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Mobbing nas relações de trabalho e o impacto social no mundo contemporâneo

Mobbing nas relações de trabalho e o impacto social no mundo contemporâneo

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É impossível calcular o número exato de vítimas do assédio psicológico ocorrido no ambiente corporativo, tampouco as consequências sofridas pelas vítimas. Como proceder diante dessas condutas?

RESUMO: A Revolução Industrial do século XVIII e XIX, culminada com a Revolução Tecnológica do século XX, reflete consequências nos dias atuais nos ambientes corporativos de relações profissionais e interpessoais. Como o século XXI é conhecido como século das doenças psicológicas e com o crescente índice de conflitos corporativos e da concorrência no mercado de trabalho, faz-se necessário o debate sobre a resolução destes conflitos com vistas à precaução com a saúde dos colaboradores.

Palavras-chave: mobbing – bullying – assédio moral – psicoterror – agressão psicológica – superior hierárquico – danos morais.


INTRODUÇÃO

O mercado de trabalho está cada vez mais competitivo, pois, além do crescimento exacerbado da população mundial, os requisitos para concorrência a uma vaga de emprego é desproporcional à realidade de muitas pessoas.

Apesar de todos os fatores que aumentam o nível de concorrência e dificuldade dentro de uma empresa, existem colaboradores que praticam algum tipo de discriminação com algum colega de trabalho, em razão do preconceito velado no seio da sociedade.

Não obstante, estas pessoas extrapolam o bom senso, violam a cordialidade e a respeitabilidade entre os colaboradores da equipe ou da empresa em geral, pelo fato de ocupar cargo de gestão.

Entretanto, a mudança deste cenário não depende apenas das empresas, mas sim dos colaboradores em geral e das equipes, sendo estas que formam a empresa e fazem a prestação do serviço de qualidade para continuar cultivando o bem estar coletivo.


ETIMOLOGIA E DEFINIÇÃO DE MOBBING

A palavra mobbing tem sua origem no estudo da etologia. No entanto, também é derivada do verbo inglês “to mob”, que na tradução significa agressão. No Brasil, a expressão é habitualmente definida como espécie de assédio moral em razão das semelhanças entre as práticas abusivas .

Mobbing consiste em subgênero do assédio moral no ambiente de trabalho, cuja agressão afeta o psicológico da vítima, diferentemente do assédio moral propriamente dito, haja vista que este atinge a honra da vítima.

Nas palavras de Piñuel y Zabala (2001, p.53), trata-se de agressão e maus tratos verbais oriundo de uma ou mais pessoas no ambiente corporativo, com o propósito de ensejar uma coação psicológica que prejudique o desempenho pessoal e profissional da vítima.

Nas relações de trabalhos é comum encontrar profissionais que confundam o assédio moral com a agressão verbal advinda do superior hierárquico, embora possuam características distintas.

Teoricamente, a agressão verbal ocorre através de uma repreensão direta e antiprofissional do superior hierárquico ao colaborador, tendo em vista a maneira com que o superior se dirige ao subordinado.

Distintamente, a prática de mobbing nas relações de trabalho consiste no psicoterror laboral decorrente de perseguições no trabalho e, para restar configurada a conduta agressiva, não necessita que ocorra isoladamente uma agressão verbal.

Conforme Piñuel y Zabala (2001, p. 56), o assédio psicológico no ambiente laborativo tem como objetivo:

“intimidar, diminuir, humilhar, amedrontar e consumir emocional e intelectualmente a vítima, com o objetivo de eliminá-la da organização ou satisfazer a necessidade insaciável de agredir, controlar e destruir que é apresentada pelo assediador que aproveita a situação organizacional particular (reorganização, redução de custos, burocratização, mudanças drástica, etc.) para canalizar uma série de impulsos e tendências psicopáticas.”

Destaca-se que, a prática de mobbing também poderá decorrer de condutas despercebidas, por vezes, distantes dos olhos do superior hierárquico ou de maneira espontânea entre os colegas de trabalho, ainda que de maneira despretensiosa.

Isto porque, eventuais condutas contínuas de gestos ou feições feitas pelos colegas de trabalho ou de equipe, palavras dirigidas indiretamente à vítima em meio a uma conversa entre os colaboradores, seja na ausência ou próximo da vítima, podem configurar como prática de mobbing.

