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Da atuação fiscal na recuperação judicial:

Agenda 21/09/2022 às 16:45

Leis específicas têm condicionado a admissão do parcelamento de débitos tributários de empresas em recuperação à renúncia ou desistência das impugnações.

RESUMO: O objetivo deste estudo é avaliar a compatibilidade dos arts. 57 da Lei nº 11.101/05 e 191-A do CTN com o conjunto de regras e princípios constitucionais aplicáveis à atuação do Fisco e à ordem econômica. Para tanto, valemo-nos de pesquisas doutrinárias, legislativas e jurisprudenciais, aliadas à hermenêutica teleológica, axiológica e sistemática. Com isso, verificamos a patente inconstitucionalidade dos dispositivos, já reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça em controle difuso, mas ainda não apreciada pelo Supremo Tribunal Federal e sequer cogitada pelo legislador. A exigência de apresentação de certidões negativas como requisito para a concessão da recuperação judicial vai de encontro ao princípio da proporcionalidade, da preservação da empresa e, inclusive, da supremacia do interesse público. Além de se revelar sanção política, não se mostra necessária e adequada para o fim que pretende atingir. Com efeito, ao obstar o reerguimento de empresas em crise, o Fisco acaba por excluir uma fonte geradora de tributos, de empregos e de riquezas.

Palavras-chave: recuperação judicial, CND, inconstitucionalidade, sanção política, proporcionalidade.


1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Após a 2ª Guerra Mundial, ganhou força o movimento denominado pós-positivimo. Isso, porque a aplicação pura das regras vigentes não foi suficiente para impedir as atrocidades perpetradas pelo Estado e pelos detentores de poder, notadamente na Alemanha e na Itália. Em decorrência, hoje o trabalho do intérprete, especialmente dos membros do Poder Judiciário, tornou-se mais relevante e complexo. O juiz não pode mais ser um mero aplicador da lei, deve antes analisar se a regra aplicável ao caso é compatível com os valores constitucionais.

Nessa linha, os arts. 57 da Lei nº 11.101/05 e 191-A do CTN parecem trazer regras inconstitucionais. Ao condicionar a concessão da recuperação judicial à apresentação de certidão negativa de débitos tributários, as regras vão de encontro ao objetivo da própria recuperação judicial, que é, nos termos do art. 47 da Lei nº 11.10105, viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores. A par disso, viola o princípio da preservação da empresa, da proporcionalidade e do interesse público primário.

Embora existam julgados em controle difuso de constitucionalidade que reconheçam a impossibilidade de aplicação desses dispositivos, a matéria ainda não foi enfrentada pela Corte Constitucional, o que possibilitaria a suspensão da execução dessa regra (art. 52, X, da Constituição Federal). Assim, permanece a insegurança jurídica aos contribuintes, que ora se deparam com julgadores que exigem as certidões e ora com outros que as dispensam. Ao longo deste trabalho, analisaremos as razões pelas quais é necessária e justa a declaração de inconstitucionalidade destes dispositivos, com efeitos erga omnes.

2 POSTULADOS E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS À RECUPERAÇÃO JUDICIAL

De início, faz-se necessário pontuar que, na Idade Média, surge o juspositivismo como forma de delimitar o poder estatal, de modo a evitar que o jusnaturalismo continuasse a ser usado como justificativa das atuações arbitrárias dos monarcas. Ocorre que, durante a 2ª Guerra Mundial, ficou evidente que a pura aplicação das leis não é suficiente para obstar os abusos de direito promovidos pelos Estados. Com isso, surge o pós-positivismo, uma postura intermediária entre o jusnaturalismo e o juspositivismo, que defende a aplicação da lei após a análise de conformidade com os valores eleitos pelo povo como norteadores do Estado. No Brasil, esse movimento ganhou força com a Constituição Federal de 1988, denominada Constituição Cidadã.

Como se extrai da Teoria de Robert Alexy (2008), a integração entre direito e elementos morais permite que os juristas impeçam novas arbitrariedades pelos Estados. Desse modo, revela-se a essencialidade de conferir às normais constitucionais, e por conseguinte às normas infraconstitucionais, maior carga valorativa. O pós-positivismo, sem desprezar o direito posto, pretender ir além da legalidade estrita, mediante uma leitura moral do direito, uma interpretação axiológica. Ao contrário do juspositivismo e do jusnaturalismo puros, a nova concepção deve ser pautada por uma teoria de justiça, ainda que hajam regras injustas ou ideias contrárias pelos intérpretes.

