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Declarada ilegalidade da cobrança de assinatura do telefone fixo pela Brasil Telecom e GVT

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02/03/2007 às 00:00
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Sentença em ação civil pública movida no Mato Grosso declarou ilegal a cobrança de tarifa básica de assinatura pelas empresas de telefonia fixa Brasil Telecom e GVT.

Autos :001.06.038619-4
Autor:Ministerio Publico Estadual
Réu:Brasil Telecom S/A e outros


Sentença

            Ementa: Ação Civil Pública - Ilegalidade tarifa básica mensal de telefonia fixa e móvel - Parcialmente procedente. Declarada ilegalidade para telefonia fixa - negada para telefonia móvel. Indeferido pedido de devolução dos valores pagos.


            Vistos etc.

            O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL e a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA CIDADANIA E DO CONSUMIDOR DE MATO GROSSO DO SUL - ABCCON-MS, por seus representantes, propuseram a presente Ação Civil Pública, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, inicialmente, em face da ANATEL – AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES e a BRASIL TELECOM S.A., aduzindo em resumo que a cobrança da tarifa básica mensal residencial e não residencial são ilegais por serem contrárias ao Código de Defesa do Consumidor, dizendo serem consubstanciadas em venda casada, consistente na imposição ao consumidor a utilizar a quantia de pulsos fixadas pela empresa, sob pena de pagamento ainda que não se utilize dos serviços. Sustenta que assim agindo, a empresa requerida exige dos consumidores vantagem manifestamente excessiva e pratica cobrança indevida. Requer em antecipação de tutela, a suspensão da cobrança impugnada tanto para a telefonia fixa quanto móvel, e, por fim, que seja confirmada a antecipação dos efeitos da tutela, bem como a determinação de que a cobrança dos 100 primeiros pulsos utilizados, seja no mesmo valor dos demais. Requer a devolução dos valores pagos e a divulgação, ao final, da eventual decisão favorável. Pugna pela procedência do pedido inicial. Juntou documentos de fls. 50-232.

            Por decisão de fls. 237-239, foi indeferido o pedido liminar e a exclusão da ABCCON - MS do pólo ativo da ação.

            Às fls. 246-247, o autor Ministério Público Estadual, requereu a citação das seguintes empresas de telefonia móvel: VIVO/TELEMS CELULAR S/A, TIM CELULAR, CLARO/AMERICEL S/A, BRASIL TELECOM CELULAR e da empresa de telefonia fixa GLOBAL VILLAGE TELECOM/GVT, o que foi deferido por despacho de fl.250.

            A ANATEL (fls. 261-289), TELEMS CELULAR S.A. (fls. 401-430), AMERICEL S.A. (CLARO) (fls. 497-536), GLOBAL VILLAGE TELECOM LTDA. (fls. 737-772), TIM CELULAR S/A., (fls. 777-794), BRASIL TELECOM S.A. (fls. 839-854), BRASIL TELECOM CELULAR S.A. (fls. 986-1006), contestaram suscitando as preliminares de:

            1. Ilegitimidade ativa e falta de interesse de agir do Ministério Público, ao argumento de que o interesse é individual;

            2. Ilegitimidade passiva sob o fundamento de que operam apenas o sistema de telefonia móvel e privado, mediante autorização e não concessão como no serviço de telefonia fixa comutado;

            3. de inépcia da inicial, dizendo que não apresenta correlação entre a exposição dos fatos, que implica na prestação do serviço sob regime público, e, posteriormente formulando pretensão que invade o regime privado, estabelecido no artigo 63, caput, da Lei Geral das Telecomunicações, que não contém para o serviço móvel a combatida denominação de tarifa básica;

            4. Impossibilidade jurídica do pedido, mediante alegação de que o Poder Judiciário não pode intervir nas normas administrativas impostas pela ANATEL;

            5. Falta de interesse de agir por ausência de utilidade da medida tutelada, dizendo que a suspensão da cobrança da assinatura, forçará um reajuste das tarifas e pela inadequação da via eleita, aduzindo que a pretensão do autor visa declarar a inconstitucionalidade e ilegalidade de normas federais.

            No mérito:

            1. defenderam a legalidade da cobrança de assinatura mensal, dizendo existir contraprestação ao consumidor por meio da manutenção e disponibilização dos serviços de modo exclusivo. Alegaram que o assinante que não faz chamadas é subsidiado pelos que fazem chamadas e consomem minutos. Asseveraram que nem todos os assinantes são consumidores, exemplificando com as empresas de telemarketing, call center, profissionais liberais, dentre outros;

            2. Alegaram que prestam serviços no regime de direito privado, com menor grau de intervenção do Poder Público, dizendo não ter a mesma essencialidade que a telefonia fixa;

            3. Rebateram a pretensão de existência de venda casada, asseverando que o plano básico é diferente de seus planos alternativos. Rechaça a tese da devolução em dobro dos valores pagos, aduzindo que as cobranças foram feitas amparadas pelas normas da ANATEL por meio das Resoluções 85/98 e 316/02;

