IV- DAS INCONSTITUCIONALIDADES:
Na seara da abordagem das inconstitucionalidades geradas pela aplicação da Lei 9.250/95, sobressai a vulneração indiscutível de princípios constitucionais, necessários e suficientes para caracterizar o abuso do fisco em face dos rendimentos dos Impetrantes, a começar pelo desrespeito ao princípio da moralidade supra exposto, além de outros, pois senão vejamos.
Inicialmente, é oportuno mencionar que Princípio da Isonomia agasalhado na Carta Magna é, sem dúvida, o sustentáculo de todos os direitos e garantias individuais, constituindo-se em pilar mestre do respeito ao cidadão. RUI BARBOSA já definia como sendo "quinhoar desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam".
A este respeito, ensina AMÉRICO LACOMBE, em seu livro Princípios Constitucionais Tributários, Malheiros, 1996, pág. 50:
"...A igualdade deixou de ser instrumento das garantias para ser a causa de direitos e garantias. Hoje todos têm direito à vida, à liberdade, à segurança porque são iguais. Se assim não fosse, a afirmação da igualdade não viria no caput do artigo 5º, como primeira afirmação a inspirar todos os direitos e deveres individuais e coletivos. A conseqüência é que a isonomia está presente em todos os incisos do artigo 5º, que existem para implementá-la, e, assim sendo, ela não pode ser esquecida na interpretação de nenhum deles."
A Carta de 1988, traz no parágrafo 1º do artigo 145, "in verbis":
"Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal (grifo nosso) e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte."
O caráter pessoal do imposto é eminente e não pode ser postergado, e este vem sendo sistematicamente desrespeitado, na medida que em não se promovendo a atualização dos valores das tabelas em face da inflação, desrespeita-se a capacidade contributiva do contribuinte, passando-se a tributar somente valores nominais de rendimentos, independentemente de riqueza nova, por assim dizer acréscimo patrimonial efetivo por parte do contribuinte.
A esta altura, vale a menção ao professor JOSÉ ARTUR LIMA GONÇALVES (Pressupostos Constitucionais, Malheiros Editores, 1997, pág.180):
"Para que haja renda, deve haver um acréscimo patrimonial, aqui entendido como incremento (material ou imaterial, representado por qualquer espécie de direitos ou bem de qualquer natureza), sendo o que importa é o valor em moeda do objeto desses direitos, ao conjunto líquido de direitos de um dado sujeito."
Não é também despiciendo, trazer à colação a posição de LUCIANO AMARO, "in" Direito Tributário Brasileiro, Saraiva, 1997, pág.136:
"...a adequação do imposto à capacidade econômica (grifo nosso) do contribuinte encontra, ainda, expressão no princípio da proporcionalidade, em face do qual o gravame fiscal deve ser diretamente proporcional à riqueza evidenciada em cada situação impositiva. A mera idéia de proporcionalidade, porém, expressa apenas uma relação matemática entre o crescimento da base de cálculo e o do imposto (se a base de cálculo dobra, o imposto também dobra). A capacidade contributiva reclama mais do que isso, pois exige que se afira a justiça da incidência em cada situação isoladamente considerada."
Um outro aspecto a considerar, e não menos relevante, é a nítida ofensa à proibição constitucional de utilização de tributo com efeito de confisco (art.150, IV, da CF).
Ao adotar-se o "congelamento" dos valores das tabelas do Imposto de Renda, a Lei nº 9.250/95, afrontou o art.150, IV da Constituição Federal, que prevê:
"art.150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas aos contribuintes, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
IV- utilizar tributo com efeito de confisco."
A inconstitucionalidade da instituição dessa sistemática é corolário inevitável a que se chega por qualquer caminho que se trilhe para tentar explicar a não atualização de tais valores.
Numa análise apressada, sem a necessária percuciência dir-se-ia, em defesa do não confisco, que tal não ocorreria porque a cobrança não destrói a fonte dos recursos. No entanto, felizmente, tal abordagem, neste caso não prosperaria, decerto.
Tal dispêndio no caso dos Impetrantes e não há o que negar, incidirá sobre verba alimentar, trazendo certamente prejuízo à economia familiar dos mesmos, que na verdade terão, na prática, que retirar do orçamento doméstico uma quantia para saldar uma exação indevida, prejudicando a estabilidade que se almeja na economia doméstica.
Ainda, questionando, existe algum percentual admitido que se pode apropriar por meio de exações, a partir do qual tal exação será considerada como destruidora da fonte dos recursos? Quem melhor para mensurar os danos da cobrança na economia familiar do que aqueles que sofrem a redução em suas remunerações?
Afinal, como último chamamento ao bom senso, será preciso então que o Estado se aproprie de 100% das remunerações dos Impetrantes para somente então eventuais defensores reconhecerem (ainda que de má vontade) que houve destruição da fonte dos recursos? se prosseguirmos nesta lógica desarrazoada, certamente afirmar-se-ia que é possível apropriar-se de até 99,9% da remuneração dos Impetrantes, pois até aí não haveria tal destruição, mesmo porque teria rigorosamente sobrado 00,1% para a "sobrevivência" familiar...
