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O PASEP das entidades controladas pelo Poder Público.

A constitucionalidade do art. 14, VI, do Decreto-Lei nº 2.052/83

Leia nesta página:

Entidade controlada pelo Poder Público interpôs recurso extraordinário, sustentando não ser obrigada ao recolhimento do PASEP, por analogia com entendimento anterior do STF referente ao PIS.

I. APRESENTAÇÃO DA CONTROVÉRSIA

1. Cuida-se de recurso extraordinário (n. 379.154) proposto pela Companhia União de Seguros Gerais em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região cuja ementa está vazada nos seguintes termos:

"TRIBUTÁRIO. PASEP.

1. Pessoa jurídica controlada pelo Poder Público, de acordo com o art. 14, VI, do Decreto-Lei n. 2.052/83, é contribuinte do PASEP.

2. O Decreto-Lei 2.052/83 não é inconstitucional"

(Apelação Cível n. 95.04.57195-6/RS, Rel. Juíza Tânia Terezinha Cardoso Escobar).

2. A questão constitucional posta no aludido recurso extraordinário, interposto com esteio no art. 102, III, "a", da Constituição de 1988, é a validade – ou invalidade – do inciso VI do art. 14 do Decreto-Lei n. 2.052, de 03.08.1983, em face do inciso II do art. 55 da Constituição de 1967 (Emendas Constitucionais ns. 1/1969 e 8/1977).

3. O relator (Ministro Carlos Velloso) votou pela decretação de inconstitucionalidade do aludido inciso VI do art. 14 do DL n. 2.052/83 em face dos mencionados dispositivos da Constituição de 1967, a despeito de seu entendimento pessoal pela constitucionalidade dessa norma inquinada. Acompanharam o voto do Relator os Ministros Eros Grau, Joaquim Barbosa e Carlos Britto. Pediu vista dos autos o Ministro Gilmar Mendes. O julgamento encontra-se suspenso por força desse pedido de vista.

4. Em seu voto, o Ministro Carlos Velloso estriba-se no precedente do STF no RE n. 148.754 (Rel. originário Carlos Velloso; Redator para o acórdão Ministro Francisco Rezek; J. 24.06.1993; DJ 04.03.1994) no qual a Corte decretou a inconstitucionalidade dos Decretos-Lei ns. 2.445 e 2.449, ambos de 1988, em face do art. 55 da Constituição de 1967/69. A ementa desse acórdão tem o subseqüente conteúdo:

"CONSTITUCIONAL. ART. 55-II DA CARTA ANTERIOR. CONSTRIBUIÇÃO PARA O PIS. DECRETOS-LEIS 2.445 E 2.449, DE 1988. INCONSTITUCIONALIDADE.

I – Contribuição para o PIS: sua estraneidade ao domínio dos tributos e mesmo àquele, mais largo, das finanças públicas. Entendimento, pelo Supremo Tribunal Federal, da EC n. 8/77 (RTJ 120/1190).

II – Trato por meio de decreto-lei: impossibilidade ante a reserva qualificada das matérias que autorizavam a utilização desse instrumento normativo (art. 55 da Constituição de 1969).

Inconstitucionalidade dos Decretos-leis 2.445 e 2.449, de 1988, que pretenderam alterar a sistemática da contribuição para o PIS."

5. O Ministro Carlos Velloso ressalva o seu entendimento pessoal no sentido da constitucionalidade do inciso VI do art. 14 do DL 2.052/83, mas se verga ao recordado precedente (RE 148.754), onde restou vencido, na honrosa companhia do Ministro Ilmar Galvão.

6. Para o Ministro Velloso, esse aludido precedente serve de parâmetro para o julgamento deste RE 379.154, que tem como objeto o PASEP – Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, instituído pela Lei Complementar n. 8, de 03.12.1970.

7. Com as vênias de estilo, nada obstante as similitudes entre o PIS e o PASEP, o precedente do RE 148.754 (PIS – DDLL ns. 2.445 e 2.449) não se aplica ao recurso extraordinário objeto de exame.


