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A revisão da vida toda.

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Na decisão sobre a revisão da vida toda, a modulação de efeitos para excluir a revisão de benefícios já extintos e limitar a retroatividade busca conciliar interesses divergentes.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como temática a modulação dos efeitos da decisão do STF no RE nº 1.276.977/DF sobre a "revisão da vida toda" no âmbito previdenciário. Trata-se de uma controvérsia que tem despertado considerável divergência no Supremo Tribunal Federal (STF) e apreensão por parte dos segurados. A delimitação do assunto se faz essencial para compreender as implicações da modulação temporal da decisão, considerando a relevância do contexto jurídico e os desafios enfrentados pelos segurados em busca do reconhecimento de seus direitos.

No cenário jurídico brasileiro, a "revisão da vida toda" refere-se à possibilidade de incluir, no cálculo do benefício previdenciário, as contribuições realizadas antes da entrada em vigor do Plano Real, em 1994. Esta revisão, embora tenha seu direito pacificado, tornou-se objeto de intensa discussão no STF, especialmente no que diz respeito à modulação dos efeitos da decisão, pois a depender da modulação diversos segurados podem ser afetados não conseguindo acesso ao melhor benefício.

Nesse contexto, este estudo de caso tem como objetivo analisar a controvérsia existente entre a modulação dos efeitos da decisão no RE nº 1.276.977/DF, em dezembro de 2022, que fixou a tese nos termos do voto do relator, Ministro Alexandre de Moraes, de que o segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da Lei 9.876, de 26 de novembro de 1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais introduzidas pela EC em 103/2019, que tornou a regra transitória definitiva, tem o direito de optar pela regra definitiva, acaso esta lhe seja mais favorável.

O esforço justifica-se pelo momento propício para uma análise aprofundada, considerando a diversidade de posicionamentos entre os ministros do STF, as implicações da modulação dos efeitos e os desafios na busca por uma solução que concilie direitos individuais, estabilidade jurídica e responsabilidade fiscal. Até porque, atualmente já existe no STF três votos em sentidos distintos para prever o marco temporal dos efeitos da decisão.

Nesse sentido, ao longo deste trabalho, será apresentado o panorama jurídico majoritário e divergente sobre o tema, esclarecendo a posição jurisprudencial dominante e as discordâncias existentes.

Para tanto, o trabalho seguirá uma estrutura organizada para explorar a complexidade jurídica da modulação dos efeitos da decisão do STF sobre a "revisão da vida toda", iniciando com a apresentação do caso, delineando o contexto específico que motiva a pesquisa.

Em seguida, na seção sobre a revisão da jurisprudência abordaremos a evolução das decisões dos tribunais superiores, identificando nuances e divergências; e na seção acerca do entendimento doutrinário amplia-se a análise ao considerar as perspectivas acadêmicas sobre a questão.

Posteriormente, no tópico da exploração das normas que regulamentam a matéria destacaremos os dispositivos legais e regulamentares que influenciam a aplicação da "revisão da vida toda"; e, por fim, far-se-á uma análise crítica para oferecer uma reflexão profunda sobre as implicações, considerando diferentes aspectos e trazendo a opinião do pesquisador sobre o tema, propondo uma solução ponderada.

Ao fim e ao cabo, por meio da conclusão, objetiva-se sintetizar os resultados da pesquisa, refletindo o estudo detalhado realizado ao longo dessas seções.

Essa abordagem estruturada visa fornecer uma compreensão abrangente e contextualizada do tema em discussão.


2. APRESENTAÇÃO DO CASO

O caso em apreço foi provocado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em face de uma decisão emanada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que assegurou a um beneficiário, vinculado ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) antes da promulgação da Lei nº 9.876/1999, a prerrogativa de reexame de sua aposentadoria mediante a aplicação da regra definitiva, consubstanciada no artigo 29 da Lei nº 8.213/1991, por se revelar mais benéfica no cômputo do benefício em comparação à regra de transição.