Pelo que vemos, a defesa do não confisco, se aqui vier a existir, não prosperará. Além disso, não é demais relembrar que por vários anos o executivo federal não promove nenhum tipo de reajuste geral nos salários dos servidores, sendo certo que a inflação neste período de mais de cinco anos e meio não foi de zero por cento.
Em conseqüência, é mais que óbvio que os salários estão defasados, porém mesmo assim é criado mais este arguto artifício a espoliar os Impetrantes, dissimulado no "congelamento" dos valores das tabelas do I.R., enquanto que os demais encargos públicos são descaradamente majorados, sob patrocínio do próprio governo federal. Disto tudo, conclui-se, utilizando-se de conhecido termo de autoria de famoso noticiarista, que "isto é uma vergonha!"
Em vista do que se expõe ressai, extreme de dúvidas, que estão sendo flagrantemente vulnerados pelo fisco, na pessoa da autoridade impetrada, vários princípios constitucionais, sendo então relevantes os fundamentos jurídicos do pedido ora elencado.
V- DA NECESSIDADE DE CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR.
A necessidade de concessão da medida liminar "inaudita altera pars", mostra-se perfeitamente clara nesta Ação, pois senão vejamos:
A aparência do bom direito:
Tal requisito se mostra presente e devidamente fundamentado, ficando muito bem delineado o direito dos IMPETRANTES, outrossim configurado como líquido e certo, em face das inconstitucionalidades elencadas. Além disso, em adição às inconstitucionalidades, conclui-se também que a norma não se reveste de moralidade, requisito especial dos atos públicos, como foi especificado no introito desta peça no item da Análise da Gênese da Lei nº 9.250/95.
Fundamentando, é direito líquido e certo, em face da existência induvidosa do direito dos IMPETRANTES em NÃO terem que arcar com a cobrança nos moldes que se observa, sem nenhum tipo de atualização dos valores em face da inflação, do que não resta margem de dúvida coerente, à vista do exposto nesta exordial, o que permite seja comprovado de imediato, é dizer, de plano.
A extensão do direito está delimitada na cobrança indevida dos percentuais do Imposto sobre a Renda dos Impetrantes. A exação ali prevista, sem nenhuma atualização em face da inflação, é a medida do direito que está sendo desrespeitado pela autoridade coatora.
O exercício do direito ora postulado, não depende de qualquer fato ou mesmo situação que seja indeterminada. O direito pode sim ser exercitado, imediatamente, mesmo porque encontra-se muito bem delineado.
O perigo da demora:
O "periculum in mora" aludido evidencia-se claramente, uma vez que o "congelamento" dos percentuais de cobrança do I.R. já surte seus nefastos efeitos. De outra parte, em não sendo condedida liminar, o ato coator continuará a ser praticado, onerando os Impetrantes, levando-os mais tarde ao injusto e tortuoso caminho da repetição do indébito (que já se mostra presente no decorrer destes anos), ainda mais em decorrência de futuro processo executório e expedição de precatório, o que levará os Impetrantes a uma espera certamente de duração imprevisível.
De outro lado, não há perigo do fisco sofrer algum prejuízo caso os Impetrantes não tenham o pedido reconhecido em Sentença definitiva (o que, aliás, nem remotamente se acredita), isto porque há meios legais de se reaver algum valor recebido indevidamente pelos Impetrantes, em face da condição de servidores públicos federais.
Desta maneira, comprovado o perigo da demora, há então que se obstar a cobrança indevida, o que somente poderá ocorrer por força de ordem judicial.
No contexto da presente situação, mostra-se imperiosa a concessão da medida liminar "inaudita altera pars", determinando-se à autoridade coatora que não pratique qualquer ato que resulte na cobrança de qualquer valor relativo ao Imposto de Renda, na forma como tem sido feita, o que é plenamente prejudicial aos Impetrantes.
VI- DO PEDIDO:
Em face de todo o exposto, é que se REQUER a Vossa Excelência, além da tramitação destes autos em segredo de justiça, que:
1)- Seja concedida a medida liminar ora pleiteada, "INAUDITA ALTERA PARS" e devidamente NOTIFICADA a autoridade coatora supra mencionada para que preste as informações, querendo, no prazo legal, além de ser determinado que a mesma providencie a cobrança do Imposto sobre a Renda dos Impetrantes, com as devidas atualizações da tabela respectiva, sob as penas da lei;
2)- Em razão da concessão da liminar que seja expedida, com urgência, a comunicação ao setor competente da Seção Judiciária do Estado de Mato Grosso, a fim de viabilizar o pronto cumprimento da ordem judicial, para tanto confeccionando-se folha de pagamento suplementar, caso necessário;
3)- Após as informações da autoridade coatora ou decorrido o prazo legal para tanto, seja colhida a manifestação do Órgão do Ministério Público Federal neste Estado;
4) Seja concedida em definitivo a segurança pleiteada, confirmando-se a liminar concedida, assim determinando-se à autoridade coatora que se abstenha, doravante, da prática de qualquer ato que repercurta na cobrança indevida do I.R.P.F. pertinente aos Impetrantes;
Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (hum mil) reais.
NESTES TERMOS,
PEDEM DEFERIMENTO
Cuiabá, 04 de agosto de 2000.