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Dono de casa com "gato" é condenado por litigância de má-fé

20/07/2008 às 00:00
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O juiz considerou que a instalação seria de responsabilidade do proprietário da residência e que o corte da energia se deu para evitar riscos à vida dos pedestres. Além de julgar improcedente a pretensão – impondo ao autor a responsabilidade pelo pagamento das custas e honorários advocatícios –, foi aplicada pena por litigância de má-fé no equivalente a 20% do valor atribuído à causa.

Processo -nº 075.07.008268-0

Classe -REPETIÇÃO DO INDÉBITO / ORDINÁRIO

Autor -[AUTOR]

-CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A.

Vistos etc.

Cuida-se de ação de REPETIÇÃO DO INDÉBITO / ORDINÁRIO, onde o ceramista [AUTOR] alega que em 16/06/2005 "recebeu em sua residência uma equipe técnica da Celesc, que lá se encontrava com a finalidade de apurar a existência ou não de irregularidade na medição de energia em sua residência, o vulgo `gato´" (fl. 02). Então, "crente na regularidade de sua instalação, feita por eletricista contratado para tanto, até ajudou a equipe a cavar os buracos para a verificação da linha subterrânea" (fl. 02), tendo sido surpreendido pela conclusão de que havia efetiva irregularidade no ramal de fornecimento, o que ensejou notificação no sentido de que enquanto não fossem quitadas "as diferenças no valor anteriormente adimplido e a padronização da instalação, nos termos exigidos pela empresa", poderia ter o fornecimento de energia elétrica suspenso, o que de fato efetivou-se.

Destarte, exaltando ter sido coagido por esta medida, [AUTOR] salientou que "viu-se obrigado a realizar as adequações ao padrão exigido pela Ré, quais sejam a colocação de poste particular e quadro de medição externo", ajustando a quitação do débito unilateralmente apontado, de R$ 2.865,91 (dois mil, oitocentos e sessenta e cinco reais e noventa e um centavos), em 24 (vinte e quatro) parcelas mensais adequadas a seu orçamento. Não bastasse isso, além de ter sido criminalmente acusado da prática de `furto de energia´ – optando, em razão de alegado desamparo jurídico, pela `suspensão condicional do processo´ – acentuou que a média de consumo considerada pela CELESC para o cálculo do valor devido, teria observado dados incorretos, visto que "nos meses que antecederam a vistoria da Celesc o autor e sua esposa permaneciam por pouco tempo em sua residência", já que sua esposa "passou por um sério problema de saúde, permanecendo maior parte do tempo na casa de sua mãe" (fl. 03), e que mesmo após a regularização da instalação, o consumo permaneceu semelhante àquele verificado antes do ilícito, o autor pugnou pela condenação da CELESC à restituição, em dobro, do valor `indevidamente´ pago, mais o ressarcimento das despesas com a adequação física da linha de transmissão, e, por fim, indenização por alegado dano de cunho moral que aduz ter sido vítima, em valor sugerido de R$ 28.659,10 (vinte e oito mil, seiscentos e cinqüenta e nove reais e dez centavos), deferindo-se-lhe o benefício da assistência judiciária gratuita (fls. 02/13).

Intimado a comprovar a alegada hipossuficiência (fl. 28), [AUTOR] apresentou o contra-cheque emitido pela [EMPRESA] S/A. (fls. 34/37).

Então, concedido o benefício da gratuidade, foi ordenada a citação da CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A. (fl. 38), que, em contestação, verberou os fatos e argumentos manejados na inicial, exaltando que o próprio [AUTOR] teria acostado aos autos "prova documental suficiente a demonstrar a conduta ilícita por ele praticada [...], qual seja, um desvio de energia elétrica antes da medição, o que fazia com que parte da carga consumida na sua residência não fosse registrada pelo relógio medidor" (fl. 43). Desta forma, se teria apresentado como legítima a suspensão do fornecimento até que as irregularidades fossem sanadas e satisfeito o débito apontado, tudo nos termos do contido na Resolução nº 456/2000, da ANEEL-Agência Nacional de Energia Elétrica.

De outro vértice, considerando que mesmo ao se conceder guarida à indemonstrada afirmação de que o autor desconhecia a fraude – o que vai de encontro ao disposto no art. 932, do CC –, há que se concluir que dela tirou proveito, dispondo ilicitamente de energia para atender à demanda de seu lar, inexistindo qualquer falha no procedimento adotado, a CELESC garantiu ter concedido ao consumidor todos os meios e recursos para a defesa de seu respectivo interesse, tendo o autor, por fim, expressamente assumido a responsabilidade pelo ilícito constatado.

Assim, sendo, especialmente em razão do contido na Lei Federal nº 8.631/93, regulamentada pelo Decreto nº 774/93, a pugnou pelo inacolhimento do pleito contido na inicial, refutando a incidência do disposto no art. 42, da Lei nº 8.078/90, com a condenação do autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios devidos aos patronos por si própria constituídos, subsidiariamente conclamando a módica fixação de eventual `quantum´ indenizatório (fls. 41/64).

Na réplica (fl. 120), o autor refutou os argumentos manejados pela CELESC, reiterando a pretensão deduzida (fls. 123/125), após o que, proferido despacho saneador, foi determinada a intimação dos litigantes, para que especificassem eventuais provas a serem produzidas (fl. 126), seguindo-se a apresentação, pela ré, de rol de testemunhas (fl. 129), com a designação de audiência de instrução e julgamento, na forma do disposto no art. 331, § 3º, do CPC (fl. 130), oportunidade em que foi unicamente colhido o depoimento pessoal de [SUPERVISOR] – supervisor de utilização de energia da CELESC – (fls. 145/146), com a oitiva dos informantes [ELETRICISTA 1] (fls. 147/148) e [ELETRICISTA 2] (fl. 149).