Insatisfeito com a decisão, o INSS interpôs o RE nº 1276977 / DF, para sanar a controvérsia e, pela relevância e possível impacto financeiro aos cofres públicos, teve repercussão geral reconhecida1 para definir se o segurado do INSS que ingressou no sistema previdenciário até o dia anterior à publicação da Lei 9.876/1999, pode optar, para o cálculo do seu salário de benefício, pela regra definitiva prevista no art. 29, I e II, da Lei 8.213/1991 quando essa lhe for mais favorável do que a previsão da lei, no art. 3º, de uma regra transitória, por lhe assegurar um benefício mais elevado.

Nas suas razões recursais, o INSS defendeu que não há que se falar em inclusão do período contributivo anterior a 1994, tendo em vista que a única norma legal aplicável ao cálculo de benefícios para todos os segurados, independentemente de terem se filiado ao RGPS antes ou depois da vigência da Lei 9.876/1999, é aquela que restringe o cômputo das contribuições para aposentadoria apenas a partir de julho de 1994. Essa limitação é imposta aos primeiros por um imperativo legal explícito e aos últimos como uma consequência lógica da filiação ocorrida após 1999.

Essa regra transitória que tinha como prisma favorecer os trabalhadores com menor escolaridade, mas em alguns casos se mostrou pior para os segurados que iam progredindo sua faixa salarial. Logo, proporcionar tratamento mais gravoso ao segurado mais antigo em comparação ao novo segurado contraria claramente o princípio da isonomia.

À vista disso, ao analisar o caso o Plenário do STF, em votação dividida, tendo em vista ter 6 votos favoráveis e 5 divergentes, seguiu o entendimento também manifestado pelo ministro Nunes Marques, de que o afastamento da regra de transição criaria uma situação que violaria a isonomia, permitindo a coexistência de dois formatos de cálculo para segurados filiados antes de novembro de 1999.

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Todavia, noutra intelecção, o ministro Luís Roberto Barroso frisou que com a nova lei, a regra geral passou a considerar todas as contribuições a partir de julho de 1994 e, por conseguinte, admitir a revisão da vida toda, ou seja, considerando o período anterior a 1994 traria para o sistema previdenciário a litigiosidade em torno dos índices de inflação anteriores ao Plano Real.

Após longo embate, ao fim e ao cabo, decidindo a controvérsia de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal ao julgar o RE nº 1.276.977/DF, 01 em dezembro de 2022 negou provimento ao recurso impetrado pelo INSS e fixou a tese nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes de que

“O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da Lei 9.876, de 26 de novembro de 1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais introduzidas pela EC em 103/2019, que tornou a regra transitória definitiva, tem o direito de optar pela regra definitiva, acaso esta lhe seja mais favorável”.

Observa-se, pois, que a despeito dos embargos declaratórios impetrado pelo INSS, não se vislumbra o que se discutir a respeito do mérito do recurso, uma vez que a matéria foi julgada em Plenário. Contudo, ainda reside grande debate a respeito da modulação dos efeitos da decisão, uma vez que além dos referidos embargos, após o julgamento, o INSS apresentou petição requerendo a suspensão de todos os processos sobre o tema no país até que haja o trânsito em julgado do RE com a apreciação dos embargos.

Fundamentando seu pleito, o INSS alega que, na forma do art. 23 da LINDB, seria necessária a instituição de um regime de transição, a fim de que pudesse prover-se das condições necessárias para fazer uma transição entre a interpretação vigente até então – para a qual se encontrava organizado – para a nova interpretação, sem prejuízo aos interesses dos demais segurados do RGPS.

Ademais, o INSS alegou o fato de que o cumprimento da decisão do STF demanda alteração de sistemas, rotinas e processos que possuem impacto orçamentário de milhões de reais, providências que não foram tomadas até então pois representariam despesas financeiras inúteis caso a revisão da vida toda fosse julgada indevida.