Segundo Leymann (1996, p.26), ”mobbing é um processo de destruição; compõe-se de uma série de procedimentos hostis que, tomados de forma isolada, poderiam parecer inofensivos, mas cuja repetição constante tem efeitos perniciosos.”

As práticas reiteradas de violência psicológica poderão causar inúmeros problemas no âmbito corporativo. A mais comum delas é a dificuldade de comunicação entre a vítima e os demais colaboradores da equipe.

Neste sentido, práticas de mobbing são semelhantes ao bullying, ou seja, uma ação ou omissão que causa constrangimento pessoal, dentre outras espécies de agressões psicológicas que, embora sejam condenadas pela sociedade, não são abordadas diariamente, tampouco conscientizada em debates, seja no seio familiar ou na coletividade.


TIPOS DE MOBBING

O assédio moral está classificado em quatro tipos, sendo ascendente, horizontal, descendente e misto. Convém esclarecer que as agressões poderão ocorrer até mesmo entre colaboradores e equipes que ocupam cargos de administração e gestão dentro de uma empresa.

O assédio ascendente decorre da conduta de um ou vários subordinados ao superior hierárquico, ou seja, quando o subordinado descumpre de forma reiterada e sem justificativa uma ordem do gestor. Não obstante, começa a persegui-lo com intuito de prejudicá-lo. Estas condutas são comuns quando ocorre a substituição do gestor antigo por um colaborador recém-contratado, mesmo que existam subordinados capazes de assumir o cargo hierarquicamente superior.

O assédio horizontal decorre de colegas de trabalho que ocupam o mesmo nível laborativo dentro de uma empresa, ou seja, rixa entre os subordinados ou até mesmo entre os gestores.

O assédio descendente é o mais comum, ocorrendo da conduta agressiva advinda do superior hierárquico ao subordinado, ou pela persuasão psicológica.

No caso do assédio descendente, o poder aquisitivo do cargo poderá favorecer a conduta do agressor e dificultar as chances de defesa da vítima.

O assédio misto caracteriza-se como subespécie do assédio horizontal, isto porque, configura-se como “troca de farpas” entre subordinado e superior hierárquico, não havendo o respeito mútuo entre estes colaboradores dentro da empresa.


IDENTIDADE E CONDUTAS DO AGRESSOR

Após a revolução industrial, o mercado de trabalho começou a se expandir demasiadamente, fazendo com que as empresas contratassem cada vez mais novos funcionários para manter a qualidade e ritmo na produção de serviço.

Neste cenário, os moradores de regiões agrícolas que sobreviviam do próprio plantio e colheita, precisaram buscar emprego e meios de subsistência nas cidades onde as empresas de grande porte estavam se instalando.

A tecnologia caminhava em passos largos, de modo que rapidamente cruzou fronteiras pelo mundo, tomando conta de espaços empresárias, comerciais e principalmente os corporativos.

O rápido crescimento, bem como as mudanças tecnológicas no mundo empresarial e corporativo, obrigaram as empresas a segregar as atividades em áreas específicas, consequentemente limitando o número de contratações de novos funcionários e exigindo maiores requisitos para concorrência de uma vaga, preferencialmente pessoas capazes de desenvolver mais de uma função no mesmo cargo laborativo.

A competitividade no mercado de trabalho cresceu na mesma proporção do crescimento exacerbado da população mundial. Com isso, as pessoas passaram a buscar conhecimento através de formação educacional, especialização acadêmica e profissionalizante.

Logo, as pessoas que ocupavam cargo de gestão e liderança simplesmente pela confiança ou proximidade familiar com os donos de empresas, passaram a ser substituídas por funcionários com algum nível de conhecimento acadêmico, ou até mesmo pelos profissionais que começaram a conquistar títulos de academia educacional, como por exemplo, nos casos de formação superior em Mestrado ou Doutorado.

Desta forma, iniciaram as práticas abusivas em ambientes laborativos, oriundo de superior hierárquico, principalmente pela vulnerabilidade que o cargo superior transmite ao colaborador da empresa, pois, o assédio moral não está relacionado com a produtividade, mas sim, com questões de poder (Hirigoyen, 2002:110).

Isto porque, o ocupante de um cargo de gestão tem a consciência de que eventualmente poderá ser substituído por outro funcionário mais novo ou com título acadêmico superior. Consequentemente, o colaborador tende a agir de maneira agressiva com os subordinados ou demais colegas de trabalho para defender sua posição na empresa.