Encerrada a instrução do feito, foram apresentadas as alegações finais na forma oral (fls. 143/144), vindo-me os autos conclusos para decisão (fl. 150 vº).

É o relato do essencial, na forma do estatuído no art. 458, inc. I, do CPC, motivo pelo qual passo, de imediato, à fundamentação, consoante enunciado no inc. II, do normativo sobredito, destacando a inexistência de preliminares argüidas (art. 301, do CPC).

Cuida-se de ação de REPETIÇÃO DO INDÉBITO / ORDINÁRIO, onde o ceramista [AUTOR] alega que em 16/06/2005, teria acompanhado a inspeção levada a efeito por uma equipe de técnicos da CELESC, que constatou a existência de um ramal paralelo de fornecimento instalado antes do medidor de consumo, circunstância que motivou a suspensão do fornecimento até que fossem honradas "as diferenças no valor anteriormente adimplido e a padronização da instalação, nos termos exigidos pela empresa", mais a instauração de processo crime pela prática de `furto de energia´.

Todavia, acentuando que a média de consumo considerada pela demandada para o cálculo do valor devido, teria observado dados incorretos, apresentando-se nitidamente excessiva e incongruente com a demanda energética verificada após a regularização do ramal interno de fornecimento, [AUTOR] pugna pela condenação da CELESC à restituição, em dobro, do valor `indevidamente´ pago, mais o ressarcimento das despesas com a adequação física da linha de transmissão, e, por fim, indenização por alegado dano de cunho moral que aduz ter sido vítima, em valor sugerido de R$ 28.659,10 (vinte e oito mil, seiscentos e cinqüenta e nove reais e dez centavos – fls. 02/13).

Resistindo à pretensão, a CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A. sobressaiu que o próprio autor teria acostado aos autos "prova documental suficiente a demonstrar a conduta ilícita por ele praticada [...], qual seja, um desvio de energia elétrica antes da medição, o que fazia com que parte da carga consumida na sua residência não fosse registrada pelo relógio medidor" (fl. 43), ressaltando que seu procedimento diante da fraude teria observado o disposto na Resolução nº 456/2000, da ANEEL-Agência Nacional de Energia Elétrica. Ademais, segundo referiu, [AUTOR] efetivamente desfrutou de consumo incompatível com a respectiva contraprestação pecuniária, o que legitimaria o procedimento de recálculo e imposição de pagamento, tendo-lhe sido concedida oportunidade para exercer o contraditório e a ampla-defesa, motivo pelo qual – invocando o contido na Lei Federal nº 8.631/93, regulamentada pelo Decreto nº 774/93 – pugnou pelo inacolhimento do pleito contido na inicial, refutando a incidência do disposto no art. 42, da Lei nº 8.078/90, com a condenação do autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios devidos aos patronos por si própria constituídos, subsidiariamente conclamando a módica fixação de eventual `quantum´ indenizatório (fls. 41/64).

A fim de solucionar a controvérsia, passo, de imediato, à análise da prova produzida na audiência de instrução e julgamento, destacando que – além de não ter comparecido ao ato – [AUTOR] sequer apresentou testemunhas ao juízo (fls. 143/144), evidenciando absoluta falta de interesse em demonstrar a veracidade dos fatos alegados na inicial.

Já a CELESC, por intermédio de [SUPERVISOR] – seu supervisor de utilização de energia – revelou que "uma vizinha fez denúncia para a CELESC, que havia um suposto desvio de energia na casa do autor; então, foi aberto um Boletim de Fiscalização e a equipe formada por [ELETRICISTA 1] e [ELETRICISTA 2] deslocou-se até a casa do autor para efetuar a referida fiscalização; lá foi constatado um desvio de energia antes do medidor: é o popular `gato´", especificando que este procedimento pode ser levado a efeito por "um contratado pelo cliente, ou até o próprio cliente, que entende de eletricidade", que "vai até lá, antes do medidor, rompe o eletroduto (cano plástico) e puxa a "fase" e o "neutro", e aí está feito o `gato´".

Segundo [SUPERVISOR], "toda a energia que passar neste fio `gato´, não vai passar pelo medidor, mascarando o consumo de energia". Constatando que "aparentemente, [AUTOR] era ladrão de energia [...] suspenderam o fornecimento de energia [...], pois a medição ficava sem proteção". Na oportunidade, "[ELETRICISTA 1] e [ELETRICISTA 2], com o auxílio do próprio [AUTOR], cavaram a entrada de energia e verificaram o desvio de energia", salientando que diante disso, "[AUTOR] dizia desconhecer o tal desvio, mas, segundo o próprio [AUTOR], ele havia contratado um eletricista para fazer o padrão de entrada de energia; só que o padrão estava irregular, com desvio".

Com a segurança de quem exerce a função há já 2 (duas) décadas, [SUPERVISOR] assegurou que, em seu entender, "ou o próprio [AUTOR] fez o desvio ou pagou algum eletricista para fazê-lo, ou, ainda, pode ter comprado a residência com o tal desvio", exaltando, por fim, que "quando um cliente é pego desviando energia, logo após que é descoberto o desvio, ele tenta reduzir ao máximo seu consumo, para, com isso, dizer que o que estava gastando anteriormente era correto", mas ainda assim, "depois de retirado o desvio, o consumo do autor aumentou" (fls. 145/146).

No mesmo rumo, [ELETRICISTA 2] – eletricista da CELESC – ressaltou que "receberam uma denúncia sobre a ligação clandestina do sr. [AUTOR]; o denunciante, que não se identificou, morava nas proximidades". Então, "o declarante e seu colega [ELETRICISTA 1] deslocaram-se até o local e vistoriaram a caixa de medição e o medidor, constatando que estavam corretos". Passados alguns dias, "receberam uma nova denúncia, da mesma pessoa, dizendo que havia uma ligação clandestina no ramal de ligação e que era subterrânea; essa ligação ia até a casa de [AUTOR] sem proteção e podia ocorrer um acidente com terceiros, podendo tirar a vida de alguém por choque elétrico, por não ter isolamento especializado para subterrâneo (1.000 Volts)".

