Remuneração de servidores e convenção coletiva de trabalho

29/04/2017 às 08:23

Resumo:


  • O parecer jurídico analisa a possibilidade de adequação salarial de uma servidora com base em Convenção Coletiva de Trabalho.

  • O princípio da legalidade é destacado como base para a decisão, apontando que a remuneração dos servidores públicos só pode ser alterada por lei específica.

  • O parecer conclui que a Convenção Coletiva não pode ser utilizada para aumentos salariais, recomendando que a decisão final seja tomada pelo Chefe do Executivo Municipal.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Trata-se de parecer no sentido de que o município é regido por estatuto e não pode haver aumento de salário utilizando como base uma convenção coletiva de trabalho, pois a iniciativa tem que ser do chefe do executivo por meio de lei específica enviada à câmara.

PARECER JURÍDICO

Processo adm: nº 0404-026/2017.

Assunto: Possibilidade ou não de adequação salarial com base em Convenção Coletiva de Trabalho.

Interessado: Secretário Municipal de Saúde e Maria Amélia Lima dos Santos Tenório.

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE OU NÃO DE ADEQUAÇÃO SALARIAL DO FARMACÊUTICO EM RAZÃO DE CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO. Arts. 37, X e 69, §1º, II da CF. Súmula 679 do STF. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. REGIME JURÍDICO ESTATUTÁRIO (Lei nº 345/92). PARECER OPINANDO PELA NÃO POSSIBILIDADE DE ADEQUAÇÃO SALARIAL (AUMENTO) POR MEIO DE CONVENÇÃO COLETIVA.


I - RELATÓRIO

Foi enviado, a esta Consultoria, requerimento da Secretaria Municipal de Saúde, no sentido de que fosse realizada a adequação salarial da servidora contratada como farmacêutica, utilizando como base a Convenção Coletiva de Trabalho 2016/2017.

A secretaria anexou ao processo cópia da Convenção e contrato de trabalho.

É o relatório.


II – DA FUNDAMENTAÇÃO

O Município segue o princípio da legalidade, ou seja, só pode realizar aquilo que está previsto em lei.

No Direito administrativo, esse princípio determina que a Administração Pública, em qualquer atividade, está estritamente vinculada à lei. Assim, se não houver previsão legal, nada pode ser feito. No princípio genérico, a pessoa pode fazer de tudo, exceto o que a lei proíbe. No princípio específico, a Administração Pública só pode fazer o que a lei autoriza, estando engessada, na ausência de tal previsão. Seus atos têm que estar sempre pautados na legislação.

Segundo o Professor Alexandre Mazza, em sua obra Manual de direito administrativo, 2013, pág 75:

“Inerente ao Estado de Direito, o princípio da legalidade representa a subordinação da Administração Pública à vontade popular. O exercício da função administrativa não pode ser pautado pela vontade da Administração ou dos agentes públicos, mas deve obrigatoriamente respeitar a vontade da lei”.

De acordo com o magistério de Hely Lopes Meirelles, obra Direito administrativo brasileiro, p. 87, com destaques nossos: “As leis administrativas são, normalmente, de ordem pública e seus preceitos não podem ser descumpridos, nem mesmo por acordo ou vontade conjunta de seus aplicadores e destinatários, uma vez que contêm verdadeiros poderes-deveres, irrelegáveis pelos agentes públicos”.

Também relatando sobre o mesmo princípio, a Professora Flávia Bahia Martins, em sua obra: Direito Constitucional, 2011, editora Ímpetus, 2ª edição, Niteroi-RJ, faz uma distinção entre a aplicação da legalidade para os particulares e para o Poder Público, vejamos:

“Para o particular, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo, senão em virtude de lei (aqui em sentido amplo ou material, referindo-se a qualquer espécie normative), diante de sua autonomia da vontade. Já quanto ao administrador, deverá ser adotado o princípio da legalidade em sentido estrito, pois só é possível fazer o que a lei autoriza ou determina”.

Nesse mesmo sentido, podemos analisar a doutrina de Marçal Justen Filho[1] quando preconiza que:

“O princípio da legalidade está abrangido na concepção de democracia republican. Significa a supremacia da lei (expressão que abrange a Constituição), de modo que a atividade administrative encontra na lei seu fundamento e seu limited validade”.

Além disso, o Professor Matheus Carvalho[2] é mais firme em sua posição quando afirma que “Não havendo previsão legal, está proibida a atuação do ente público e qualquer conduta praticada ao alvedrio do texto legal será considerada ilegítima”.

Ao analisar o caso concreto, vê-se que a requerente é ocupante do cargo de farmacêutica e que, Segundo Secretário Municipal de Saúde, deveria ter seus vencimentos adequados ao que preconiza a Convenção Coletiva de Trabalho 2016/2017.