            4. Afirmaram que são empresas autorizadas, e que portanto, não estão sujeitas à estrutura tarifária estabelecida pela ANATEL;

            5. Asseveraram que a cobrança da tarifa mínima é acobertada pelo acordo de vontades, mediante expressa previsão contratual;

            6. Afirmaram que a tarifa básica é mecanismo que possibilita a capitalização de recursos para que as concessionárias do serviço de telefonia, cumpram com a obrigação assumida ante a ANATEL de prestação de serviço adequado e contínuo, pretendendo que constitua direito adquirido e ato jurídico perfeito

            7. Rechaçaram a pretensão de devolução em dobro com a argumentação de que a cobrança é efetivada de boa fé, amparada pela Súmula 159 do STF;

            8. Mencionaram que o feito deve ficar sobrestado ao julgamento final de Conflito de Competência a ser julgado pelo Superior Tribunal de Justiça.

            Às fls. 1112-1192, o autor impugnou integralmente as contestações, repisando o pedido inicial.

            Oportunizada às partes a especificação de provas, o autor o fez às fls. 1313-1314, e, as partes requeridas AMERICEL (CLARO) (fls. 1316-1317), TELEMS CELULAR S/A (fls. 1325-1334, pugnaram pelo julgamento antecipado da lide.

            Por decisão de fls. 1321-1323, a ANATEL foi excluída do pólo passivo da ação, sendo os autos remetidos a este Juízo.

            Por despacho de fl. 1421, foram ratificados os atos até então praticados.

            O autor renovou os pedidos liminares às fls. 1441-1455 e repisou a juntada de documentos.

            Relatei o necessário. D E C I D O.

            O feito comporta julgamento antecipado, porquanto não há questões prejudiciais a serem analisadas e as questões de mérito submetidas à apreciação são unicamente de direito, estando fartamente comprovadas pelos documentos acostados aos autos, nos termos do artigo 330, I, do Código de Processo Civil.


I – DAS PRELIMINARES

            1.1. Ilegitimidade ativa e falta de interesse de agir do Ministério Público, ao argumento de que o interesse é individual homogêneo disponível.

            Não prosperam as argumentações de ilegitimidade e falta de interesse de agir do Ministério Público, pois é Órgão legalmente legitimado a propor ação civil pública na defesa coletiva, em sentido amplo, como no presente caso, que envolve interesses do consumidor, segundo dispõe o artigo 82, I, do Código de Defesa do Consumidor.

            Entendo que a Constituição Federal, recepcionou integralmente a Lei n. 8.078/90, e, nesse sentido, o artigo 129, III, da Constituição Federal, teve ampliado o conceito direitos difusos e coletivos, passando a incluir os individuais homogêneos, que não diferentemente, são interesses coletivos, lato sensu.

            Comungo do entendimento esposado por HUGO NIGRO MAZZILLI, que propõe a atuação do Ministério Público no pólo ativo sempre que:

            "(...) a) haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou pelas características do dano, ainda que potencial; b) seja acentuada a relevância social do bem jurídico a ser defendido; c) esteja em questão a estabilidade de um sistema social, jurídico ou econômico, cuja preservação aproveite à coletividade como um todo." [01]

            Com efeito, a legitimidade do Parquet, deve ser analisada no caso concreto, avaliando-se a abrangência do interesse tutelado, de forma a subsumir-se ao citado artigo 82, I, do Código de Defesa do Consumidor. Como ocorre no presente caso, em que se discute a legalidade da cobrança da tarifa básica dos serviços de telefonia, que indubitavelmente, é manifesta a relevância do interesse social, e, pela sua dimensão que aproveitará à coletividade como um todo.

            Sobre o tema, oportuno brilhante julgado do Superior Tribunal de Justiça:

            Ementa: PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC, NÃO-CONFIGURADA. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA A TUTELA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA CONCESSIONÁRIA DO SERVIÇO DE TELEFONIA CELULAR. DIREITO À INFORMAÇÃO. FORNECIMENTO DE FATURA DETALHADA. IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA. EXEGESE DO ART. 3° DA LEI N° 7.347/85. OBRIGAÇÕES DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE PAGAR QUANTIA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. PRECEDENTES. 1. Ação civil pública proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS que busca a condenação da empresa concessionária de telefonia celular, AMERICEL S/A, ao fornecimento, sem nenhum encargo, de fatura discriminada dos serviços prestados, além da devolução, em dobro, dos valores cobrados pelo detalhamento da conta telefônica. (...). Assim sendo, não se verifica, na espécie, omissão a ensejar a nulidade do julgado, e, conseqüentemente, nenhuma contrariedade ao art. 535 do CPC. 3. Os interesses dos consumidores/assinantes da linha telefônica são de natureza individual, o que, todavia, não afasta seu caráter homogêneo, na medida em que a relação jurídica de consumo se aperfeiçoou por meio de pactos de adesão formulados unilateralmente pela AMERICEL, o que coloca os usuários em situação homogênea, no que se refere à eventual violação de direitos. Portanto, vislumbrada a tutela de interesses individuais homogêneos, tem incidência o art. 81 do CDC (Lei n° 8.078/90), além do art. 82 deste Diploma, que legitimou o Ministério Público, dentre outros entes, a agir na defesa coletiva dos interesses e direitos dos consumidores.(...) (REsp 684712 / DF ; RECURSO ESPECIAL 2004/0079186-3 Relator(a) Ministro JOSÉ DELGADO (1105) Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 07/11/2006 Data da Publicação/Fonte DJ 23.11.2006 p. 218)