Então, considerando que esta espécie de fraude poderia ocasionar "um curto circuito e danificar a rede, caindo um cabo energizado, queimando eletrodomésticos de todos os consumidores ligados neste transformador; poderia ocasionar também um incêndio na casa de [AUTOR], pois ficava sem proteção", diligenciaram no sentido preventivo de "desconectar o ramal de [AUTOR] da rede", momento em que "puxaram o cabo", constatando que "o cabo neutro estava livre e o cabo fase não vinha: estava trancado" dentro do eletroduto.

Investigando as causas do ocorrido, constataram que "[AUTOR] botou o tal `gato´ no meio do vão, tendo aberto o eletroduto e feito a derivação dali", acentuando que "[AUTOR] poderia ter morrido eletrocutado ao ter aberto o eletroduto e ter feito a derivação com a rede energizada", concluindo que "com certeza [AUTOR] deve ter cavado o passeio público para colocar o `gato´; se acontecesse um curto circuito no local, da derivação para a frente, como o cabo ficou delimitado ao transformador, o cabo nu da rede da CELESC poderia cair e matar outras pessoas" (fl. 149).

Por fim, [ELETRICISTA 1] – técnico industrial da CELESC – noticiou que "estiveram 02 (duas) vezes na casa de [AUTOR], através de uma denúncia, feita por uma moradora do bairro" de que lá existiria um `gato´, ou seja, quando "o cliente fazia um desvio de energia para diminuir o consumo". Destacando que "na primeira vez que estiveram na casa do autor, fiscalizaram toda a medição, nada tendo sido encontrado", exaltou que "a vizinha denunciante encontrou o declarante no meio do caminho e disse que não tinham descoberto o tal "gato", pois ele estava bem escondido". Portanto, "na semana seguinte, retornaram até o local e resolveram cavar de "fora à fora", desde o poste até o medidor", salientando que "para surpresa do declarante e deu seu colega [ELETRICISTA 2], encontraram, próximo ao poste da CELESC, na calçada do vizinho, um desvio de energia", causando espanto o fato de "o autor ter feito o desvio de energia próximo ao poste da CELESC, que se encontra em frente a casa do vizinho", salientando que "talvez [AUTOR] soubesse que esse é um método utilizado que a CELESC não procura, pois quando o desvio é subterrâneo, geralmente existe uma caixa de passagem no "pé do poste" e outra próxima à medição; isto facilita que os fios sejam movimentadas e se percebe caso haja alguma irregularidade". Todavia, "no caso do [AUTOR], não existe nenhuma caixa de passagem, razão pela qual resolveram "cavar o chão", tendo sido encontrado o desvio".

Com experiência de 25 (vinte e cinco) anos na função de técnico industrial da CELESC, o informante asseverou que "o tal desvio aparentava ter já aproximadamente uns 03 (três) anos de existência", destacando que "foi um serviço muito mal feito, com risco de morte, visto que todo cabo subterrâneo deve ter duplo isolamento, mas ao ser instalado o desvio, houve rompimento do isolamento do cabo e foi colocado um cabo inadequado para fazer o desvio", e que "no caso de [AUTOR], como era direto na terra, ali, num dia de chuva, poderia ter fuga de energia e matar alguém, um terceiro, inclusive alguém da própria família de [AUTOR], pois o local era uma área pública; inclusive a tal vizinha denunciante referiu que o próprio [AUTOR] gozava da comunidade, rindo dos outros, dizendo que pagavam mais energia elétrica do que ele e que ele tinha feito um "gato"" (fls. 147/148).

Destaca a doutrina que "dentro do livre convencimento motivado (art. 131), a prova testemunhal não é mais nem menos importante do que os outros meios de probatórios [...] Nas hipóteses comuns, o valor probante da testemunha será aferido livremente por meio do cotejo com as alegações das partes e com os documentos, perícias e mais elementos do processo" (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de processo civil. v. 1. 26. ed. Forense, 1999. p. 466).

Acerca da validade da prova testemunhal, colhe-se da jurisprudência do TJSC que "de acordo com o princípio da persuasão racional, o Magistrado apreciará livremente as provas produzidas, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes, obrigando-se, todavia, a expor claramente as razões de seu convencimento." (TJSC - AC 00.020945-7 - 3ª C.Cív. - Rel. Des. Silveira Lenzi - Julgado em 28.11.2000), mais, "a regra geral, em tema de ônus da prova, consagrada pelo art. 333, I, do CPC, é a mesma estatuída por Paulo, compilada por Justiniano, segundo a qual a prova incumbe a quem afirma e não a quem nega a existência de um fato (Dig. XXII, 3,2). Incumbe, portanto, ao autor demonstrar em juízo a existência do ato ou fato por ele descrito na inicial como ensejador do seu direito. "Se a prova técnica não fornece sinais e dados técnicos que possa levar o juiz a formar um convencimento seguro, a solução da causa é de ser encontrada na prova testemunhal. Sendo conflitante a prova testemunhal produzida pelas partes, a improcedência do pedido se impõe." (Ap. Cív. nº 33.217, da Capital, rel. Des. Nestor Silveira, in JC 66/354)" (TJSC - AC 97.015845-9 - 4ª C.Cív. - Rel. Des. Pedro Manoel Abreu - Julgado em 01.06.2000).

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A percuciente análise da prova oral não deixa dúvidas acerca da irregularidade constatada no medidor de consumo de energia elétrica instalado na residência de [AUTOR], e, do mesmo modo, depreende-se que a violação do eletroduto foi proposital, resultando daí, o ininterrupto abastecimento de energia elétrica sem a correspondente quantificação de consumo, com o que, [AUTOR] obteve vantagem pecuniária indevida, ocasionado prejuízo à CELESC.

