Petição Destaque dos editores

Ação civil pública contra fotossensores

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VII. DAS DEFICIÊNCIAS DO FOTOSSENSOR:

          Muito já foi dito sobre as ilegalidades envolvendo o fotossensor sem que, no entanto, tenha-se definido o aparelho sob comento. Por uma questão de clareza e para uma melhor compreensão de todas as irregularidades que se passará a expor doravante, mister se faz explicar agora o que é o aparelho fotossensor, como funcionamento e qual é sua finalidade, para que o ilustre julgador tenha uma dimensão maior para poder aplicar a justiça e banir deste Estado esse "chicote" que a todos açoita e assombra e que levam os motoristas ao "tronco".

          Segundo informações prestadas pelo Detran (f. 229 do IC 11/98), o fotossensor teria duas funções básicas: detectar a invasão da faixa de segurança e o avanço no sinal vermelho. Para isso, conta com um microcomputador e uma câmera fotográfica acoplados ao próprio semáforo. A lente da câmara capta o movimento em toda extensão da faixa. Possui também dois sensores instalados no asfalto, localizados no início e no final da faixa de pedestre. Quando um veículo pára sobre o primeiro sensor, este emite sinal para um micro-processador para dar 8 segundos de tolerância para que o condutor saia dali, em marcha à ré, para não ser fotografado e, assim, não ser tido como infrator. Caso o veículo passe pelo segundo sensor, a máquina fotográfica também é acionada.

          De acordo com o fabricante, o fotossensor dispara tão somente após 1 segundo do surgimento do sinal vermelho, o que demonstra que ele é uma máquina que mensura o tempo e não é simplesmente uma máquina fotográfica.

          A partir de agora, passar-se-á a demonstrar as irregularidades detectadas no funcionamento deste aparelho, demonstrando que ele não tem, definitivamente, condição técnica de exercer o papel de auxiliar do controle do tráfego.

          E) O equipamento não tem percepção sensorial para poder multar, ele só registra:

          Será uma foto o meio seguro para se saber se houve realmente uma infração de trânsito? A resposta com certeza é negativa. Os fotossensores apenas registram eventos sem, no entanto, utilizar do bom senso, psicologia e discernimento que teria uma autoridade de trânsito para concluir se ocorrera ou não a infração. Isso são qualidades inerentes ao ser humano que, apesar de falho em muitos aspectos, é insubstituível pela máquina. O que, por uma simples foto, pareceria uma infração às leis de trânsito, poderia ter um julgamento diferente por um guarda. Com sua experiência e sensibilidade detectaria fatos que escapariam ao alcance dos "olhos mecânicos". Assim se determinaria, por exemplo, se o motorista passou no sinal vermelho a mando de um agente de trânsito que nesse sentido o orientou; se um outro parou sobre a faixa de pedestres devido a presença de bombeiros, polícia ou ambulância ou de um repentino engarrafamento a sua frente; se outro ainda adentrou o cruzamento com o sinal amarelo, por lhe ter sido impossível parar em tempo e, em face da exiguidade do sinal amarelo e para não causar um acidente com o veículo que vinha atrás de si, acabou por ter que – para não atrapalhar o trânsito – completar o cruzamento com o sinal vermelho para si.

          É por esse motivo que o TJ/MS vem decidindo no sentido de que uma só foto não serve para comprovar o cometimento de uma infração.

          "O sistema de fotografias ou "foto sensor" utilizado pelo Detran é falho, pois registra um único momento, qual seja aquele em que o veículo acoimado de "infrator" já ultrapassou o sinal. Seria necessário para fazer prova em juízo, pois, que se apresentasse, no mínimo, uma seqüência de fotos, em que a primeira mostrasse o veículo frente ao sinal vermelho e, ato contínuo, a outra ou outras, quando o seu carro já estivesse ultrapassado."(Acórdão da 3a turma cível do TJ/MS, decisão unânime, f. 920 do IC n° 11/98).

          O CREA/MS, ao tratar do assunto, foi bem claro em seu posicionamento, não deixando dúvida a respeito da deficiência do equipamento neste aspecto.

