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Ação de nulidade de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM)

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09/04/2021 às 15:27
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A modalidade de empréstimo consignado via cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM) concedida a servidores públicos, aposentados e pensionistas é muito utilizada por instituições financeiras. O problema é que na maioria das vezes o consumidor contrata essa modalidade, pensando tratar-se de empréstimo consignado tradicional, quando na verdade não é, e a dívida nunca terá fim, diante de cláusulas ilegais e abusivas, passíveis de indenização por dano moral, além de restituição em dobro. Confira o modelo de ação para nulidade de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM) com pedido de tutela antecipada para suspender os descontos em folha ou benefício.

EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE CHAPECÓ - SC

TUTELA DE URGÊNCIA

AUTOR..., brasileiro..., estado civil..., aposentado, inscrito no RG n..., e CPF..., residente e domiciliado na Rua..., número..., Bairro..., Cidade..., UF..., CEP..., endereço eletrônico...., vem, a presença de Vossa Excelência, por seu advogado, propor AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RCM) E INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA CUMULADA COM RESTITUIÇÃO DE VALORES EM DOBRO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL em face de BANCO..., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n..., com sede na Av. Paulista, n..., Bairro..., São Paulo/SP, CEP..., pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.


1. DA JUSTIÇA GRATUITA

O art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal garante que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.

A respeito da referida norma, Alexandre de Moraes ensina:

A Constituição Federal, ao prever o dever do Estado em prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, pretende efetivar diversos outros princípios constitucionais, tais como igualdade, devido processo legal, ampla defesa, contraditório e, principalmente, pleno acesso à Justiça. Sem assistência jurídica integral e gratuita aos hipossuficientes, não haveria condições de aplicação imparcial e equânime de Justiça. Trata-se, pois, de um direito público subjetivo consagrado a todo aquele que comprovar que sua situação econômica não lhe permite pagar os honorários advocatícios, custas processuais, sem prejuízo para seu próprio sustento ou de sua família.1

Para o Emérito Des. Ricardo Roesler:

A justiça gratuita não deve ser concedida apenas àqueles em estado de miserabilidade de fato, até mesmo porque a lei de regência não exige comprovação da penúria de quem postula o benefício. A norma determina, apenas, a demonstração de que o requerente não possui condições de arcar com as despesas processuais, sem que para isso tenha que comprometer, ou modificar, a manutenção regular do seu cotidiano, representando um verdadeiro sacrifício; é a hipossuficiência técnica2 .

Acontece, que o Autor possui despesas mensais inadiáveis como financiamento de veículo, empréstimos consignados, aluguel, alimentação, vestuário, transporte, plano de saúde, medicamentos, luz, água, telefone, gás, e outras despesas de manutenção, que consomem toda a sua remuneração líquida mensal, razão pela qual afirma ser pessoa juridicamente necessitada, não podendo arcar com o pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios sem prejuízo do próprio sustento e de sua família, requerendo portanto, com fundamento no art. 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal e no art. 98. e seguintes do Código de Processo Civil, a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.


2. DOS FATOS

O Autor, servidor público estadual, buscou o Réu em 18.11.2014 com a finalidade de obtenção de empréstimo consignado tradicional, mas restou nitidamente ludibriado com a realização de outra operação, qual seja, contração de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM), porém, sem nunca receber o cartão de crédito. Todavia, teve creditado (via TED) em sua conta bancária, em razão dessa operação, o valor de R$ 1.795,84.

Essa modalidade de empréstimo, funciona da seguinte maneira: o banco credita na conta bancária do requerente ─ antes mesmo do desbloqueio do aludido cartão e sem que seja necessária a sua utilização ─ o valor solicitado, e o pagamento integral é enviado no mês seguinte sob a forma de fatura. Se o requerente pagar integralmente o valor contraído, nada mais será devido. Não o fazendo, porém, como é de se esperar, será descontado em folha apenas o VALOR MÍNIMO desta fatura e, sobre a diferença, incidem encargos rotativos, evidentemente abusivos.

Desde modo, o valor a ser pago no mês seguinte ao da obtenção do empréstimo é o valor TOTAL da fatura, isto é, o valor total obtido de empréstimo, acrescido dos encargos e juros. Esse pagamento deve ocorrer por duas vias: o mínimo pela consignação (desconto em folha) e o restante por meio de fatura impressa enviada à residência do consumidor com valor integral.

