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Rescisória contra decisão já recorrida: erro sanável.

Creditamento de IPI: insumos não tributados ou tributados a alíquota zero

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V. A LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ DA FAZENDA NACIONAL E O SISTEMA RECURSAL BRASILEIRO

47. A Contribuinte alegou litigância de má-fé fazendária, porquanto foi ajuizada no Tribunal Regional Federal da 2ª Região a Ação Rescisória n. 2003.02.01.005675-8 proposta pela Fazenda Nacional em face da mesma contribuinte e objetivando rescindir a mesma sentença.

48. Sucede que aqui há interessantes nuanças provocadas pelo sistema recursal brasileiro, mormente os recursos excepcionais (o extraordinário e o especial).

49. O acórdão do TRF 2 na Apelação em Mandado de Segurança n. 0214199 (Processo originário n. 98.02.49739-8) foi hostilizado pela Fazenda Nacional via recursos extraordinário e especial. Este discutindo o direito federal infraconstitucional. Aquele o direito federal constitucional. Ambos foram inadimitidos na Corte a qua. Essas inadmissões foram desafiadas por agravos de instrumento. No STF o referido AI 313.481, que ora se analisa a sua rescisão. No STJ ganhou o número 318.157, Relator Ministro José Delgado.

50. Pois bem, no STF o aludido agravo não foi provido, mas o Relator analisou a questão constitucional controvertida. Todavia, no STJ o agravo não foi conhecido nem foi analisada a questão federal controvertida.

51. Tenha-se presente a ementa do acórdão do respectivo julgado do STJ (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 318.157, Relator Ministro José Delgado, J. 23.10.2000; DJ 18.12.2000):

CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO QUE NEGOU PROVIMENTO A AGRAVO DE INSTRUMENTO. CRÉDITO PRESUMIDO DO IPI. COMPENSAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. MATÉRIA DE CUNHO CONSTITUCIONAL EXAMINADA NO TRIBUNAL "A QUO". IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO DO APELO EXCEPCIONAL.

1. Agravo Regimental interposto contra decisão que, com base no art. 544, § 2º, CPC entendeu não emprestar caminhada a agravo de instrumento intentado para fazer subir recurso especial, negando-lhe, assim, provimento.

2. Acórdão a quo que julgou procedente ação mandamental para fins de autorizar a recorrida a compensar o crédito presumido de IPI com o crédito a recolher ao final do processo industrial, em face da não-cumulatividade do tributo (art. 153, § 3º, II, da CF/88).

3. Ausência do necessário prequestionamento, visto que os dispositivos legais indicados como afrontados não foram abordados, em nenhum momento, no âmbito do voto-condutor do aresto hostilizado, quer implícita ou explicitamente.

4. Não se conhece de recurso especial quando a decisão atacada basilou-se, como fundamento central, em matéria de cunho eminente constitucional, com alicerce, ainda, em decisões proferidas pela Excelsa Suprema Corte.

5. Agravo regimental improvido.

52. No ponto que interessa. A rescisória ajuizada no TRF 2 voltou-se contra os aspectos infraconstitucionais. Como essa matéria não foi conhecida no STJ, o órgão competente era o Tribunal a quo. No caso das questões constitucionais, a ação foi proposta no órgão competente: o STF.

53. Veja-se a ementa do acórdão dessa aludida Ação Rescisória n. 2003.02.01.005675-8 (redator para acórdão Des. Fed. Poul Erik Dyrlund, J. 09.12.2004):

RESCISÓRIA. COMPENSAÇÃO CRÉDITO PRESUMIDO IPI. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMILATIVIDADE.

1 - Na seara, da análise da pretensão, colhe-se que a mesma se desdobra em duas vertentes: a) - "A questão da decadência do direito de repetir – ou aproveitar, em compensação, valores impagos por IPI – anteriormente a cinco anos da data do ajuizamento do pedido." b) - "A questão de mérito: a impossibilidade de se repetir ou compensar o que, a título de IPI, não se pagou.Como sabemos, a empresa sustentou em seu processo original que tinha direito à compensações ou repetições de créditos do IPI, mesmo que não houvesse pago a exação nas aquisições de mercadorias que adquiriu nos últimos dez anos por serem insumos ou isentos, ou atingidos por não-incidência ou, ainda, taxados com alpiquota zero. Disse impor-se tais compensações ou restituições por força do princípio da não-cumulatividade do IPI, insculpido no art.153, § 3º., II, da CF/88."

2 - No que concerne ao primeiro aspecto, entendo assim razão à parte autora, pois que a jurisprudência dos Tribunais Superiores, de há muito, se fixou na orientação de ser o prazo, in casu, qüinqüenal, regido pelo Decreto 20.910/32.

3 -Quanto ao segundo ângulo, a questão, quando de prolação de decisão rescindenda, ainda não havia se pacificado, o que atrai os verbetes nos. 134, da Súmula do extinto Tribunal Federal de Recursos, e 343, da Súmula do Supremo Tribunal Federal, conforme se extrai, v.g. do RE 212484, DJ 27/11/98, julgado pelo Plenário, por maioria de votos.

4 - Julgo parcialmente procedente o pedido rescisório, com despesas processuais, e honorários compensados.

54. Do relatório desse acórdão extrai-se elucidativa passagem:

Trata-se de ação rescisória interposta pela UNIÃO FEDERAL/FAZENDA NACIONAL objetivando desconstituir o acórdão da 3ª Turma, que tem a seguinte ementa:

"PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.

l. Embargos de declaração interpostos com fundamento no art. 535, I do CPC, com o objetivo de suprir contradição entre datas do termo inicial para compensação de crédito presumido de IPI.

