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Técnica do direito processual civil na ação cautelar de arrolamento

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Agenda 21/11/2007 às 00:00

Conceito

Inicialmente cabe diferenciar o arrolamento de bens previsto no art. 855 e seguintes em face do art. 1.031 e seguintes, todos do CPC/73.

Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião Luiz Amorim1 assim se pronunciam a respeito:

"Não confundir o arrolamento, do direito sucessório, com a medida cautelar de arrolamento de bens, de que trata o artigo 855 do Código de Processo Civil. A finalidade do processo cautelar é a de evitar extravio ou dissipação de bens, assegurando a imodificabilidade de situação. Em casos como de partilha de bens de sociedade em dissolução, ou de separação judicial, cabe o arrolamento, inclusive com outorga de liminar, funcionando como arrecadação prévia, para a justa e oportuna divisão dos bens a ser efetuada na ação principal. Nada tem a ver, pois, com o processo de arrolamento de bens da herança, que visa formalizar sua transmissão aos sucessores legítimos ou testamentários, como uma forma simplificada de inventário".

Os juristas2 ainda diferenciam "arrolamento sumário" (art. 1.031 do CPC na redação da Lei 11.441, de 4 de janeiro de 2007) de "arrolamento" (art. 1.036 do CPC na redação da Lei 7.019, de 31 de agosto de 1982), confim do direito ao inventário/partilha que não será abordado, evidentemente.

Feito esse destaque preliminar, passemos ao mérito do instituto previsto no Livro III do Código de Processo Civil, que tipificou o Processo Cautelar.

O mineiro Humberto Theodoro Júnior3, citando Pontes de Miranda, Cláudio Vianna de Lima e Ovídio A. Baptista da Silva, conceitua o arrolamento de bens previsto no art. 855 e seguintes do CPC da seguinte forma:

"O Código revogado conhecia o arrolamento e descrição de bens como medida cautelar acessória das ações matrimoniais, com função meramente conservativa de prova a ser utilizada na futura partilha dos bens comuns e sem qualquer invasão imediata na esfera jurídica do cônjuge que detinha os bens.

Para o referido Código, o cônjuge interessado, além do arrolamento, podia usar o seqüestro, uma vez que as duas medidas tinham objetivos distintos e inconfundíveis.

O Código atual, adotando o sistema português como paradigma, alterou profundamente a figura e os objetivos do arrolamento cautelar.

Agora, conforme se depreende do art. 858, a medida cautelar ‘dirige-se à conservação de bens em perigo de extravio ou dilapidação. Por isso, a nomeação de depositário a quem cabe o arrolamento propriamente dito é obrigatória, configurando mesmo ‘a razão de ser da medida’’.

Enquanto o arrolamento do art. 676, IX, do Código anterior é providência meramente probatória, ou, dizendo-se melhor, ação cautelar correspondente a pretensão à segurança de prova, o arrolamento de bens incluído no novo Código corresponde à pretensão de segurança da própria prestação. Há mais do que simples arrolamento ‘ad probationem’. Arrolam-se os bens para depositarem-se em mão de terceiro, nomeado pelo juiz. Há constrição semelhante à do seqüestro.

Deu-se, outrossim, maior extensão à medida, que agora não cabe apenas aos cônjuges nas ações matrimoniais, mas a qualquer interessado nos bens, inclusive credores (art. 856), em outras ações patrimoniais.

Não merece aplausos a inovação por ter desnaturado a antiga e útil figura de segurança da prova, ao mesmo tempo em que criou duas medidas de feições distintas, mas com inútil duplicidade de natureza e objetivos, uma vez que, agora, não há distinção essencial entre o arrolamento e o seqüestro, a não ser de rito.

Ao amoldar-se à figura similar do CPC português, esqueceu o legislador brasileiro de que a legislação lusa desconhece o seqüestro, e realiza sua função através do arrolamento.

Para nosso sistema, todavia, que conta com a figura típica do seqüestro, seria muito mais útil, mais maleável e prático conservar o arrolamento como medida cautelar probatória, sem confundi-la com as medidas constritivas, já tão bem delineadas entre nós".