Ressalta-se que, na tradução literal do termo, mobbing significa agressão, por esta razão pode ser praticado por qualquer indivíduo e em qualquer ambiente, seja público, privado ou corporativo.

No que tange ao ambiente corporativo, o agressor poderá ser qualquer colaborador, independentemente do cargo que ocupa ou função que desempenha na empresa. Logo, o agressor poderá ser o presidente da empresa ou até mesmo o estagiário que é membro da mesma equipe da vítima.

As agressões poderão ser soerguidas pelo superior hierárquico ou gestor da empresa, em face do colaborador que desenvolve o trabalho de maneira concisa, dedicada e destacada, no qual também passa a ser objeto de admiração, exaltação e respeito pelos demais colaboradores (Piñuel y Zabala, 2001:54).

Diante deste cenário, o agressor pode se sentir ameaçado e exposto a uma competitividade com o subordinado, achando que este almeja o cargo hierarquicamente superior ao ocupado.

Desta forma, o agressor começa a agir incansavelmente de maneira antiética com o subordinado, no intuito de oprimir a vítima, demonstrando para a vítima que é o chefe da equipe, pelo simples fato de ocupar cargo superior ao do colaborador.

Conforme Piñuel y Zabala (2001, p.75), o superior utiliza-se de ameaças, insultos, humilhações diretas e frequentes na frente dos colegas de trabalho ou privadamente contra a vítima, de modo que demonstre forçosamente a sua autoridade hierárquica de exigir do subordinado alguma tarefa fortemente estressante, causando psicoterror no funcionário.

Estas condutas desencadeiam transtornos psicológicos no colaborador que poderão afetar o desempenho profissional, pessoal e a capacidade de desenvolvimento interpessoal da vítima ao longo da vida.

Destaca, ainda, que a agressão passa a ser motivada pelo sentimento de ciúme, inveja, medo de competição, causando um desiquilíbrio no ambiente corporativo decorrente de comportamentos incoerentes e antiéticos do superior hierárquico, ora agressor, em face do subordinado, ora vítima.

A agressão também poderá ocorrer em razão das vestimentas da vítima, gosto musical, ideais, raça, cor, sexo, sotaque, ou seja, as diferenças poderão ser objeto de agressão em razão de preconceito velado. Também é comum que o agressor utilize o nível de formação acadêmica para praticar mobbing, ou pela diferença meramente comercial da instituição educacional frequentada pela vítima.

Geralmente as condutas adotadas pelos agressores consistem em sobrecarregar o colaborador, delegando e cobrando atividades cada vez maiores com resoluções em menor tempo, exigindo da vítima um esforço físico ou psicológico desproporcional ao considerado normal em tempo hábil.

Consequentemente, a vítima tentará cumprir com as tarefas, pois, sente-se ameaçada de perder o emprego. Despercebidamente, a vítima começa a passar mais tempo trabalhando para entregar em menor tempo o maior número de tarefas delegadas.

Ocorre que os esforços adotados pelos colaboradores poderão trazer resultados negativos decorrente do cansaço psicológico. Consequentemente, o agressor desprezará o subordinado, alegando descontentamento pelo suposto mal desempenho do colaborador.

Piñuel y Zabala (2001, p.72) retratam que a conduta de mobbing também poderá ocorrer pelo desiquilíbrio emocional e descontrole psicológico do superior hierárquico que, assim, defere expressões de cunho diminutivo contra a vítima, fazendo com que o subordinado se sinta desacreditado do seu trabalho ou capacidade de raciocínio no ambiente corporativo.

Independentemente da maneira com que as expressões são deferidas ao subordinado ou se ocorrer em público ou isoladamente, são frases como “sabia que você não conseguiria resolver isso...” ou “você demorou demais para me entregar esta tarefa e isto atrapalhou toda a equipe...” ou “você poderia trabalhar mais a agilidade. Hoje em dia o mercado de trabalho necessita de pessoas ágeis...” ou ainda “é por causa de pessoas como você que a mão de obra humana está sendo substituída por máquinas e robôs”.

A conduta repetitiva com expressões de cunho ofensivo dirigida ao subordinado poderá afetar o psicológico do colaborador, além de se enquadrar como conduta abusiva, configurando a prática de mobbing, ou seja, a agressão psicológica em uma relação de trabalho.

