Petição Destaque dos editores

Ação civil pública contra fotossensores

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III. NULIDADE DO CONTRATO FEITO:

          C) Da contrariedade do edital à norma legal:

          Como visto anteriormente, o edital é ilegal, porque dispôs que, para comprovação da capacidade técnica, o interessado poderia apresentar "Certidão de registro e prova de quitação da empresa e de seu(s) responsável(eis) técnico(s) no CREA da região da(s) empresa(s)", quando a lei exige que o registro deva ser feito no CREA que tenha jurisdição no local que a obra ou o serviço será executado.

          Essa ilegalidade, aparentemente insignificante, gera, por si só, a nulidade do contrato, posto que a Lei n° 5.194/66, em seu artigo 15, é expresso nesse sentido.

          Eis o seu teor:

          "Art. 15 - São nulos de pleno direito os contratos referentes a qualquer ramo da Engenharia, Arquitetura e da Agronomia, inclusive a elaboração de projeto, direção ou execução de obras, quando firmados por entidade pública ou particular com pessoa física ou jurídica não legalmente habilitada a praticar a atividade nos termos desta Lei."

          Que pretende o Detran? Será que essa autarquia pensa que pode usurpar a competência do legislativo? Ou foi mera quaestio de desconhecer a lei? Em todo caso, demonstra a irresponsabilidade de seu ex-diretor-geral e o fato de que tudo arrumou para que a empresa ré não perdesse a licitação de forma alguma. Como já observado, tudo foi adredemente preparado para que o resultado da indigitada licitação fosse um só, isto é, que a vencedora fosse a Empresa ........ Ltda.

          Urge que o Judiciário fulmine de nulidade o contrato que serve unicamente para fomentar a ganância de alguns que consideram que o fim justifica os meios, invertendo os valores e acreditando que arrecadar é mais importante do que educar e prevenir acidentes.

          D) Das cláusulas contratuais ilegais que, igualmente, tornam nulo o sobredito contrato:

          Passa-se agora analisar as cláusulas contratuais da avença n° 008/97/PJU, celebrada entre o Detran e a ............, pois cláusulas obscuras e manifestamente ilegais não podem prevalecer lesando de forma escabrosa o Erário Público e ao cidadão.

          A1. Da inexistência do valor do contrato e da não-identificação dos recursos destinados a atender as despesas com a instalação e manutenção dos fotomultas:

          A cláusula quinta, que estipula o valor do contrato, diz que "o valor estimado para o presente contrato é de R$ 27,30 (vinte e sete reais e trinta centavos) preço unitário por infração consoante Nota de Empenho inicial n° 000416, por estimativa, emitida em 19.03.97." Será esse mesmo o real valor do contrato? Remetendo-se a cláusula décima terceira, referente a caução dada como garantia, que fala no montante de R$ 6.552,00 (seis mil quinhentos e cinqüenta e dois reais), correspondente a 0,01%(um centésimo por cento) "do valor estimado deste", ou seja, do contrato, chega-se a conclusão de que o valor do contrato seria de R$ 65.520.000,00 (sessenta e cinco milhões e quinhentos e vinte mil reais). Mas isso é apenas uma suposição, posto que este valor vai contra o próprio edital que prescreve, em seu item 13.1, que a garantia dada será no valor de 0,1% do contrato. Nesse caso o valor do contrato seria de R$ 655.200,00(seiscentos e cinqüenta e cinco mil e duzentos reais).

          Isso sem dizer que, em verdade, o contrato não tem valor fixo, a não ser o seu valor mínimo, que é de 150 infrações mensais por equipamento, como previsto na cláusula quinta da avença (f. 827 do IC 11/98 e f. 119 do PA 14/97) o que, em espécie representava a quantia de R$ 15.724.800,00, no ato da assinatura do contrato.

          Claro está que o valor acima descrito foi calculado em cima do número mínimo de infrações mensais e do valor unitário previsto originariamente no contrato (sem qualquer correção posterior) por cada multa aplicada, posto que o pagamento do contrato é feito mensalmente por número de multas cujo número mínimo não pode ser inferior a 150 por equipamento e cujo valor unitário é de R$ 27,30, atualizável anualmente. O cálculo foi o seguinte: R$ 27,30 por infrações X 150 multas mensais por equipamento = R$ 4.095,00 X 80 fotossensores atualmente instalados (70 em Campo Grande e 10 em Dourados) = R$ 327.600,00 X 48 meses (duração do contrato) = R$ 15.724.800,00.