            1.2. A) Ilegitimidade passiva sob o fundamento de que operam apenas o sistema de telefonia móvel e privado, mediante autorização e não concessão como no serviço de telefonia fixa comutado; B) de inépcia da inicial, dizendo que não apresenta correlação entre a exposição dos fatos, que implica na prestação do serviço sob regime público, e, posteriormente formulando pretensão que invade o regime privado, estabelecido no artigo 63, caput, da Lei Geral das Telecomunicações, que não contém para o serviço móvel a combatida denominação de tarifa básica; c)falta de interesse de agir por ausência de utilidade da medida tutelada, dizendo que a suspensão da cobrança da assinatura, forçará um reajuste das tarifas e pela inadequação da via eleita, aduzindo que a pretensão do autor visa declarar a inconstitucionalidade e ilegalidade de normas federais.

            Referidas preliminares dizem respeito à teses que envolvem diretamente o mérito da ação, e, com ele serão julgadas.

            1.3. Impossibilidade jurídica do pedido, mediante alegação de que o Poder Judiciário não pode intervir nas normas administrativas impostas pela ANATEL.

            Afasto a preliminar, com fundamento no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, que prevê a impossibilidade da lei determinar a exclusão de qualquer lesão ou ameaça a direito, da apreciação do Poder Judiciário.

            Como se vê, se a Carta Magna estabelece a impossibilidade de haver lei que exclua lesão ou ameaça a direito da apreciação do Judiciário, quanto mais impossibilitadas estão as normas administrativas.

            Ademais, o Código de Defesa do Consumidor, estabelece expressamente em seu artigo 6º:

            "Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:

            (...)

            VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos, com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

            VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências."

            Pois bem, rechaçadas as preliminares ventiladas pelos requeridos, passo a análise do mérito da causa.


MÉRITO

            O ponto controvertido da lide cinge-se a legalidade ou não, da cobrança da tarifa de assinatura básica, pelos serviços que prestam as empresas de telefonia, quanto ao sistema fixo e móvel.

            1. Da cobrança da tarifa básica para os serviços de telefonia fixa

            Primeiramente, analiso a legalidade da cobrança para os serviços de telefonia fixa.

            A telefonia fixa, hodiernamente, se apresenta como serviço público essencial, dados os avanços tecnológicos, principalmente como eficiente meio de comunicação e pelo uso da internet.

            Não pairam dúvidas quanto a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor ao presente caso, pois, a relação jurídica encartada entre as empresas de telefonia fixa BRASIL TELECOM S/A. e GVT - GLOBAL VILLAGE TELECOM LTDA e os usuários dos serviços é de consumo, a teor do que dispõe os artigos 2º e 3º da Lei Consumerista.

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            Indiferentemente do sistema em que operem as empresas, se público ou privado, devem obedecer ao Código do Consumidor por ser norma de ordem pública.

            Ademais, em ambos os sistemas, as empresas requeridas exercem atividade de prestação de serviço público de telefonia. Referida atividade é de relevante interesse social, tanto que a Constituição Federal, no artigo 21, XI, atribui à União Federal, explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações.

            Como bem observa RAQUEL DIAS DA SILVEIRA:

            "É mister observar que em se tratando de serviços de telefonia fixa, quando prestados no regime privado por empresas autorizatárias, como a Intelig, a Vésper-SP, a Vésper S/A e a GVT, o regime jurídico da prestação irá sofrer influência inevitável das normas de Direito Público, vez que, a despeito de as autorizatárias não estarem sujeitas a certas obrigações como universalização e continuidade, submetem-se às metas de qualidade, cujo descumprimento poderá acarretar, inclusive, a caducidade da autorização e a retomada do serviço pela Agência.

            Logo, os serviços de telefonia fixa, segundo o nosso entendimento, ou serão prestados no regime público, quando forem objetos de concessão ou permissão, ou serão prestados no regime parcialmente público, quando forem objeto de autorização." (g.n.)

            Nesta senda, o artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor estabelece:

            Art. 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

            Parágrafo único - Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código.

            A par, dos reconhecidos benefícios implantados em nosso país com a evolução dos serviços de telecomunicações após a reclamada desestatização, não se serve de guarida a fundamentação de modernização tecnológica a qualquer custo, em prejuízo a direitos fundamentais, como o do consumidor.