As gravuras de fls. 75/79, bem comprovam a técnica e dimensão do ilícito, que, consoante já referido pelos profissionais inquiridos, poderia ter acarretado a morte de terceiros por eletrocussão...

A irresponsabilidade, aliás, foi noticiada ao autor, por meio do documento de fl. 11, que lhe concedia prazo para recorrer da decisão que fixou o valor retroativo apurado (fl. 18).

A todo momento [AUTOR] sustenta que a fraude teria sido realizada pelo eletricista por ele próprio contratado, mas sem o seu conhecimento, o que, convenhamos, revela-se por demais inverossímil!

Não creio que um profissional capacitado a operar com sistemas e instalações elétricas desconheça as regras e procedimentos de segurança estabelecidos pela CELESC, e muito menos que fosse realizar um desvio ilícito do ramal de fornecimento, viabilizando consumo de energia sem a respectiva medição, desprovido do conhecimento e anuência do contratante de sua mão-de-obra.

Conferindo legitimidade ao procedimento adotado pela , extrai-se do documento acostado à fl. 14, que o autor teve imediata ciência da constatação da fraude de energia, consignando o aludido documento que a equipe técnica da CELESC verificou, na ocasião, a existência de "um desvio antes da medição", em decorrência do que [AUTOR] foi formalmente comunicado da "suspensão do fornecimento em sua instalação de energia elétrica", bem como de que deveria comparecer no escritório da concessionária "no prazo de 03 (três) dias úteis" (fl. 14).

Conclusão: o autor teve imediata ciência do motivo da interrupção do fornecimento; foi convocado a comparecer aos escritórios da CELESC, onde todos os esclarecimentos certamente foram-lhe prestados, e demonstrou ter exercido o direito de defesa por meio do recurso de fl. 10.

Na inicial, refere a inexistência de contraditório e ampla defesa, mas a prova documental por ele próprio encartada aos autos, revela que exerceu a defesa de seu interesse na esfera extrajudicial !

Evidente que o ceramista [AUTOR] objetiva com a presente demanda apenas afastar a obrigação de honrar o pagamento da penalidade quantificada pela CELESC, o que, em decorrência da gravidade da irregularidade constatada, merece rechaço !

Não bastasse isso, o argumento de que faturamento complementar seria arbitrário, por ter inobservado reduzido consumo de sua família, igualmente deve ser repudiado, visto que o singelo compulsar do documento de fl. 18, revela que foi efetuada uma minudente análise dos equipamentos existentes na residência, com a especificação da demanda energética instalada, aplicando-se fator de carga e demanda nos 25 (vinte e cinco) meses que antecederam a constatação do embuste, disto resultando o débito de R$ 2.865,91 (dois mil, oitocentos e sessenta e cinco reais e noventa e um centavos).

Muito embora [AUTOR] tenha comprovado o distúrbio psíquico de sua esposa (fls. 19/26), não comprovou que ambos estivessem residindo com a sogra, deixando de apresentar qualquer testemunha de tal circunstância, sequer comparecendo à audiência de instrução e julgamento.

À toda evidência, o furto de energia elétrica já vem de longa data, o que permite concluir que desde muito tempo, [AUTOR] vem obtendo vantagem própria em prejuízo da concessionária do serviço público, o que implica necessário inacolhimento do pleito contido na inicial !

O art. 72, da Resolução nº 456/2000, preceitua que `constatada a ocorrência de qualquer procedimento irregular cuja responsabilidade não lhe seja atribuível e que tenha provocado faturamento inferior ao correto, ou no caso de não ter havido qualquer faturamento, a concessionária adotará as seguintes providências: I - emitir o "Termo de Ocorrência de Irregularidade", em formulário próprio, contemplando as informações necessárias ao registro da irregularidade, tais como: a) identificação completa do consumidor; b) endereço da unidade consumidora; c) código de identificação da unidade consumidora; d) atividade desenvolvida; e) tipo e tensão de fornecimento; f) tipo de medição; g) identificação e leitura(s) do(s) medidor(es) e demais equipamentos auxiliares de medição; h) selos e/ou lacres encontrados e deixados; i) descrição detalhada do tipo de irregularidade; j) relação da carga instalada; l) identificação e assinatura do inspetor da concessionária; e m) outras informações julgadas necessárias; II - promover a perícia técnica, a ser realizada por terceiro legalmente habilitado, quando requerida pelo consumidor; III - implementar outros procedimentos necessários à fiel caracterização da irregularidade; IV - proceder a revisão do faturamento com base nas diferenças entre os valores efetivamente faturados e os apurados por meio de um dos critérios descritos nas alíneas abaixo, sem prejuízo do disposto nos artigos 73, 74 e 90: a) aplicação do fator de correção determinado a partir da avaliação técnica do erro de medição causado pelo emprego dos procedimentos irregulares apurados; b) na impossibilidade do emprego do critério anterior, identificação do maior valor de consumo de energia elétrica e/ou demanda de potência ativas e reativas excedentes, ocorridos em até 12 (doze) ciclos completos de medição normal imediatamente anteriores ao início da irregularidade; e c) no caso de inviabilidade de utilização de ambos os critérios, determinação dos consumos de energia elétrica e/ou das demandas de potência ativas e reativas excedentes por meio de estimativa, com base na carga instalada no momento da constatação da irregularidade, aplicando fatores de carga e de demanda obtidos a partir de outras unidades consumidoras com atividades similares´.

De tal preceito, depreende-se que o faturamento retroativo efetuado pela CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A. encontra amparo em normativo adequado, tendo sido procedido na forma de estimativa, com base na carga instalada no momento da constatação da irregularidade, aplicando fatores de carga e de demanda obtidos a partir de outras unidades consumidoras com atividades similares (fl. 18), o que, `in casu´, revela-se possível e mesmo recomendável.