Eis o registro do processualista, crítico do instituto trazido ao ordenamento jurídico pelo CPC/73.

Ainda sobre o conceito do instituto, vejamos o que nos diz a doutrina paulista com Paulo Afonso Garrido de Paula4:

"Medida genuinamente cautelar, consistente na apreensão, listagem e depósito de bens sob posse de outrem, tendo por finalidade sua conservação. Trata-se de medida onde é ínsita a constrição, de sorte que resumida a pretensão ao arrolamento documental de bens, a providência amolda-se à cautelar inominada, com fulcro no art. 798 do CPC".

Seria prematura, neste momento, a análise pormenorizada sobre a natureza jurídica do arrolamento de bens. Mais à frente, porém, cuidaremos do assunto, mormente sobre a fungibilidade trazida ao ordenamento jurídico brasileiro pela Lei 10.444, de 7 de maio de 2002, que acrescentou o § 7º ao art. 273 do CPC, de lege lata a norma que cuida da teoria geral dos efeitos da antecipação da tutela. Falaremos, também, sobre o Projeto de Lei do Senado 186/2005.


Pressupostos

Os pressupostos são cravados por Humberto Theodoro Jr.5, citando Sérgio Sahione Fadel, que diz:

"Procede-se ao arrolamento sempre que há fundado receio de extravio ou de dissipação de bens (art. 856). E pode requerê-lo todo aquele que tem interesse na conservação dos bens (art. 856).

O cabimento da medida cautelar tem como pressupostos:

a) o fundado receio de extravio ou dissipação dos bens;

b) o interesse do requerente na conservação dos mesmos bens.

O fundado receio deve ser extraído de fatos concretos apurados na conduta daquele que detém os bens em seu poder, como vida desregrada, ocultação de bens, negócios ruinosos etc.

O interesse do requerente pode decorrer de direito próprio sobre o bem, já constituído ou que deva ser declarado em ação própria (art. 856, § 1º). Podem, assim, ser arrolados bens próprios em poder de terceiro, bens comuns ou bens alheios sobre que incida interesse legítimo do requerente.

A medida cautelar terá, assim, além da separação judicial e da anulação de casamento, exata aplicação em várias ações, como as de dissolução de sociedade de fato.

Não é condição de admissibilidade a prévia aferição da viabilidade de êxito do requerente na ação principal, o que seria uma incabível antecipação de julgamento da lide. O que importa é a demonstração do fundado receio de dano (extravio ou dissipação), aliado ao simples interesse processual da parte na conservação dos bens, evidenciado pelo direito ao processo principal (direito de ação). Como toda medida cautelar, o arrolamento tende apenas a evitar que o provimento final da ação definitiva caia no vazio e na inocuidade.

Basta, portanto, que o requerente esteja em posição tal que, se vier a ser vitorioso na ação principal, tenha interesse sobre bens que devam ser arrolados cautelarmente".

Paulo Afonso Garrido de Paula6, sob a rubrica do receio, diz, ainda, que:

"O temor de sumiço culposo ou desaparecimento doloso dos bens deve ser concreto, isto é, fundado em indícios dos quais possam extrair-se a conclusão de que a tutela jurisdicional representa única forma de conservação patrimonial".

Parece-nos que o próprio tipo deixa claro o pressuposto necessário à tomada da medida constritiva:

Art. 855. Procede-se ao arrolamento sempre que há fundado receio de extravio ou de dissipação de bens.

Assim, cabe ao intérprete verificar o atendimento dos pressupostos descritos acima ("fumaça do bom direito" e "perigo da demora"), pois caso estejam ausentes, o juiz deve indeferir a petição inicial cautelar liminarmente, por exemplo, por falta de interesse processual, extinguindo-se o processo sem resolução do mérito7.

Não se pode, entretanto, ser rejeitada liminarmente a petição inicial da medida cautelar preparatória de arrolamento de bens nos termos do art. 285-A do CPC. É inaplicável, pois, o fundamento de mérito do novo dispositivo. Correntemente, incide o julgamento antecipado de mérito das ações repetitivas quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, onde será dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada. Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação. Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso.