          Eis como o perito daquele Conselho se manifestou em sua conclusão:

          "Conclusão: Uma foto nem sempre oferece subsídio absolutamente seguro para materializar o cometimento de uma infração de trânsito."(Perícia realizada pelo CREA/MS, f. 780 do IC n°11/98)

          Nas condições em que as fotos são tiradas, só se poderia ter as infrações detectadas pelos fotossensores como válidas se as elas fossem convalidadas por um agente da autoridade de trânsito. Como colocar um guarda ao lado de cada "olho vivo" é contraproducente, os fotomultas devem ser descredenciados como instrumento auxiliar no controle do tráfego, por não serem confiáveis e por beneficiarem tão somente quem quer manter a indústria das multas.

          Como a coisa é feita, o Detran não tem como provar que efetivamente um motorista fotografado por um fotomulta tenha desrespeitado o sinal de trânsito, pelo que se conclui – levando-se em conta os princípios da inocência, da ampla defesa e do contraditório – que nenhum motorista deve ser punido nestas condições. Punição assim é absurda, posto que obriga o administrado, para não ser tido como infrator, a fazer comprovação negativa da não-transgressão das normas de trânsito. O ônus da prova da violação da lei é do órgão acusador.

          F) O tempo do sinal amarelo é exíguo, gerando multas indevidas:

          Em perícia realizada pelo CREA/MS, em sete cruzamentos da Capital, foi detectado que o tempo do amarelo estava menor do que o mínimo tolerável, que é de 3 a 6 segundos, e, por conseguinte, gerando multas indevidas, pois o motorista não pode parar abruptamente na mudança para o sinal amarelo sem comprometer o fluxo do trânsito.

          Na mesma perícia, foi demonstrado que:

          "O tempo do amarelo, em todos os setes semáforos citados, é insuficiente e causador de multas indevidas".

          Sobre o tempo de amarelo foi publicada recentemente matéria no jornal Correio do Estado, que, de forma percuciente, asseverou:

          "Através de perícia detectou-se, por exemplo, que em sete cruzamentos informados pelo Departamento Estadual de Trânsito (Detran), como de maior incidência de multas oriundas dos fotossensores, todos apresentam semáforos com tempo de foco amarelo inferior ao mínimo aceitável, resultando a penalização indevida de uma grande parcela de motoristas."

          Há de se deixar registrado que o manejo incontrolado que tem o Setrat do tempo dos sinais, principalmente do amarelo, é outro fator preponderante para tornar viável economicamente o "negócio" e, assim, poder manter todos os equipamentos funcionando, posto que todos gerarão o número de multa que os interessados desejam.

          O sinal amarelo, além de ser uma das melhores forma de fazer com que a indústria da multa se mantenha forte e atuante, é um dos empecilho para que se afira o equipamento, posto que todo equipamento aferido deve ser lacrado. Não se pode falar em aferimento, se, a qualquer momento, o interessado pelo funcionamento inadequado do equipamento pode manipulá-lo livremente. E como lacrar um equipamento que depende quase que exclusivamente do sinal amarelo que pode ser manipulado livremente pelo Setrat, com um simples toque de dedo no computador?

          Para se vencer essas insegurança e volatilidade do aferimento e para se garantir o respeito ao princípio da inocência e da ampla defesa, haveria de se instalar em cada semáforo equipado com "olho vivo", um aparelho que demonstrasse com eficácia a diminuição de tempo de cada sinal, como os que já existem instalados na Cidade de Aquidauna.

          Estes controladores de tempo de sinal mostraria, através de um cronômetro ou de luzes que acenderiam em escala decrescente, o tempo que resta de cada sinal, com o fim único de que os motoristas não fossem pegos de surpresa e, assim, não acabassem punidos, mesmo quando tinham o firme propósito de obedecer as normas de trânsito.

          Tem-se nos autos do IC/98, à f. 897, uma proposta de um aparelho que muito bem poderia ser usado no presente caso. Eis os fins para os quais seu inventor o idealizou:

          "Pensando em tudo isso é que resolvemos acabar de vez com esse problema, desenvolvendo o ‘Timer Digital para Semáforos’ um sistema que poderá reduzir a praticamente em ‘ZERO’ o número de acidentes, e também reduzir consideravelmente o de multas que, na maioria das vezes, recebemos sem ter a certeza de que realmente cometemos tal infração, pois nem sempre os fotossensores estão ‘Aferidos’ corretamente."

