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Primeiras linhas sobre a nova sistemática dos embargos à execução

Primeiras linhas sobre a nova sistemática dos embargos à execução

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            Em 20 de janeiro de 2007 entrará em vigor a Lei nº 11.382, de 06 de dezembro de 2006, que altera diversos artigos do Código de Processo Civil relativos ao processo de execução.

            Anteriormente, a Lei nº 11.323/05 já havia alterado os dispositivos concernentes à execução da sentença. Chega a vez, agora, da execução do título extrajudicial.

            Dentre as várias alterações que a nova lei trará, merecem especial atenção as relativas aos embargos à execução.

            Os embargos à execução representam a forma processual pela qual o devedor pode se opor à execução. É que na ação de execução o devedor não é citado para se defender. Como o título executivo extrajudicial atesta a liquidez e a certeza da obrigação (requisitos indispensáveis para a constituição do título), o devedor será citado para pagar a dívida ou cumprir a obrigação, sendo os embargos o meio que ele dispõe para atacar o título, demonstrando sua invalidade, ineficácia ou inexigibilidade [01].

            Embora tenha natureza jurídica de ação [02], os embargos são, em realidade, a forma processual que o devedor tem para se defender da execução que lhe é aforada. Como ensina Cândido Rangel Dinamarco, "os embargos à execução constituem a mais ampla e vigorosa das vias defensivas permitidas ao executado, no sistema do processo civil" [03].

            Rompendo com a tradicional idéia de que não se admitem embargos senão antes de seguro o juízo, a nova redação do art. 736 contempla a possibilidade do executado opor seus embargos, independentemente de penhora, depósito ou caução:

            Art. 736. O executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá opor-se à execução por meio de embargos.

            No sistema tradicional, até então em vigor, somente se poderia receber os embargos após o juízo estar seguro. Era o que dizia o art. 737, revogado pela nova lei. A segurança do juízo refletia, assim, verdadeira condição da ação ligada ao interesse de agir e a sua ausência implicaria a carência da ação. A regra – decorrente da própria evolução histórica do direito executório – era que primeiro se fizesse a constrição do bem, para somente depois se autorizar a oposição dos embargos.

            Vale lembrar que essa regra havia sido estatuída para todas as formas de execução então existentes, ou seja, tanto aquelas lastreadas em título executivo judicial como em título executivo extrajudicial, e o seu objetivo era dar efetividade ao título executivo, especialmente o judicial. No entanto, não há mais processo de execução fundando em sentença, eis que com as recentes alterações do Código de Processo Civil passou-se a tratar tal execução como uma mera etapa ou fase do processo de conhecimento, ao qual deu-se o nome de cumprimento de sentença (arts. 475-I e seguintes do CPC).

            Destarte, reservou-se o processo de execução apenas para os títulos executivos extrajudiciais, e somente a ele aplicam-se as mudanças ora em comento.

            Temos, pois, que na ação de execução, o devedor, citado, poderá opor seus embargos, independentemente de estar seguro o juízo. Os embargos deverão ser opostos no prazo de 15 (quinze) dias, contados da data da juntada aos autos do mandado de citação devidamente cumprido (novo art. 738). Embargos ajuizados intempestivamente serão rejeitados liminarmente pelo juízo (novo art. 739, inciso I). Deste modo, os mandados expedidos nas ações de execução deverão, ao citar o devedor para pagamento (novo art. 652), alerta-lo expressamente para o prazo de interposição dos embargos.

            Deve se observar, entrementes, que quando houver mais de um executado no mesmo processo, o prazo para cada um embargar é independente, individual e autônomo, contando-se a partir da juntada aos autos dos respectivos mandados, exceção feita apenas se se tratar de cônjuges (novo art. 738, §1º).

            Nesse particular, repete-se a situação que já existia, não se aplicando a regra da fluência simultânea de prazos, vigente em relação à resposta do réu no processo de conhecimento, segundo a qual o prazo só começa, para todos os réus, a partir de quando o último deles houver sido citado (CPC, art. 241, inciso II) [04]. Não há incidência, também, da regra prevista no art. 191 do CPC, de que litisconsortes com diferentes procuradores gozam de prazo em dobro (novo art. 738, § 2º).

            As alterações visam dar maior celeridade aos processos de execução, sabidamente os mais emperrados na justiça brasileira. Na forma anterior, o processo não se desenvolveria até que se encontrassem bens passíveis de penhora, o que, em grande número de casos, consumiu anos. Como os embargos só eram admitidos para discussão após a realização da penhora, dá para se imaginar o tempo da demora.

            Atento aos problemas forenses, a alteração legislativa tem a intenção da dar maior celeridade ao processo de execução. Desta forma, discute-se todas as questões relacionadas ao título logo no início do processo e não se perde tempo aguardando a penhora, que pode nunca ocorrer.

            Por outro lado, ao contrário do que ocorria anteriormente, os embargos à execução não terão, ordinariamente, efeito suspensivo (novo art. 739-A), ou seja, eles não suspenderão a execução. Assim, enquanto se discutem e se julgam os embargos, a execução prossegue normalmente.

            Todavia, poderá o juiz atribuir-lhes efeito suspensivo quando, a requerimento do devedor, e sendo relevantes os seus fundamentos, o prosseguimento da execução puder causar um dano grave e de difícil reparação, desde que a execução já esteja suficientemente garantida por penhora, depósito ou caução (novo art. 739-A, § 1º). Duas são as condições necessárias, pois, para se atribuir o efeito suspensivo aos embargos: 1) a possibilidade de dano grave e de difícil reparação e 2) a garantia do juízo por penhora, depósito ou caução. A decisão que conceder o efeito suspensivo aos embargos poderá ser recorrida por meio de agravo de instrumento (CPC, art. 522), por força do que dispõe o art. 598 do Código de Processo Civil, de que ao processo de execução aplicam-se subsidiariamente as disposições que regem o processo de conhecimento.