Ao analisar tal pleito, inicialmente, o Ministro Relator Alexandre de Moraes não concedeu a suspensão, mas apenas o prazo de 10 (dez) dias para que o INSS apresentasse cronograma de aplicação da diretriz formada no Tema 1102 da repercussão geral.

Entretanto, o INSS reiterou a necessidade de suspensão de todos os processos que versem sobre a mesma controvérsia do Tema 1102, sob argumento de que somente a partir da publicação do acórdão do referido precedente e do julgamento de Embargos de Declaração, será possível definir o número de benefícios a serem analisados, estimar o impacto financeiro, e mensurar as condições estruturais necessárias ao cumprimento da tese vinculante, bem como apresentar um cronograma de implementação factível.

Ao analisar tal pleito, o Ministro Alexandre Moraes entendeu ser prudente a suspensão dos processos que tramitam nas instância de origem até a decisão definitiva, haja vista que tramitam nas instâncias inferiores processos versando sobre a matéria analisada no precedente, bem como que há um relevante impacto social da decisão, necessitando assim que a tese de repercussão geral seja aplicada sob condições claras e definidas.

À vista disso, fora determinada a suspensão de todos os processos que versem sobre a matéria julgada no Tema 1102, até a data da publicação da ata de julgamento dos Embargos de Declaração opostos pela autarquia.

Acontece que, após o voto-vista do Ministro Cristiano Zanin, e dos votos dos Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente) e Dias Toffoli, todos divergiram do Relator, tanto para dar parcial provimento aos embargos de declaração, no sentido de sanar a omissão quanto à violação ao art. 97 da Constituição da República e reconhecer a nulidade do acórdão proferido pela colenda Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça e determinar a remessa dos autos à Corte, para que seja realizado novo julgamento.

Noutro ponto, que nos interessa neste estudo de caso, foi fixado que para caso fiquem vencidos nesse ponto, por razão de segurança jurídica, na esteira dos arts. 926 e 927 do CPC, que fossem modulados os efeitos da decisão, atribuindo efeitos ex nunc, a contar da publicação da ata de julgamento, qual seja, 13/12/2022, sem qualquer ressalva, restando expressa, portanto, a impossibilidade de:

Assim, subsiste a questão crucial que se busca abordar neste estudo de caso: caso a argumentação de omissão seja refutada e a tese estabelecida seja mantida, como modular de maneira mais eficaz os efeitos da decisão proferida no RE nº 1.276.977/DF com o objetivo de assegurar o melhor marco temporal para a aplicação da "revisão da vida toda", bem como promover simultaneamente a segurança jurídica e garantindo o direito ao benefício mais vantajoso.


3. REVISÃO DE JURISPRUDÊNCIA

Evidentemente, em suas razões recursais o INSS defendeu que fossem modulados os efeitos da decisão de forma que ele se aplique apenas para o futuro, excluindo-se expressamente a possibilidade de:

“a) revisão de benefícios previdenciários já extintos;

b) rescisão das decisões transitadas em julgado que, à luz da jurisprudência dominante, negaram o direito à revisão; e

c) revisão e pagamento de parcelas de benefícios quitadas à luz e ao tempo do entendimento então vigente, vedando-se por consequência o pagamento de diferenças anteriores a anteriores a 13.04.2023 (data de publicação do acórdão do Tema 1.102/STF).”

A partir da problemática, três Ministros já se posicionaram acerca da modulação dos efeitos da decisão, o Relator, o ministro Alexandre de Moraes, o ministro Cristiano Zanin e a ministra Rosa Weber, hoje aposentada.