Como dificilmente aquele que busca empréstimo consignado ─ como é o caso do Autor ─ tem condições de adimplir o valor total já no mês seguinte, incidirão em todos os meses subsequentes juros elevados sobre o valor não adimplido. Além disso, o desconto via consignação leva o cliente a ilusão de que o empréstimo está sendo adequadamente quitado.

Em verdade o cartão de crédito (plástico) contratado nem chega a ser encaminhado para o endereço do consumidor, tampouco as faturas ou informações detalhadas do débito.

Ocorre que, a ilegalidade da contratação realizada normalmente só vem à tona quando o cliente percebe, após anos de pagamento, que o tipo de contratação realizada não foi a solicitada e ainda, QUE NÃO HÁ PREVISÃO PARA O FIM DOS DESCONTOS.

In casu, o Autor realizou o empréstimo de R$ 1.795,84 em 18.11.2014, e até 21.02.2019 adimpliu o montante de R$ 4.215,59, e não há previsão de termino. Atualmente, o valor descontado em folha, é na média de R$ 90,00 conforme extrai-se dos contracheques (todos acostos).

Em outras palavras, a dívida nunca será paga, vez que os descontos mensais abatem apenas os juros e encargos da dívida, gerando, assim, descontos por prazo indeterminado, e portanto, como ainda irão incidir juros e encargos, esse valor nunca será abatido.

Excelência, é certo que nenhum consumidor aceitaria realizar a contração de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM), se não fosse ludibriado e induzido ao erro dolosamente. Neste ponto, resta claro, que nunca a parte autora quis contratar cartão de crédito algum e, ainda que essa fosse sua intenção, o Réu jamais prestou qualquer informação a respeito da constituição da reserva de margem consignável (RMC), tão pouco, enviou as faturas do referido cartão ao endereço do Autor, possibilitando a amortização total do débito.

Portanto, o termo de adesão é visivelmente nulo, pois viola os direitos do Autor consumidor, especialmente aqueles relacionados à informação e à transparência das relações de consumo, além de ser omisso quanto às informações vitais para o mínimo de entendimento da avença por parte do cliente, pois, não há indicação do número de parcelas; data de início e de término das prestações; do custo efetivo com e sem a incidência de juros; etc.

Além do mais, o termo de adesão firmado com o Réu contêm práticas abusivas vedadas pelo CDC, pois tal como formuladas, geraram parcelas infindáveis e pagamentos que irão ultrapassar facilmente 3 vezes o valor inicialmente obtido, constituindo vantagem manifestamente excessiva e onerosa ao Autor, razão pela qual faz-se necessária a obtenção de tutela jurisdicional.


3. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

3.1. DA APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Preambular, é de ressaltar que tratam-se de questões afeitas às relações de consumo, justificando a escolha desse foro para apreciá-la, a teor do art. 101, I do Código de Defesa do Consumidor (CDC), prevendo a possibilidade de propositura desta demanda no domicílio do Autor porquanto reconhecidamente hipossuficiente.

Dispõe a Constituição Federal de 1988 (CF/88) em seu artigo 5º, inciso XXXII, que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”. A defesa de seus direitos é, portanto, garantia constitucional.

Dessa forma, por meio da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, o Estado Brasileiro instituiu o CDC, que regulamenta as formas de proteção do consumidor, com normas de ordem pública e interesse social, em consonância com a CF/88.

Entre os direitos básicos previstos no CDC está à garantia de reparação dos danos patrimoniais e morais, o acesso à justiça e a inversão do ônus da prova em favor do consumidor, nos termos do artigo 6º, incisos VI, VII e VIII.

Cumpre destacar, em relação ao art. 6º, VIII, do CDC, que o Autor encontra-se em nítida desvantagem em relação ao Réu, o que por si só autoriza a inversão do ônus probandi, uma vez que se trata de aplicação do direito básico do consumidor, inerente à facilitação de sua defesa em juízo.

Sobre a relação de consumo, as partes enquadram-se nos conceitos de consumidor e fornecedor conforme dispõem os arts. 2º e 3º do CDC, vez que o Autor é consumidor final e o Réu instituição financeira, nos termos da Súmula 297 do STJ.

Sendo assim, inexistem maiores dificuldades em se concluir pela aplicabilidade do referido Código, visto que este corpo de normas pretende aplicar-se a todas as relações desenvolvidas no mercado brasileiro que envolvam um consumidor e um fornecedor.