          Em relação ao valor máximo, deve-se dizer que o céu é o limite, dado que o contrato não estipula valor máximo de multa. Quanto mais infrações forem cometidas tanto melhor, posto que mais dinheiro a contratada ganhará.

          Para perceber a exorbitância que poderá chegar o valor do contrato, imagine-se que cada fotossensor aplique 200 multas mensais. Nesse caso, o valor do contrato subiria para R$ 20.966.400,00. Eis o cálculo: R$ 27,30 X 200 = R$ 5.460,00 X 80 = R$ 436.800,00 X 48 = R$ 20.966.400,00.

          Imagine-se ainda a geração de 400 multas diárias por equipamento e a instalação de mais 80 equipamentos no Estado, então o valor do contrato passará de R$ 20.966.400,00 para R$ 83.865.600,00 (oitenta e três milhões, oitocentos e sessenta e cinco mil e seiscentos reais).

          Isso tudo, volta-se a frisar, sem considerar que, da contratação até a presente data, o valor a ser pago por multa à empresa ré já majorou, pelo menos, por duas vezes, isto é, em abril ou maio de 98 e abril ou maio de 1999, pelo que se conclui que o valor do contrato estará bem mais elevado do que acima se estipulou.

          Diz-se em abril ou maio porque não se sabe exatamente qual a data em que o contrato foi assinado. Esse dado não contém no contrato, o que leva a suspeita de que o mesmo tenha sido assinado mesmo antes da feitura da licitação, tamanha são as falcatruas que o envolvem.

          Diante disso tudo há de se perguntar: então, qual o real valor da avença? Por que a necessidade de mascarar o valor do contrato? Quem arcará com esse preço exorbitante? Haverá previsão orçamentária para tanto? Haja multas para propiciar esses valores!

          A falta de previsão objetiva valor do contrato, com contemplação apenas do seu valor mínimo mensal, sem qualquer estipulação de compensação entre os meses de grande arrecadação e os de pequena onde o número mínimo de multas não é atingido, leva o Detran a prejuízos homéricos, com enriquecimento indevido da empresa ré.

          O réu .........., atual Diretor-Geral do Detran, confirma essas conclusões ao afirmar em matéria veiculada no dia 08/10/99 pelo jornal Folha do Povo (f. 844 do PA n°14/97):

          "Hoje, o Detran paga mais do que arrecada".

          Ora, se isso realmente ocorre é por culpa da própria Administração do Detran, que não fez um contrato dentro dos padrões éticos e da legalidade.

          Evidenciado esse fato, conclui-se que a Administração fica sempre submetida ao critério da "sorte", já que tanto pode ter lucros gigantescos como prejuízos incalculáveis, inexistindo a previsibilidade quanto às contas administrativas posto que não há como saber se elas se encaixarão dentro do orçamento prévio estabelecido, burlando dessa forma o controle exercido pelo legislativo e ferindo o princípio da harmonia que deve existir entre os Poderes Estatais.

          Hoje, o Detran é um refém da empresa ré que impõe suas normas àquele órgão, inclusive ao arrepio da lei.

          Fica, assim, ilidido o valor estipulado de R$ 27,30 ( vinte e sete reais e trinta centavos) e constatado que a vultosa desproporção entre o fictício valor apontado e o seu real valor não é mero acaso ou obra do descuido, bem como fica demonstrado mais uma vez a indústria das multas, em prejuízo, às vezes até dos cofres públicos.

          Nesse mesmo tema, uma outra questão se impõe. É a de se saber de onde virão os recursos para atender as despesas com instalação, manutenção dos fotossensores e o pagamento dos serviços da empresa contratada. Alguém já poderia pensar que esta é um questionamento inútil, já que o contrato dispõe sobre o tema, ao prever que os recursos virão das multas aplicadas. Há de se retrucar, de pronto, que tal receita é inadmissível. Para fazer frente a esse tipo de gasto, a Administração Pública não pode lançar mãos das multas aplicadas no trânsito, dado que o Código Brasileiro de Trânsito, ao estabelecer, em seu artigo 320, a destinação das multas, não previu tal possiblidade. Além do mais, é totalmente imoral que a Administração Pública permita que a receita para pagar empresa particular tenha a origem e a forma como é concebida. É inadmissível que a empresa ganhe tanto dinheiro quanto consiga arrecadar com a criação de situações para que os administrados venham a ser punidos.