II. A GÊNESE LEGISLATIVA DO PIS E DO PASEP

8. O PIS – Programa Integração Social foi criado pela Lei Complementar n. 7, de 7 de setembro de 1970, destinado a promover a integração social do empregado na vida e no desenvolvimento da empresa. Os contribuintes do PIS, nos termos da referida LC 7/70, eram as pessoas jurídicas de direito privado, salvante as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

9. O PASEP – Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público foi criado pela Lei Complementar n. 8, de 3 de dezembro de 1970. Os contribuintes do PASEP, nos termos da referida LC 8/70, eram as pessoas jurídicas de direito público, inclusive as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

10. Eis, de início, uma diferença fundamental entre o PIS e o PASEP: os sujeitos passivos. Do PIS as pessoas jurídicas de direito privado. Do PASEP as entidades componentes da administração pública direta e indireta.

11. Por conseqüência, se os contribuintes do PIS eram as pessoas jurídicas de direito privado, os valores repassados ao programa tinham origem privada. Nessa linha, em sendo as entidades da administração pública (direta e indireta) as contribuintes do PASEP, forçosamente, os valores repassados ao programa tinham origem pública.

12. Eis, portanto, outra diferença fundamental: a natureza das verbas financiadoras dos aludidos programas: privada, no caso do PIS, e pública, no caso do PASEP.


III. O JULGAMENTO DO RE 148.754: PIS - DDLL 2.445 e 2.449

13. O Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucionais os DDLL ns. 2.445 e 2.449, ambos de 1988, forte na tese de que à época de suas edições, o PIS, em face da Emenda Constitucional n. 8, de 14.04.1977, perdeu o caráter tributário. E, por conseqüência, não tinha a natureza de receita pública nem estava contido dentro das chamadas finanças públicas.


IV. O PASEP E O DL 2.052/83

14. O Decreto-Lei n. 2.052/83 se encarta nas hipóteses de edição do mencionado provimento normativo a partir de seu enunciado capitular, contido no art. 1º, e nos arts. 2º, 6º e 7º:

"Art. 1º. Os valores das contribuições para o Fundo de Participação PIS-PASEP, criado pela Lei Complementar nº 26, de 11 de setembro de 1975, destinadas à execução do Programa de Integração Social - PIS e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PASEP, instituídos pelas Leis Complementares nºs 7 e 8, de 7 de setembro e 3 de dezembro de 1970, respectivamente, quando não recolhidos nos prazos fixados, serão cobrados pela União com os seguintes acréscimos: (...)"

Art 2º. Observada a legislação específica, as receitas mencionadas no art. 1º do presente Decreto-lei serão arrecadadas pelo Banco do Brasil S.A., pela Caixa Econômica Federal e pelos agentes credenciados, para crédito do Fundo de Participação PIS-PASEP, e repassadas ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social para aplicação.

Parágrafo único - O previsto na parte final do caput não se aplica ao encargo legal de cobrança da Dívida Ativa, referido no item IV do art. 1º, cujo produto será integralmente recolhido ao Tesouro Nacional, como receita não vinculada da União.

Art 6º. Compete à Secretaria da Receita Federal a fiscalização do recolhimento das contribuições e seus acréscimos para o PIS e o PASEP.

Parágrafo único. A Secretaria da Receita Federal poderá celebrar convênios com outros órgãos e entidades para a execução da fiscalização de que trata este artigo, inclusive quanto aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e aos Territórios, e a suas entidades da administração indireta e fundações, observadas as disposições legais pertinentes e a existência de dotação orçamentária própria.

Art 7º. O órgão fiscalizador enviará às Procuradorias da Fazenda Nacional os demonstrativos de débitos relativos às contribuições e seus acréscimos de que trata este Decreto-lei, acompanhados de prova de declaração, para fins de apuração, inscrição e cobrança da Dívida Ativa no interesse do PIS ou do PASEP, conforme o caso, observada a legislação específica.

Parágrafo único - A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional poderá celebrar convênios com outros órgãos ou entidades para execução do processo de apuração, inscrição e cobrança da Dívida Ativa de que trata este artigo, observadas as disposições legais pertinentes e a existência de dotação orçamentária própria.