Portanto, re quer desde logo que o caso seja analisado e julgado sob o prisma da relação de consumo, deferindo-se em favor do Autor o benefício da inversão do ônus da prova consoante artigo 6º, VIII, do CDC, ante a manifesta hipossuficiência técnica e financeira em relação ao Réu.

3.2. DA VIOLAÇÃO AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

A modalidade de empréstimo consignado via contração de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM) é marcada por abusividade, vez que o Réu, deliberadamente, impõe ao Autor o pagamento mínimo da fatura mensal, o que para ele é vantajoso, já que enseja a aplicação, por muito mais tempo, de juros e demais encargos contratuais, sem data final de pagamento.

Nesse diapasão, o CDC considera tal situação abusiva, in verbis:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério.

Ao tecer comentário acerca do inciso I do art. 39, a Professora Cláudia Lima Marques:

Tanto o CDC como a Lei Antitruste proíbem que o fornecedor se prevaleça de sua superioridade econômica ou técnica para determinar condições negociais desfavoráveis ao consumidor. Assim, proíbe o art. 39, em seu inciso I, a prática da chamada venda "casada", que significa condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço. O inciso ainda proíbe condicionar o fornecimento, sem justa causa, a limites quantitativos. A jurisprudência assentou que a prática de venda casada não pode ser tolerada, pois apenas os limites quantitativos é que podem ser valorados como justificados ou com justa causa.3

A despeito dos incisos V e XII do art. 39, restam violados porquanto o Réu já exigiu do Autor, quantia muito superior à contratada, sem estipular data de início e fim para pagamento das parcelas. Evidente essa abusividade flagrante dispensa ensinamentos doutrinários.

O Autor, diante da necessidade, apenas buscou contrair um empréstimo consignado, mas como dito, restou ludibriado, por práticas abusivas e sórdidas cometidas pelo Réu. A jurisprudência já apreciou milhares de casos assim:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TOGADO DE ORIGEM QUE JULGA IMPROCEDENTES OS PEDIDOS DEDUZIDOS NA EXORDIAL. IRRESIGNAÇÃO DA AUTORA. [...] CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). DESCONTOS REALIZADOS DIRETAMENTE DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA REQUERENTE, PESSOA HIPOSSUFICIENTE E COM PARCOS RECURSOS. CONTEXTO PROBATÓRIO QUE INDICA QUE A AUTORA PRETENDIA FORMALIZAR APENAS CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. INEXISTÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE VONTADE QUANTO À CELEBRAÇÃO DE AJUSTE DE CARTÃO DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO À UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO E TAMPOUCO DO SEU ENVIO PARA O ENDEREÇO DA CONSUMIDORA. PRÁTICA ABUSIVA CONFIGURADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 39 , INCISOS I , III E IV DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR . PRECEDENTES DESTE AREÓPAGO. SENTENÇA REFORMADA. [...]

(Apelação Cível n. 0300073-36.2018.8.24.0029, Rel. Des. José Carlos Carstens Köhler, j. em 26/6/2018) (sem grifos no original)

Convêm pôr em relevo, que o Réu afigura à contração de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM) como sendo um empréstimo consignado normal, quando de fato, não é! Registre-se que a publicidade enganosa é definida pelo CDC como:

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

1º É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza , características, qualidade, quantidade, propriedades, origem , preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

[...]

3º Para os efeitos deste código , a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço .

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A despeito do r. artigo, leciona Rizzatto Nunes:

A primeira leitura nos remete ao problema do “dado essencial”. A lei diz que a publicidade é enganosa por omissão quando deixa de informar sobre dado essencial do produto ou serviço: “Para os efeitos deste Código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço” (§ 3º do art. 37). [...] constrói-se um conceito de essencial naquilo que importa à publicidade. E, nessa linha, é de dizer que essencial será aquela informação ou dado cuja ausência influencie o consumidor na sua decisão de comprar, bem como gere um conhecimento adequado do uso e consumo do produto ou serviço, “realmente”, tal como são.4

Logo, vez que não se tem dúvida de que a intenção do Autor, era a de simples empréstimo consignado, a de contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM) se mostra abusiva, e, portanto, nula, nos termos do art. 51, IV, e § 1º, III, do CDC:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade ;

§ 1º. Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso .

Resta mencionar, que o Réu trata a contração de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM) como sendo um Termo de Adesão. Pois bem, o § 3º do art. 54 do CDC dispõe:

§ 3º. Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor.