            Também não pode, os serviços públicos de telefonia fixa ficarem a mercê de normas administrativas editadas pela ANATEL em dissonância com o Código de Defesa do Consumidor, pois sabidamente, há o interesse do Poder Executivo que cria e controla as agências reguladoras, como no presente caso, em que a assinatura básica é manifesta vantagem à Administração, calcada no interesse público secundário, porquanto 30% (trinta por cento) da arrecadação obtida é repassada ao governo por meio de impostos como PIS, Cofins e ICMS.

            A Lei n. 8.078/90 nasceu da necessidade de proteção ao consumidor frente a expansiva evolução industrial-econômico-financeira que gerou a sociedade de massas.

            Consubstanciado num subsistema jurídico próprio, baseado no princípio do protecionismo, decorrente diretamente do ordenamento constitucional, que estabelece a defesa do consumidor como um dos princípios gerais da atividade econômica (inciso V do art. 170) e impõe ao Estado o dever de promover tal defesa (inciso XXXII do art. 5º). [02]

            Repito, fundamentações já feitas em análise da discriminação das faturas telefônicas, pois os direitos invocados respaldam-se nas mesmas pretensões: efetivação da dignidade da pessoa humana, boa-fé contratual e equilíbrio nas relações de consumo.

            A Constituição Federal, com a previsão de edição do Código de Defesa do Consumidor (artigo 48 ADCT), impõe uma releitura de todo o sistema jurídico, situação esta que passa desapercebida pela maioria da comunidade jurídica que ainda acredita que as normas constitucionais são dirigidas ao legislador e não têm aplicação imediata; muito pelo contrário, o fato é que o ordenamento jurídico deve ser interpretado sobre o prisma da dignidade da pessoa humana como valor absoluto a ser aplicado em todas as searas do direito.

            A finalidade da institucionalização da defesa do consumidor é meio de equilibrar as relações contratuais consumeristas, com o objetivo de igualar as partes, observada a vulnerabilidade do consumidor, banindo-se ilegalidades e abusos praticados pelos até então detentores intocáveis da força – os fornecedores de produtos e/ou serviços.

            Neste sentido, é que se apresenta a efetiva lesão ao consumidor pela cobrança da tarifa de assinatura básica de telefonia residencial, irrelevante tratar-se de concessionária, permissionária ou autorizatária do poder público, pois a cobrança indevida caracteriza a ilegalidade.

            Muito discutido nos tribunais pátrios acerca da natureza jurídica da cobrança, se taxa ou tarifa; a meu ver, não resta dúvida que se trata de tarifa, porquanto não pode ser imposta ao cidadão brasileiro, por duas razões:

            Uma que: não decorre de previsão legal específica - princípio da legalidade, mas de normas administrativas, no intuito de que a entidade outorgada ou delegada receba prestação pelo serviço prestado, gerando para os usuários um penoso encargo mensal.

            Duas que: diferentemente de taxa, em que os serviços nem sempre trazem consigo vantagens, vez que se referem a atividades essenciais, visando o bem comum, sob a característica da compulsoriedade, a tarifa tem caráter voluntário, sendo cobrada por serviço contratualmente assumido.

            Neste sentido é a Súmula 545 do STF:

            "PREÇOS DE SERVIÇOS PÚBLICOS E TAXAS NÃO SE CONFUNDEM, PORQUE ESTAS, DIFERENTEMENTE DAQUELES, SÃO COMPULSÓRIAS E TÊM SUA COBRANÇA CONDICIONADA À PRÉVIA AUTORIZAÇÃO ORÇAMENTÁRIA, EM RELAÇÃO À LEI QUE AS INSTITUIU."

            Mesmo tratando-se de tarifa, a cobrança se apresenta ilegal, tendo em vista que é regida por normas do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de preço público por serviços prestados.

            Aplicáveis ao caso, os princípios: da vulnerabilidade, do equilíbrio, boa-fé objetiva, da informação, da revisão das cláusulas contrárias, da transparência, da equivalência, da solidariedade e da harmonia, todos descritos nos artigos 4º, 6º e 7º do Código de Defesa do Consumidor. [03] Senão vejamos.

            Nos termos do artigo 4º, I, da Lei Consumeirista, o consumidor é a parte mais frágil da relação jurídica, diante da potencialidade técnica e econômica do fornecedor.

            Assim, não pode o fornecedor se amparar nos custos que despende para a manutenção e aprimoramento de suas atividades como motivo a cobrar a tarifa básica do consumidor, mediante a simples desculpa de que coloca o serviço à disposição, porquanto o serviço é colocado à disposição do consumidor pelo fornecedor, na ânsia de vender mais e não somente para assegurar a comodidade do usuário, como quer fazer crer as requeridas.

            Ademais, as requeridas assumiram o encargo de prestarem serviços públicos, que por sua própria natureza devem ser adequados e contínuos.

            De igual modo, violação ao princípio do equilíbrio e harmonização das relações jurídicas, in casu, seria assentir com a continuidade da cobrança da tarifa básica, ainda que o consumidor não utilize os serviços em determinado mês, ou utilize aquém da franquia.