Todavia, como se sabe, os servidores municipais são regidos por seu estatuto, a lei nº 345/92, ou seja, a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) não é utilizada para os agentes públicos (servidores) regidos por estatuto próprio.

Ademais, caso o Município queira majorar os vencimentos de seus servidores públicos, deverá encaminhar projeto de lei à Câmara Municipal nesse sentido, haja vista que, segundo o artigo 37, X da CF:

a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices”.

Para corroborar o exposto acima, urge trazer à baila o posicionamento dos doutrinadores Dirley e Novelino[3]:

“cumpre sublinhar que a fixação e a alteração da remuneração e do subsídio só podem ocorrer por meio de lei formal que disponha especificamente sobre isso. Nesse sentido, e conforme recente Súmula do STF nº 679, “A fixação de vencimento dos servidores públicos não pode ser objeto de convenção coletiva”.

Ainda em análise do citado texto dos doutores, vimos que o STF proíbe por meio de sua Súmula de nº 679 a fixação de vencimentos dos servidores públicos por meio de convenção coletiva.

Além da Súmula referendada, vejamos decisão da Suprema Corte nesse sentido:

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Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 57 DA LEI COMPLEMENTAR N. 4 DO ESTADO DO MATO GROSSO. SERVIDORES PÚBLICOS. ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVAS DE TRABALHO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 61 , § 1º , II , DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. ARTIGO 69 , "CAPUT" E §§, DA LEI COMPLEMENTAR N. 4 . FIXAÇÃO DE DATA PARA O PAGAMENTO DE VENCIMENTOS. CORREÇÃO MONETÁRIA EM CASO DE ATRASO. CONSTITUCIONALIDADE. 1. A celebração de convenções e acordos coletivos de trabalho constitui direito reservado exclusivamente aos trabalhadores da iniciativa privada. A negociação coletiva demanda a existência de partes detentoras de ampla autonomia negocial, o que não se realiza no plano da relação estatutária. 2. A Administração Pública é vinculada pelo princípio da legalidade. A atribuição de vantagens aos servidores somente pode ser concedida a partir de projeto de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, consoante dispõe o artigo 61 , § 1º , inciso II , alíneas a e c , da Constituição do Brasil, desde que supervenientemente aprovado pelo Poder Legislativo. Precedentes. 3. A fixação de data para o pagamento dos vencimentos dos servidores estaduais e a previsão de correção monetária em caso de atraso não constituem aumento de remuneração ou concessão de vantagem. Pedido julgado parcialmente procedente para declarar inconstitucional a expressão "em acordos coletivos ou em convenções de trabalho que venham a ser celebrados", contida na parte final do artigo 57, da Lei Complementar n. 4, de 15 de outubro de 1990, do Estado do Mato Grosso. Data de publicação: 05/05/2006. STF - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE ADI 559 MT (STF)

Caso seja decidido por possíveis aumentos salariais, a iniciativa caberá ao Chefe do Poder executivo como previsto no artigo 61, §1º, II, da CF, vejamos:

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;

II - disponham sobre:

a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

(...)

Onde se lê Presidente da República, entenda-se Chefe do Poder Executivo que, no presente caso, trata-se do Prefeito Municipal.


CONCLUSÃO

Portanto, como se viu de forma clara, Convenção Coletiva de Trabalho não pode servir como base para aumento de remuneração de servidores. Essa iniciativa cabe ao Chefe do Executivo municipal por meio de lei específica, razão pela qual OPINO pelo indeferimento do pedido do requerente, uma vez que a Administração Pública é pautada na obrigação de seguir e obedecer o princípio constitucional da legalidade, ou seja, só faz aquilo que está previsto em lei.

Desta feita, por ser este parecer meramente de caráter OPINATIVO, remeta-se o processo para apreciação do Chefe do Executivo, sendo este competente para decidir quanto a adequação ou não da remuneração da servidora, ocupante do cargo de farmacêutica, tomando como base Convenção Coletiva de Trabalho. 

É o parecer. S.M.J

Água Branca-AL, 28 de abril de 2017.

WAGNER TINÔ DE CARVALHO

Procurador do Município

Portaria nᵒ. 251/13


Notas

[1] JUSTEN FILHO, Marçal – Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Fórum, 4ª ed.2009

[2] CARVALHO, Matheus – Manual de Direito Administrativo. Salvador: Juspodivm, 3ª edição. 2016

[3] CUNHA JÚNIOR, Dirley. NOVELINO, Marcelo – Constituição Federal para Concursos. Salvador: Juspodivm, 2ª edição. 2011

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Sobre o autor
Wagner Tinô

Procurador Municipal efetivo na cidade de Água Branca-AL; especialista em Direito Público pela Universidade Anhanguera - UNIDERP. Membro da Associação dos Procuradores Municipais de Alagoas - APROMAL;

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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