          Estando demonstrado que o tempo do sinal amarelo é: a) o fator preponderante para se conseguir o aumento das infrações e, por conseqüência, das arrecadações indevidas; b) um dos empecilho para se lacrar o fotossensor depois de aferido, por possibilitar seu manejo a qualquer tempo pelos representantes do Setrat, que poderão mudar o tempo do amarelo para o tanto que bem desejarem, com o fim único de gerar multas; e c) uma forma ilegal e imoral de se vedar ao motorista fazer uso do princípio da inocência e da ampla defesa, posto que não tem como fazer prova contra o aparelho, deve o fotossensor ser condenado, posto que sua atuação está intimamente ligada com o tempo do amarelo.

          G1. O fotomulta pune quando a lei permite que o motorista faça a travessia de forma regular:

          Várias razões antes apontadas comprovam e demonstram que o fotossensor não pode, com justiça e eqüidade, substituir o agente de trânsito, porque não possui o tato, a experiência, a percepção sensorial necessárias para perceber se houve ou não uma infração. Assim o fotossensor acaba por classificar como infração um fato que, por motivos circunstanciais de momento e contexto, não constitui-se em uma violação às leis de trânsito.

          Para reforçar ainda mais a tese apresentada neste item, faz-se aqui menções a outras situações, além daquelas já citadas antes, em que o fotomulta tem como irregular um comportamento completamente autorizado pela Lei de Trânsito.

          Tem-se, assim, aquela situação de se exigir que o motorista que pára sobre a faixa de pedestre, por lhe ter surgido o sinal amarelo ou vermelho, dela se retire, dando marcha à ré, em oito segundos, para não ser flagrado, como infrator, pelo "olho-vivo". Esse comportamento, por evidente, não tem critério legal, posto que em nenhum momento o Código Brasileiro de Trânsito impõe essa obrigação ao motorista, muito menos assinala que essa obrigação deve ser feita no exíguo tempo de 8 segundos. A obrigação criada pelo Detran e pela empresa ré fere princípio constitucional de que ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

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          Outra aberração está ligada ao sinal amarelo. A normatização expedida pelo órgão que regula o trânsito em nível nacional é clara quando, em consonância com o Artigo 45 do CNT, dispõe a respeito da finalidade do sinal amarelo e de como o motorista deve proceder diante dele(4).

          Ao proibir o motorista de parar onde se encontra ou de efetuar o cruzamento para não colocar em risco a segurança do tráfego, quando vier o sinal amarelo ou o vermelho, o órgão estadual do trânsito está punindo o cidadão quando a lei não lhe confere direito de paragem ou de passagem. O Detran impõe tais exigências descabidas para que possa mais facilmente punir o cidadão em virtude da exiguidade do tempo do amarelo e, assim, alcançar a finalidade do contrato, que é o êxito do negócio.

          Segundo o Artigo 71, § 1o, inciso II, do Decreto n.o 62.127, de 16 de janeiro de 1968, que regulamenta o Código Nacional de Trânsito, estipula que o sinal amarelo significa advertência e, em seguida, no seu § 3º prevê que "O uso da luz amarelo-alaranjada, isoladamente ou com a luz verde, significa que os veículos deverão deter-se, a menos que já se encontrem na zona de cruzamento ou à distância tal que, ao se acender a luz amarelo-alaranjada, não possa deter-se sem risco para a segurança do trânsito.

          Só para exemplificar uma situação detectada como irregular pelo fotossensor em ofensa ao disposto neste inciso II do parágrafo 1º do artigo 71 do Decreto 62.127/68, cita-se, imaginariamente, o caso de um motorista (Senhor Pedro) que vinha conduzindo normalmente seu veículo na velocidade permitida pelo local, qual seja, 40 km/h. Quando este tocou o início da faixa de pedestre a luz amarelo-alaranjada do semáforo acendeu e ele, em obediência as normas de trânsito, parou, posto que não se encontrava no cruzamento nem colocava em risco a segurança do trânsito. Embora este motorista estivesse, como já dito, cumprindo fielmente todas as normas de trânsito, ele foi multado, posto que logo em seguida (a menos de 3 segundos) o sinal tornou-se vermelho e o fotossensor o fotografou como invasor de faixa. Não constitui isso uma ilegalidade?