Segundo Hirigoyen (1998, p.77), a luta constante pelo poder hierárquico ocorre de maneira desigual e, por esta razão, o superior hierárquico reduz a vítima a uma posição de impotência laborativa, posteriormente passa a agredi-la, desta forma o subordinado não tem como se defender.

Embora a prática do mobbing no ambiente corporativo independa do cargo ou função desempenhada pelo agressor, existe o cúmplice do agressor, que geralmente são colaboradores do mesmo nível operacional da vítima. A conduta destes agressores é classificada pela doutrina como assédio horizontal.

Para configurar cumplicidade de agressores no mobbing, basta que uma ou mais pessoas pactuem da conduta do agressor e não façam nada a respeito, seja para repreender o agressor ou para orientar a vítima em como lidar com a situação, ou buscar meios alternativos de solução destas condutas, sem que coloque em risco sua integridade física.

Geralmente, a conduta do cúmplice em mobbing ocorre pela omissão dos colegas diante da prática do agressor, ou até mesmo pela participação destes nos atos de violência e psicoterror laborativo, porquanto julgam que o ato agressivo não constitui agressão, mas apenas “pressão” no trabalho ante o cargo ocupado na qualidade de superior hierárquico.

Os cúmplices possuem as mesmas características do agressor, inclusive o medo e receio de competitividade da vítima, independentemente do cargo ou da função desempenhada na empresa.

Desse modo, os cúmplices começam a agir com a mesma conduta do agressor ou também podem presenciar a conduta agressiva do superior hierárquico e não intermediar, seja por medo de demissão ou achar normal e aceitável a conduta agressiva do superior hierárquico.


VÍTIMAS

As vítimas de mobbing poderão ser qualquer colaborador da empresa, independentemente do cargo ocupado ou da função desempenhada, pois, todas as pessoas estão vulneráveis a sofrer mobbing no ambiente corporativo.

No entanto, Piñuel (2003) realizou uma pesquisa denominada Cinsneros e concluiu que as maiores vítimas do mobbing eram pessoas com menos de 30 aos de idade. A pesquisa confirmou a linha de estudos de Piñuel, considerando que as pessoas com menos de 30 anos ainda estão em fase de formação acadêmica e profissional.

Sendo assim, estão mais expostos ao assédio moral e psicológico em um ambiente corporativo, seja por parte do superior hierárquico ou pelos próprios colaboradores com mesmo nível acadêmico e da mesma equipe por mera insegurança ou por se sentirem ameaçados em uma possível concorrência de cargo superior na empresa.

Conforme Hirigoyen (2002, p.91), habitualmente as pessoas praticam o assédio moral em conduta discriminatória pela recusa de aceitar as diferenças de outra pessoa. Neste sentido, as condutas discriminatórias permeiam a religião, orientação sexual, raça, cor, orientação sexual, portadores de deficiência, dentre inúmeras classificações discriminatórias que estão enraizadas de forma velada na sociedade.

Muitas vezes, as pessoas tendem a esconder suas diferenças para que possam ser aceitos com facilidade tanto na sociedade, quanto pelos colegas de trabalho.

Estes comportamentos geralmente são adotados pelos colaboradores recém-contratados e que já foram vítimas de mobbing em algum momento da vida profissional, cuja experiência negativa ensejou a pessoa a viver em um redoma invisível capaz de esconder suas diferenças e facilite a inclusão social no ambiente laborativo.

Tendo em vista que a principal conduta do agressor decorre da inveja e constante receio de competitividade no ambiente laborativo, as vítimas de mobbing acabam sendo pessoas com classe social diferente do agressor, pessoas em início de carreira, jovens com menos de 25 anos, negros, LGBT+, mulheres ou pessoas com deficiência (PcD), ou seja, indivíduos que sofrem com preconceitos velados na sociedade (Hirigoyen, 2002:83).

As vítimas propendem a ser pessoas educadas, com elevado nível de inteligência (Q.I), que sejam capazes de se destacar rapidamente em um ambiente corporativo, ainda que o colaborador não demonstre ou não desenvolva um comportamento competitivo.


IMPACTO SOCIAL NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Atualmente, é inimaginável o número total de pessoas que são vítimas de mobbing diariamente no ambiente de trabalho, tampouco as consequências esteadas pelas vítimas.