Em seu voto, o ministro Alexandre de Moraes adotou posicionamento no sentido de que por razões de segurança jurídica presentes na espécie, era recomendada a modulação dos efeitos da decisão para que se exclua do entendimento fixado no Tema 1102:

(a) a revisão de benefícios previdenciários já extintos; e

(b) a revisão retroativa e pagamento de parcelas de benefícios quitadas anteriormente ao julgamento por força de decisão já transitada em julgado. Todavia, nesta hipótese, o interesse social recomenda que, tendo em vista a orientação do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL adotada a partir do julgamento do Tema 1102 e, considerando a cláusula rebus sic stantibus, tais parcelas sejam corrigidas observando-se a tese fixada nesse leading case, a partir do julgamento do mérito (1º/12/2022). Esse entendimento prestigia o princípio da inafastabilidade da jurisdição, que não pode prejudicar aqueles que recorreram ao Poder Judiciário.

Ao apresentar seu voto, enquanto ainda estava na atividade, a Ministra Rosa Weber acolheu o relatório do Relator, porém apresentou divergência em relação à modulação nos termos por ele propostos.

Em relação a revisão de benefícios previdenciários já extintos a Ministra votou por mantê-lo, contudo, no tocante a revisão retroativa e pagamento de parcelas de benefícios quitadas anteriormente ao julgamento por força de decisão já transitada em julgado, a Ministra firmou parcial divergência no sentido de que, o STF ao ratificar o posicionamento proferido pelo STJ não alterou a jurisprudência em análise, pois não declarou a inconstitucionalidade do art. 3º da Lei 9.876/1999.

Assim, consoante a Ministra “houve alteração jurisprudencial, sim, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do recurso especial sob o rito dos repetitivos, mas não, repito, nesta Suprema Corte”, daí porque, entendeu que desde que publicado o acórdão do STJ (17.12.2019) o INSS já deveria ter ajustado sua prática administrativa para se adequar ao pronunciamento do STJ firmado sob o rito dos recursos repetitivos.

Sendo assim, para a Ministra, a modulação de efeitos deve contar da data da publicação do acórdão perante o Superior Tribunal de Justiça (17.12.2019), ante a necessidade de preservar as situações jurídicas consolidadas até o julgamento do STJ.

Como vimos, ao analisar os embargos, o Ministro Cristiano Zanin divergiu totalmente dos entendimentos proferidos pelo Relator e da Ministra já aposentada Rosa Weber, assentando preliminarmente que verificou omissão no acórdão embargado, especialmente quanto à alegação de inobservância do art. 97 da CF pelo órgão prolator do acórdão extraordinariamente recorrido e, por conseguinte, votou pela nulidade do acórdão oriundo da Primeira Seção do STJ, e determinou o retorno dos autos ao Plenário, para que seja realizado novo julgamento do feito, com a devida observância do postulado da reserva de plenário.

Além do que, antevendo a possibilidade de ficar vencido neste ponto, entendeu também ser necessário modular os efeitos da decisão embargada, porém, de forma diversa da que foi proposta pelo Ministro Alexandre de Moraes e pela Ministra Rosa Weber, defendeu o marco temporal a data da publicação da ata de julgamento do mérito, ou seja, 13/12/2022.


4. ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO

Percebe-se, portanto, que a divergência existente atualmente no STF recai sobre a definição do marco temporal dos efeitos da decisão que, 01 de dezembro de 2022, antes de Zanin ser escolhido para o cargo, reconheceu o direito de os aposentados usarem todas as suas contribuições previdenciárias, inclusive aquelas recolhidas antes do Plano Real, de 1994, para calcular os valores de seus benefícios.

Importante frisar desde já, que há um consenso acerca da impossibilidade de revisão de benefícios previdenciários já extintos, logo a divergência apresenta-se sobre a possibilidade ou não da revisão retroativa e pagamento de parcelas de benefícios quitadas anteriormente ao julgamento por força de decisão já transitada em julgado.