Clarividente é, a violação ao CDC praticada pelo Réu, porquanto o referido termo de adesão, sequer expressa o número de parcelas; data de início e de término das prestações.

3.3. DA VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO NA FASE PRÉ CONTRATUAL

Outra constante na realização do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável – RMC é a ausência de informações mínimas acerca da data de início e de término das parcelas referentes à obtenção do empréstimo e das taxas de juros aplicadas ao contrato, o que viola o disposto pelo Código de Defesa do Consumidor em seu art. 52:

Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor , o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo previa e adequadamente sobre:

I - preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;

II – montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros;

III – acréscimos legalmente previstos;

IV – número e periodicidade das prestações;

V – soma total a pagar, com e sem financiamento.

No termo de adesão assinado pelo Autor, não constam informações quanto à data de início e de término das parcelas, percentual de juros, nem tampouco valor total de pagamento em razão do acréscimo de juros. E se assim o é, deve incidir a regra disposta no art. 46. do CDC:

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores , se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

Não obstante, jamais foi enviado qualquer cartão de crédito ao endereço do Autor, tampouco as faturas destinadas à amortização do saldo devedor que sobejasse após o descontado mensal sobre o seu subsídio.

Evidente, pois, que o contrato sob análise afronta direitos básicos do Autor como consumidor, em especial por estabelecer desvantagem manifestamente excessiva, em clara violação ao dever de informação insculpido no art. 52. do CDC. Impõe-se, então, reconhecer a nulidade do negócio jurídico em questão, com o consequente retorno das partes ao seu status quo ante.

3.4. DA NULIDADE DA CONTRAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RCM)

Os danos causados ao Autor são oriundos do vício existente no negócio jurídico chamado “dolo”. Trata-se de um vício em que uma das partes da relação jurídica induz a outra ao erro, causando-lhe um dano. Todo negócio jurídico que possui como fato gerador o dolo é anulável nos termos do art. 145. do Código Civil:

Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa.

O final do artigo supra demonstra a necessidade em que um negócio jurídico para ser anulado por dolo faz-se necessário que este elemento tenha sido sua causa. No caso em questão, o Autor, com certeza, não teria aceitado um contrato tão adverso, se não fosse levado a cometer tal erro, por isso, vale destacar também o artigo 147 do Código Civil:

Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado.

O CDC, em seu art. 6º prevê ser um dos direitos básicos do Consumidor a prestação que as informações sobre o produto ou serviço devam ser adequadas e claras, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentarem, além de proteção contra práticas e cláusulas abusivas no fornecimento de produtos e serviços.

No caso em comento, restou evidenciado que o Autor não possuía informação clara sobre o serviço que estava adquirindo. Não sabia que aquele contrato de crédito consignado que acreditava estar assinando, era na verdade um contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM), IMPAGÁVEL.

Não sabia ele, igualmente, que a parcela debitada mensalmente em seus contracheques era apenas uma forma de adimplemento mínimo, incapaz de amortizar a dívida original, em flagrante violação à publicidade enganosa e falta de informação.

Neste sentido, o Emérito Desembargador Robson Luz Varella, durante a relatoria da Apelação Cível n. 0301292-89.2018.8.24.0092, da Capital – Bancário registrou que:

Sobre essas duas modalidades de mútuo bancário, o Banco Central do Brasil define como "empréstimo consignado aquele cujo desconto da prestação é feito diretamente em folha de pagamento ou benefício previdenciário. A consignação em folha de pagamento ou de benefício depende de autorização prévia e expressa do cliente à instituição financeira concedente" ( https://www.bcb.gov.br/pre/bc_atende/port/consignados.Asp ).

Já a jurisprudência esclarece que no empréstimo por intermédio de cartão de crédito com margem consignável, coloca-se"à disposição do consumidor um cartão de crédito de fácil acesso ficando reservado certo percentual, dentre os quais poderão ser realizados contratos de empréstimo . O consumidor firma o negócio jurídico acreditando tratar-se de um contrato de empréstimo consignado, com pagamento em parcelas fixas e por tempo determinado, no entanto, acaba por aderir a um cartão de crédito, de onde é realizado um saque imediato e cobrado sobre o valor sacado, juros e encargos bem acima dos praticados na modalidade de empréstimo consignado, gerando assim, descontos por prazo indeterminado [...]" (Tribunal de Justiça do Maranhão, Apelação Cível n. 043633, de São Luis, Rel. Cleones Carvalho Cunha).

