possui o seguinte enunciado:

Qualquer trabalhador integrante da categoria profissional suscitante poderá, no prazo de até 10 (dez) dias após o primeiro pagamento reajustado, opor-se ao desconto da contribuição assistencial, manifestação a ser efetuada perante a empresa.(grifo nosso)

Assim, não pode ser cobrado dos empregados que se opuserem a cobrança e tal requerimento deverá ser efetuado perante a empresa sendo ilegal qualquer cláusula em contrário.

CONCLUSÃO

Como vimos no presente estudo, as empresas não podem ser compelidas a descontarem contribuições dos contracheques de seus funcionários mesmo havendo oposições destes no que pertine a Contribuição Assistencial. Tal desconto é exigido dos empregadores, visando beneficiar entidade sindical ao qual os empregados não participam e sequer gostariam de participar conforme expressa manifestação de vontade destes.

Conforme natureza jurídica da contribuição, esta visa o auxílio para despesas assistenciais, nesta englobando médicos, advogados, entre outros, dos quais somente os associados possuem benefícios. Ainda, subverter a todos os integrantes da categoria seria incluir aqueles que não possuem direitos a voto nas assembléias, o que é ilegal. Por fim, o sindicato é parte ilegítima para criar tributos, sendo esta tarefa da União.

Assim, existe a inequívoca a obrigatoriedade de prévio assentimento pessoal para o desconto ou recolhimento da contribuição assistencial, em respeito ao direito constitucional de livre associação, mais ainda se há de exigir da vontade da pessoa, natural ou jurídica, a contribuir para entidade não-estatal à qual não associado, sendo irrelevante o fato de que tenha sido instituída exatamente pelo convênio dos sindicatos do setor que integra no campo econômico. [41]

Como a incerteza jurídica é um fator que indiscutivelmente comprime as pessoas na acepção de não concretizarem negócios que normalmente realizariam se tivesse a garantia jurídica, é interesse que a postura do Judiciário Trabalhista deve contribuir para que seus julgados cumpram seu caráter social.

A aceitação da obrigatoriedade de associação e de contribuição é um retrocesso e o acordo coletivo que ofende a ordem constitucional e internacional não pode prevalecer em detrimento das liberdades conquistadas pelos trabalhadores ao longo da história. Portanto, não há como se admitir a cobrança de contribuição assistencial de empregados quando da oposição deste.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1988, v. I.

BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Direito Sindical. São Paulo: LTr, 2000.

GOMES, Orlando. Obrigações. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1968.

LEBRE, Eduardo Antônio Tempony. Sistema Jurídico de Custeio dos Sindicatos, São Paulo: Iglu, 1997.

LUNARDI, Ariovaldo. Contribuição assistencial X contribuição confederativa. LTr Suplemento Trabalhista, São Paulo, v. 27, n. 6, p. 27-28, 1991.

MAGANO, Octavio Bueno. Manual de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 1984, v. III.

MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: FGV, 1978.

MARTINS, Sérgio Pinto. Contribuições sindicais: direito comparado e internacional: Contribuições assistencial, confederativa e sindical. 2 ed., São Paulo: Atlas, 1998.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de, In:____ Elementos de Direito Administrativo, 1. ed., São Paulo: RT, 1983.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Direito Sindical, 2 ed., São Paulo: Saraiva, 1991.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Perspectivas do Direito Sindical. In ______ LTr Revista legislação do trabalho. São Paulo,1999.

PEREZ, Pablo Luis Barros. A inconstitucionalidade da contribuição sindical assistencial em face do trabalhador não associado . Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 603, 3 mar. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6388>. Acesso em: 19 nov. 2005.

SOUZA, Ricardo Conceição. Regime jurídico das contribuições. São Paulo: Dialética, 2002.

SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio, VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima. Instituições de Direito do Trabalho. 20. ed., São Paulo: LTr, 2002, v. II.

TROPPMAIR, Edgar. Contribuição às entidades sindicais. LTr Suplemento Trabalhista, São Paulo, v. 28, n. 108, p. 675-678, 1992.

