Parecer sobre a redução da maioridade penal

Leia nesta página:

Parecer técnico afim de esclarecer pontos acerca da maioridade penal no Brasil.

 

Ementa: Redução. Maioridade. Adolescente. Punição. Proposta. Criminalidade.

Trata-se de consulta formulada por João Barbosa acerca da redução da maioridade penal.

Informo ainda a consulente que a Proposta de Emenda Constitucional propõe alterar os artigos 129 e 228 da Constituição Federal, acrescentando um parágrafo que prevê a possibilidade de desconsiderar da inimputabilidade penal de maiores de 16 anos e menores de 18 anos.

É o relatório.

Passo a opinar: Ao fazer uma análise intrínseca das questões jurídicas técnicas, é notório evidenciar que a proposta de redução da maioridade penal é inconstitucional, pois afronta a Constituição Federal Brasileira que reconhece prioridade e proteção especial a crianças e adolescentes, além de ir contra a Doutrina da Proteção Integral do Direito Brasileiro que exige que os direitos humanos de crianças e adolescentes sejam respeitados e garantidos de forma integral e integrado às políticas de natureza universal, protetiva e socioeducativa, contra a Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente da Organização das Nações Unidas (ONU) e a Declaração Internacional dos Direitos da Criança compromissos assinados pelo Brasil, contra o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) de princípios administrativos, políticos e pedagógicos que orientam os programas de medidas socioeducativas e por fim, contra aos parâmetros internacionais de leis especiais para os casos que envolvem pessoas abaixo dos dezoito anos autores de infrações penais.

Um dos inúmeros argumentos a favor da maioridade penal é que o adolescente entre 16 e 17 anos já possui um discernimento suficiente para responder pelos seus atos, pois pelo fato do adolescente já ter o direito de votar em seus eleitores é passível a aceitação de acreditarem que o jovem infrator possua maturidade suficiente para responder pelos seus crimes. Além da grande influência de muitos países desenvolvidos que adotam maioridade penal abaixo de 18 anos, e também por entender que a impunidade assegura uma maior liberdade para o adolescente cometer crimes.

Entretanto, é necessário enfatizar que a redução da maioridade penal torna-se ineficaz no plano social, pois vai inserir o menor na vida criminal muito cedo e propiciar o aumento das chances de reincidência, por conta da não reinserção do jovem no meio social. Constata-se que essa possibilidade de reincidência nas penitenciárias é de 70% enquanto no sistema socioeducativo estão abaixo de 20%, fazendo com que 7 entre 10 desses presos acabem  saindo com o nível de periculosidade muito maior.

É possível notar que esses menores infratores pertencem a uma linha de pessoas com condições sociais vulneráveis, onde negros, pobres e moradores de periferias de grandes cidades do Brasil, acabam sendo afetados por essa redução. O adolescente marginalizado não surge ao acaso, ele é fruto de um estado de injustiça social que gera e agrava a pobreza em que sobrevive grande parte da população, pois não possui a capacidade para efetivar os direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal. Além disto, o sistema prisional Brasileiro não possui mais estrutura física para comportar mais pessoas, ele está em um nível de superlotação e por isso, não tem cumprido sua função social de controle e sim agravando cada vez mais a criminalidade.

Faz-se necessário pontuar que no Brasil, já existe a punição para o menor infrator que é executado pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) que tem como objetivo ajudar o jovem a  recomeçar e a prepará-lo para uma vida adulta de acordo com o socialmente estabelecido. Entretanto, devido a uma má gestão governamental, essas medidas educativas previstas não são efetivadas de fato, são elas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação, que devem ser aplicadas de acordo com a capacidade de cumpri-las, as circunstâncias do fato e a gravidade da infração.