            Situação interesse foi criada pelo novo art. 745-A. Conforme o mencionado artigo, caso o devedor, no prazo que dispõe para embargar, reconheça o crédito do exeqüente e deposite o equivalente a 30% do valor da dívida, mais custas processuais e honorários advocatícios, ele poderá requerer parcelamento do valor restante em até 06 (seis) parcelas mensais, com correção monetária e juros de 1% ao mês. É uma espécie de concordata (permitindo-me a analogia com a não mais existente figura do direito falimentar), pois o credor não é consultado a respeito e a sua concordância é imposta pela decisão judicial que defere o pedido.

            Essa proposta deverá ser feita ao juiz da causa, que a apreciará e deferirá conforme seu livre convencimento. Se deferida, o exeqüente levantará a quantia depositada e os demais atos executivos serão suspensos até final cumprimento. Se indeferida, seguir-se-ão os atos executivos, mantido o depósito efetuado (novo art. 745-A, § 1º).

            O não pagamento de alguma das prestações acarretará o vencimento imediato das demais e o prosseguimento da execução, com a aplicação da multa de 10% sobre o saldo remanescente. Nesse caso, o devedor não poderá mais opor embargos (novo art. 745-A, § 2º).

            Conforme a nova redação do art. 745, o devedor poderá alegar nos embargos 1) nulidade da execução, por não ser executivo o título apresentado; 2) penhora incorreta ou avaliação errônea; 3) excesso de execução ou cumulação indevida de execuções e 4) qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento. Aqui, pouca alteração houve. Apenas se adequou a redação para ficar em consonância com todas as alterações havidas nos últimos tempos.

            Mas é de se observar uma questão importante: se o excesso de execução for o fundamento dos embargos, o embargante deverá declarar na petição inicial o valor que entende correto, apresentando memória de cálculo sob pena de rejeição liminar dos embargos ou de não conhecimento desse fundamento. É o que diz o § 5º do novo art. 739-A. Penso, todavia, que o legislador teria sido mais feliz se tivesse colocado tal disposição no art. 745, que trata diretamente da questão. De toda sorte, o fato é que a não observância da determinação legal acarretará a rejeição dos embargos.

            Uma última questão é de ser levantada. As alterações na ação de execução trarão como conseqüência imediata o fim das exceções e objeções de -executividade. Como sabido, admitidas por construção doutrinária e jurisprudencial, mas sem previsão legal, as exceções e objeções de executividade eram utilizadas quando se pretendia atacar as condições da ação de execução ou mesmo do título executivo, antes da ocorrência da penhora. Conforme Nelson Nery Junior, admite-se a exceção de executividade "quando desnecessária qualquer dilação probatória para a demonstração de que o credor não pode executar o devedor" [05]. Argüia-se, por meio de simples petição, matérias de ordem pública que podiam ser conhecidas a qualquer tempo, sem a necessidade de se garantir o juízo (e até como forma de evitar possível penhora). Com a nova sistemática da ação de execução, não haverá mais espaço para tais exceções e objeções, haja vista que toda a matéria deverá ser alegada nos embargos, que não estando condicionados à segurança do juízo, adquirem nova configuração. Mas isso é assunto para outra ocasião.


Notas

            01 Cf. Jonatas Milhomens e Geraldo Magela Alves, MANUAL DAS EXECUÇÕES, Ed. Forense, 2ª ed., 2001, p. 257.

            02 Os embargos à execução são autuados em apartado (art. 736, parágrafo único) e visam a obtenção de uma sentença de mérito (art. 740). Tais fatos reforçam a tese de que os embargos têm natureza jurídica de ação, constituindo um processo de conhecimento.

            03 INSTITUIÇÕES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, Ed. Malheiros, 2ª ed., 2004, p. 637.

            04 Cf. Cândido Rangel Dinamarco, ob. cit., p. 653.

            05 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COMENTADO, Ed. RT, 9ª Ed., 2006, p. 907.


Autor

  • Fernando Augusto Sales

    Advogado em São Paulo. Mestre em Direito. Professor da Universidade Paulista - UNIP, da Faculdade São Bernardo - FASB e do Complexo de Ensino Andreucci Proordem. Autor dos livros: Direito do Trabalho de A a Z, pela Editora Saraiva; Súmulas do TST comentadas, pela Editora LTr; Manual de Processo do trabalho; Novo CPC Comentado; Manual de Direito Processual Civil; Estudo comparativo do CPC de 1973 com o CPC de 2015; Comentários à Lei do Mandado de Segurança e Ética para concursos e OAB, pela Editora Rideel; Direito Ambiental Empresarial; Direito Empresarial Contemporâneo e Súmulas do STJ em Matéria Processual Civil Comentadas em Face do Novo CPC, pela editora Rumo Legal; Manual de Direito do Consumidor, Direito Digital e as relações privadas na internet, Manual da LGPD, Manual de Prática Processual Civil; Desconsideração da Personalidade Jurídica da Sociedade Limitada nas Relações de Consumo, Juizados Especiais Cíveis: comentários à legislação; Manual de Prática Processual Trabalhista e Nova Lei de Falência e Recuperação, pela editora JH Mizuno.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SALES, Fernando Augusto. Primeiras linhas sobre a nova sistemática dos embargos à execução. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1265, 18 dez. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9286. Acesso em: 29 mar. 2024.