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15. Percebe-se, claramente, que o referido DL 2.052/83 cuidou de tema atinente às finanças públicas. Por essa razão, enquadrava-se plenamente na hipótese constitucional do inciso II do art. 55 da Constituição de 1967/69.

16. Nessa senda, o precedente do RE 148.754 não se aplica ao presente caso, pois este, diferentemente daquele, cuida de matéria relacionada às finanças públicas.

17. Se isso não bastasse, tenha-se, mais uma vez, que as receitas oriundas das entidades da administração indireta que alimentam o PASEP têm natureza pública. Isso, por si só, demonstra a diferença entre esses dois aludidos programas sociais (o PIS e o PASEP).


V. A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 14, VI, DL 2.052/83

18. Eis o referido artigo 14, itens:

Art 14. São participantes contribuintes do PASEP:

I - a União, os Estados, o Distrito Federal, os Territórios e Municípios;

II - as autarquias em geral, inclusive quaisquer entidades criadas por lei federal com atribuições de fiscalização do exercício de profissões liberais;

III - as empresas públicas e suas subsidiárias;

IV - as sociedades de economia mista e suas subsidiárias;

V - as fundações instituídas, mantidas ou supervisionadas pelo Poder Público;

VI - quaisquer outras entidades controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público.

19. O referido inciso VI do art. 14 do DL 2.052/83 é plenamente válido em face do ordenamento constitucional decaído. Com efeito, o mencionado diploma legislativo cuidou de matéria relacionada às finanças públicas, conforme se demonstrou, e o PASEP era financiado por verbas essencialmente públicas, porquanto originárias das entidades da administração pública direta e indireta.

20. O aludido artigo 14 dispôs acerca dos contribuintes do PASEP no mesmo sentido estabelecido pela LC 8/70 (entidades da administração pública direta e indireta).

21. O inciso VI desse artigo 14, seguindo essa linhagem legislativa, explicitou que quaisquer outras entidades controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público seriam contribuintes do PASEP.

22. O combatido inciso VI, em verdade, deu eficácia normativa à Constituição de 1967/69 e à Lei Complementar n. 8/70, porquanto apanhou todas as entidades da administração pública direta e indireta como financiadora do PASEP, em conformidade com a finalidade do sistema jurídico, pois fazem parte da administração pública indireta as entidades controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público.

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Sobre o autor
Luís Carlos Martins Alves Jr.

Piauiense de Campo Maior; bacharel em Direito, Universidade Federal do Piauí - UFPI; Orador da Turma "Sexagenária" - Prof. Antônio Martins Filho; doutor em Direito Constitucional, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; procurador da Fazenda Nacional; e procurador-geral da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA. Exerceu as seguintes funções públicas: assessor-técnico da procuradora-geral do Estado de Minas Gerais; advogado-geral da União adjunto; assessor especial da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência da República; chefe-de-gabinete do ministro de Estado dos Direitos Humanos; secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; e subchefe-adjunto de Assuntos Parlamentares da Presidência da República. Na iniciativa privada foi advogado-chefe do escritório de Brasília da firma Gaia, Silva, Rolim & Associados – Advocacia e Consultoria Jurídica e consultor jurídico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. No plano acadêmico, foi professor de direito constitucional do curso de Administração Pública da Escola de Governo do Estado de Minas Gerais na Fundação João Pinheiro e dos cursos de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, da Universidade Católica de Brasília - UCB do Instituto de Ensino Superior de Brasília - IESB, do Centro Universitário de Anápolis - UNIEVANGÉLICA, do Centro Universitário de Brasília - CEUB e do Centro Universitário do Distrito Federal - UDF. É autor dos livros "O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras", "Memória Jurisprudencial - Ministro Evandro Lins", "Direitos Constitucionais Fundamentais", "Direito Constitucional Fazendário", "Constituição, Política & Retórica"; "Tributo, Direito & Retórica"; e "Lições de Direito Constitucional".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES JR., Luís Carlos Martins. O PASEP das entidades controladas pelo Poder Público.: A constitucionalidade do art. 14, VI, do Decreto-Lei nº 2.052/83. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1600, 18 nov. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/16816. Acesso em: 5 nov. 2024.

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