Para o advogado Ariel de Castro Alves, reduzir a maioridade penal seria como “revogar” o ECA em relação à proteção de adolescentes entre 16 e 17 anos. Esse ponto é de extrema relevância, pois como já fora enfatizado anteriormente, o menor que realiza uma infração penal não tem nenhuma estrutura familiar e possui condições sociais vulneráveis, portanto, é o dever do Estado proteger essas crianças visto que o ECA é bem projetado, apenas é preciso cumprir materialmente as leis existentes, ou seja, tirá-las do papel. Como bem avalia Edson Sêda um dos redatores do texto do ECA, “Temos uma série de princípios que não se aplicam, por exemplo, os programas socioeducativos. Há 25 anos que está faltando competência técnica e gente especializada nesse assunto. Então, não é pra mudar a lei, mais a realidade.”

O problema do crescimento da criminalidade não é culpa da criança ou do adolescente e sim de uma grande irresponsabilidade do Estado a fim de garantir direitos fundamentais que são assegurados nos artigos 5º e 6º da Constituição Federal, como educação, saúde, moradia e outros. A educação é fundamental para qualquer indivíduo se tornar um cidadão, mas a realidade é que no Brasil muitos jovens pobres são excluídos deste processo, puni-los com o encarceramento é tirar a chance de se tornarem cidadãos conscientes de direitos e deveres, o Estado deve ter consciência que educar é melhor e mais eficiente do que punir.

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Dados do UNICEF revelam a experiência mal sucedida dos Estados Unidos da América, que assinou a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aplicou em seus adolescentes, penas previstas para os adultos. Os jovens que cumpriram pena em penitenciárias voltaram a delinquir e de forma mais violenta, o resultado concreto para a sociedade foi o agravamento da violência. Cerca de 54 países que reduziram a maioridade penal não houve nenhum registro de redução latente da violência.

A UNICEF expressa sua posição contrária à redução da idade penal, assim como a qualquer alteração desta natureza. Acredita que ela representa um enorme retrocesso no atua estágio de defesa, promoção e garantia dos direitos da criança e do adolescente no Brasil. A Organização dos Estados Americanos (OEA) comprovou que há mais jovens vítimas da criminalidade do que agentes dela.

Ao analisar o perfil do menor infrator, verifica-se que os delitos graves são em sua maioria contra o patrimônio, o que não justifica a privação de liberdade desse jovem. Vale lembrar que dificilmente um adulto cumpre pena em se tratando de danos contra o patrimônio. De acordo com Carmen Silveira de Oliveira:

A redução da maioridade penal não é uma saída para resolver o problema da violência juvenil. A gente entende que o medo da população em relação à sua própria segurança urbana exista, mas é notório e os números confirmam isso que os delitos cometidos por adolescentes correspondem a menos de 10% do total de crimes cometidos no País e não constituem o foco de criminalidade no Brasil.

Assim sendo, é imprescindível que o Estado possua uma estrutura de segurança pública que opere estreitamente dentro da lei investindo na ampliação, qualificação e melhor remuneração de seus recursos humanos, fortalecendo suas ações de inteligência, gerando as possibilidades de aplicação da lei.

CONCLUSÃO

Em face do exposto, opino que com a redução a maioridade penal não vai haver uma sensível diminuição da criminalidade no Brasil e sim um aumento significativo na probabilidade  do envolvimento do menor com o crime. Reduzir a maioridade é transferir o problema, pois não adianta só tornar as leis mais rígidas se o próprio Estado não as cumpre. A violência juvenil não será solucionada com a repressão e punição e sim com práticas políticas públicas a fim de reeducar e reinserir esses jovens na sociedade é necessário que o Estatuto da Criança e do Adolescente faça cumprir sua real função social, efetivando as medidas socioeducativas previstas em lei, visto que, reduzir não trará nenhum benefício, a não ser um retrocesso no campo dos direitos.

Local e data

NOME DO ADVOGADO

Nº DA OAB

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Sobre as autoras
Taiana Levinne Carneiro Cordeiro

Advogada criminalista, professora de penal e processo penal da faculdade de Ilhéus/BA, professora de cursinho preparatório para concurso, especialista em processo penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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