          O Senhor Pedro, para não ser tido como infrator, segundo as normas do réu, deveria dar marcha à ré, em 8 segundos, para, no dizer do Detran, retornar "ao local permitido".

          Em primeiro lugar há que se questionar, mas que lugar permitido é esse se pelas normas de trânsito, naquelas circunstâncias, o veículo conduzido pelo Senhor Pedro já se encontrava no local permitido?

          Em segundo lugar, além de o Detran não poder determinar que o motorista faça algo que a lei não exige, ele não está autorizado pela lei a expedir normas de trânsito, mas apenas determinado a cumprir e a fazer cumprir as já existentes. Assim, ele jamais poderia determinar que o motorista desse marcha à ré nem ter fixado o tempo de 8 segundos para fazer tal proeza. Como pode um motorista sair, com os cuidados devidos, em marcha à ré, de cima das faixas de pedestre para retornar ao "local permitido"? Mesmo que o Detran pudesse fazer tal determinação e o tempo de 8 segundos fosse suficiente para fazer toda esse malabarismo, como deve proceder o motorista quando atrás dele já existem outros veículos que não o permitem retornar ao denominado "local permitido"?

          Em terceiro lugar, deve-se dizer que obrigar alguém frenar seu veículo e dar ré para, em 8 segundos, sair de cima da faixa de pedestre, é, no mínimo, autorizar o ferimento dos artigos 42 e 194 da Lei n.o 9.503, de 23 de setembro de 1997, que prescrevem esta última atitude como Infração grave:

          "Art. 42. Nenhum condutor deverá frear bruscamente seu veículo, salvo por razões de segurança."

          "Art. 194. Transitar em marcha à ré, salvo na distância necessária a pequenas manobras e de forma a não causar riscos à segurança".

          Apenas com esses exemplos, dá para perceber a paranóia em que o órgão estadual de trânsito coloca o motorista que dirige em Campo Grande. Como pode o condutor de veículo estar dirigindo em velocidade compatível para o local, estar atento ao trânsito e ao semáforo, imprimir velocidade razoável, de modo que possa passar antes de mudar o sinal para vermelho, frenar seu veículo e dar ré, para, em 8 segundos, sair da faixa de pedestre, sem colocar em risco à segurança própria e a de terceiro, para não ser multado? É este um jogo de malucos que a lei não exige nem pode exigir e só explicável pela ganância usurária dos representantes do Detran.

          Além das ilegalidades acima citadas, inúmeras outras reclamações de motoristas lesados poderiam ser aqui transcritas para demonstrar as inúmeras punições injustas que o predito equipamento impõe por funcionar contrariamente às disposições legais. Se o julgador tiver a paciência necessária e entender conveniente passar pelo menos uma vista d’olhos nas sobreditas reclamações, basta compulsar os autos Inquérito Civil n°11/98, de f. 04 a 223. Lá encontrará farto material demonstrando outras punições injustas e ilegais.

          O pior que punir quando a lei tem o comportamento como legal, é a impossibilidade de a Administração Pública poder comprovar, de forma objetiva, que o cidadão flagrado pelo fotossensor feriu a lei. Ora, se a própria Administração não consegue comprovar que o administrado cometeu infração, como pode exigir que o punido faça prova negativa contra si, para demonstrar que não infringiu a norma de trânsito? É a implantação do absurdo. É o desrespeito frontal as normas constitucionais.

          Tal estado de ilegalidade não pode continuar.

          H) Do ferimento aos princípios constitucionais da ampla defesa e da inocência, além de admitir provas oriundas de meio ilícito:

          O fotossensor não permite uma defesa ampla pois o motorista não tem como saber que, no momento da "suposta" infração, ele estava sendo multado. Faltam os sinais sonoros e visuais da aplicação da multa, dificultando sobremaneira a contestação da infração. Some-se a isso o fato de que uma única foto não é suficiente para comprovar uma infração. O Detran vem invertendo o ônus da prova, pois através de uma simples foto, que não comprova a infração cometida, obriga os motoristas a provarem que não estavam errados. Cabe ao acusador o ônus de comprovar a infração e não ao acusado provar que não a cometeu. Por tudo mais que já se comentou, as fotos, além de não comprovarem as infrações, padecem do vício da ilegalidade porque provêm de um equipamento que não tem base legal e que não respeita os critérios exigidos pelo CONTRAN para estar em funcionamento.