É o que dispõe o art. 285-A, caput, e §§ 1º e 2º, respectivamente, do Código de Processo Civil8.

Vale lembrar, ainda, que nessas hipóteses haverá extinção do processo com resolução de mérito (art. 269, I, do CPC, na redação da Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005). O fundamento seria a observância ao princípio da celeridade processual instituído pelo poder constituído ou de segundo grau através da emenda constitucional 45, de 2004, que acrescentou o inciso LXXVIII ao art. 5º da Constituição.

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Portanto, na medida cautelar preparatória de arrolamento de bens, não se invoca qualquer julgamento antecipado sob o argumento de ação repetitiva. O direito material discutido nos autos, quando já tiver sido apreciado objetivamente pelo juízo em outros casos semelhantes, liga-se às ações de mérito, não havendo, por outro lado, o corte quanto ao normal prosseguimento do feito em razão de se tratar de ações repetitivas segundo a legislação vigente. Aqui nos antecipamos em certa medida para dizer que o arrolamento de bens é medida cautelar e não ação ou procedimento heterotópico do Livro III do CPC, sede do Processo Cautelar, sem aplicação, destarte, o novo dispositivo acrescentado pela Lei 11.277.

Sobre a aplicabilidade do disposto no art. 285-A no processo cautelar, ao comentar o tópico despacho liminar, José Carlos Barbosa Moreira9:

"Submete-se a petição inicial ao controle do órgão a que se dirige, em termos análogos aos expostos para o processo de conhecimento (1ª parte, § 2º). São aplicáveis, mutatis mutandis, as regras dos arts. 284, 285 e 285-A (introduzido pela Lei nº 11.277), e bem assim, quanto ao indeferimento da inicial, as dos vários incisos do art. 295. Incide também o art. 296".

Talvez a aplicação dita por Barbosa Moreira quanto ao art. 285-A, no processo cautelar [eis que tirada tal idéia da 3ª parte de sua monografia, que trata do instituto cautelar] se deve à discussão atualíssima na doutrina a respeito da fungibilidade entre a antecipação e a cautelar e entre a cautelar e a antecipação. Pode o mestre ter se referido – silêncio que é justificado pela abordagem direta que o carioca fez perante o novo processo civil - sobre a aplicabilidade do dispositivo, nas hipóteses em que há fungibilidade entre a ação de conhecimento e a ação ou medida cautelar. Mesmo a doutrina que só admite a fungibilidade prevista expressamente no art. 273, § 7º, do CPC, e, também, a que emprega conceito mais amplo, quando a parte pede cautelar e o juiz concede a medida sob efeito de antecipação, aceita exceções à regra. Não é difícil o doutrinador ter enxergado essa possibilidade, mesmo sabendo que o art. 285-A liga-se ao mérito da lide, faz coisa julgada material, e, assim, não pode já na cautelar, sem adotar a fungibilidade, ser indeferida a ação preparatória pelo juiz, limitando o direito de ação do requerente e abortando de vez seu direito material.

Fredie Didier Jr., Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, esses dois últimos em co-autoria, comentam sobre o novato art. 285-A, respectivamente10.

Ressalte-se, todavia, que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade, com o objetivo de decretar a inconstitucionalidade do art. 285-A (ADI 3695). Conforme apontou o baiano Fredie Didier Jr.11, o Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP) pediu para intervir no feito na qualidade de amicus curiae, com peça processual produzida por Cassio Scarpinella Bueno. Foi aplicado ao rito especial pelo Ministro Cezar Peluso o art. 12 da Lei 9.868, de 10 de novembro de 1999, remetendo-se o feito ao julgamento pelo tribunal, que poderá julgar definitivamente a ação.

Aguardemos o que decidirá o Supremo Tribunal Federal.

Enquanto isso cabe ao juiz aplicar a lei, pois até que sobrevenha eventual decisão transitada em julgado pela corte, a nova disposição presume-se ex vi legis constitucional. Mesmo assim, pode haver entendimento radical em sentido contrário, ou seja, reputando o novo dispositivo inconstitucional, que não escapa ao controle difuso, de efeitos limitados ou estritos ao caso concreto e que pode ser assim considerado pelo magistrado em razão de seu livre convencimento motivado. É o coro dos que defendem a independência funcional do juiz, que, para muitos, é pressuposto processual de existência diante do regime constitucionalista-republicano que prima pela harmonia e independência dos poderes de Estado12.