NOTAS

  1. Art. 8º da Constituição Federal de 1988: É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: [...] III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
  2. Art. 513 Consolidação das Leis do Trabalho: "São prerrogativas dos sindicatos: a) representar, perante as autoridades administrativas e judiciárias, os interesses gerais da respectiva categoria ou profissional liberal ou interesses individuais dos associados relativos à atividade ou profissão exercida; b) celebrar convenções coletivas de trabalho; c) eleger ou designar os representantes da coletiva da respectiva categoria ou profissão liberal; d) colaborar com o Estado, como órgãos técnicos e consultivos, no estudo e solução dos problemas que se relacionam com a respectiva categorias ou profissão liberal; e) impor contribuição a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas."
  3. Art. 545 da Consolidação das Leis do Trabalho: "Os empregadores ficam obrigados a descontar na folha de pagamento dos seus empregados, desde que por eles devidamente autorizados, as contribuições devidas ao Sindicato, quando por este notificados, salvo quanto à contribuição sindical, cujo desconto independe dessas formalidades." (g.n.)
  4. Acima mencionado.
  5. Art. 2º Convenção 87 OIT: Trabalhadores e empregadores, sem distinção de qualquer espécie, terão o direito de constituir, sem prévia autorização, organizações de sua própria escolha e, sob a única condição de observar seus estatutos, a elas se filiarem", e, no item 1 de seu art. 3º, que "as organizações de trabalhadores e de empregadores terão o direito de elaborar seus estatutos e regimentos, eleger livremente seus representantes, organizar sua administração e atividades e formular seus programas de ação"
  6. Enunciado 119 TST: "Contribuições Sindicais – Inobservância de preceitos constitucionais. A Constituição da República, em seus arts. 5° XX e 8°, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio de sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que observem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados."
  7. MARTINS, Sérgio Pinto. Contribuições sindicais: direito comparado e internacional: Contribuições assistencial, confederativa e sindical. 2 ed., São Paulo: Atlas, 1998, p.125.
  8. Relator do ROS n. 00644.2003.051.18.00.3 julgado em 11.11.03
  9. MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: FGV, 1978, p. 200. Convém ressaltar o entendimento de Eduardo Antônio Tempony Lebre quando menciona que "a contribuição assistencial é mera contribuição voluntária de natureza privada, não obrigando os empregados e empregadores, associados ou não do sindicato" (LEBRE, Eduardo Antônio Tempony - Sistema Jurídico de Custeio dos Sindicatos, São Paulo:. Iglu, 1997, p. 90).
  10. Nesse sentido, é a lição de Ricardo Conceição Souza: "Evidente que não há como negar que se trata de uma obrigação compulsória de dar dinheiro, instituída mediante lei, em prol do interesse das categorias profissionais e econômicas. Ocorre, entretanto, que isso não é suficiente para dar-lhe natureza tributária, muito menos dizer que tem lastro no art. 149 da Carta Constitucional, pois não existe atuação estatal e nem poderia haver. Afinal, não se pode ignorar que o Texto Constitucional, em seu art. 8º, I, veda ao Poder Público qualquer forma de interferência ou intervenção na organização sindical. Basta isso para percebermos que não estamos falando, então, de uma contribuição instituída como instrumento de atuação da União no interesse de categorias profissionais ou econômicas, muito menos de dar dinheiro ao Estado ou a quem lhe faça as vezes por força de função pública delegada".(SOUZA, Ricardo Conceição. Regime jurídico das contribuições. São Paulo: Dialética, 2002, p.47). A inconstitucionalidade da contribuição assistencial se deve ao artigo 5° incisos II e XX, artigo 8°, incisos IV e V, artigo 149 e artigo 150, inciso I da Constituição da República Federativa do Brasil. A abusividade da Cláusula de acordo coletivo que estabelece a Contribuição Assistencial se deve também ao precedente Normativo n.° 119 e da Orientação jurisprudencial n.° 17 do Tribunal Superior do Trabalho e dos Arestos Jurisprudenciais do TST e STF. Acredita-se que coagir os trabalhadores, por simples arbitrariedade do sindicato, a contribuírem com algo que não concordam e que não vem assentado em lei, mostra-se plena perversidade jurídica, bem como afronta ao princípio da legalidade, garantia constitucional prevista no artigo 5°, inciso II da Constituição Federal de 1988 – CF/88, e artigos 149 e 150 do mesmo diploma legal. (Contribuição sindical: é obrigatória e devida anualmente por todos que integram a correspondente categoria, independente da vontade de contribuir para o sindicato, uma vez que decorrente de lei (CLT, art. 548, "a", c/c 545 e 578 e seguintes da CLT)(...) contribuição assistencial: sendo prevista em acordo, convenção coletiva ou sentença normativa, por se tratar de contribuição cobrada de todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou, ainda, das profissões liberais representadas, em função da negociação coletiva empreendida pelo sindicato.) (PEREZ, Pablo Luis Barros. A inconstitucionalidade da contribuição sindical assistencial em face do trabalhador não associado. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 603, 3 mar. 2005)

Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Roberta Pappen da. Contribuição assistencial: (in)exigibilidade quando da oposição do empregado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 904, 24 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7724. Acesso em: 26 abr. 2024.