2.Induzido o julgador a erro a partir de equívoco de digitação na peça postulatória, mas constando da mesma menção ao período correto para a incidência do provimento judicial, é possível a alteração do conteúdo decisório em sede de embargos de declaração, sanando o conflito existente entre os fundamentos do acórdão e o seu decisum.

3.Embargos de declaração providos para, integrando o acórdão de fls. 206, reconhecer o alcance do direito à compensação do crédito presumido de IPI, garantido pela procedência do pedido, pelo período de dez anos, de julho de 1988 a julho de 1998."

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55. Fácil de ver que a insurgência se dá em relação às questões infraconstitucionais. É fora de toda dúvida que não poderia na rescisória proposta perante o STF, em face de agravo de instrumento em recurso extraordinário, que feriu matéria constitucional, rescindir decisão de mérito infraconstitucional. Eis a razão do ajuizamento de outra ação rescisória. Não houve má-fé, mas zelo da Fazenda Nacional.

56. Se isso não bastasse, o CPC, no art. 17, elenca as sete hipóteses taxativas da litigância de má-fé e em nenhuma delas se encarta a conduta da Fazenda Nacional. Diz a Lei que reputa-se litigante de má-fé aquele que:

I – deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;

II – alterar a verdade dos fatos;

III – usar do processo para conseguir objetivo ilegal;

IV – opuser resistência injustificada ao andamento do processo;

V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;

VI – provocar incidentes manifestamente infundados; e

VII – interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.

57. Ademais, a litigância de má-fé pressupõe conduta dolosa, sabidamente ilícita e com o objetivo de causar prejuízo à outra parte, bem como desrespeitadora do Judiciário. Essa conduta propositada e ilícita não pode ser imputada à Fazenda Nacional.

58. Em arremate, a Fazenda Nacional entende inaceitável a injuriosa imputação de litigância de má-fé, seja porque cabível a ação rescisória perante o TRF 2 em face dos aspectos infraconstitucionais, seja porque a sua conduta não foi dolosa nem se enquadra nas taxativas hipóteses legais da litigância de má-fé.


VI. CONCLUSÃO

59. Tenha-se presente que o não cabimento da presente ação rescisória implicará violação ao magno princípio constitucional da igualdade, porquanto a Empresa será a única empresa no Brasil que gozará do inconstitucional creditamento de IPI nas hipóteses de produtos não-tributados ou tributados à alíquota zero.

60. É fora de toda a dúvida que uma das missões constitucionais do STF é a unidade do direito constitucional e a igual aplicação desse direito para todos. Além disso, haverá um desequilíbrio na concorrência, pois as demais empresas não terão esse benefício, o que causará danos à ordem econômica concorrencial.

61. Ora, decisões do STF não podem gerar injustiças. E aqui injustiça como desigualdade de tratamento em relação aqueles que estão em situações iguais. Seria injusto que por motivos procedimentais a Demandada não sofresse a mesma sorte de todos os demais contribuintes/litigantes. Esse, obviamente, não é o escopo do processo. Não faz parte da sagrada missão do Pretório Excelso a efetivação das injustiças.

62. Por derradeiro, a Fazenda Nacional acertou em suas opções processuais e, sobretudo, de que o direito encontra-se ao seu lado, mormente em face de todos os precedentes recordados neste texto, tanto nas questões de mérito (Creditamento de IPI – produtos não-tributados ou tributados à alíquota zero, RREE ns. 353.657 e 370.682) quanto nos aspectos processuais ensejadores do cabimento e conhecimento da presente Ação Rescisória (formalismo excessivo que afeta a prestação jurisdicional, erro no pedido que não gera nulidade, nem causa o não-provimento e supremacia e autoridade da jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal, RREE ns. 312.538 e 395.662).

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Sobre o autor
Luís Carlos Martins Alves Jr.

LUIS CARLOS é piauiense de Campo Maior; bacharel em Direito, Universidade Federal do Piauí - UFPI; orador da Turma "Sexagenária" - Prof. Antônio Martins Filho; doutor em Direito Constitucional, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; professor de Direito Constitucional; procurador da Fazenda Nacional; e procurador-geral da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA. Exerceu as seguintes funções públicas: assessor-técnico da procuradora-geral do Estado de Minas Gerais; advogado-geral da União adjunto; assessor especial da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência da República; chefe-de-gabinete do ministro de Estado dos Direitos Humanos; secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; e subchefe-adjunto de Assuntos Parlamentares da Presidência da República. Na iniciativa privada foi advogado-chefe do escritório de Brasília da firma Gaia, Silva, Rolim & Associados – Advocacia e Consultoria Jurídica e consultor jurídico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. No plano acadêmico, foi professor de direito constitucional do curso de Administração Pública da Escola de Governo do Estado de Minas Gerais na Fundação João Pinheiro e dos cursos de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, da Universidade Católica de Brasília - UCB do Instituto de Ensino Superior de Brasília - IESB, do Centro Universitário de Anápolis - UNIEVANGÉLICA, do Centro Universitário de Brasília - CEUB e do Centro Universitário do Distrito Federal - UDF. É autor dos livros "O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras", "Memória Jurisprudencial - Ministro Evandro Lins", "Direitos Constitucionais Fundamentais", "Direito Constitucional Fazendário", "Constituição, Política & Retórica"; "Tributo, Direito & Retórica"; e "Lições de Direito Constitucional".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES JR., Luís Carlos Martins. Rescisória contra decisão já recorrida: erro sanável.: Creditamento de IPI: insumos não tributados ou tributados a alíquota zero. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1573, 22 out. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16808. Acesso em: 22 nov. 2024.

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