Sob a ótica do neoconstitucionalismo, incumbe aos operadores do direito observarem não somente as regras dispostas ao longo dos diplomas normativos, mas também os postulados e princípios que lhes deram causa. Nos dizeres de Marinoni (2017), a lei não vale mais por si, porém depende da sua adequação aos direitos fundamentais. Ou seja, o conteúdo normativo expresso, embora essencial para a segurança jurídica, garantia de direitos e limitação de poderes, somente há de ser aplicado quando estiver em consonância com os direitos fundamentais consagrados pela constituição, expressa ou implicitamente, ante a cláusula aberta do art. 5º, § 2º, da Constituição Federal. Desse modo, garante-se a efetivação dos valores constitucionais e da justiça.

A propósito:

Os operadores jurídicos devem buscar, sempre, seguir os anseios da ordem constitucional vigente. Dos juristas, inaceitável é que fechem os olhos para o desrespeito aos preceitos constitucionais, que são a base de criação e funcionamento do Estado. Os princípios jurídicos, constitucionalizados, indicam, pois, os valores em que se assenta e para onde se orienta uma comunidade, sempre ao encontro de uma nova redenção (ROTHENBURG, 2003).

Para além disso, defende Barroso (2003) que princípios e regras ocupam o mesmo status de norma jurídica, razão pela qual devem ser igualmente aplicados aos fatos postos sob análise:

Sem embargo da multiplicidade de concepções sobre a matéria, há pelo menos o consenso sobre o qual trabalha a doutrina em geral: princípios e regras desfrutam igualmente do status de norma jurídica e integram, sem hierarquia, o sistema referencial do intérprete. (BARROSO, 2003).

. Pela ótica do neoconstitucionalismo, não há mais sentido colocar os princípios como simples orientações. Isso, porque as regras vigentes surgem de princípios e, portanto, com eles devem ser compatíveis, sob pena de nada mais justificar sua existência. Com efeito, ao se criar uma nova ordem constitucional, o povo de determinado Estado elege, com base no momento histórico, os valores relevantes que devem prevalecer. Assim, os legisladores ordinários não podem, depois, contrariar aquilo que foi decidido como ordem fundamental do Estado.

Em complemento, é válido trazer as lições de Humberto Ávila (apud LENZA, 2020), segundo o qual um sistema não pode ser composto só de regras ou só de princípios, sob pena de se tornar excessivamente flexível ou demasiadamente rígido. Para que haja equilíbrio --- adequando as normas às peculiaridades de cada caso, permitindo o controle de poder e garantindo a efetivação dos direitos fundamentais --- normas e princípios devem ser vistos como um conjunto, partes que se encaixam. Como vetor hermenêutico, deve o aplicador do direito pautar-se em postulados normativos inespecíficos (ponderação, concordância prática e proibição de excesso) e específicos (como a igualdade, razoabilidade e proporcionalidade).

Dito isso, sobressai que toda e qualquer análise das regras atinentes à atividade empresarial deve ser interpretada com base nos princípios e postulados que justificam sua existência. A letra fria da lei só deve ser aplicada quando compatível com os preceitos fundamentais elegidos pelo constituinte. Dito isso, deve-se considerar que a atividade empresarial possui íntima ligação com princípios fundamentais (art. 1º da CF), como a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, além de contribuir para a concretização de objetivos fundamentais, como o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização e a promoção do bem de todos (art. 3º da CF). Em decorrência, estabelece o art. 170 da CF que a ordem econômica deve ponderar a liberdade e a justiça social.

Nesse sentido, pontua Coelho (2012) que a função social da empresa é efetivada pela simples geração de empregos, tributos e riquezas:

A empresa cumpre sua função social ao gerar empregos, tributos e riqueza, ao contribuir para o desenvolvimento econômico, social e cultural da comunidade em que atua, de sua região ou do país, ao adotar práticas empresariais sustentáveis visando à proteção do meio ambiente e ao respeitar os direitos dos consumidores, desde que com estrita obediência às leis a que se encontra sujeita. (COELHO, 2012).

Corolário dessa importância social, o legislador infraconstitucional positivou o instituto da recuperação judicial, em substituição à concordata e com claro reconhecimento da empresa como uma instituição social. Essa é a conclusão que se extrai do art. 47 da Lei nº 11.101/05, segundo o qual

a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica (BRASIL, 2005).