            Justamente, o princípio da boa-fé visa assegurar a harmonia das relações de consumo, como expressamente dispõe o artigo 4º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor.

            A cláusula geral da boa-fé objetiva tem por finalidade munir o julgador com algo mais que a letra fria da lei, colocando-o em posição de observador dos mandamentos de justiça, lealdade e verdade, desapegando-se da visão estática do processo, para fixar bases numa concepção dinâmica do direito entrelaçado à justiça.

            Ressalte-se que o princípio da informação previsto no Código de Defesa do Consumidor no artigo 6º, III, consubstancia o "dever de informar que passa a ser natural na atividade de fomento ao consumo, na atividade de toda a cadeia de fornecedores, é verdadeiro ônus atribuído aos fornecedores, parceiros contratuais ou não do consumidor" [04].

            A cobrança da tarifa básica é indevida, na medida que retira do consumidor o direito de pagar apenas pelo que consumiu, bem como da informação correta acerca da quantidade especificada de ligações que efetuou e quanto pagará por cada uma delas.

            Os contratos de telefonia fixa são de adesão, e, no ponto da tarifa básica, devem ser revistos, a teor do que dispõe o artigo 6º, V, do Código de Defesa do Consumidor, que prevê a possibilidade de modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.

            A cobrança da tarifa básica mensal é prestação desproporcional, na medida em que o usuário paga por serviço que nem sempre utiliza, ou utiliza a menor. Sem, contudo, ter a disponibilidade de escolha por qualquer outro tipo de serviço que dispense a tarifa básica, porquanto, recentemente, foi abolido o sistema de telefonia fixa pré-pago puramente, retirando dos consumidores o direito de opção.

            In casu, os consumidores são vulneráveis na relação de consumo, pois as empresas de telecomunicações, sendo concessionária ou autorizatária de serviço público, impõem unilateralmente aos consumidores seus serviços, com a prioritária intenção de lucro econômico um valor fixo, quase como de um "aluguel" para dispor dos serviços de telecomunicações, restando aos usuários a submissão às suas regras para utilização do serviço de telefonia, hodiernamente essencial, considerando a evolução social.

            Imperativo o equilíbrio na relação acordada, de maneira que o dever do consumidor em pagar pelos serviços de telefonia que lhe são prestados e do fornecedor em receber a contraprestação, sejam sopesados em face do dever do fornecedor cobrar do consumidor somente pelos serviços que presta, com a finalidade de que ambos tenham condições de avaliar reciprocamente os custos-benefícios da utilização.

            Trata-se da aplicação dos princípios da probidade e boa-fé na execução do contrato, imposto pelo o artigo 422 do Código Civil. Por conseguinte no art. 423, estabelece que quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.

            Desta forma, descabe às empresas de telefonia ampararem-se nas normas administrativas editadas pela ANATEL, na medida em que as práticas ofendem ao que estabelece o Código de Defesa do Consumidor.

            A Lei n. 9.472/97, denominada de Lei Geral das Telecomunicações, com a finalidade de ordenar os serviços de telecomunicações, estabelece a adequação das tarifas e preços:

            Art. 2º

O Poder Público tem o dever de:

            I - garantir, a toda a população, o acesso às telecomunicações a tarifas e preços razoáveis, em condições adequadas;

            (...) (g.n.)

            A tarifa como preço público que é, somente pode ser considerada adequada quando cobrada no exato valor dos serviços prestados.

            O artigo 127, da citada Lei dispõe:

            Art. 127.

A disciplina da exploração dos serviços no regime privado terá por objetivo viabilizar o cumprimento das leis, em especial das relativas às telecomunicações, à ordem econômica e aos direitos dos consumidores, destinando-se a garantir:

            (...) (g.n.)

            Pagar o preço pelos serviços efetivamente consumidos é um direito do consumidor.

            Neste sentido é que o artigo 31 da Lei Consumerista estabelece:

            "Art. 31 - A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidade, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores." (g.n.)

            A própria Lei Geral das Telecomunicações que instituiu a agência reguladora ANATEL estabelece no artigo 5º, a obrigatoriedade de observância das normas consumeiristas pelo prestador de serviços, como transcrevo:

            "Art. 5º Na disciplina das relações econômicas no setor de telecomunicações observar-se-ão, em especial, os princípios constitucionais da soberania nacional, função social da propriedade, liberdade de iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, repressão ao abuso do poder econômico e continuidade do serviço prestado no regime público."

            Com maior apoio o artigo 127, caput, III e V, da mesma Lei Geral de Telecomunicações impõe:

            "Art. 127. A disciplina da exploração dos serviços no regime privado terá por objetivo viabilizar o cumprimento das leis, em especial das relativas às telecomunicações, à ordem econômica e aos direitos dos consumidores, destinando-se a garantir:

            I - a diversidade de serviços, o incremento de sua oferta e sua qualidade;

            II - ...