Não bastasse isso, o art. 73, da Resolução nº 456/2000, prevê que `nos casos de revisão do faturamento, motivada por uma das hipóteses previstas no artigo anterior, a concessionária poderá cobrar o custo administrativo adicional correspondente a, no máximo, 30% (trinta por cento) do valor líquido da fatura relativa à diferença entre os valores apurados e os efetivamente faturados. Parágrafo único. Sem prejuízo da suspensão do fornecimento prevista no artigo 90, o procedimento referido neste artigo não poderá ser aplicado sobre os faturamentos posteriores à data da constatação da irregularidade, excetuado na hipótese de auto-religação descrita no inciso II, artigo 74´.

Assim, compreendo que a conta lançada à fl. 18, representa adequada imposição de responsabilidade, respeitando o estatuído no art. 31, da Lei nº 8.987/95, republicada no DOU de 28/09/1998, segundo o qual `incumbe à concessionária: [...]; IV - cumprir e fazer cumprir as normas do serviço e as cláusulas contratuais da concessão;´ [...], o que necessariamente compreende a responsável e racional administração da demanda energética.

Curioso, ainda, que [AUTOR] tenha, durante 10 (dez) meses, silenciado acerca da significativa variação do consumo de energia elétrica (entre 27 e 126 Kwh), quando estava obrigado, por força do disposto no inc. IV, do art. 7º, da Lei nº 8.987/95, a `levar ao conhecimento do poder público e da concessionária as irregularidades de que tenham conhecimento, referentes ao serviço prestado´.

Em razão de tal incongruência, revela-se percuciente a transcrição de precioso ensinamento da lavra de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, qual seja, que "embora abstrata, a ação não é genérica, de modo que, para obter a tutela jurídica, é indispensável que o autor demonstre uma pretensão idônea a ser objeto da atividade jurisdicional do Estado. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. Forense, 12. ed., 1994. v. 1. p. 51).

Após detidamente compulsar a prova encartada aos autos, compreendo adequada a transcrição de magnífico raciocínio professado por DARCI GUIMARÃES RIBEIRO, para quem "é natural, provável, que um homem não julgue sem constatar o juízo com as provas que lhe são demonstradas. Quando o autor traz um fato e dele quer extrair conseqüências jurídicas, é que, via de regra, o réu nega em sentido geral as afirmações do autor; isto gera uma litigiosidade, que, por conseqüência lógica, faz nascer a dúvida, a incerteza no espírito de quem é chamado a julgar. Neste afã de julgar, o juiz se assemelha a um historiador, na medida em que procura reconstituir e avaliar os fatos passados com a finalidade de obter o máximo possível de certeza, pois o destinatário direto e principal da prova é o juiz. Salienta MOACYR A. SANTOS que também as partes, indiretamente, o são, pois igualmente precisam ficar convencidas, a fim de acolherem como justa a decisão. Para o juiz sentenciar é indispensável o sentimento de verdade, de certeza, pois sua decisão necessariamente deve corresponder à verdade, ou, no mínimo, aproximar-se dela. Ocorre recordar que a prova em juízo tem por objetivo reconstruir historicamente os fatos que interessam à causa, porém há sempre uma diferença possível entre os fatos, que ocorreram efetivamente fora do processo e a reconstrução destes fatos dentro do processo. Para o juiz não bastam as afirmações dos fatos, mas impõem-se a demonstração da sua existência ou inexistência, na medida em que um afirma e outro nega, um necessariamente deve ter existido num tempo e num lugar, i.e., uma de ambas as afirmações é verdadeira. Daí dizer com toda a autoridade J. BENTHAM que "el arte del proceso no es esencialmente otra cosa que el arte de administrar las pruebas´´".

Segue o mestre afirmando que "o problema da verdade, da certeza absoluta, repercute em todas as searas do direito. A prova judiciária não haveria de escapar desses malefícios oriundos dessa concepção, tanto isto é certo que para o juiz sentenciar é necessário que as partes provem a verdade dos fatos alegados, segundo se depreende do art. 332 do Código de Processo Civil" [...], e mais adiante sintetiza que "por objeto da prova se entende, também, que é o de provocar no juiz o convencimento sobre a matéria que versa a lide, i.e., convencê-lo de que os fatos alegados são verdadeiros, não importando a controvérsia sobre o fato, pois um fato, mesmo não controvertido, pode influenciar o juiz ao decidir, na medida que o elemento subjetivo do conceito de prova (convencer) pode ser obtido, e. g., mediante um fato notório, mediante um fato incontroverso", destacando que [...] "a parte não está totalmente desincumbida do ônus da prova de uma questão de direito, na medida que cada qual quer ver a sua alegação vitoriosa devendo, por conseguinte, convencer o juiz da sua verdade" e conclui destacando que "o juiz julga sobre questões de fato com base no que é aduzido pelas partes e produzido na prova." (RIBEIRO, Darci Guimarães. Tendências modernas da prova. RJ n. 218. dez-1995. p. 5).

Aplicando o precioso ensinamento à situação vertente, têm-se que [AUTOR] não nega a existência de fraude na medição de consumo, apesar de negar a autoria do delito; classifica a conduta administrativa da CELESC como arbitrária, na medida em que alega ter-lhe sido negado o direito ao contraditório e à ampla defesa. Todavia, expressamente demonstrou ter oferecido defesa em processo administrativo.

Classifica, ainda, como ilegal a imediata suspensão do fornecimento, quando o art. 90, da Resolução nº 456/2000, determina que `a concessionária poderá suspender o fornecimento, de imediato, quando verificar a ocorrência de qualquer das seguintes situações: I - utilização de procedimentos irregulares referidos no artigo 72;´ [...].

Não vislumbro, pois, qualquer ilicitude no procedimento adotado pela concessionária do serviço público, o que, necessariamente, importa no inacolhimento do frágil e temerário pleito deduzido na inicial.