Legitimidade

Cuida-se de norma aberta, geralmente técnica legislativa utilizada pelo legislador ordinário ou extraordinário, que não pode prever as situações concretas da vida. Estipulada a abstração, pode o juiz fazer a subsunção, sem arbítrio.

A propósito, vejamos o que fala o dispositivo, in verbis:

Art. 856. Pode requerer o arrolamento todo aquele que tem interesse na conservação dos bens.

§ 1º. O interesse do requerente pode resultar de direito já constituído ou que deva ser declarado em ação própria.

§ 2º. Aos credores só é permitido requerer arrolamento nos casos em que tenha lugar a arrecadação de herança.

Neste sentido, Humberto Theodoro Jr.13, citando Hugo Alsina, sobre a legitimação do instituto:

"Todo aquele que tiver interesse na conservação dos bens em poder de outrem pode requerer o respectivo arrolamento (art. 856), desde que demonstre o fundado receio de extravio ou dissipação (art. 855).

Para legitimar-se o interessado há de ser titular:

a) de uma situação jurídica já constituída, que lhe assegure a faculdade de reclamar os bens do detentor, como o depositante, o comodante, o locador, o condômino, o sócio; ou

b) de um interesse relativo a um direito que possa ser declarado em ação própria, como a do cônjuge que demanda a dissolução da sociedade conjugal, a do sócio que pede a dissolução da sociedade comercial ou mesmo de uma sociedade de fato, como, por exemplo, nas situações de concubinato e outras similares. Observe-se que o uso da medida cautelar em exame não é privilégio da mulher, nas ações matrimoniais, pois, também, o marido pode promover arrolamento dos bens em poder da esposa;

c) quanto aos credores, que sempre têm interesse sobre o patrimônio do devedor, visto que este representa a garantia de satisfação de direitos, o Código restringe sua legitimidade para promover o arrolamento cautelar apenas aos casos em que tenha lugar a arrecadação de herança (art. 856, § 2º), isto é, nos casos de herança jacente (art. 1.142)".


Finalidade

Citando o alagoano Pontes de Miranda, Humberto Theodoro Jr.14 diz que:

"O arrolamento destina-se a preservar os bens sobre que incide o interesse da parte. É medida puramente cautelar.

Não realiza a separação preventiva de bens, figura conhecida do direito português, mas inexistente em nosso ordenamento jurídico. Tampouco serve para dirimir questões controvertidas sobre fraude ou desvio de bens já perpetrados pelo promovido.

Essas divergências só poderão ser solucionadas por vias contenciosas ordinárias. Atinge apenas coisas corpóreas de valor econômico, móveis ou imóveis. O documento puro e simples não está abrangido pelo alcance da medida; mas os documentos que representam valores econômicos em si, como os títulos de crédito, podem ser arrolados".

No mesmo sentido, Paulo Afonso Garrido de Paula15:

"Deflui do dispositivo que o interesse do requerente consiste na conservação de bens, prevenindo extravio ou dissipação. Quem conserva resguarda algo de dano, de modo que a pretensão deve fundar-se em utilidade que possa o requerente retirar da coisa, indicando a titularidade de direito subjetivo cuja consistência dependa da existência ou da integridade dos bens".

E continua o jurista16-17 com os tópicos "fumus boni juris" e "interesse de credor", relacionados com a finalidade do arrolamento de bens:

"Como toda cautelar genuína, contenta-se o legislador com a plausibilidade do direito invocado, de sorte que o requerente não precisa demonstrar nem o juiz deve dispor a respeito da existência/inexistência do direito cuja consistência dependa da conservação dos bens.

Essa é a razão da menção ao direito que deva ser declarado em ação própria, indicando também a possibilidade da medida quando o fundamento da conservação ainda dependa de reconhecimento judicial em ação própria. É o caso, por exemplo, do arrolamento preparatório de uma ação de reconhecimento de uma sociedade de fato, do qual poderá redundar em meação patrimonial".