            III - o respeito aos direitos dos usuários;

            IV - a convivência entre as modalidades de serviço e entre prestadores em regime privado e público, observada a prevalência do interesse público;

            V - o equilíbrio das relações entre prestadoras e usuários dos serviços;

            VI -...

            VII - ...

            VIII - o cumprimento da função social do serviço de interesse coletivo, bem como dos encargos dela decorrentes;

            (...)"

            As regras são claras no sentido de equilibrar os interesses entre a concessionária do serviço público e os usuários, sendo inviável que o Poder Público na concessão esteja eximido do seu dever de atender adequadamente os usuários, transferindo todos os ônus a estes em proteção à concessionária. Pelo contrário, assume a concessionária obrigação de ordem pública de respeito aos direitos dos usuários-consumidores. Trata-se do princípio da vedação ao retrocesso, que não é expresso, mas decorre do sistema jurídico-constitucional.

            Útil a transcrição do brilhante voto proferido pelo recentemente aposentado Des. JORGE EUSTÁCIO DA SILVA FRIAS - nosso Egrégio Tribunal de Justiça, em julgamento da Apelação Cível - Ordinário - N. 2006.015937-0/0000-00 - Dourados:

            "(...)Consoante venho entendendo, ilegal me parece a cobrança da chamada assinatura básica de telefone, para a prestação do serviço público ser mantida continuamente à disposição do usuário. E ainda que tal cobrança seja feita desde quando estatal explorava o serviço de telefonia, se a medida contraria a lei, não pode a reiteração (a práxis, o costume) servir de fundamento para rejeição da pretensão inicial. (...) Por outro lado, não se mostra legítima a cobrança de valor especial para a concessionária prestar o serviço que, por natureza, deve ser prestado de forma contínua. É da natureza do serviço público sua prestação continuada e de modo adequado (art. 6º, § 1º, Lei nº 8.987/95), diante do que não se pode admitir a cobrança de um plus para prestação do serviço que, por natureza, não pode ser executado de outro modo. Por isto que na prestação do serviço de transporte coletivo a tarifa é calculada por forma a que o serviço seja ininterrupto, mesmo nos dias e horários em que existem poucos passageiros que paguem pelo serviço. Daí que, com a tarifa estabelecida, a concessionária do serviço de transporte está obrigada a prestá-lo ininterruptamente, garantindo que ele não pare de funcionar mesmo quando nenhum passageiro estiver a bordo. Mesmo quando não haja ninguém usufruindo o serviço ou quando há um único passageiro, ainda assim a concessionária de transporte coletivo não deixa de ter lucro, em razão de outros momentos de maior movimento cobrirem os custos operacionais da escassez de consumidores em outras oportunidades, o que, aliás, é de se computar para cálculo do valor da passagem. Coisa semelhante deve orientar o setor de telefonia, pelo que a remuneração dos serviços há de ser estabelecida por forma a que haja tal continuidade e adequação, descabendo cobrança de importância extraordinária para isto ocorrer.Da mesma forma, não é o consumidor que deve pagar para a concessionária, que presta serviço que lhe garante lucro, modernizar-se. Em economia de mercado, ela, que se propõe a prestar serviços com lucro, é que deve correr os riscos empresariais (art. 83, parágrafo único, Lei nº 9.472/97), e ela é que deve modernizar-se continuamente para não ser alijada do mercado e para não perder a concessão. O valor por ela oferecido na licitação terá previsto tal expansão e modernização, pois a tarifa não se presta para ela obter capital de investimento. A concessionária é remunerada pelas tarifas e por outras receitas alternativas_ftn2, mas aquelas não podem ser compostas por mais do que a remuneração do próprio serviço. Assim como a concessionária do serviço de transporte não poderia cobrar embutido nesse serviço valor para ampliar sua frota (a fim de expandir as linhas para locais ainda não atingidos), não pode a prestadora de serviço de telefonia arrecadar fundo para ampliar seus serviços. Como se verifica, a cobrança da referida assinatura básica de telefonia não encontra embasamento jurídico para ser cobrada. A tarifa, destinada a remunerar a prestação efetiva de serviço público, que é de fruição facultativa, deve ser suficiente para remunerar a atividade desenvolvida pelo concessionário, por forma a cobrir os custos operacionais e tributos devidos, além de lhe propiciar lucro. Mais do que isto não se pode cobrar do utente. Se o usuário não usa o serviço, não pode ser obrigado a pagar nada relacionado com tal serviço. Como, no caso, tal pagamento instituído por Resolução, é compulsório, não estando previsto em lei, e como não corresponde a nenhuma efetiva e concreta prestação do serviço, não pode ser exigível. Aliás, se ninguém é obrigado a fazer algo senão por força de lei (art. 5º, II, CF), resolução nenhuma pode criar obrigação. (...) Assim, o poder concedente não pode, por si ou por meio de sua autarquia especial, sem lei, criar obrigação para o usuário (a de contribuir para a constituição de capital para investimento na área de telefonia); pode definir a composição da tarifa pelo serviço de telefonia efetivamente utilizado, pode definir a forma de reajustes e pode proceder à revisão dos valores estabelecidos, mas não lhe é dado criar fonte nova de obrigação. De tal arte, a Resolução que cria essa obrigação (nº 85/97) não é válida, de modo que os valores cobrados com base nela são indevidos e devem ser restituídos. Ainda que por serviço de comunicação possa se compreender a geração, emissão, recepção, transmissão, retransmissão, recepção e ampliação de comunicação de qualquer natureza, o que cabe o consumidor remunerar é apenas aquele por ele percebido (ou aqueles outros especiais, objetos de contrato celebrado pelas partes). (...) Em resumo, o serviço de telefonia deve ser prestado de forma contínua e adequada, qualidades estas que são da natureza de todo serviço público, de modo que não se justifica a cobrança de tarifa especial para isto. Por outro lado, deve o usuário pagar apenas pelo serviço que contratou, não podendo resolução, sem assento em lei, criar para ele obrigação de financiar expansão do serviço público. (...) De fato, se não existe relação entre os serviços prestados e a remuneração estabelecida para aquela assinatura básica, ainda que contratada, tal prestação importa em enriquecimento sem causa da prestadora dos serviços, a justificar a repetição pretendida pelo usuário (art. 884, CCB), ainda mais que a cobrança não se funda em lei, mas em resolução. Pelas razões expostas, cabe reconhecer a ilegalidade da cobrança perpetrada pela recorrida quando, embora assentada em Resolução, cobra a chamada assinatura básica de telefonia." (g.n.)