Embora o conceito de mobbing não seja um fator extremamente preocupante, é importante que a sociedade consiga identificar a conduta agressiva, visto que a própria sociedade está vulnerável a violências psicológicas no ambiente laborativo.

Isto porque, a prática de mobbing começa repentinamente, e então, quando o agressor percebe a vulnerabilidade da vítima, passa a persegui-la frequentemente até o momento em que o subordinado recorra ao pedido de demissão do trabalho, pois, em decorrência do desgaste psicológico em face das condutas reiteradas do agressor e, muitas vezes,d a ausência de conhecimento ou informações que possam auxiliá-lo na busca por ajuda, aumenta ainda mais a sensação de impotência profissional.

Conforme aponta Hirigoyen (2005, p.159), a vítima de mobbing poderá desenvolver estresse, ansiedade, depressão, distúrbios psicossomáticos, transtornos psicológicos, transtornos de humor, baixa autoestima, ou seja, fatores que afetam diretamente o psicológico do agredido.

Cabe ressaltar que, além das doenças psicológicas, a vítima poderá desenvolver traumas decorrente das humilhações, incapacidade de estar ou falar em público ou até mesmo desenvolver síndrome do pânico.

Saliente-se que as doenças desenvolvidas pelas vítimas também são consideradas como doenças do século XXI, visto que a geração atual está constantemente vulnerável ao desgaste mental.

Como o significado de mobbing é conceituado como espécie de assédio, é recorrente que as vítimas busquem do Poder Judiciário, indenização por danos morais e assédio moral decorrente de assédio moral nas relações de trabalho, quando, em verdade, foi vítima de mobbing, que é espécie de assédio.

A adequação literal do termo é agressão psicológica local de trabalho ou, ainda, psicoterror no ambiente corporativo. É importante a invocação de debates sobre o termo no dia a dia corporativo, visto que tanto a violência de mobbing, quanto as consequências iniciam-se de maneira velada.

A prática de mobbing é assemelhada ao assédio moral porque no Brasil o termo não é amplamente conhecido, além exigir que a vítima tenha controle psicológico e emocional diante de uma situação de agressão psicológica, haja vista que, geralmente, a conduta do agressor decorre da hierarquia de cargo ocupado ou até mesmo do tempo em que o agressor trabalha na empresa.

É notório que as relações corporativas não estão imunes à prática de atos que resultam em agressão psicológica contra algum colaborador, ainda que de forma velada, tampouco, o colaborador está imune às consequências destas agressões.

Mister se faz necessário ressaltar que, além das doenças psicológicas que são desencadeadas pela violência, a vítima também ficará propício à frequente irritabilidade no próprio local de trabalho, impaciente ou insegura da sua capacidade profissional.

Segundo Di Martino (1999, p.132), a conduta do mobbing poderá contribuir para que a vítima se torne um indivíduo agressivo, desconfiado e com alto grau de incapacidade no desenvolvimento de relações interpessoais.

Tendo em vista as consequências do mobbing, a vítima poderá sofrer com desconcentração social, dificuldade de pensar e se expressar com clareza, enfrentar dificuldade na resolução de problemas que antes resolvia com facilidade, além do isolamento social com sentimento de inutilidade.

Apesar da prática de mobbing desencadear inúmeros problemas e consequências a serem suportadas pelas vítimas, raramente se discute o assunto na sociedade, mesmo que o mundo atravesse o século das doenças psicossomáticas que afetam vários campos e fatores da vida social da vítima.

Pode acontecer que o colaborador esteja com problemas pessoais, ou até mesmo já enfrente algumas destas doenças, mas prefere esconder para facilitar a inclusão no ambiente corporativo ou pelo resultado negativo que o mobbing causa, que é o isolamento interpessoal da vítima.

Considerando que é comum e recorrente o número de processos judiciais com pedido de danos morais decorrente de assédio moral na relação de trabalho, pesquisas realizadas a critério das empresas, demonstraram quais os fatores que necessitam de atenção da empresa com intuito de preservar o bem-estar social e corporativo de cada colaborador.

A implantação do compliance se tornou grande ferramenta de uso das empresas contra arbitrariedades dos superiores em face dos colaboradores, no entanto, pouco se debate sobre eventual sequela suportada pelo colaborador.

Na medida em que a evolução tecnológica e científica cresce, o mercado de trabalho se torna cada vez mais competitivo, de modo que as empresas passam a exigir funcionários mais especializados e possivelmente com alto nível de capacidade laborativa para resoluções de tarefas em menor tempo, ou seja, desenvolvimento de tarefas sob pressão.