Sabe-se que, na sistemática do CPC, o ônus da prova, preconizado no seu art. 333, inc. I, estabelece que incumbe ao autor provar fato constitutivo do seu direito. Doutrinando acerca do assunto, acentua o emérito HUMBERTO THEODORO JÚNIOR que "não há um dever de provar, nem à parte assiste o direito de exigir a prova do adversário. Há um simples ônus, de modo que o litigante assume o risco de perder a causa se não provar os fatos alegados e do qual depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar através da tutela jurisdicional. Isto porque, segundo a máxima antiga, fato alegado e não provado é o mesmo que fato inexistente" (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 12. ed. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 411).

Da mesma forma, observa o festejado Moacyr Amaral Santos que "como a simples alegação não é suficiente para formar a convicção do juiz (allegatio et non probatio quasi non allegatio), surge a imprescindibilidade da prova da existência do fato. E dada a controvérsia entre o autor e os réus, com referência ao fato e às suas circunstâncias, impondo-se, pois, prová-lo e prová-las, decorre o problema de saber a quem incumbe dar a sua prova. A quem incumbe o ônus da prova? Esse é o tema que se resume na expressão - ônus da prova" (Santos, Moacyr Amaral. Primeiras linhas do direito processual civil. 17. ed. 2. v. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 343-344). Fornecendo a resposta, registra o mestre à pág. 345, que "incumbe o ônus da prova a quem diz, ou afirma, ou age. Ora, que vem a juízo, em primeiro lugar, é o autor; quem inicia a lide é o autor; quem afirma o fato é o autor. Donde tudo parecia mostrar, como corolário imediato daquele preceito, que ao autor cumpria o ônus da prova: actori incumbit ônus probandi", e, ao depois, adita que "o critério para distinguir a qual das partes incumbe o ônus da prova de uma afirmação - ensina CARNELUTTI - é o do interesse da própria afirmação. Cabe provar - escreve ele - a quem tem interesse de afirmar; portanto, quem apresenta uma pretensão cumpre provar-lhe os fatos constitutivos e quem fornece a exceção cumpre provar os fatos extintivos ou as condições impeditivas ou modificativas" (p. 347).

Por igual, anotam os brilhantes Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery que "segundo a regra instituída por Paulo, compilada por Justiniano, a prova incumbe a quem afirma e não a quem nega a existência de um fato (Dig. XXII, 3, 2). O autor precisa demonstrar em juízo a existência do ato ou fato por ele descrito na inicial como ensejador do seu direito" (Nery Júnior, Nelson; Nery, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado. RT, 1994. p. 516).

A respeito, tem decidido nosso egrégio TRIBUNAL DE JUSTIÇA que "sustentando-se o direito em fatos, aquele que invoca arca com o ônus da prová-los. Faltando consistência objetiva ao pedido do autor, inarredável é a improcedência da prestação jurisdicional" (ACV nº 44.087, de Campo Erê, rel. Des. Francisco Oliveira Filho). "O autor precisa demonstrar em juízo a existência do ato ou fato por ele descrito na inicial como ensejador do seu direito, sob pena de, não o fazendo, ver inacolhida a sua pretensão" (ACV nº 96.000425-4, da Capital, rel. Des. Eder Graf), e, ainda "ao autor, por evidente, incumbe o ônus da prova do fato constitutivo do seu direito. Não logrando prová-lo satisfatoriamente, a pretensão não pode ser acolhida" (AC nº 1997. 007426-3, Des. Pedro Manoel Abreu), e, por fim, "o ônus da prova incumbe ao autor, quanto aos fatos por ele alegados e dos quais depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar através da tutela jurisdicional, a teor do art. 333, I, do CPC. Não se desincumbindo do ônus probandi, é de ser rejeitado o pedido de reparação de danos decorrentes de acidente automobilístico" (AC nº 2000.010900-2, Des. Luiz Carlos Freyesleben).

Assim, por entender não ter restado demonstrada a percuciência do Direito perseguido por [AUTOR], julgo improcedente a pretensão contida na inicial, o que encontra arrimo no precioso acórdão de julgamento das Apelações Cíveis nº 2006.034005-0 e nº 2006.034006-7, de onde infere-se, à identidade da presente demanda, que "o ponto de embaraço cinge-se na possibilidade da suspensão do fornecimento de energia elétrica face à apuração de irregularidades com a imposição de pagamento do montante apurado administrativamente. Infere-se dos autos que, na data de 12.06.02 realizou-se no estabelecimento da apelada inspeção rotineira com intuito de fiscalizar as instalações elétricas, constatando-se irregularidades respectivas ao relógio medidor do consumo de energia elétrica, bem como à segmentação do "fio que alimenta uma das três bobinas de potência". As verificações mencionadas restaram consignadas no Termo de Ocorrência de Irregularidade juntado à fl. 54, assinado por representante da autora, que acompanhou o procedimento e sobejou ciente do condicionamento da religação da unidade consumidora ao pagamento "das diferenças apuradas, e sanadas as deficiências técnicas", assim como notificado para apresentar-se no escritório de atendimento da CELESC no prazo de 1 (um) dia. Ali, a concessionária elaborou a memória descritiva dos cálculos do valor apurado pertinente às irregularidades constatadas (fl. 55). A par desse procedimento, o funcionário responsável pela inspeção registrou Boletim de Ocorrência n. 1910/02, relatando o ocorrido, restando a conduta tipificada como furto de energia elétrica (fl. 38). Pois bem. A legislação que ampara a interrupção da prestação do serviço e a fixação de pena pecuniária na hipótese é taxativa, valendo mencionar textualmente o conteúdo do § 3º do art. 6º da Lei n. 8.987/95 e dos artigos 72, 78, inc. IV e 90, todos da Resolução n. 456/00 da ANEEL, que analisados sistematicamente permitem concluir pela legitimidade da conduta da concessionária [...]. Decorre de previsão legislativa, portanto, a conduta adotada pela concessionária, respeitando, como está provado, o contraditório e o devido processo administrativo".