            Como bem ensina o ilustre Desembargador, todo e qualquer regulamento dos serviços de telefonia deve ser consentâneo à Lei Geral de Telecomunicações atrelada às regras do Código de Defesa do Consumidor, principalmente os provimentos oriundos da ANATEL, que munida de função regulatória importantíssima, somente exerce atividade legítima se a exercer dentro dos parâmetros das citadas legislações, sem inovação à ordem jurídica, sob pena de ofensa ao princípio da reserva legal. [05]

            Oportuna a lição de RAQUEL DIAS DA SILVEIRA, comentando o regime jurídico dos serviços de telefonia fixa:

            "Toda a vasta gama de direitos previstos no art. 6º, da Lei n. 8.078/90, trazem, como pressuposto, que o usuário é a parte técnica e economicamente mais fraca da relação travada na prestação de serviços ofertados pelo Estado.

            Daí ser inafastável o dever do prestador de serviço público de fornecer a correta, adequada e segura informação sobre o funcionamento e, mormente, sobre as tarifas cobradas dos usuários pela utilização. (...)

            O inciso IV, do art. 6º, do Código de Defesa do Consumidor, dispõe sobre a possibilidade de modificação de cláusulas contratuais, que estabeleçam prestações desproporcionais, ou sua revisão, em razão de fatos supervenientes, que as tornem excessivamente onerosas aos usuários."

[06]

            Assim, caracterizada está a ilegalidade da cobrança da tarifa básica para os terminais de telefonia fixa.

            Aplicado o princípio da proporcionalidade na ponderação dos interesses em litígio face os critérios normativo-político-administrativos, concluo que num escalonamento de prioridades do ordenamento jurídico, in casu, incumbe ao Poder Judiciário impor às concessionárias BRASIL TELECOM S.A e GVT - GLOBAL VILLAGE TELECOM LTDA., o cumprimento da obrigação legal disposta na LGT e no CDC, de cobrar apenas os pulsos consumidos, extinguindo-se a cobrança mensal da tarifa básica.

            Como se vê, não é uma imposição aleatória mas respaldada no ordenamento jurídico, constitucional. Ademais, oportuno frisar que, com a promulgação de nossa Carta Magna no dia 05 de outubro de 1988, houve uma mudança da função do Estado. Segundo o Professor – Doutor LENIO LUIZ STRECK, Procurador de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, passamos de um estado social para o Estado Democrático de Direito. Para esse mestre houve "uma revolução copernicana no campo do direito público (...) a própria constituição será, agora, fonte de direito, prescindindo, por vezes, da interposição legislativa (...) o Estado Democrático de Direito é um plus normativo em relação ao Estado Social (...) passando a protetor dos direitos fundamentais, isto é, a fórmula liberal do Estado mau é ultrapassada por esse plus normativo: o Estado passa a condição de amigo dos direitos fundamentais (no sentido de não ser mais o opositor). Trata-se de compreender que a proteção dos direitos fundamentais implica um duplo viés: não mais somente a proteção negativa dos direitos (proteção contra o arbítrio estatal), mas, também, a proteção positiva (proteção contra as insuficiências na proteção dos direitos por parte do Estado)" [07].

            Por conseguinte, acolho o pedido formulado de que a cobrança dos 100 primeiros pulsos utilizados, seja no mesmo valor dos demais, pois referida prática decorre da extinção da cobrança da tarifa básica, porquanto o preço dos pulsos devem obedecer aos padrões gerais de cada operadora da telefonia fixa (horários, distância, etc.), sob pena de se reimplementar a referida tarifa básica.