Ressalte-se que a prática abusiva e ilegal difundiu-se, atingindo escala significativa de aposentados e pensionistas, tendo como consequência o ajuizamento de inúmeras ações , inclusive visando tutelar o direito dos consumidores coletivamente considerados, a fim de reconhecer a nulidade dessa modalidade de desconto via "RMC" .

O "modus operandi" utilizado pelas instituições financeiras foi assim descrito pelo Núcleo de Defesa do Consumidor da defensoria Pública do Estado do Maranhão, na ação civil pública ajuizada pelo órgão na defesa dos interesses dos "aposentados e pensionistas do INSS" :

O cliente busca o representante do banco com a finalidade de obtenção de empréstimo consignado e a instituição financeira, nitidamente, ludibriando o consumidor, realiza outra operação - a contratação de cartão de crédito com RMC . "Assim, na folha de pagamento é descontado apenas um pequeno percentual do valor obtido por empréstimo e o restante desse valor é cobrado através de fatura de cartão de crédito, com incidência de juros duas vezes mais caros que no empréstimo consignado normal. ( https://condege.org.br/noticias/473-ma-defensoria-promove-ação-civil-pública-contrabancos-por-ilegali ... )

A jurisprudência firmada em ocasião do julgamento supra foi a seguinte:

[...] DEMANDA OBJETIVANDO A DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO POR MEIO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) - ACIONADO QUE DEFENDEU A LEGALIDADE DOS DESCONTOS EFETUADOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA - ATO ILÍCITO CONFIGURADO - DEDUÇÃO A TÍTULO DE CONSIGNAÇÃO VIA CARTÃO DE CRÉDITO JAMAIS UTILIZADO PELA CONSUMIDORA - PRÁTICA ABUSIVA - VASTO CONJUNTO PROBATÓRIO A DERRUIR A TESE DEFENSIVA - EXTRATOS QUE EVIDENCIAM A AUSÊNCIA DE ABATIMENTO DO MONTANTE DO MÚTUO - INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 6º, III, E 39, V, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - POSSIBILIDADE DE READEQUAÇÃO DA AVENÇA CONVENCIONADA PARA A MODALIDADE INICIALMENTE PRETENDIDA, QUAL SEJA, DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PURO E SIMPLES - RECLAMO PROVIDO NO CAPÍTULO. A prática abusiva e ilegal de contrair modalidade de empréstimo avesso ao objeto inicialmente pactuado é conduta infensa ao direito, sobretudo quando a instituição financeira, ao difundir seu serviço, adota medida anômala ao desvirtuar o contrato de mútuo simples consignado, modulando a operação via cartão de crédito com reserva de margem. Ao regular seus negócios sob tal ótica, subverte a conduta que dá esteio as relações jurídicas, incidindo em verdadeira ofensa aos princípios da transparência e da boa fé contratual, situando o consumidor em clara desvantagem, provocando, por mais das vezes, a cobrança de valores reconhecidamente descabidos e infundados, gerando toda sorte de injusto endividamento. Na hipótese, constata-se devidamente demonstrada a consignação ilegal da reserva de margem consignável (RMC) em cartão de crédito jamais utilizado pela demandante. Assim, em observância à pretensão expressamente externada na exordial, determina-se a readequação da contratação para a modalidade inicialmente pretendida, qual seja, de empréstimo consignado puro e simples. [...]

(TJSC, Apelação Cível n. 0301292-89.2018.8.24.0092, da Capital, rel. Des. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 20-11-2018).

Quando a Instituição Financeira omite que o valor descontado no contracheque é insuficiente para amortizar a dívida, incorre com propaganda enganosa, induzindo o cliente a erro, uma atitude claramente criminosa nos termos do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva.

Pena: Detenção de três meses a um ano e multa.

Portanto, a desvirtuação do contrato de empréstimo buscado pelo Autor para um cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM), implica em ofensa aos princípios da transparência e da boa-fé, além de caracterizar abusividade, colocando o consumidor em franca desvantagem ao gerar um endividamento sem termo final, e portanto, é nulo!

3.5. TAXA DE JUROS MUITO SUPERIOR ÀQUELA DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL

Conforme restou demonstrado, o Autor, após ser ludibriado à contração de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM), recebeu via TED em sua conta bancária, a quantia de R$ 1.795,84 em 18.11.2014, cujo desconto atual no contracheque é de aproximadamente R$ 90,00, e sem previsão de término.