Seguem os magnânimos integrantes da superior instância destacando que "os julgados, aliás, não discrepam ao concluir que: "1. Constatada a alteração do medidor com o rompimento do lacre, é justo o corte no fornecimento de energia elétrica, caso não seja quitado o débito existente, independentemente de notificação ou aviso prévio. "2. Não se caracteriza como descontinuidade do serviço de fornecimento de energia elétrica a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso quando por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade" (Lei 8.987/95, art. 6º, § 3º)." (AC n. 2005.033315-5, de Chapecó, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros). Mais: "Comprovada a fraude no relógio medidor em razão da violação do lacre e defeito no disco responsável pelo registro do consumo da energia elétrica, pode a empresa concessionária de energia suspender o serviço de fornecimento de energia, se não for pago o valor do consumo arbitrado, após garantidos o contraditório e a ampla defesa, no âmbito administrativo." (AC n. 2005.000872-6, de Lages, rel. Des. Jaime Ramos). "Se é lícito suspender o fornecimento de energia elétrica a usuário inadimplente, por mais razão o é em relação àquele que frauda o medidor e se recusa a pagar o valor da diferença entre os KW registrados e os provavelmente consumidos, apurados de acordo com os critérios estabelecidos na Resolução 456/2000, da ANEEL." (AC n. 2005.020103-0, de Lages, rel. Des. Newton Trisotto). Ainda: "É lícito à empresa concessionária do serviço de fornecimento de energia elétrica exigir o adimplemento de consumo não aferido corretamente em razão de defeito no equipamento de medição ou por eventual fraude engendrada pelo consumidor. "A apuração desse valor, entretanto, não pode ser aleatória, devendo, sob pena de invalidade, pautar-se pelo regramento ditado nos atos normativos expedidos pelos órgãos competentes." (AC n. 2001.01116-0, de Itajaí, rel. Des. Newton Janke). Inúmeros precedentes deste Tribunal seguem essa posição, valendo destacar: ACMS n. 2005.019720-5, de Joinville, rel. Des. Francisco Oliveira Filho; AC 2003.020328-1, de Araranguá e AC n. 2005.043067-9, de Tubarão, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros; ACMS n. 2005.034219-2, de Joinville e AC n. 2005.021608-6, de Lages, rel. Des. Rui Fortes; dentre outros".

Mais adiante, prosseguem avultando que "o valor apresentado pela apelante, resultou de comando legal expresso no art. 72, inc. IV, alínea "b" da Resolução n. 456/00 da ANEEL, do que a apelada foi devidamente cientificada, mas não se insurgiu na esfera administrativa. Assim sendo, forçoso concluir pela reforma da r. sentença, ante à legalidade da atuação da CELESC ao interromper o fornecimento de energia elétrica e impor pena pecuniária à apelada, efetivamente constatada a fraude nas instalações da unidade consumidora" (Apelações Cíveis nº 2006.034005-0 e nº 2006.034006-7, da Comarca de São José. 3ª Câmara de Direito Público. Rel. Desª. Sônia Maria Schmitz. Julgado em 31/10/2006).

Em razão da absoluta identidade dos precedentes sobreditos, desnecessária maior dilação argumentativa para concluir pela improcedência do pleito contido na inicial.

Por fim, tendo pleno conhecimento de tudo o que foi deduzido e encartado aos autos, tenho para mim que a pretensão deduzida na inicial constitui, efetivamente, circunstância tipificadora de litigância de má-fé, visto que ao apresentar os fatos na presente demanda, o ceramista [AUTOR] silenciou acerca de elementos imprescindíveis ao conhecimento da real situação de fato, alterando a verdade dos fatos, objetivando a mera obtenção de vantagem pecuniária indevida, para isto dispondo os argumentos de forma a direcionar a atuação jurisdicional.

Desta forma, a pretensão contida na inicial encontra-se maculada pelo reprovável intento do autor em dispor dos meios judiciais para resistir ao lídimo dever de honrar a obrigação pecuniária que lhe cabe, por ter fraudado a medição do consumo de energia elétrica, nos termos da legislação própria.

Insofismavelmente implementada, pois, a circunstância preceituada nos incisos II e III, do art. 17, do CPC, quais sejam, ´alterar a verdade dos fatos´ e `usar do processo para conseguir objetivo ilegal´, estando o Juiz, portanto, de ofício, ou a requerimento, autorizado a condenar a litigante de má-fé a indenizar à parte contrária os prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e as despesas que efetuou (art. 18, do mesmo `codex´).

Sobre a utilização e manuseio do direito, de forma a caracterizar a litigância de má-fé, ensina JOSÉ MANOEL M. BERNAL que "o uso normal é aquele que não excede as necessidades normais da vida, sendo contraposição equilibrada de interesses sociais e morais em jogo, emergentes de situações concretas em determinado lugar e época, o exercício anormal de um direito seria a exceção, pois na maioria das vezes o ordenamento é respeitado e o critério da anormalidade seria sempre objetivo em todas as doutrinas, pois poderia ser conceituado como desvio do fim econômico e social, intenção de prejudicar, rompimento do equilíbrio de interesses individuais e coletivos" (BERNAL, José Manuel Martin. ´El abuso del derecho´. Madrid: Editorial Montevorco, 1982. p. 221-224).