A relevância social das empresas se evidencia principalmente em tempos de crise. Se o setor econômico vai mal, o restante também vai, já que os empregos, os tributos e a riqueza gerados pelas empresas é o combustível que move a sociedade e a mantém em funcionamento. Nesse tanto, releva notar que o Projeto de Lei nº 6.229, de 2005, somente agora, com a pandemia causada pela Covid-19, teve a devida atenção do Poder Legislativo, com o fim de buscar a preservação de empresas. É necessário, todavia, que essa postura seja constante, não só pelo Legislativo, mas por também pelo Executivo e pelo Judiciário, a fim de as normas constitucionais, especialmente os valores por elas preconizados, sejam realmente respeitados em todos os atos normativos.

3 INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 57 DA LEI Nº 11.101/05 E 191-A DO CTN

O art. 57 da Lei nº 11.101/05 prevê que, após a juntada aos autos do plano aprovado pela assembleia-geral de credores ou decorrido in albis o prazo para impugnação, o devedor apresentará certidões negativas de créditos tributários. O art. 191-A do CTN, por sua vez, dispõe que a concessão de recuperação judicial depende da apresentação da prova de quitação de todos os tributos. Há, portanto, uma exigência legal de quitação de dívidas tributárias para que se prossiga com a recuperação judicial ou, ao menos, um prévio parcelamento.

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Conforme visto no tópico anterior, todavia, as regras devem se interpretadas de acordo com os princípios que as norteiam, de modo a se obter um direito justo, compatível com a ordem constitucional vigente. Inclusive, o art. 5º da LINDB impõe ao juiz que, ao aplicar a lei, atenda aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Reforça-se, com isso, a notável carga valorativa que permeia não só os princípios, mas também as regras. Indubitável, portanto, que ao aplicador da lei não cabe mais observar a legalidade estrita, sem analisar valores axiológicos.

Isso posto, não é difícil perceber que a exigência legal citada vai de encontro aos princípios que regem a ordem econômica e a própria recuperação judicial. Com efeito, impor a quitação das dívidas tributárias como condição para a concessão da recuperação judicial inviabiliza, não raramente, a efetiva aplicação do instituto. Uma empresa que necessite de recuperação judicial, certamente, não possui recursos para adimplir suas dívidas e muitas delas têm caráter tributário.

Sobre o tema:

Ora, conquanto se trate de crédito tributário - que compõe o patrimônio público e que, portanto, prevalece sobre os interesses individuais e possui inúmeras garantias e privilégios em relação a créditos de outras naturezas - não se pode admitir que tal interesse viole outros direitos essenciais garantidos pela Constituição, tal como o princípio da preservação da empresa e a inadmissibilidade da cobrança de tributos por meio coercitivos indiretos (sanção política). De fato, se a empresa passa por crise financeira, não se pode exigir, a pretexto de interesse público, que pague ou parcele os débitos tributários para que possa pôr em prática o plano de reestruturação. (MORETI, 2019)

Na jurisprudência pátria, há julgados que vão contra essa exigência, especialmente sob o argumento de que a Fazenda Pública dispõe de meio próprio para cobrança de seus créditos, não submetidos à recuperação judicial, e que restaria configurada sanção fiscal:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECISÃO CONCESSIVA DA RECUPERAÇÃO. RECURSO INTERPOSTO PELA FAZENDA NACIONAL. CONTROVÉRSIA A RESPEITO DA EXIGÊNCIA DE PROVA DA QUITAÇÃO/PARCELAMENTO DOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS.ART. 57 DA LEI Nº 11.101/05 E ART. 191-A DO CTN. (...) EXIGÊNCIA, NO ENTANTO, AFASTADA NO CASO CONCRETO. APARENTE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 191-A DO CTN E DO ART. 57 DA LEI Nº 11.101/05. VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL SUBSTANTIVO E AO DIREITO AO LIVRE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ECONÔMICA. VEDAÇÃO AO LEGISLADOR DE ESTABELECER MEDIDAS LEGISLATIVAS DESNECESSÁRIAS AO FIM COLIMADO E INADEQUADAS AO ESPÍRITO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS QUE NÃO SE SUJEITAM AO REGIME RECUPERACIONAL. FAZENDA PÚBLICA QUE DISPÕE DE DIVERSOS MEIOS EXTRAJUDICIAIS E JUDICIAIS PARA A COBRANÇA DE TRIBUTOS. SANÇÃO POLÍTICA E MEIO COERCITIVO AO PAGAMENTO DE TRIBUTOS (...) I. São de aparente inconstitucionalidade as exigências contidas no art. 57 da Lei nº 11.101/05 e do art. 191-A do CTN acerca da prova da regularidade fiscal como condição para a concessão da recuperação judicial, por violarem o devido processo legal substantivo (art. 5º, LIV, da CF) e o direito ao livre exercício de atividades econômicas e profissionais lícitas (art. 170, parágrafo único, da CF). II. É que a exigência de apresentação das certidões negativas de débito fiscal para a prática de ato regular da vida privada (recuperação judicial) caracteriza meio coercitivo do pagamento de tributos, tanto mais se os débitos tributários não estão sujeitos ao regime da recuperação judicial, sendo lícito às Fazendas Públicas cobrá-los e executá-los nas vias próprias. III. Assim, trata-se de sanção política e medida desproporcional, uma vez que desnecessária (à Fazenda Pública não é oponível o Plano de Recuperação Judicial), além de inadequada ao espírito da Lei nº 11.101/05, norteada pelo princípio da preservação da empresa. IV. Por não englobar os débitos tributários, o regime de recuperação judicial, embora de inequívoco interesse público, é de natureza predominantemente privada, de modo que a frustração do cumprimento do Plano aprovado soberanamente pelos credores da recuperanda caracteriza indevida ingerência estatal na esfera de interesses daqueles envolvidos e efetivamente afetados pelas disposições do Plano, o que não é o caso da Fazenda Nacional. (...) (TJ-PR - AI: 13800981 PR 1380098-1, Relator Desembargador Fernando Paulino da Silva Wolff Filho, Data de Julgamento: 22/05/2019, 17ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 2536 15/07/2019)