Ocorre, que o Autor já adimpliu a quantia estarrecedora de R$ 4.215,59, pelos mesmo R$ 1.795,84 que recebeu à época do empréstimo, ou seja, os juros, encargos e taxas cobradas pelo Réu, são notadamente abusivas, e muito acima da média de mercado.

Ocorre que, a taxa média de juros para crédito pessoal consignado na data da contratação pelo Autor, conforme divulgado pelo Banco Central do Brasil para o Réu, era, de 2.06% a.m., totalizando 27,74% a.a.

Após longa discussão tanto na doutrina quanto na jurisprudência, consolidou-se o entendimento de que os juros remuneratórios somente possuem caráter abusivo, desde que ultrapassada a taxa média de mercado à época do contrato, tomando como base a lista divulgada pelo Banco Central do Brasil que dispõe sobre as taxas médias de juros cobradas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. CONSUMIDOR QUE PRETENDIA OBTER EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EFETIVAÇÃO DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC. DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DESTINADOS AO PAGAMENTO MÍNIMO INDICADO NA FATURA DO CARTÃO. TAXA DE JUROS INCOMPATÍVEIS COM A ESPÉCIE CONSIGNADA . PRÁTICA ABUSIVA. ADEQUAÇÃO DA MODALIDADE CONTRATUAL QUE SE IMPÕE. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. DANO MORAL PRESUMIDO. DEVER DE INDENIZAR. REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

(TJSC, Apelação Cível n. 0301908-34.2017.8.24.0081, de Xaxim, rel. Des. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 22-11-2018).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. TERMO DE ADESÃO A CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM AUTORIZAÇÃO PARA DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. RESERVA DE MARGEM DE CARTÃO DE CRÉDITO (RMC) DESCONTADO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA. TAXA DE JUROS ACIMA DAQUELA PRATICADA NO MERCADO PARA CRÉDITO CONSIGNADO A APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO INSS. PRÁTICA ABUSIVA. ARTIGO 39 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR . NULIDADE RECONHECIDA. ADEQUAÇÃO DO AJUSTE À VONTADE MANIFESTADA DO CONSUMIDOR. CONVERSÃO DO CONTRATO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, COM A OBSERVÂNCIA DOS ENCARGOS PREVISTOS PARA OPERAÇÕES DE CRÉDITO PESSOAL CONSIGNADO A APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO INSS. ABATIMENTO NO SALDO DEVEDOR DOS VALORES DESCONTADOS. [...]

(Apelação Cível n. 0300459-71.2018.8.24.0092, Rel. Des. Jânio Machado, j. em 23/8/2018 )

Assim, à luz do entendimento que vem sendo adotado, a revisão dos contratos financeiros, tem como base para aferição de abusividade a média de juros praticados pelo mercado, que difere em muito daquela imposta ao Autor.

3.6. DANO MORAL CARACTERIZADO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS

De início resta evidente que o Autor não pretendia contratar o cartão de crédito oferecido pelo Réu, em que pese tenha autorizado os descontos sobre o limite da margem consignável em seu contracheque, que, como se percebe, só serviram para efetuar o pagamento mínimo das faturas mensais do cartão de crédito, com abatimento quase insignificante do saldo devedor.

Outrossim, a jurisprudência é pacífica no que tange à responsabilidade objetiva da instituição financeira, ou seja, esta responde, independentemente da caracterização de culpa, pelos danos causados ao consumidor, sendo suficiente a comprovação do dano (in reipsa) e do nexo de casualidade.

Assim, estando evidente a conduta ilícita da instituição financeira (venda casada de cartão de crédito e reserva de margem consignável) e o dano moral (desvirtuar contrato de empréstimo consignado e submeter o consumidor à dívida impagável), resta caracterizado o nexo de causalidade, uma vez que a falha na prestação de serviço deu causa ao dano, ou seja, é uma relação lógica jurídica, de causa e efeito.

Isso porque, não há adimplemento além do mínimo deduzido diretamente da fonte de renda do Autor, tampouco utilização do cartão de crédito para qualquer outra finalidade que não os próprios descontos, vez que é recalculado a cada novo pagamento parcial da fatura, com acréscimo dos encargos mensais, e portanto, notadamente impagável.