No entanto, cabe aos gestores de equipe estudar e definir o limite da pressão laborativa, respeitando a saúde mental do colaborador, para que as tarefas a serem concluídas em menor tempo não se tornem frequentes ou violentas.

É importante destacar que todos colaboradores da empresa devem assumir a responsabilidade individual de observar os comportamentos dos colegas de trabalho, independentemente da função ou cargo, haja vista que uma das doenças do século XXI é a depressão.

Ainda existem pessoas que julgam a depressão como irrelevante ou “moda de adolescente”, no entanto, mister se faz a observância tanto dos comportamentos dos colaboradores, quanto das agressões, pois, a vítima poderá estar enfrentando a depressão e a violência de mobbing ser um fator contribuinte para a vítima cometer suicídio.

Assim, resta evidenciado que o termo mobbing, apesar da classificação como espécie de assédio, ainda não é amplamente conceituada na sociedade, bem como os impactos negativos que a prática poderá causar a uma vítima.


MEIOS DE PREVENÇÃO E RESOLUÇÃO

Certamente, o meio mais comum de prevenção e resolução de conflitos no ambiente corporativo é o Código de Conduta, ao qual destinam-se aos colaboradores, visando à orientação e à proteção de todos os meios de ferramentas utilizados no dia a dia de trabalho.

Além disso, o código de conduta também disciplina as relações de trabalho, orientando aos colaboradores qual o comportamento que se espera dentro da empresa entre os funcionários.

Para tanto, também busca esclarecer quais as sanções administrativas aplicáveis no caso de violação dos termos do código. Não obstante, neste código as empresas esclarecem quais são as medidas judiciais poderão ser tomadas em caso de violação das regras.

Certamente, a prevenção e repreensão são meios eficazes de se evitar condutas abusivas de colegas ou superiores hierárquicos, no entanto, não abordam de maneira específica os tipos de assédio moral, psicológico e psicoterror como agressão.

Destarte, é de extrema necessidade que os códigos de condutas abordem de forma expressiva quais são as condutas agressivas que, além de repudiadas, devem ser evitadas pelos superiores hierárquicos e observados entre os colegas subordinados.

Nesse interim, as empresas devem definir qual estratégia de treinamento dos colaboradores e superiores, visando a alcançar a inclusão social e corporativa de todos funcionários, sem distinção de raça, cor, sexo, etnia, ideologia, nível acadêmico ou quaisquer outros tipos de diferenças que possam ser passíveis de preconceito velado.

Conforme já ensinava Peiró (1983), abordar expressamente o tema em debates, contribui para esclarecer do que se trata o mobbing, como é a conduta do agressor e prepara a vítima e demais colaboradores a identificar o momento em que ocorre a prática de mobbing, bem como a maneira de intervenção no conflito.

Entretanto, é fundamental que departamento de Recursos Humanos da empresa, junto com os superiores, adotem meios de prevenção e repressão de condutas abusivas e agressivas como o mobbing.

A responsabilidade individual de observar o comportamento do colaborador, também se estende ao departamento de Recursos Humanos das empresas, porque as empresas implementaram a presença de um profissional de psicologia nos processos seletivos para analise comportamental dos candidatos.

Assim, é fundamental que a atuação do psicólogo não fique restrita apenas aos processos seletivos, mas também seja constante na análise de desenvolvimento dos colaboradores, haja vista que é um profissional extremamente importante no acompanhamento de integração dos colaboradores.

Sendo assim, poderão, em conjunto com os gestores de equipe, observar a maneira com a qual os colaboradores interagem e a frequência com que interagem, buscando promover resoluções de tarefas em grupo e, se o caso, realizar reuniões de equipe para esclarecer um feedback sobre a evolução da equipe em geral.

Destaca-se que, nos últimos anos as empresas buscaram implantar o compliance como ferramenta de solução de conflitos na empresa, colaborando com a diminuição dos processos judiciais, visto que o objetivo principal é promover o relacionamento interpessoal e otimização do ambiente laborativo, pois, contribui com as tarefas desempenhadas pelos colaboradores e até mesmo dos gestores de equipe.