Não há dúvidas de que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, há muito (ex vi do RE 63.045/SP, julgado em 11/12/1967), não permite que a Administração Pública impeça ou cerceie a atividade profissional do contribuinte para compeli-lo ao pagamento de débito. O entendimento atual, de inconstitucionalidade desses meios indiretos coercitivos --- denominados sanção política (RE 565.048, julgado em 29/05/2014) ---, aplica-se perfeitamente à exigência dos arts. 57 da Lei nº 11.101/05 e 191-A do Código Tributário Nacional, pois comporta um meio de coerção para pagamento de tributos, na medida que impõe como consequência a não concessão da recuperação judicial da empresa em crise.

A Fazenda Pública tem meios próprios para cobrança dos créditos tributários, a exemplo da cobrança administrativa e da execução fiscal. Além disso, ao contrário das execuções comuns, as execuções fiscais não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial (art. 6º, § 7º, da Lei nº 11.101/05). Isto é, a Fazenda Pública não sofrerá prejuízo algum com o deferimento da recuperação judicial, pois será mantida a possibilidade de executar seu crédito normalmente. Diante disso, a exigência de apresentação das certidões negativas revela-se como nítida sanção civil, na medida em que se já existe meio próprio para a cobrança do crédito tributário e o cumprimento da regra pode levar à inviabilidade de a empresa continuar com suas atividades.

Atento a seu papel de guardião da Constituição Federal e na linha do neoconstitucionalismo, o Supremo Tribunal Federal deixa claro que a certidão negativa pode ser exigida pelo Fisco, nos limites impostos pelo legislador constituinte, quando garante (i) o exercício da atividade profissional, (ii) o fundamento da República atinente aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e (iii) o princípio da legalidade. Ao analisar esses três requisitos e contrapô-los às regras dos artigos aqui analisados, constata-se a inconstitucionalidade, pois a não concessão da recuperação afeta a continuidade da empresa e, por via oblíqua, afronta os dois primeiros limites citados.

Como já mencionado, ordinariamente, a empresa que possui mais passivos do que ativos tem também várias dívidas tributárias e insuficiência de recursos para quitá-los. Logo, impor-lhes a quitação desses tributos para valer-se da recuperação judicial, a fim de viabilizar o prosseguimento da atividade, comumente acarreta a falência imediata. Por consequência, afeta o fundamento da República que preza pelos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, além de prejudicar o desenvolvimento da sociedade como um todo.

A conclusão pela inconstitucionalidade, inclusive, condiz com os ensinamentos de Humberto Ávila (2003). Ao se analisar a regra em conjunto com os princípios que a norteiam, notadamente a função social da empresa, verifica-se, à toda evidência, sua incompatibilidade. Pela aplicação dos postulados da proibição de excesso, da proporcionalidade e da razoabilidade, chega-se à conclusão de que a letra fria dos dispositivos não pode subsistir.