          O art. 5°, inciso LVI, da Carta Política é claro ao dispor que no ordenamento jurídico pátrio não é admitido provas obtidas por um meio ilícito, para se evitar, como ocorre no caso em comento, punições realizadas de forma desleal e sorrateira.

          Em reclamação feita ao Ministério Público, f. 33 do IC 11/98, o motorista reclama, e com razão, que foi cerceado seu direito de ampla defesa. O auto de notificação da autuação e multa não esclarece se o reclamante teria atravessado o sinal vermelho ou parado sobre a faixa de pedestres. Nesse caso há efetivamente o cerceamento do direito de defesa, pois não é possível que o cidadão possa se defender de algo, de forma ampla e irrestrita, sem saber qual é precisamente a infração que lhe está sendo imputada? A defesa torna-se pior ainda em virtude do fato de que os semáforos equipados com fotossensores não tem sinal sonoro nem luminoso indicadores da infração e esta é, na maioria das vezes enviada ao cidadão acoimado de infrator muito tempo depois do prazo tolerado pela lei. Esquecem-se os réus que as pessoas não podem se defender de acusações dúbias, que não esclarecem o motivo de estarem sendo penalizados, nem podem elas se lembrar de fatos que sequer tomaram ciência se aconteceram ou não.

          É para facilitar o direito de defesa do cidadão que o inciso I do artigo 280 da Lei n° 9.503/97 estabelece:

          "Art. 280- Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:

          I - tipificação da infração;"

          Claro está que, da forma dúbia como a notificação tipifica a infração, a lei está sendo desrespeitada. Se o Detran não cumpre a lei, como pode exigir isso do cidadão?

          Outro ponto a ser lembrado nesse tópico é a habilitação do equipamento. Sem o aferimento e a certificação - condições sine qua non para instalação, funcionamento, legalidade, transparência e idoneidade do "olho-vivo" - não há como ter certeza de que o aparelho funciona dentro de padrões aceitáveis. Assim, todas as vezes que se pune um motorista com base nas acusações feitas pelo fotossensor, corre-se o risco de se estar punindo um inocente. Todos os brocardos positivados que refletem esse princípio (v.g. in dubio pro reo e in dubio pro mísero no âmbito penal e trabalhista) demonstram que, ao longo dos anos de evolução do Direito Positivo, sabiamente se aprendeu a aceitar pacificamente que é preferível deixar de punir dez culpados a punir um inocente.

          A Resolução do CONTRAN n° 801/95, que tratava das barreiras eletrônicas e que vigia no momento das instalações dos fotossensores, estabelecia que:

          "Parágrafo Único - Para atender às suas finalidades específicas e a critério de autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via, a Barreira Eletrônica pode ser complementada, ainda com:

          I - lâmpadas indicativas da situação que está sendo verificada no trânsito;

          II- sinal sonoro indicador da infração;

          III- ser dotada de dispositivo que possibilite a identificação do veículo em infração;

          O fotossensor não possui sinal algum que indique que foi cometida uma infração. A colocação de tais indicativos não é só um dever do órgão de trânsito, mas um direito do cidadão para saber se cometeu ou não a infração que lhe é imputada. Além do mais, tais indicadores visariam, não a multa em si, mas a educação e prevenção no trânsito, que são os objetivos maiores previstos nas normas de trânsito.

          Em verdade, a multa gerada pelo fotomulta não oferece a segurança que dela se espera. Não consegue a empresa .............. nem o Detran comprovarem que o motorista flagrado pelo "olho-vivo" efetivamente desobedeceu o sinal de trânsito. Como bem dispôs a perícia do CREA/MS e as decisões do TJ/MS, uma única foto não é o suficiente para se ter um motorista como infrator. Nesse caso, é melhor deixar impune vários culpados do que punir um inocente.