O compliance auxilia os colaboradores no planejamento de tarefas e organização do ambiente de trabalho, visando a melhoria do ambiente e qualidade do trabalho prestado por cada colaborador em menor tempo, desta forma contribuindo para o controle de tarefas com equilíbrio emocional e psicológico.

Após o Código de Processo Civil de 2015 entrar em vigor, passou-se a utilizar a mediação e a conciliação com mais frequência como meio de solução e resolução de conflitos, com intuito de evitar o litígio judicial.

Atualmente, tem crescido cada vez mais o número de pessoas que procuram o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania com o intuito de serem auxiliados na realização de um acordo extrajudicial.

Alguns escritórios, independentemente da área que atuam, já aderiram à inclusão de um departamento específico para mediação e solução de conflitos dentro da empresa, de modo a evitar eventual embate judicial sobre danos morais decorrente de condutas reiteradas de assédio moral do superior hierárquico ou quaisquer outros conflitos que são comuns em uma equipe corporativa.

Portanto, a adesão à mediação e conciliação é um meio de resolução consensual de conflitos que, além de evitar demandas judiciais, poderá auxiliar as equipes corporativas a treinar o relacionamento interpessoal, bem como a respeitar e praticar a diversidade e inclusão social.


LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E JURISPRUDÊNCIA

No Brasil, embora ocorra de forma habitual a prática de assédio moral nos ambientes corporativos, não existe legislação específica para repreensão ou punição dos agressores, tampouco para as práticas de mobbing.

No entanto, os magistrados que se deparam com ações trabalhistas que visam à indenização por danos morais decorrente de condutas abusivas, dentre elas o assédio moral ou mobbing como espécie de assédio moral, a jurisprudência têm buscado aplicar o artigo 186 do Código Civil Brasileiro para reconhecer o pedido autor.

Alguns magistrados também aplicam o artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho, em respeito ao princípio da autonomia da vontade, bem como ao princípio da legalidade constitucional.

Isto porque, a empresa tem o dever de zelar pela integridade física e moral de seus colaboradores, e quando tem ciência da ocorrência de condutas abusivas praticadas pelo superior hierárquico ou pelo colega de trabalho, mas mantém-se silente, incorre em omissão que consequentemente acabam sendo responsabilizadas.

O Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado no sentido de que eventual pedido por danos morais pela reclamante não depende de provas de ocorrências dos fatos, pois, presumem-se que as relações de trabalho se pautam pelo respeito mútuo, tanto em direitos quanto em obrigações (Ag – AIRR – 1002207-55.2015.5.02.0613).

Assim, cabe ao empregador fornecer condições de trabalho adequadas que viabilizem o regular desempenho da função, respeitando a integridade física e moral dos colaboradores.

Portanto, a C. Corte declarou que as condutas abusivas de psicoterror no trabalho caracterizam-se como assédio moral, haja vista que deterioram o ambiente de trabalho, além dos transtornos psicológicos que são causados ao trabalhador.

Ressalta-se que a proteção à dignidade da pessoa humana, bem como a proteção aos valores sociais do trabalho, constituem-se como princípios fundamentais da República Federativa do Brasil, expressos no artigo 1º da Constituição Federal do Brasil em vigor desde 1988.

Deste modo, a decisão de um magistrado não será fundada apenas no conceito do que é assédio moral ou em eventual doença esteada pela vítima, mas também pelo respeito à integridade física e moral que é resguardada pela Carta Magna como fundamento de respeito e ordem social.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

As práticas abusivas nos ambientes corporativos têm se tornado cada vez mais complicados de combater, seja pela dificuldade da vítima em comprovar os danos sofridos ou pelo receio de sofrer represálias.

De todo modo, é notório que grandes empresas têm buscado meios alternativos de orientar e treinar os gestores de equipe para evitar as condutas abusivas, consequentemente diminuindo o número de ações trabalhistas cujo objeto seja pedido de danos morais em razão de assédio moral no ambiente corporativo.

Destarte, apesar da ausência de uma norma específica para tratar do assédio moral no ambiente corporativo, a jurisprudência brasileira tem buscado resguardar o direito à indenização por danos morais dos trabalhadores que, diariamente, acabam sendo vítimas destas agressões.

Portanto, resta a esperança de uma sociedade justa, acolhedora e inclusiva, que respeite as diferenças das pessoas, com a consciência de que a concorrência sempre existirá em qualquer campo da vida, mas que, certamente, existe um espaço para todos.


REFERÊNCIAS

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