A mera constatação de que a medida constitui sanção política implica concluir que a medida é excessiva para os fins que se propõe, uma vez que a Fazenda Pública já dispõe de meios efetivos e suficientes para receber seu crédito e o instrumento trazido pelos arts. 57 da Lei nº 11.101/05 e 191-A do CTN acaba por inviabilizar a continuidade da atividade empresarial.

Ademais, a doutrina ressalta a violação do princípio da proporcionalidade, em todas suas dimensões:

() na hipótese da recuperação judicial, a exigência da CND não atende a nenhum dos três princípios específicos, mostrando-se claramente desproporcional e, por conseguinte, inconstitucional. De fato, o fisco não participa do acordo de recuperação, não tem suas execuções fiscais suspensas e de forma alguma é prejudicado pelo andamento da recuperação judicial. Desse modo, não há nenhuma necessidade de se resguardar o pagamento dos créditos fiscais na recuperação judicial. (TOMAZETTE, 2017)

Para Alexy (2008), quem trata da proporcionalidade como uma regra, para que algo seja proporcional deve ser:

(1) adequado, quando puder ser melhorado sem prejuízo de outro;

(2) necessário, quando for menos prejudicial, dentre aqueles meios igualmente adequados; e

(3) proporcional em sentido estrito, quando atender à ponderação de valores.

A exigência de CND como pressuposto à concessão da recuperação judicial, de fato, não atende esses parâmetros.

A um, porque inadequada em razão do prejuízo que causa às empresas, prejudicando o próprio reerguimento. Sob o pretexto de garantir a quitação de créditos tributários, acaba por levar a empresa à falência. Assim, se por um lado pode contribuir para a adimplência tributária, extingue a pessoa jurídica que pratica as atividades geradoras de tributo. Além de que extirpar a própria fonte de renda do Fisco em prol do recebimento dos tributos em atraso, desconsidera outros princípios contidos na Carta Magna, tais como a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização e a promoção do bem de todos

A dois, porque há outros meios igualmente eficazes que podem ser usados para garantir o pagamento do crédito tributário. Como visto, a Fazenda Pública utiliza-se de meios de cobrança administrativos e judiciais, os quais, ao contrário dos créditos comuns, não sofrem interferência significativa em razão do deferimento da recuperação judicial. Em que pese a necessidade de controle dos atos de penhora pelo Juízo da recuperação, o fato é que o Fisco pode continuar executando seu crédito e obter a satisfação mesmo na pendência da recuperação judicial. Sem sombra de dúvidas, esse meio é imensamente menos prejudicial à empresa do que listar como requisito para a concessão da recuperação a prévia quitação dos tributos.

A três, porque a ponderação leva à conclusão de que a exigência causa mais males à sociedade do que benefícios. A razão de ser dos tributos é o custeio das necessidades públicas. Não se pode olvidar, todavia, que a Administração Pública é regida pelo princípio da supremacia do interesse público, que se subdivide em primário e secundário. O primário é o verdadeiro interesse da coletividade, enquanto o secundário é o interesse patrimonial do Estado, que serve de instrumento para se atingir o primário. No caso, o Fisco atua com base no interesse secundário para exigir a apresentação da CND, porém acaba atingindo o interesse primário, uma vez que a não concessão da recuperação judicial pode ensejar o fechamento da empresa e um efeito cascata, com desemprego em massa, redução do recolhimento tributário, diminuição de riquezas circulantes e prejuízo do bem-estar da coletividade. A considerar a função social da empresa, o Estado deve colaborar com a recuperação judicial e não criar entraves a ela, notadamente porque o sucesso do instituto garantirá arrecadação futura, manutenção de emprego e renda. Não há, portanto, respeito à proporcionalidade em sentido estrito.

Diante da controvérsia judicial, no geral decorrente da plena vigência dos dispositivos, a matéria foi levada à apreciação do Supremo Tribunal Federal por meio da ADC nº 46. A Corte Constitucional, entretanto, em recorrente jurisprudência defensiva, não conheceu da ação declaratória de constitucionalidade. Meses depois, em recente julgado, o Superior Tribunal de Justiça acabou por declarar a inconstitucionalidade incidentalmente, por considerar desproporcional a regra contida no art. 57 da Lei nº 11.101/05:

RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CERTIDÕES NEGATIVAS DE DÉBITOS TRIBUTÁRIOS. ART. 57 DA LEI 11.101/05 E ART. 191-A DO CTN. EXIGÊNCIA INCOMPATÍVEL COM A FINALIDADE DO INSTITUTO. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA E FUNÇÃO SOCIAL. APLICAÇÃO DO POSTULADO DA PROPORCIONALIDADE. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DA LEI 11.101/05. 1. Recuperação judicial distribuída em 18/12/2015. Recurso especial interposto em 6/12/2018. Autos conclusos à Relatora em 30/1/2020. 2. O propósito recursal é definir se a apresentação das certidões negativas de débitos tributários constitui requisito obrigatório para concessão da recuperação judicial do devedor. 3. O enunciado normativo do art. 47 da Lei 11.101/05 guia, em termos principiológicos, a operacionalidade da recuperação judicial, estatuindo como finalidade desse instituto a viabilização da superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. Precedente. 4. A realidade econômica do País revela que as sociedades empresárias em crise usualmente possuem débitos fiscais em aberto, podendo-se afirmar que as obrigações dessa natureza são as que em primeiro lugar deixam de ser adimplidas, sobretudo quando se considera a elevada carga tributária e a complexidade do sistema atual. 5. Diante desse contexto, a apresentação de certidões negativa de débitos tributários pelo devedor que busca, no Judiciário, o soerguimento de sua empresa encerra circunstância de difícil cumprimento. 6. Dada a existência de aparente antinomia entre a norma do art. 57 da LFRE e o princípio insculpido em seu art. 47 (preservação da empresa), a exigência de comprovação da regularidade fiscal do devedor para concessão do benefício recuperatório deve ser interpretada à luz do postulado da proporcionalidade. 7. Atuando como conformador da ação estatal, tal postulado exige que a medida restritiva de direitos figure como adequada para o fomento do objetivo perseguido pela norma que a veicula, além de se revelar necessária para garantia da efetividade do direito tutelado e de guardar equilíbrio no que concerne à realização dos fins almejados (proporcionalidade em sentido estrito). 8. Hipótese concreta em que a exigência legal não se mostra adequada para o fim por ela objetivado - garantir o adimplemento do crédito tributário -, tampouco se afigura necessária para o alcance dessa finalidade: (i) inadequada porque, ao impedir a concessão da recuperação judicial do devedor em situação fiscal irregular, acaba impondo uma dificuldade ainda maior ao Fisco, à vista da classificação do crédito tributário, na hipótese de falência, em terceiro lugar na ordem de preferências; (ii) desnecessária porque os meios de cobrança das dívidas de natureza fiscal não se suspendem com o deferimento do pedido de soerguimento. Doutrina. 9. Consoante já percebido pela Corte Especial do STJ, a persistir a interpretação literal do art. 57 da LFRE, inviabilizar-se-ia toda e qualquer recuperação judicial (REsp 1.187.404/MT). 10. Assim, de se concluir que os motivos que fundamentam a exigência da comprovação da regularidade fiscal do devedor (assentados no privilégio do crédito tributário), não tem peso suficiente - sobretudo em função da relevância da função social da empresa e do princípio que objetiva sua preservação - para preponderar sobre o direito do devedor de buscar no processo de soerguimento a superação da crise econômico-financeira que o acomete. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. (REsp 1864625/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/06/2020, DJe 26/06/2020)

Embora a decisão do Superior Tribunal de Justiça seja precedente de grande importância para a comunidade jurídica e principalmente para os empresários, não resolve o problema da insegurança jurídica. É certo que o CPC/15 traz uma grande valorização dos precedentes, incluindo em nossa sistemática processual certos aspectos da common law. O Recurso Especial, todavia, julgado fora da sistemática dos recursos repetitivos, não possui eficácia vinculante e, portanto, não obriga a adoção do mesmo entendimento pelos demais Juízos. Diante disso, mantém-se a possibilidade de os empresários ficarem à mercê do subjetivismo de cada juiz, podendo ora ter que respeitar a legalidade estrita, e ora ser protegido pelos preceitos constitucionais. O ideal seria, sem dúvidas, a pacificação do tema pelo Supremo Tribunal Federal, a fim de vincular todos os casos análogos e tornar possível a suspensão da execução da lei declarada inconstitucional, nos termos do art. 52, X, da Constituição Federal.