            2. Da cobrança da tarifa básica para os serviços de telefonia móvel

            Agora, passo a analisar a legalidade da cobrança quanto aos serviços de telefonia móvel.

            Diferentemente, os serviços de telefonia móvel, que efetivam a cobrança da tarifa básica, sabidamente conhecidos como pós-pago, trata-se de opção inversa ao serviço pré-pago, que constitui no uso da telefonia móvel por meio de prévia inserção de créditos, sem conta telefônica mensal.

            Então, muda-se o foco de apreciação da prestação dos serviços mediante a cobrança da tarifa básica mensal, porquanto existe uma opção dada aos usuários para não pagarem referida tarifa.

            Neste caso, a prestação do serviço é adequada, pois abre um leque de opções ao consumidor, de aderir a este ou aquele plano ofertado pela empresa de telefonia, com as vantagens e desvantagens de cada um.

            Aqui, cabe ao usuário escolher qual a modalidade de prestação de serviços que melhor atende às suas necessidades, com a opção de escolher determinado plano pré-pago, em que não há cobrança de tarifa básica.

            Portanto, inexiste ilegalidade a ser combatida, vez que os serviços estão sendo prestados de acordo com as normas do Código de Defesa do Consumidor, acima mencionadas.

            Ademais, o serviço pós-pago de telefonia móvel é considerado de interesse restrito, e não de interesse coletivo.

            3. Da devolução dos valores pagos

            Noutra vertente, rejeito a pretensão de devolução dos valores pagos, porque entendo que o presente decisum somente pode ter efeitos futuros.

            É que no processo coletivo, a sentença tem cunho regulamentador, de maneira que a prática reputada ilícita passa a ser redirecionada para a consonância com a ordem jurídica estabelecida.

            Ademais, deve haver "a harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (artigo 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores", conforme dispõe o artigo 4º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor.

            Extreme de dúvidas que a determinação de devolução dos valores já pagos pela tarifa básica, configuraria fato novo desestabilizador do desenvolvimento econômico e tecnológico das empresas de telefonia fixa.

            Ademais, a devolução, a meu ver, somente seria possível pela cobrança indevida, contudo, entendo que esta passa a ser indevida a partir da decretação da ilegalidade da prática, até então suportada no meio jurídico, assim escapa à disposição do parágrafo único do artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor.

            Noutro vértice, comungo o entendimento de que é inaplicável ao caso a aplicação da teoria do defeito do serviço, pois tal prática descrita no art. 27, do Código de Defesa do Consumidor, implica em reparação de danos ocasionados pela prestação defeituosa do serviço, e o início da contagem do prazo se inicia pelo conhecimento do dano e da autoria, pontos improváveis no caso em análise.

            4. Da divulgação do julgado

            Defiro o pedido de divulgação do julgado pelos meios de comunicação, pois aliás, tudo aconselha, uma vez que o interesse é público. E se os próprios autores divulgarem a sentença e, do mesmo modo, a imprensa, o efeito propagador será bastante eficiente." [08]

            No mesmo sentido leciona RIZZATTO NUNES:

            "O legislador consumerista, quando fez referência à região, certamente estava preocupado com um dano que se alastrasse por várias cidades, e que, por não ser possível determinar um local, município ou comarca específica, preferiu que a demanda fosse ajuizada na Capital do Estado."*

            Como é o caso dos autos em que os danos alastram-se por todo o Estado de Mato Grosso Sul, conforme contratos acostados aos autos.

            Em arremate, o art. 16 da Lei de Ação Civil Pública dispõe:

            "Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova."

            Acertadamente sobre o tema MANCUSO cita JOSÉ SANTOS CARVALHO FILHO:

            "A ação civil pública, para proteger os interesses coletivos dos consumidores, terá duplo objeto, consistindo o primeiro no pedido constitutivo de invalidação da cláusula, no que toca aos contratos já celebrados, e o segundo no pedido condenatório mandamental, pelo qual o fornecedor fica obrigado a não mais utilizar a cláusula nos futuros contratos." [09]

            É a aplicação dos princípios da efetividade e economia processual, dos quais a finalidade primeira é o aproveitamento máximo da tutela jurisdicional ao maior número de indivíduos.

            E a justificação perfeita é dada por PASQUALOTTO:

            "A mediação de regras eqüitativas pode ser a solução. Como, porém, isso não ocorre espontaneamente, o Estado intervém, acenando com a bandeira da ética e da lealdade como forma de alvitrar o entendimento desejável. Visto pela ótica mais elementar de sua teleologia, o Código de Defesa do Consumidor não passa de um manual de boas maneiras oferecido aos agentes do mercado – que será observado voluntariamente ou será feito valer como lei que é."

[10]
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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

. Declarada ilegalidade da cobrança de assinatura do telefone fixo pela Brasil Telecom e GVT. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1339, 2 mar. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/jurisprudencia/16749. Acesso em: 20 abr. 2024.

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