          A necessidade da fixação do valor do contrato e da identificação dos recursos destinados a atender as despesas previstas na avença não é fruto de imaginação cerebrina, mas é imposição legal, como se vê pela disposição estampada no artigo 67, inciso VI da Lei estadual n° 1.070/90, "in verbis":

          "Art. 67 - São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:

          VI - o valor do contrato e a identificação dos recursos destinados a atender as despesas;"

          Assim, há de se concluir que também em virtude das irregularidades acima apresentadas, o contrato é nulo e como tal deve ser reconhecido pelo Judiciário.

          B1 Da desconformidade do contrato com o edital:

          Nota-se clara falta de conformidade entre edital e o contrato. O item 14.1, que trata da rescisão, estabelece que esta operar-se-á de pleno direito "independentemente de interpelação judicial ou extrajudicial, sem prejuízos das penalidades previstas no item 23 do edital". Ocorre, porém, que edital sob comento não possui esse item. Logo, as referidas penalidades, colocadas para dar ares de seriedade ao contrato, não existem.

          Seria casual e insignificante essa desconformidade? Não. Ela é fundamental. Demonstra ela o real objetivo do contrato: favorecer indevidamente os representantes das partes contratantes, sem lhes impor qualquer penalidade em caso de descumprimento do contatado, em prejuízo à Administração Pública e aos administrados, o que, por este ângulo, demonstra também a nulidade da avença.

          C1. Da fiscalização de serviço público de trânsito por particular:

          Outra cláusula viciada é a décima sétima, que delega as atribuições da Administração Pública relacionada com a fiscalização do trânsito para empresa particular. Com efeito estabelece a referida cláusula:

          "A contratada designará Comissão Técnica especializada para acompanhar a instalação e ativação dos produtos, até a assinatura do Termo de Recebimento Definitivo do objeto contratado e servidor para acompanhar a execução dos serviços pertinentes durante a vigência do Contrato."

          Em outros termos, é a própria prestadora de serviços que fiscaliza seu próprio trabalho. É a raposa tomando conta do galinheiro.

          Tal modo de proceder ofende o artigo 67, caput, da Lei n°8.666/93 que dispõe:

          "Art. 67 - A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição."

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          A fiscalização, prerrogativa fundamental da Administração Pública, para a garantia de uma boa gestão do dinheiro público, foi confiada à contratada. Mais uma vez o princípio da legalidade, impessoalidade e da moralidade foi desconsiderado por aqueles que tinham o encargo de bem gerir a "res" pública.

          D1. Do controle de tráfego e da aplicação de multas por empresa particular:

          Do artigo 8° ao 24, o Código de Trânsito Brasileiro (Lei n° 9.503/97) enumera as competências administrativas dos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Trânsito, que compõem em sua expressiva maioria ou quase totalidade, um feixe de competências que se inserem na exteriorização do conhecido e denominado Poder de Polícia da Administração. Esse Poder tem sua legitimidade na avocação pelo Estado da tarefa de garantir a paz e a harmonia social, regulando condutas e, destarte, limitando direitos individuais para garantir a tranqüilidade, sossego e a convivência pacífica da coletividade, um dos fins justificadores da sua própria existência. Especificamente quanto ao trânsito, o Estado, através dos seus órgãos competentes, regula o tráfego e aplica multas aos motoristas infratores de suas normas, mais para educar e prevenir acidentes que propriamente penalizar.

          Ocorre, porém, que não é possível delegar esse Poder de Polícia ao particular, seja ele pessoa física ou jurídica de direito privado, como vem acontecendo e fundado no contrato celebrado entre o Detran e a .............. A Lei n° 9.503/97 apresenta a norma contida no artigo 25 que, data venia, vem proporcionando equivocada inteligência.

          Para melhor entendimento, cita-se o referido artigo em sua inteireza:

          "Art. 25. Os órgãos e entidades executivos do sistema Nacional de Trânsito poderão celebrar convênios delegando as atividades previstas neste Código, com vistas à maior eficiência e à segurança para os usuários da via.

          Parágrafo único. Os órgãos e entidades de transito poderão prestar serviços de capacitação técnica, assessória e monitoramento das atividades relativas ao trânsito durante prazo a ser estabelecido entre as partes, com ressarcimento dos custos apropriados."