É válido mencionar que, a despeito de o neoconstitucionalismo buscar a justiça com base em princípios preestabelecidos, muito se critica essa função de legislador negativo atribuída ao Poder Judiciário. A princípio, a função legislativa é atribuída ao Poder Legislativo, a quem incumbe criar e revogar leis. Ao Poder Judiciário restaria o controle desse atividade, em casos excepcionais. Cresce, entretanto, na jurisprudência prática, o ativismo judicial. De fato, muitas vezes essa conduta é nociva e violadora da tripartição dos poderes. Por outro lado, há casos em que é necessária essa atuação mais ativa do Poder Judiciário, em razão da inércia e eventual desinteresse do poder competente. Assim, desde que a atuação seja pautada em preceitos preestabelecidos pelo constituinte e não advenha de subjetivismo do julgador, como é o caso, não pode o julgador abster-se de atuar.

Dentre as soluções trazidas pelo legislador para a compatibilização entre a crise da empresa e o interesse do Fisco, podemos citar a permissão às Fazendas Públicas e ao INSS para o parcelamento de seus créditos, em sede de recuperação judicial, por meio de lei específica (art. 68 da Lei nº 11.101/05). A princípio, isso significaria uma resposta para o problema, já que também se admite a concessão da recuperação judicial mediante apresentação de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa, emitida para créditos com exigibilidade suspensa. Ocorre, contudo, que muitas dessas leis, a exemplo da Lei Federal nº 13.043/14, impõem como condição para o parcelamento a desistência ou renúncia de qualquer discussão administrativa ou judicial. Assim, o que parecia ser uma solução para regras que violavam a proporcionalidade, acaba por se tornar uma afronta ao princípio da inafastabilidade da jurisdição e do devido processo legal (art. 5º da CF). Sob o argumento de resolver um problema, cria-se outro maior. Substitui-se a exigência de quitação dos tributos para a concessão da recuperação judicial pela exigência de renúncia a toda e qualquer relação do devedor com o Fisco, ainda que sejam patentes as ilegalidades. Diante disso, não se pode dizer que a existência de regimes especiais de parcelamento afasta toda a problemática que envolve os arts. 57 da Lei nº 11.101/05 e 191-A do CTN.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, ao analisar, em arguição de inconstitucionalidade, o art. 3º da Lei Estadual nº 16.097/2014, que também instituiu programa de parcelamento incentivado de débitos condicionado à desistência e à renúncia de impugnações, decidiu pela ausência de constitucionalidade do dispositivo, sob o argumento de que O ingresso no programa de parcelamento incentivado PPI implica mera opção do devedor tributário, e não obrigação, de tal sorte que se for do seu interesse a mantença de ações judiciais envolvendo discussão sobre o débito parcelado, basta simplesmente não aderir àquele programa (TJSP, Arguição de Inconstitucionalidade nº 0045900-16.2017.8.26.0000, julgado em 29/11/2017). Não há, todavia, que se falar em livre opção. Como visto, a apresentação de CND ou CPD-EN é pressuposto para a concessão da recuperação judicial e, por conseguinte, a chance de a empresa se reerguer. Destarte, a adesão ao parcelamento, mesmo com a desistência ou renúncia de seus direitos, acaba sendo a única opção para aqueles que precisam de recuperação judicial e possui débitos tributários, mas ausência de recursos suficientes para quitá-los ou garanti-los.

Expostas essas considerações sobre o parcelamento, chega-se, mais uma vez, à conclusão de que a aplicação das regras contidas nos arts. 57 da Lei nº 11.101/05 e 191-A do CTN leva a situações absurdas, que devem ser analisadas sob um viés constitucional e decididas com efeitos erga omnes e vinculantes. Por um lado, concede superprivilégio às Fazendas Públicas nos processos de recuperação, uma vez que estas já são imunes à suspensão prevista no caput do art. 6º da Lei nº 11.101/05 e terão a quitação de seus créditos como pressuposto de concessão da recuperação. Por outro, coloca as empresas em um impasse, porquanto precisam da concessão da recuperação para continuarem suas atividades, mas não a conseguirão enquanto não quitarem as dívidas tributárias.

Como bem observado no precedente do Superior Tribunal de Justiça, acima colacionado, a realidade econômica brasileira é de que as empresas em crise possuem vários débitos tributários. E, por estarem em crise, certamente não possuirão recursos suficientes para quitá-los no momento exigido pela lei, o que se revelará comum neste período de quebras ocasionadas pela pandemia da Covid-19. Há, portanto, que se adotar uma solução efetiva para o problema, seja judicial ou legislativa.