"Ao restringir o pedido de arrolamento cautelar do credor nos casos em que tenha lugar a arrecadação da herança o legislador circunscreveu a providência aos casos de herança jacente, conforme prescrição do art. 1.142 do CPC. A defesa de crédito líquido e certo, ainda que não exigível, faz-se mediante cautelar de arresto, enquanto aquele cujo crédito dependa de constituição por sentença poderá vale-se [SIC] de cautelar inominada visando à indisponibilidade patrimonial. Se o direito é sobre a coisa, objeto litigioso de ação judicial iniciada ou ainda por iniciar, a medida adequada é o seqüestro".


Procedimento

Humberto Theodoro Jr.18, citando Sérgio Sahione Fadel, assevera que:

"O arrolamento corre em autos próprios, seja como medida preparatória ou como incidente da ação principal, dando-se o apensamento sempre que possível (art. 809).

A petição inicial deve atender, além dos requisitos comuns (arts. 282 e 801), aos do art. 857, isto é, a exposição:

I – do seu direito aos bens ou seu interesse sobre eles; e

II – dos fatos em que se funda o receio de extravio ou de dissipação dos bens.

Deferida a inicial, o juiz permitirá que o requerente justifique unilateralmente seu receio de prejuízo, o que pode ser feito documentalmente ou através de outras provas em audiência.

Se as circunstâncias não revelarem maior perigo de frustração da medida, o juiz determinará a citação do possuidor ou detentor dos bens, para pronunciar-se, em cinco dias (arts. 803 e 858, parágrafo único).

Convencendo-se, porém, de que o interesse do requerente corre sério risco, o arrolamento será liminarmente deferido (art. 858).

No ato de decretar a medida, seja liminarmente, seja após a ouvida do promovido, o juiz desde logo nomeará depositário para encarregar-se do arrolamento.

Se não houver inconveniente sério, a nomeação de preferência deve recair sobre a pessoa do possuidor dos bens, mormente nos casos de cabeça-de-casal em causas de família.

O depositário – seja o possuidor, seja um terceiro – prestará compromisso e passará a ter a guarda dos bens no exercício de uma função pública, sob as ordens do juiz do feito.

O arrolamento, malgrado sua aproximação do sistema português, deve ser aplicado entre nós como medida mais branda do que o seqüestro, de modo que não se deve impedir ou restringir desnecessariamente o exercício dos atos normais de administração do possuidor transformado em depositário.

A lavratura do auto de arrolamento caberá ao depositário, que fará constar dele a descrição minuciosa de todos os bens e o registro de quaisquer ocorrências que tenham interesse para sua conservação (art. 859).

Para cumprimento da diligência, será expedido mandado judicial, e um oficial de justiça acompanhará o depositário e efetuará a apreensão de todos os bens, intimando o promovido a não oferecer resistência ou obstáculo, e os entregará ao depositário.

Se os bens forem daqueles que exigem não só a guarda, mas também atos de gestão do depositário (empresas, semoventes, plantações etc.), e se o depositário não for o antigo possuidor, caberá a ele traçar um plano de administração e submetê-lo à aprovação do juiz.

Qualquer ato de disposição dos bens arrolados ou de seus frutos dependerá sempre de prévia anuência judicial.

O arrolamento deve quanto possível iniciar e terminar no mesmo dia. Mas, se isso não for possível, o oficial de justiça e o depositário colocarão selos ou lacres nas portas da casa ou nos móveis em que estejam os bens, continuando no dia seguinte a diligência. O Código fala em dia que for designado, mas, dada a urgência da medida, deve ser sempre o dia seguinte, se útil.

O arrolamento, quando necessário, não deve ser deliberado por conta própria pelo oficial de justiça e depositário. O obstáculo deve ser levado ao conhecimento do juiz, que autorizará o arrombamento e requisitará a força policial quando isso for indispensável".

Antes de marchar à frente, frise-se que falaremos, em tópico específico, sobre a prisão civil do depositário infiel, principalmente sobre a discussão envolvendo a constitucionalidade ou não do instituto restritivo de direito.