          I) Da ausência de equipamento luminoso ou de contagem regressiva indicando qual o tempo que resta de sinal verde e de sinal amarelo:

          Tendo em vista que o objetivo principal dos sinais de trânsito é o de educar e de prevenir acidentes, é de fundamental importância que o motorista saiba exatamente o quanto do sinal verde falta, principalmente diante da deficiência do tempo do amarelo. Passa a ser imprescindível, para não se pegar os motoristas desprevenidos e penalizá-los de forma artificiosa, que se instale equipamento luminoso ou de contagem regressiva, indicando qual o tempo que resta de verde e de amarelo.

          A já referida perícia do CREA/MS recomendou uma espécie de contagem regressiva a ser realizado pelas lâmpadas verdes (o semáforo teria três lâmpadas e elas iam se apagando, uma a uma, a medida que o sinal amarelo e vermelho fossem se aproximando). O DETRAN, no entanto, não aceitou tal sugestão pois implicaria na redução das multas, por estarem os motoristas efetivamente avisados de quanto poderiam ou não passar com segurança, o que redundaria, para o órgão e os demais envolvidos, um lucro menor.

          Como se acoplou ao semáforo um outro elemento que lhe é estranho, deve-se também tomar outras providências para que os motoristas que efetivamente querem cumprir a lei possam fazer com consciência, dentro de limites de segurança aceitável. Agir de forma contrária é querer que os motoristas sejam surpreendidos por arapucas e não tenham como delas se livrar, o que é ilegal, imoral e inaceitável.

          J) Da impossibilidade de aferimento e de lacração do equipamento:

          O INMETRO afirmou, categoricamente, que não pode aferir o equipamento, posto que o mesmo não permite aferição.

          Ora, se não admite aferição não pode estar instalado para controlar o tráfego. Como já foi visto, a Resolução do Contran, a de nº 810/95, em vigor na época da instalação da maioria dos equipamentos, dispunha:

          "Art. 2º - A Barreira Eletrônica deve permitir a aferição e calibração no local onde estiver instalada."

          Por outro lado, a Resolução CONTRAN de n° 23, de 21.05.98, dispõe:

          "Art. 2° - Os requisitos básicos necessários para a instalação dos Instrumentos de Medição de Velocidade de Operação Autônoma são:

          I- estar aprovado e certificado pelo INMETRO - Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualificação ou entidade por ele credenciada, atendendo aos requisitos técnicos estabelecidos pelo CONTRAN e legislação metrológica em vigor;

          II- passar por verificação anual do INMETRO ou entidade por ele credenciada, ou quando for observada alguma irregularidade no seu funcionamento ou após sofrer manutenção".

          Como se pode estar regular um equipamento que sequer pode ser aferido? Não preenchendo as exigências legais, o equipamento está instalado e funcionando ao arrepio da lei.

          Mesmo que ele permitisse o aferimento e efetivamente fosse aferido, não tinha como ser lacrado depois desse ato para se ter a garantia necessária do órgão aferidor, posto que o tempo do sinal amarelo que rege basicamente o funcionamento do aparelho pode ser alterado na central de computadores da Setrat com um mero toque de dedo. Assim, o aferimento seria inócuo, pelo que se pode concluir que o referido equipamento é uma parafernália totalmente incontrolável e infiscalizável que só serve para punir homens de bem e servir como instrumento de arrecadação para seus inescrupulosos e avarentos idealizadores.

          K) Do ferimento ao princípio da igualdade e da aplicação de punição sem se utilizar de critérios legais:

          Por outro lado, o funcionamento do equipamento, da forma como é feito, fere o princípio constitucional da isonomia, por tratar condutores de veículos automotores que estão nas mesmas condições de forma desiguais.

          Para elucidar melhor a questão, passa a citar alguns exemplos. O motorista que parar seu veículo por 7,9 segundos sobre a faixa de pedestre não será multado, enquanto que o outro que parou por 8,1 segundos o será, apesar de a infração poder ter sido cometida por ambos. As motocicletas, consideradas veículos pela Lei n° 9.503/97, que fizerem um cruzamento desobedecendo o sinal vermelho jamais serão flagrados pelo equipamento, não sendo seus condutores punidos.