          Com uma leitura desatenta e solitária, poder-se-ia afirmar que a lei autoriza ao Estado a terceirização do seu Poder de Polícia, no tocante ao trânsito. Ledo engano. A Lei n° 9.037/97 possui uma série de normas que impossibilitam uma interpretação literal isolada do referido artigo. O que se depreende - de uma interpretação sistemática, como deve ser feita - é que somente é possível a delegação para outras entidades integrantes do Sistema Nacional de Trânsito, verbi gratia, demonstrado no artigo 19, VII, da predita Lei de Trânsito. Ao mencionar a expressão delegação, não quis o legislador possibilitar a terceirização das atividades do trânsito, delegando-a para particulares, pessoas físicas ou jurídicas de direito privado.

          O exercício do poder de policia, por ser inerente ao Estado, é indelegável, conforme confirma Álvaro Lanzini:

          "O Poder de Polícia é um conjunto de atribuições da Administração Pública, indelegáveis aos particulares, tendentes ao controle dos direitos e liberdades das pessoas, naturais ou jurídicas, a ser inspirados nos ideais do bem comum, incidentes não só sobre elas, como também em seus bens e atividades"(in Estudos de Direito Administrativo, Ed. R.T., 1a ed., p.197).

          Hely Lopes Meirelles, após caracterizar a multa como ato punitivo, afirma que aplicação desse tipo de sanção constitui-se em atividade indelegável do Estado.

          Eis como expõe a matéria:

          "A multa pode ser definida no âmbito do Direito Administrativo como uma imposição pecuniária aplicada aos transgressores de preceitos administrativos(1), integrando o rol dos atos punitivos da administração pública, imposta no exercício do seu poder de intervenção sancionatória. Esta, conceituada como intervenção concreta do Estado na propriedade e na atividade privadas, limitativa ou expropriatória, permanente ou transitoriamente imposta e indelegável, destinada a compelir remissos e infratores ao cumprimento de preceitos administrativos."(2)

          Então, qualquer atividade que se traduza em típico exercício do poder de polícia, inclusive as chamadas sanções de polícia, que são decorrência do mesmo, não admitem delegação a particulares. Nesse sentido dispõe o § 4° do artigo 280, ao permitir a lavratura do auto de infração tão somente por servidor civil, celetista ou estatutário.

          O que deve fazer o Detran é cumprir de forma fiel e eficaz as funções que lhe são acometidas pelos incisos V e VII do artigo 22 do CBT que dispõem:

          "Art. 22. Compete aos órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, no âmbito de sua circunscrição:

          (....);

          V - executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis pelas infrações previstas neste Código, excetuadas aquelas relacionadas nos incisos VI e VIII do art. 24, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito;

          VI - aplicar as penalidades por infrações previstas neste Código, com exceção daquelas relacionadas nos incisos VII e VIII do art. 24, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar."

          Não obstante a cristalina obrigação legal do Detran, o item 9.4 do contrato sob comento estabelece como uma das obrigações da contratada ré "processar os registros de infração inerentes ao processo colhidos pelos sensores remotos".

          A delegação feita é inadmissível, sendo, neste particular, igualmente ilegal o contrato, merecendo o reconhecimento de sua nulidade pelo Poder Judiciário.

          E1. Do repasse indevido de parte do montante obtido com as multas à empresa particular:

          Os valores arrecadados com os recolhimentos de multas oriundas de infração de trânsito não pode ter outro destino a não ser aquele previsto na norma legal.

          Para evitar desvio de finalidade e abuso de poder, por insuflar comportamento arrecadatório, como o que ora se observa, o artigo 320 da Lei n° 9.503/97 estabelece que:

          "A receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito será aplicada, exclusivamente, em sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito.

          Parágrafo Único - O percentual de cinco por cento do valor das multas de trânsito arrecadadas será depositado, mensalmente, na conta de fundo de âmbito nacional destinado à segurança e educação de trânsito."

          Sabe-se, como já dito antes, que a Empresa ............. tem participação direta nos valores arrecadados por cada infração aplicada. A Lei, todavia, não permite destinar parte dessa receita a empresa privada. É de se observar que o contrato estabelece metas financeiras muito bem definidas, mas em momento algum estabelece metas educacionais para a redução de acidentes, de infrações, melhora na educação do trânsito. Não mostra nem o valor total contratado.

          De maneira solar está demonstrada a ilegalidade e o abuso cometido pelos réus, ferindo por conseguinte os princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da finalidade, que devem ser respeitados pelos gestores do dinheiro público, dando-lhe o destino devido.