Vale destacar que não se trata de consentir com a inadimplência tributária, mas tão somente otimizar fins maiores. Se o interesse arrecadatório do Fisco colide com os interesses da coletividade, não se pode admitir que aquele prevaleça, já que a função da arrecadação é justamente o bem-estar da coletividade. Além disso, os créditos tributários não serão desconsiderados pelo administrador-judicial e pelo juiz. A solução que melhor harmoniza esses dois interesses é a dispensa da apresentação da CND ou CPD-EN para a concessão da recuperação judicial e a fiscalização do cumprimento dessas obrigações durante o período de cumprimento do plano homologado, a fim de evitar que os créditos de particulares preponderem sobre os créditos tributários. Ainda que estes não se sujeitem à recuperação judicial, é de bom alvitre que os executores e fiscais do plano de recuperação sempre se atentem para as dívidas tributárias, mesmo que dispensada a apresentação das certidões. Uma solução legislativa plausível seria, por conseguinte, uma regra que determine o pagamento das dívidas tributárias pelo administrador em momento posterior à recuperação, sem incluí-las propriamente no plano de recuperação, mas atento a ele.

É certo que o caminho da declaração incidental de inconstitucionalidade ou a fixação de novas regras dentro do processo sub judice pode ser visto um ativismo judicial, tão criticado pela comunidade leiga e pelos outros poderes, já que afasta comando legal imperativo e em vigor. Não há dúvidas, contudo, que a teoria dos freios e contrapesos atribuiu ao Poder Judiciário a função de controlar os excessos cometidos pelos demais poderes no aspecto jurídico. Nesse tanto, quando o Fisco exige algo ilegal ou inconstitucional, ou quando o legislador edita leis que violam as normas-princípios ou normas-regras constitucionais, incumbe ao Judiciário corrigir esses excessos e restabelecer à situação a constitucionalidade. Nos artigos analisados, verifica-se a incompatibilidade com princípios da preservação da empresa, da função social, da proporcionalidade e até mesmo da supremacia do interesse público primário, impondo ao julgador o poder-dever de afastar a exigência prevista nos arts. 57 da Lei nº 11.101/05 e 191-A do CTN. Desse modo, caso não editada nova lei que compatibilize essa exigência de pagamento com a função da empresa e da recuperação judicial, deve o Poder Judiciário, sim, adotar uma posição mais ativa.

4 CONCLUSÃO

A recuperação judicial é procedimento criado para possibilitar o reerguimento da empresa em crise. O beneplácito legislativo, flexibilizador das regras gerais aplicáveis às obrigações, decorre da incontestável função social da empresa, uma vez que é fonte produtora, de emprego e de tributos.

Não obstante, o próprio legislador criou uma exigência que, em prol dos interesses fazendários, culmina na inviabilidade dessa recuperação, especialmente às empresas de menor estrutura. No geral, as empresas em crise possuem diversas dívidas tributárias e recursos insuficientes para quitá-las, de modo que a exigência de apresentação das certidões negativas impossibilita, muitas vezes, a concessão da recuperação.

Uma das soluções legais foi a permissão de parcelamento especial. Isso, todavia, veio com a afronta ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, porquanto as leis específicas condicionam a admissão do parcelamento à renúncia ou desistência das impugnações. Em vez de solucionar o problema, apenas o substituiu.

Com isso, tem o Poder Judiciário exercido seu papel de controle dos atos legislativos e declarado, incidentalmente, a inconstitucionalidade desses dispositivos, pois, além de constituírem inegável sanção política, afrontam os princípios da proporcionalidade, da preservação da empresa e, a nosso ver, da supremacia do interesse público primário.

Entendemos, todavia, que é necessário mais. Para que o empresário brasileiro tenha efetivamente segurança jurídica e não dependa do subjetivismo de cada julgador, a questão deve ser decidida por processo que produza efeitos vinculantes e erga omnes. Após, entretanto, deve cada julgador atentar-se para a necessária quitação dos tributos durante o processamento da recuperação judicial, a fim de que a declaração de inconstitucionalidade não seja usada de forma abusiva pelos devedores.

A par disso, outra solução interesse e mais ponderada, especialmente para aqueles que criticam o ativismo judicial, seria a edição de leis que, em substituição à exigência de prévia apresentação das certidões, estabeleçam regras que compatibilizem a quitação dos tributos com o reerguimento da empresa, como a postergação do pagamento e o parcelamento sem obrigatoriedade de renúncia.


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Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOPES, Andressa Carvalho. Da atuação fiscal na recuperação judicial:: inconstitucionalidade dos arts. 57 da Lei nº 11.101/05 e 191-A do Código Tributário Nacional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7021, 21 set. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/100253. Acesso em: 23 dez. 2024.

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