Por conseguinte, sabe-se que, nos termos dos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil, aquele que por ação voluntária violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, ficará obrigado a repará-lo. In verbis:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186. e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Sobre o assunto, leciona Maria Helena Diniz:

Para que se configure o ato ilícito, será imprescindível que haja: a) fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência; b) ocorrência de um dano patrimonial ou moral; c) nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente.5

O doutrinador Carlos Alberto Bittar conclui:

Assim sendo, para que haja ato ilícito, necessária se faz a conjugação dos seguintes fatores: a existência de uma ação; a violação da ordem jurídica; a imputabilidade; a penetração na esfera de outrem. Desse modo, deve haver um comportamento do agente, positivo (ação) ou negativo (omissão), que, desrespeitando a ordem jurídica, cause prejuízo a outrem, pela ofensa à bem ou a direito deste. Esse comportamento (comissivo ou omissivo) deve ser imputável à consciência do agente, por dolo (intenção) ou por culpa (negligência, imprudência, imperícia), contrariando, seja um dever geral do ordenamento jurídico (delito civil), seja uma obrigação em concreto (inexecução da obrigação ou de contrato). [...] Deve, pois, o agente recompor o patrimônio (moral ou econômico) do lesado, ressarcindo-lhe os prejuízos acarretados, à causa do seu próprio, desde que represente a subjetividade do ilícito.6

Constatado o ato do agente e o nexo de causalidade, resta perquirir a extensão do prejuízo, não para garantir o recebimento da indenização, mas para que o valor seja arbitrado com fundamento no artigo 944 do Código Civil, in verbis:

Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.

No caso, o fato do Autor já ter adimplido mais do dobro do valor incialmente contratado, é com certeza, um dano significativo, que causou prejuízos para além da ordem patrimonial, motivo para fixação da indenização no montante de R$ 15.000,00, consoante o abalo psíquico experimentado.

O CDC, por seu turno, também contempla a indenização por dano moral, nos incisos VI e VII, do artigo 6º, in verbis:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais , individuais, coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

Tecidas estas considerações e, verificada a presença dos requisitos necessários à caracterização da responsabilidade civil, cabe ao Réu suportar o pagamento de indenização, já que estabelece a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso V que “É assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem".

E ainda, o inciso X do referido artigo diz que "São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".

Ademais, a norma consumerista estatui que a responsabilidade por falha na prestação dos serviços é objetiva, in verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

No que concerne ao quantum, deve ser levando em conta os seguintes parâmetros, aceitos tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência: a) a posição social e econômica das partes; b) a intensidade do dolo ou o grau de culpa do agente; c) a repercussão social da ofensa; e d) o aspecto punitivo-retributivo da medida. Nesse sentido, o montante não pode ser irrisório, a ponto de menosprezar a dor e o abuso sofridos pelo Autor.

Ainda durante o julgamento da r. Apelação Cível n. 0301292-89.2018.8.24.0092, da Capital – Bancário, o Des. Relator Robson Luz Varella fixou o quantum indenizatório:

DANO MORAL - ATO ILÍCITO - RELAÇÃO DE CONSUMO - INCIDÊNCIA DO ART. 14 DA LEI N. 8.078 /1990 - ABALO ANÍMICO EVIDENCIADO - DESCONTOS INDEVIDOS EFETUADOS QUE COLOCARAM EM RISCO A SUBSISTÊNCIA PESSOAL DA ACIONANTE , HAJA VISTA O ÍNFIMO VALOR PERCEBIDO A TÍTULO DE PENSÃO POR MORTE PREVIDENCIÁRIA - AGASALHAMENTO DA IRRESIGNAÇÃO NO PARTICULAR. Nas relações de consumo o fornecedor de serviços responde objetivamente na reparação de danos causados aos consumidores, nos casos de defeito ou por informações não prestadas ou inadequadas (CDC , art. 14 ). Assim, para a configuração do dever de indenizar, necessária a prova do ato ilícito, do dano e nexo causal entre a conduta do agente e os prejuízos causados (CC , arts. 186 e 927 ) [...] As normas jurídicas pátrias não definiram expressamente os critérios objetivos para arbitramento do "quantum" indenizatório, sabendo-se, apenas, que "a indenização mede-se pela extensão do dano" ( CC , art. 944 ). Dessa forma, devem ser analisadas as particularidades de cada caso concreto, levando em consideração o mencionado dispositivo, as condições econômico-financeiras das partes envolvidas, os princípios da proporcionalidade e razoabilidade e o caráter pedagógico do ressarcimento. Na hipótese em análise, trata-se de pessoa cujo benefício previdenciário perfaz a cifra de pouco mais de um salário mínimo mensal, enquanto que a responsável pela reparação é instituição financeira dotada de grande poder econômico com larga atuação no mercado creditício. Sopesando tais circunstâncias, principalmente em atenção ao caráter punitivo pedagógico da condenação, entende-se adequada a fixação do "quantum" indenizatório em R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos pelo INPC, a partir do presente arbitramento, e com incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde o evento danoso (Súmulas 362 e 54 do STJ, respectivamente).