          F1. Falta de disposição contratual obrigando a empresa contratada obedecer o Código Brasileiro de Trânsito e as resoluções do Contran:

          O Detran, ao deixar de mencionar no contrato que a empresa contratada deveria atender, em qualquer circunstância, o CBT, as Resoluções do CONTRAN e as normas expedidas pelo CETRAN, não cumpriu sua finalidade precípua de cumprir e fazer cumprir as normas de trânsito, como previsto no artigo 22, inciso I, do predito códex(3). O que fez ele foi deixar a empresa contratada bem a vontade para fazer o que bem entendesse, inclusive para transformar o fotossensor em um caça níqueis.

          Essa relevante omissão é, se dúvida, suficiente, por si só, para se decretar a nulidade do contrato, principalmente em virtude dos resultados funestos que daí advieram e estão advindo para a população e para a Administração Pública.

          G1. O ilegal caracter comercial do contrato, com o objetivo meramente pecuniário:

          Três cláusulas do Contrato 008/97/PJU (f. 118/126 do PA 14/97), firmado pelo Detran e a empresa ................ Ltda., demonstram, de forma cristalina, o caracter mercantilisata e econômico do "negócio", com evidente desvio de finalidade dos equipamentos eletrônicos, que deveriam servir para educar, prevenir acidentes e, eventualmente, punir. Mas mesmo a punição, com a aplicação da multa e obtenção de valores pecuniários, devem ter como único objetivo o de educar e prevenir acidentes.

          Eis o teor das cláusulas que interessam:

          "3.1 - O preço unitário por registro de infração é de 27,30 (vinte e sete reais e trinta centavos) admitindo-se reajustes anuais pela variação da Unidade de Referência do Estado de Mato Grosso do Sul, ou conforme disposição legal vigente à época.

          3.2 – O valor total do pagamento será obtido multiplicando-se o valor unitário de cada registro de infração, processado pela Contratada, pelo número total de processamentos entregues à Contratante, no mês.

          (....).

          7.1 – A Contratante efetuará o pagamento dos serviços executados pela Contratada e aceitos definitivamente pela Contratante, ou seja, referente aos registros de infração emitidos para o mês. A partir do segundo equipamento instalado, inclusive, a instalação dos demais equipamentos fica condicionada à geração de uma quantidade média mínima de 150 (cento e cinqüenta) registros de infração mensais, por equipamento, considerado o total de equipamentos.

          7.1.1 – A contratante, a seu critério, poderá, caso a média estabelecida no item anterior não seja atingida, determinar o cumprimento do cronograma de instalação dos equipamentos, assumidos, neste caso, a complementação do pagamento de forma que referida média mínima seja cumprida.

          7.1.3 – Caso, ao longo da vigência Contrato, seja configurada a INVIABILIDADE ECONÔMICA DO NEGÓCIO, representada por um volume médio inferior a 150 (cento e cinqüenta) infrações mensais por equipamento, por 3 (três) meses consecutivos, considerado o total dos equipamentos instalados, fica a Contratada autorizada a retirar o(s) equipamento(s) responsável(eis) pelo não atingimento da cota média estabelecida.

          7.1.4 – A contratante, a seu critério, poderá determinar a permanência dos equipamentos deficitários, assumindo, neste caso, a complementação do pagamento de forma que a referida média mínima seja cumprida."

          A clareza das cláusulas transcritas não deixam dúvida sobre o objetivo ilícito do negócio: gerar fácil lucro financeiro aos envolvidos e nada mais.

          A título de elucidação, para aproveitar a oportunidade, cabe observar que o próprio Detran fez-se refém da contratada. Ela tudo determina: onde instalar, quando instalar e até quanto tempo deixar instalado um equipamento eletrônico. Ele só pode determinar a permanência de algum aparelho em um determinado local em uma circunstância bem específica: caso este equipamento não esteja alcançando a meta prevista (gerar 150 infrações mensais) e ele completar o valor do pagamento até atingir o valor equivalente a 150 multas X 27,30 (devidamente atualizada).

          Demonstrado o caracter mercantilista do negócio, com evidente desvio de finalidade e ferimento aos princípios da moralidade, legalidade e da impessoalidade, impõe-se o reconhecimento da nulidade do contrato, com a reparação dos danos causados.

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Sobre os autores
Amilton Plácido da Rosa

Procurador de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSA, Amilton Plácido ; ALMEIDA, Luiz Antônio Freitas. Ação civil pública contra fotossensores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 36, 1 nov. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16210. Acesso em: 29 mar. 2024.

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