          No caso dos motociclistas o caso torna-se mais grave quando os fotossensores estão em frente de local de grande movimento, como o de uma escola, quando os condutores de motocicletas e mobilletes, se aproveitando da deficiência do equipamento, passam com o sinal vermelho para si, pegando os pedestres desprevenidos.

          O Tribunal de Justiça do Ceará decidiu, em agravos infringentes, que os fotossensores ferem o princípio da isonomia no caso de um carro ultrapassar o sinal vermelho, ser fotografado e multado e em um instante após atravessarem outros carros, não dando tempo ao aparelho para se preparar e, por conseqüência, ficando impunes. Diz o acórdão que "eis que os aparelhos soltos pela cidade só apanham um carro de cada vez que afrontado o sinal vermelho, sendo o caso, pois, de não serem multados os demais que, como aquele, por alguma razão, de força maior ou não, atravessaram o sinal de uma só vez, rescindo a penalidade sobre um só deles."

          É chegada a hora de dar um basta ao banquete de ilegalidades que consome toda a esperança da população, crivando-a da fé nos órgãos públicos, o que faz com que cada vez mais cresça a parcela de descrentes na justiça e na democracia.

          L) Da falta de placas de advertência dando conta da existência de fiscalização elétrica-eletrônica e fotográfica:

          Os motoristas e proprietários de veículos automotores de Campo Grande, de Dourados e, porque não dizer, do Estado de Mato Grosso do Sul e quiçá do Brasil todo, estão sendo multados pelo Detran/MS, através de fotossensores, instalados de forma camuflada, sem qualquer ostensividade, com o fito exclusivo de arrecadação de numerários, quando a norma em vigor é expressa em exigir a colocação de sinalização vertical ao longo da via fiscalizada, para manter o usuário permanentemente informado da existência do equipamento eletrônico, posto que o objetivo primeiro da fiscalização de trânsito, como já dito, é a educação e prevenção de acidentes e não a repressão e arrecadação.

          A norma existente sobre o assunto é tão exigente que chega até detalhar as dimensões das placas informativas e onde deverão ser colocadas. E essa obrigatoriedade, diga-se de passagem, não é válida apenas para os equipamentos fixos, mas também para os móveis, como o são os usados pela Polícia Rodoviária Federal nas rodovias.

          Eis a redação da Resolução nº 008/98 que estabelece a obrigatoriedade de sinalização indicativa de fiscalização mecânica, elétrica, eletrônica ou fotográfica dos veículos em circulação:

          "O Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, usando da competência que lhe confere o art. 12 da Lei 9.503, de 23 de setembro de 1997, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro - CTB, e conforme Decreto nº 2.327, de 23 de setembro de 1997, que dispõe sobre a coordenação do Sistema Nacional de Trânsito;

          Considerando o que dispõe o Código de Trânsito Brasileiro;

          Considerando o caráter educativo da fiscalização de trânsito;

          Considerando a necessidade de estabelecer uma fiscalização ostensiva e preventiva que evite os acidentes de trânsito;

          R E S O L V E:

          Art. 1º. Toda fiscalização de trânsito por meio mecânico, elétrico, eletrônico ou fotográfico, deverá ser indicada, pelo menos, por sinalização vertical conforme modelo constante no anexo I da presente Resolução.

          Art. 2º. A sinalização deverá ser colocada ao longo da via fiscalizada, observada a engenharia de tráfego, respeitando espaçamentos mínimos que mantenham o usuário permanentemente informado.

          Parágrafo Único. Quando a fiscalização for realizada com equipamento tipo portátil, operado por agente de fiscalização, a sinalização poderá ser do tipo removível.

          Art. 3º. Esta Resolução entra em vigor trinta dias após a data de sua publicação, mantidas as Resoluções 795/95, 801/95 e 820/96 e revogadas as disposições em contrário."

          "ANEXO I DA RESOLUÇÃO N.º 008/98

          Placas Informativas:

          Fundo: Azul

          Orla Interna: Branca

          Orla Externa: Azul

          Legendas: Branca

          I - aparelhos sem agente operador no local:

          Dimensões:

          Largura: 1,90m

          Altura: 0,90m

          II) sinalização removível:

          Dimensões:

          Largura: 1,00m

          Altura: 0,50m".