(TJSC, Apelação Cível n. 0301292-89.2018.8.24.0092, da Capital, rel. Des. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 20-11-2018 ).

Nesse norte, considerando-se que a contratação do cartão de crédito ocorreu por meios ardilosos do Réu, que ignorou os deveres da boa-fé objetiva e constrangeu o consumidor em evidente necessidade financeira a contratar serviço por ele não desejado, obrigando-o a pagar valores manifestamente excessivos, motivo pelo qual deve ser fixado como valor justo e adequado, o montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de indenização por dano moral.

3.7. DEVOLUÇÃO EM DOBRO

Constatada a cobrança de valores indevidos pela instituição financeira, cabível é a aplicação do art. 876. do Código Civil, que estabelece: "Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição".

Nítida é, a percepção que o Réu sabia exatamente dos descontos que realizou e continua a realizar, mesmo ultrapassando o dobro do valor incialmente contratado, e que também tem conhecimento da ilegalidade da operação, entretanto, cômodo é cobrá-las e transferir ao consumidor o ônus de reclamá-las.

E nesse norte, tem entendido a Corte Catarinense que o ato de se apropriar indevidamente de valores referentes a salário, configura hipótese de culpa gravíssima, equiparada, portanto, ao dolo, razão pela qual sujeita o Réu à restituição em dobro dos valores descontados, na forma do artigo 42, parágrafo único, do CDC:

Art. 42. [...]

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

Ocorre que não há, no caso em tela, engano justificável para a cobrança de R$ 4.215,59 com a continuidade dos descontos sem previsão de término, quando o valor emprestado pelo Réu foi de R$ 1.795,84. Ao realizar descontos sobre o subsídio do Autor, sem possibilitar a real amortização do saldo devedor ─ procedimento que certamente atende a seus interesses econômicos ─ a toda evidência o Réu assumiu o risco de prejudicá-lo.

A este proceder desidioso, por certo não se pode conferir a qualidade de causa "justificável" de engano, eis que presente está, o dolo do Réu, que jamais enviou qualquer fatura ou documento ao endereço do Autor a fim de informá-lo do valor devido ou adimplido.

Neste mesmo sentido, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina já decidiu:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO BANCO RÉU. CONTRATO DE UTILIZAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM DESCONTO NO BENEFÍCIO DA AUTORA. (...) DESCONTO INDEVIDO NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA DECORRENTE DE CONTRATO ENTABULADO MEDIANTE INDUZIMENTO EM ERRO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 42 , PARÁGRAFO ÚNICO , DO CDC . (...)

(Apelação Cível n. 2015.070554-6, rel.ª Des.ª Soraya Nunes Lins, j. em 04.02.2016).

APELAÇÃO CÍVEL. DANOS MORAIS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DESCONTO INDEVIDO. AUSÊNCIA DE ENGANO JUSTIFICÁVEL. OBRIGAÇÃO DE DEVOLVER EM DOBRO O VALOR DESCONTADO. (...) DESCONTOS INDEVIDOS. CONTA BANCÁRIA NA QUAL A PARTE RECEBE PENSÃO . DANO MORAL CONFIGURADO . A diminuição da capacidade financeira decorrente de descontos mensais em benefício previdenciário relativos a empréstimo consignado realizado de forma ilegal, carateriza abalo moral, passível de compensação pecuniária (TJSC, Ap. Cív. n. 0021112- 95.2010.8.24.0045, de Palhoça, rel. Des. Joel Figueira Júnior, j. 8-9-2016). (...)

(Apelação Cível n. 0300034-78.2016.8.24.0071, rel.ª Des.ª Janice Ubialli, j. em 02.05.2017).

Por fim, resta pleitear a devolução em dobro dos valores que o Réu dolosamente cobrou a mais do Autor, que deverá ser apurado em eventual liquidação de sentença.

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