JOSÉ OLÍMPIO DE CASTRO FILHO, em relação ao dever de veracidade pontua que "se não se apresenta ou se apresenta ilicitamente, normalmente a premissa (fato), abusa do direito de demandar, porque, sem aquela, a conclusão silogística (sentença) é juridicamente impossível. O abuso, uso anormal, indevido, então, consiste em pretender convocar alguém a juízo para discutir o que não existe (fato não proposto) ou que existe de modo diverso (fato produto da alteração da verdade). Por outro lado, também aí existe abuso porque ao Estado (Juiz) pode ser pedida a prestação jurisdicional acerca de um fato e de fato exposto verazmente" (CASTRO FILHO, José Olímpio de. Abuso do direito no processo civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1960).

ALFREDO BUZAID, na Exposição de Motivos do Código de Processo Civil (nº 17) referiu que "posto que o processo civil seja de sua índole, eminentemente dialético, é reprovável que as partes se sirvam dele, faltando ao dever da verdade, agindo com deslealdade e empregando artifícios fraudulentos; porque tal conduta não se compadece com a dignidade de um instrumento que o Estado põe à disposição dos contendores para atuação do direito e realização da justiça. Tendo em conta estas razões ético jurídicas, definiu o projeto como dever das partes: a) expor os fatos em juízo conforme a verdade; b) proceder com lealdade e boa-fé; c) não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento; d) não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou defesa do direito (art. 17). E, em seguida, dispôs que "responde por perdas e danos todo aquele que pleitear de má-fé, como autor, réu ou interveniente" (art. 19). No art. 20 prescreveu: "Reputa-se litigante de má-fé aquele que: a) deduzir pretensão ou defesa, cuja falta de fundamento não possa razoavelmente desconhecer; b) alterar intencionalmente a verdade dos fatos; c) omitir intencionalmente fatos essenciais ao julgamento da causa; d) usar do processo com o intuito de conseguir objetivo ilegal; e) opuser resistência injustificada ao andamento do processo; f) proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; g) provocar incidentes manifestamente infundados."

A boa-fé no processo deve presidir a atividade das partes no processo: lealdade e honestidade. A idéia de boa-fé está ligada ao próprio conceito e à finalidade do processo: é elemento constitutivo do conceito e condição necessária de sua finalidade.

ROSENBERG afirma que "a relação jurídica processual impõe a todos que a compõem deveres, direitos e obrigações, e que em relação às partes não há um dever de atuar, recebendo as conseqüências de sua inércia ou rebeldia, porém, quando atuam devem fazê-lo honestamente, não faltando à verdade e não retardando o procedimento, têm "o dever de uma condução processual conveniente e cuidadosa" (ROSENBERG. ´apud´ OLIVEIRA, Ana Lúcia Iucker Meirelles de. Litigância de má-fé. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 43).

O art. 17, do CPC, elenca as hipóteses de atos atentatórios à dignidade da Justiça. Tendo o ceramista [AUTOR] alterado a verdade dos fatos, omitindo circunstâncias essenciais ao julgamento da demanda, movimentando a máquina judiciária a seu bel prazer, segundo sua conveniência – não atendendo aos objetivos sociais do processo – é de ser condenado à pena por litigância de má-fé, visto que seu ato deve ser considerado como atentatório à dignidade da Justiça.

O art. 18, do CPC, que regra a aplicação pecuniária da condenação pela litigância de má-fé, no entender de ANA LÚCIA IUCKER MEIRELLES DE OLIVEIRA, pode ser interpretado da seguinte forma: "se o juiz afere a conduta ímproba e a parte prejudicada não alega prejuízos materiais, a indenização é devida pelos danos morais, pois o litigante foi atingido no seu direito de ter um processo pautado pela probidade, e ainda, a indenização tem caráter nitidamente sancionador; pode, então, o juiz estabelecer, desde logo, a sanção em até 21% do valor da causa: 1% a título de multa e 20% a título de indenização. Do mesmo modo, se o prejudicado comprova prejuízos em valor a menor que o percentual mencionado, o juiz pode condenar de imediato até aquele valor, além da multa" (´in´ Litigância de má-fé. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000).

Assim, com arrimo no estatuído em os artigos 16, 17, 18 e 18, § 2º, todos do CPC, tenho por bem cominar ao autor pena por litigância de má-fé no percentual de 20% (vinte por cento), calculado sobre o valor atribuído à causa, devidamente corrigido.

Posto isto, considerando, ainda, o mais que dos autos consta – especialmente os princípios gerais de Direito aplicáveis à espécie – com fundamento nos arts. 269, inc. I, 333, inc. I, 458, inc. III, 796 e 807, do CPC, arts. 36, 72, 73 e 90, da Resolução nº 456/2000, arts. 7 e 31, estes da Lei nº 8.987/95, julgo improcedente o pedido deduzido contra a CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A., visto que [AUTOR] ´alegatio et non probatio´ fato constitutivo de seu respectivo direito.

De outro vértice, na forma do disposto no art. 20, § 4º, do CPC, condeno-o ao pagamento tanto das respectivas custas processuais, bem como dos honorários advocatícios devidos aos patronos da demandada, no valor de R$ 3.152,50 (três mil, cento e cinqüenta e dois reais e cinqüenta centavos), monetariamente corrigido a contar do ajuizamento da ação (03/08/2007 - fl. 02), acrescido dos juros de mora a contar do respectivo trânsito em julgado, declarando, entretanto, suspensa a exigibilidade imediata dos encargos, na forma do disposto no art. 12, da Lei nº 1.060/50.

Por fim, com arrimo em o disposto no art. 17, incs. II e III, c/c. o art. 18, ambos do CPC, vai o autor condenado a pagar à CELESC, pena por litigância de má-fé, arbitrada em 20 % (vinte por cento) do valor atribuído à pretensão, monetariamente corrigido, acrescido de juros de mora a contar do trânsito em julgado.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Tubarão, 14 de julho de 2008.

Luiz Fernando Boller

JUIZ DE DIREITO

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BOLLER, Luiz Fernando. Dono de casa com "gato" é condenado por litigância de má-fé. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1845, 20 jul. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/jurisprudencia/16859. Acesso em: 26 abr. 2024.

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