Fui questionado o que segue abaixo. Aproveito para compartilhar meu pensamento sobre o assunto.
- Os descontos salariais efetuados pelo empregador, com a autorização prévia e por escrito do empregado, para ser integrado em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, de seguro, de previdência privada, ou de entidade cooperativa, cultural ou recreativo associativa de seus trabalhadores, em seu benefício e de seus dependentes, afrontam o disposto no art. 462 da CLT?
O sistema jurídico trabalhista vigente prevê a proteção ao empregador, sendo certo que dos inúmeros direitos que goza, a proteção ao salário possui papel essencial, pois acaso não houve a garantia da intangibilidade salarial, o empregado veria todo o esforço do mês escoando através de descontos e mais desconto em seu salário, assim como ainda ocorre com o truck system ou situações análogas a escravidão.
Assim, prevê o art. 462 da CLT que: “Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositvos de lei ou de contrato coletivo.”, sendo possível o desconto apenas em casos legais (ex.: pensão alimentícia) e por contrato coletivo (Ex.: contribuição sindical assistencial).
No entanto, no dia a dia da relação empregado e empregador sobreveio a discussão quanto a possibilidade de desconto ou não de outras verbas, tais como: (i) planos de assistência médica e odontológica; (ii) médico hospitalar; (iii) seguro; (iv) previdência privada; (v) cooperativa; (vi) cultural ou recreativo associativo; pois alguns patrões concediam tais benefícios em busca de uma melhor condição de negociação a seus empregados, o que resulta numa vida social mais bem estruturada.
Sobreveio a discussão quanto a legalidade de tais descontos versus a vedação da intangibilidade prevista no art. 462 da CLT, que resultou na Súmula 342 do TST, que diz:
Súmula nº 342 do TST
DESCONTOS SALARIAIS. ART. 462 DA CLT (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
Descontos salariais efetuados pelo empregador, com a autorização prévia e por escrito do empregado, para ser integrado em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, de seguro, de previdência privada, ou de entidade cooperativa, cultural ou recreativo associativa de seus trabalhadores, em seu benefício e de seus dependentes, não afrontam o disposto no art. 462 da CLT, salvo se ficar demonstrada a existência de coação ou de outro defeito que vicie o ato jurídico.
Portanto, o entendimento sumulado do C. TST é de que tais descontos não afrontam a intangibilidade prevista no art. 462 da CLT, mantendo-se a garantia de proteção ao salário.
Facilitando a compreensão de tal permissivo jurisprudencial, podemos citar que os precedentes que embasaram a emissão da Súmula apontavam em síntese que (i) concessões ligadas a finalidades sociais; (ii) o empregado pode espontaneamente se filiar ou gozar dos benefícios apontados; (iii) o próprio empregado gozaria de condições mais benéficas do que as do mercado comum; o que garantiria a mesma proteção apontada no art. 432 da CLT.
Não obstante a Súmula deve o aplicador da norma avaliar se houve ou não a existência de coação ou de outro defeito que vicie o ato jurídico, pois a garantia de proteção ao salário não cessa durante toda a vigência do contrato, perquirindo mês a mês sua aplicação e observância.
Isto posto, a OJ n.º 160 da SDI-I do TST apontou que a prova da demonstração do vício de vontade deve ser concreta e não presumida, afastando assim a coação pela subordinação:
160. DESCONTOS SALARIAIS. AUTORIZAÇÃO NO ATO DA ADMISSÃO. VALIDADE (inserida em 26.03.1999)
É inválida a presunção de vício de consentimento resultante do fato de ter o empregado anuído expressamente com descontos salariais na oportunidade da admissão. É de se exigir demonstração concreta do vício de vontade.
Porém, como dito linhas acima a garantia não é declinável ou derrogável, estando sempre presente, assim a doutrina ao exarar a orientação jurisprudencial acima exclui da presunção de vício, em especial, o caso de funcionário que é contratado e no ato da contratação assina documentos que permitem o desconto de plano de saúde, pela ausência de presunção de vício.
Com a devida vênia, há que se perquirir mais a fundo sobre tal possibilidade, pois a garantia da intangibilidade do salário não se esgota facilmente, por exemplo, se aplicaria o mesmo entendimento aos casos em que o empregado no ato de contratação anui com o desconto salarial pela adesão a seguro de vida? E se o empregador foi instituição financeira que vende o seguro de vida? Não teria a subordinação e o próprio objetivo de lucro na venda força suficiente de viciar o ato?
Por fim, gozo da particular opinião de que a Súmula n.º 342 goza de presunção relativa, a qual mesmo combinada com a OJ-160-SDI-I não exclui a necessária análise do vício de consentimento, que pode não gozar de presunção, mas deverá inquinar o julgador a sua necessária valoração.