Vejamos, agora, o que disse Paulo Afonso Garrido de Paula19 sobre os dispositivos procedimentais relativos ao arrolamento de bens, excerto feito depois da redação oficial:

Art. 857. Na petição inicial exporá o requerente:

I – o seu direito aos bens;

II – os fatos em que funda o receio de extravio ou de dissipação dos bens.

"Petição inicial: Dispositivo complementar ao art. 801 do CPC, esclarecedor de que a causa de pedir cautelar (direito ameaçado e o receio de lesão) está relacionada ao arrolamento, no direito aos bens (causa remota) e na possibilidade de dano irreparável ou de difícil reparação em razão do receio de extravio ou dissipação dos bens (causa próxima)".

Art. 858. Produzidas as provas em justificação prévia, o juiz, convencendo-se de que o interesse do requerente corre sério risco, deferirá a medida, nomeando depositário dos bens.

Parágrafo único. O possuidor ou detentor dos bens será ouvido se a audiência não comprometer a finalidade da medida.

"Audiência de justificação prévia: A audiência de justificação prévia somente deverá ser designada havendo pedido de liminar inaudita altera parte e se o requerente não trouxer, com a petição inicial, prova pré-constituída da urgência urgentíssima e da indispensabilidade de surpresa ao requerido.

Liminar cautelar de arrolamento: O deferimento de liminar de arrolamento, com ou sem audiência de justificação prévia, impõe pedido expresso do requerente ante à possibilidade objetiva por perdas e danos derivada do art. 811 do CPC. Não havendo pedido de liminar, o requerido deverá ser citado nos termos do art. 802 do CPC.

Depósito dos bens: A menção ao depositário dos bens revela que o arrolamento consiste na apreensão material dos bens, provocando desapossamento material ou jurídico. Material, quando os bens saem da esfera de fruição de seu possuidor e jurídico quando se verifica a transformação do possuidor em mero detentor, em caso de sua nomeação como depositário. Necessário aduzir que a apreensão judicial que é ínsita ao arrolamento vem também expressa no art. 1.046 do CPC, quando da previsão dos embargos de terceiro.

Procedimento: À falta de regras especiais de rito, tirante as relacionadas ao conteúdo da causa de pedir, o arrolamento reclama o procedimento cautelar comum amplo, disciplinado nos arts. 801, 802, 803 e 804 do CPC"20.

Art. 859. O depositário lavrará auto, descrevendo minuciosamente todos os bens e registrando quaisquer ocorrências que tenham interesse para sua conservação.

"Auto de arrolamento: O auto deverá observar o que dispõe o CPC a respeito da penhora (art. 665), de modo que deverão estar presentes: (a) a indicação de dia, mês, ano e lugar onde foi feito; (b) os nomes do requerente e requerido; (c) a descrição minuciosa dos bens, com todos os seus característicos, permitindo a perfeita individualização; (d) a nomeação do depositário dos bens"21.

Art. 860. Não sendo possível efetuar desde logo o arrolamento ou concluí-lo no dia em que foi iniciado, apor-se-ão selos nas portas da casa ou nos móveis em que estejam os bens, continuando-se a diligência no dia que for designado.

"Execução do arrolamento: Esclarece o dispositivo a necessidade de lacração do local onde se encontram os bens ainda não arrolados (e conseqüentemente não depositados nas mãos do depositário), permitindo a suspensão do ato processual. Não raras vezes a medida exige prévia busca e apreensão, mera providência de execução que não se confunde com cautelar autônoma. Entregue os bens ao depositário lavrar-se-á o auto correspondente, passando a partir daí o depositário a responder pela conservação dos bens apreendidos"22.

Seguindo-se a tônica adotada pela doutrina citada, abrem-se mais dois tópicos descritos por Humberto Theodoro Jr.23 em sua dileta monografia.

Sobre o autor
Tassus Dinamarco

advogado, pós-graduando em processo civil pela Universidade Católica de Santos (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DINAMARCO, Tassus. Técnica do direito processual civil na ação cautelar de arrolamento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1603, 21 nov. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10632. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Texto baseado em Seminário realizado na pós-graduação em Direito Processual Civil da Universidade Católica de Santos.

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