Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Hierarquia normativa e o princípio da norma mais favorável no direito trabalhista

Exibindo página 4 de 4
Agenda 08/09/2007 às 00:00

4.CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base no que foi apresentado, pergunta-se novamente: qual o fundamento técnico-jurídico da norma justrabalhista? A resposta agora parece mais clara: o fundamento de vigência da norma justrabalhista, como de qualquer outra norma jurídica, está no dispositivo legal que lhe é hierarquicamente superior. Assim, a Constituição fundamenta a validade das leis e das outras normas inferiores a esta; a lei fundamenta os decretos e os atos normativos individuais, quais sejam, os contratos individuais e coletivos, as sentenças, os regulamentos empresariais etc. A norma trabalhista está, pois, vinculada à estrutura hierárquica normativa, como qualquer outra norma jurídica.

E o caráter hierarquizante do Princípio da Norma Mais Favorável diante da pirâmide normativa? Na verdade, este princípio não possui caráter hierarquizante: seu conteúdo na realidade é uma presunção de dispositividade pró-trabalhador da norma trabalhista. Não há necessidade de que se inverta a hierarquia de vigência existente entre as normas para se aplicar ao caso concreto a regra que traga mais benefícios ao trabalhador. Pelo contrário, não é devida a inversão da hierarquia normativa, sob pena de invalidade da norma, portanto de sua extirpação do sistema jurídico vigente e impossibilidade de sua aplicação ao caso concreto.

O Princípio da Norma mais Favorável não estabelece nenhuma desorganização na hierarquia normativa. Esta é um pressuposto da existência do Estado de Direito. Invertê-la afrontaria os fundamentos deste Estado, o que além de ser inconstitucional e ilegal, não condiz com a organização social e política contemporânea. É uma incorreção científica afirmar que o Princípio da Norma mais Favorável inverte a hierarquia normativa.

Mas nem por isso o princípio deve deixar de ser aplicado. Dentro do Direito do Trabalho, porque toda norma é presumivelmente dispositiva em favor do trabalhador, ao caso concreto se aplicarão os preceitos secundários das normas menos favoráveis, garantindo validade à norma de hierarquia inferior. Só assim será possível que uma norma de menor dignidade, como as que são elaboradas por pessoas privadas, tenha vigência que lhe permita se colocar diante da situação material em tese. Só porque há obediência à hierarquia normativa é possível a aplicação do Princípio da Norma mais Favorável.

Por fim, considerando que o conteúdo real do Princípio da Norma mais Favorável é a presunção de que toda norma laboral seja dispositiva em favor do obreiro, talvez este não seja seu nome mais adequado. À luz do que foi exposto, talvez seja mais interessante chamá-lo de Princípio da Presunção de Dispositividade Pró-Trabalhador, varrendo de vez da doutrina a idéia enganosa de que no Direito do Trabalho há qualquer mudança na hierarquia tradicional da norma.


REFERÊNCIAS

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. São Paulo: Celso Bastos, 2002.

BOBBIO, Noberto. O futuro da democracia. Trad. Marco Aurélio Nogueira. 8. ed. rev. e ampl. São Paulo: Paz e Terra, 2000. (Pensamento crítico, 63).

______. Teoria da norma jurídica. Trad. Fernanda Pavan Batis e Ariane Bueno Sudatti. São Paulo: Edipro, 2001a.

______. Teoria da formas de governo. Trad. Sérgio Bath. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001b.

BRASIL. Decreto-lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, DF, 9 ago. 1943. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 29 nov. 2006.

______. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União, Brasília, DF: Senado Federal, 5 out. 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 29 nov. 2006.

______. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 29 nov. 2006.

COELHO, Fábio Ulhôa. Para entender Kelsen. São Paulo: Max Limonand, 1995.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 4. ed. São Paulo: LTr, 2005.

DINIZ, Maria Helena de. Conflito de normas. 3. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 1998.

______. Compêndio de introdução à ciência do direito. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

GONÇALEZ, Aline Gonçalves et al. Crime Organizado. Jus navigandi, Teresina, a. 8, n. 392, 3 ago. 2004. Disponível em: <hhttp://jus.com.br/artigos/5529>. Acesso em: 05 dez. 2006.

GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 25. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

HOFFMANN, Fernando. O princípio da proteção ao trabalhador e a atualidade brasileira. São Paulo: LTr, 2003.

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito: introdução à problemática científica do direito. Trad. Cretella Jr. e Agnes Cretella. 3. ed. rev. da tradução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. (RT Textos Fundamentais, 5).

LIMA FILHO, Francisco C. Hierarquia das normas: prevalência da constituição e o princípio da norma mais favorável no direito do trabalho. In: Revista Síntese Trabalhista, Porto Alegre, v.11, n. 132, junho de 2000.

LIMA, Francisco Meton Marques de. Interpretação e aplicação do direito do trabalho: à luz dos princípios jurídicos. Fortaleza: IOCE, 1988.

MARX, Karl; ENGELS, Friederich. Manifesto do partido comunista. Trad. Pietro Nasseti. São Paulo: Martin Claret, 2003. (Coleção a obra-prima de cada autor).

MONTESQUIEU. De l’espirit des lois. In: WEFFORT, Francisco C. (organizador). Os clássicos da política. Trad. Lólio Lourenço de Oliveira. 13. ed. 1. vol. São Paulo: Ática, 2002. (Série Fundamentos, 62).

NADER, Paulo. Introdução ao estudo do direito. 21. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

PRESTES, Maria Luci de Mesquita. A pesquisa e a construção do conhecimento científico: do planejamento aos textos, da escola à academia. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Rêspel, 2003.

REALE, Miguel. Fundamentos do direito. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.

______. Filosofia do direito. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2002a.

______. Lições preliminares de direito. 27. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2002b.

RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. Trad. Wagner D. Giglio. São Paulo: LTr; Editora da Universidade de São Paulo, 1978.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 19. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2001.

SILVA, Réia Silvia Rios Magalhães e; FURTADO, José Augusto Paz Ximenes. A monografia na prática do graduando: Como elaborar um trabalho de conclusão de curso-tcc. Teresina: Editora do CEUT, 2002.

VANCONCELOS, Arnaldo. Teoria da norma jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.

WIKIPÉDIA. Revoluções de 1848. atual. em 23 nov. 2006. (Categoria: Revoluções) Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%B5es_de_1848>. Acesso em: 11 dez. 2006.

Sobre o autor
Hugo Alexandre Cançado Thomé

bacharel em Direito em Teresina (PI)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

THOMÉ, Hugo Alexandre Cançado. Hierarquia normativa e o princípio da norma mais favorável no direito trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1529, 8 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10388. Acesso em: 23 dez. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!