          Essa Resolução é datada de 23 de janeiro de 1998, publicada em 22 de fevereiro de 1998, mas com sua eficácia contida até 22 de março de 1998, evidenciando que esse prazo foi concedido a todos os órgãos de fiscalização de trânsito para dar tempo à afixação das placas indicativas.

          A esse prazo nenhuma prorrogação foi acrescida, significando dizer que nesse interregno a norma tinha e tem força vinculante sobre o Detran e os Municípios réus, bem como sobre os motoristas dela destinatários.

          Ao Detran e aos Municípios coube o comando para a afixação de placas indicativas no prazo legal. Ao cidadão, o direito de somente ser multado eletronicamente quando da implementação da ordem legal, com a afixação de todas as placas de orientação e educação.

          Contudo, a ordem legal não foi cumprida em ambos os seus aspectos pelo Detran/MS e pelos Municípios réus, quais sejam: a de afixar as placas e a de não multar enquanto isso não ocorresse.

          Assim, todos os fotossensores estavam e estão funcionando sem as advertências legais, pelo que se conclui que o Detran e os Municípios demandados continuam fora da lei.

          Cientes estão o Detran e o Município de Campo Grande da ilegalidade praticada, tanto é verdade que os representantes legais desses órgãos ficam disputando entre si de quem é a culpa pela não instalação das referidas sinalização, como se vê pelas reportagens veiculadas pelo Jornal de Domingo, no dia 12 de setembro de 1999, sob os títulos: "SETRAT quer fotossensores como arapuca" e "Secretário rebate acusações". O absurdo de tudo isso é que o Secretário de Trânsito da Capital, JOSÉ JOAQUIM DA SILVA, afirma que não é necessária a colocação de qualquer placa de advertência, posto que, no seu entender, "o semáforo já é um sinal, então não necessita de outra informação" (f. 92 do PA 14/97/PJPPPSF). Totalmente ilegal, arbitrária e sovina tal maneira de proceder dessa autoridade que deveria pautar seu comportamento pela legalidade e moralidade de seus atos. Mal sabe ele que, como esse modo de agir, está cometendo improbidade administrativa capaz de lhe retirar o cargo que ocupa, por falta de dignidade e moralidade.

          Digno de nota, posto que vem reforçar tudo o que até aqui foi dito, é a decisão tomada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, no Agravo Regimental proposto pelo Ministério Público nos autos da ação civil pública nº 98.02.1720145 que aquele órgão moveu em face do Estado do Ceará e do Detran/CE, em virtude de funcionamento irregular de fotossensor.

          Eis o teor da Ementa (constante à f. 837 dos autos de PA 14/97/PJPPPSF):

          "EMENTA: - Agravo Regimental. Suspensão dos efeitos de Medida Cautelar proferida nos autos de Ação Civil Pública. Equipamentos eletrônicos destinados à imposição de multas aos proprietários de veículos automotores.

          1. A utilização de equipamentos eletrônicos com o fim de impor multas aos proprietários de veículos automotores, sob pena de violação aos princípios da legalidade, igualdade e impessoalidade, deve atender a exigência do CONTRAN, de colocação de placas de advertência em todos os locais onde tais aparelhos estejam instalados deve ter aferição das câmaras fotográficas pelo INMETRO, deve destinar tratamento igualitário a todos os indivíduos sob as mesmas situações jurídicas, e por fim, deve individualizar a responsabilidade de cada infrator.

          Recurso conhecido e provido"

          Frisar, mais uma vez, a falta de certificação, homologação, aferimento e calibração dos aparelhos é importante, para demonstrar que, se tais procedimentos fossem tomados, detectar-se-ia, com certeza, todas as ilegalidades e irregularidades até aqui apontadas e, certamente, seriam feitas, oportunamente, as correções devidas, antes mesmo que essas parafernálias fossem instaladas e colocadas em funcionamento para controlar o tráfego.

          Assim, verifica-se que é absolutamente nulas, lesivas, por conseguinte, todas as multas aplicadas pelo Departamento Estadual de Trânsito.

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Sobre os autores
Amilton Plácido da Rosa

Procurador de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSA, Amilton Plácido ; ALMEIDA, Luiz Antônio Freitas. Ação civil pública contra fotossensores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 36, 1 nov. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16210. Acesso em: 5 nov. 2024.

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