Em outras palavras, faz-se necessário definir se as parcelas de benefícios já pagas e quitadas por força de decisão já transitada em julgado serão corrigidas observando-se: a) a tese fixada a partir da data do julgamento do mérito, em 1º de dezembro de 2022; b) a partir de 13 de dezembro de 2022, data da publicação da ata de julgamento do mérito; ou c) a partir de 17 de dezembro de 2019, quando o STJ confirmou o direito à correção do valor recebido pelos aposentados.

Deveras, uma das consequências das decisões em sede de repercussão geral é a possibilidade de se “afastar a inexorabilidade de que os efeitos da nova regra, ou seja, da nova maneira de o tribunal decidir a mesma questão, produza efeitos retroativos” (ALVIM e MONNERAT, 2021, p. 186).

Para esses autores (ALVIM e MONNERAT, 2021), quando se abandona uma orientação que era antes encampada ou por um precedente vinculante, ou por uma súmula (vinculante ou não), ou pela jurisprudência pacificada daquele ou de outro tribunal, têm parecido os três critérios que devem ser considerados por um tribunal para proceder à modulação temporal dos efeitos da nova posição adotada.

Nesse sentido, o primeiro critério é “a circunstância de existir uma orientação firme anterior que justamente tivesse sido capaz de gerar no jurisdicionado a certeza de estar agindo conforme o direito em vigor à época de sua conduta” (ALVIM e MONNERAT, 2021, p. 187).

O segundo critério é o âmbito do direito em que essa mudança ocorre, ou seja, como os princípios da previsibilidade e da segurança jurídica podem ser afetados. E, o terceiro e último dos critérios diz respeito aos casos em que o Estado está envolvido, direta ou indiretamente, e a nova posição adotada prejudique o particular.

De fato, o princípio da segurança jurídica é uma decorrência do Estado de Direito (MENDES e BRANCO, 2019, p. 410), “daí que se mostra importante dizer que a segurança jurídica tem norte apontado tanto para condutas a serem praticadas pelo Estado, sobretudo aqui para atos judiciais” (BRANDÃO e FARAH, 2020, p. 844).

Diversos doutrinadores optam por abordar a segurança jurídica sob duas perspectivas: objetiva e subjetiva. A perspectiva objetiva está relacionada aos limites da retroatividade das ações do Estado, enquanto a perspectiva subjetiva diz respeito à salvaguarda e à confiança das indivíduos em relação a atos, procedimentos e comportamentos estatais (MOREIRA e PEREIRA, 2018, p. 255), evitando atos inesperados e prejudiciais e até mesmo bloqueando mudanças surpreendentes do Estado.

Para Cavalcanti (2019, p. 384) existem três possibilidades para modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo: “1) restringir os efeitos da declaração; 2) decidir que ela só tenha eficácia a partir do seu trânsito em julgado; 3) decidir outro momento que venha a ser fixado”.

Sendo assim, a modulação deve ocorrer, em princípio, mesmo quando a jurisprudência antes consolidada muda repentinamente de rumo, pois “basta que a situação existente gere confiança do jurisdicionado, a ponto de este planejar sua vida com base nesta pauta de conduta” (ALVIM e MONNERAT, 2021, p. 190-191).

Todavia, a despeito da posição adotada de forma “não científica”2 por alguns juristas e que atendem a expectativa de todos os contribuintes, no sentido de que modular os efeitos a partir do julgamento significaria chancelar a ilegalidade previdenciária rechaçada pelo acórdão embargado, prejudicando o auferimento da diferença pecuniária pela revisão da vida toda de todos os aposentados, “nem sempre o critério prejuízo do particular, gerado pela alteração da orientação do Poder Judiciário prevalece na decisão pela modulação” (ALVIM e MONNERAT, 2021, p. 192).

Deveras, a exemplo do que aconteceu no RE n. 559.943, no qual o STF declarou inconstitucionais os prazos prescricional e decadencial de dez anos para a cobrança das contribuições previdenciárias, fazendo prevalecer o prazo do Código Tributário Nacional, de cinco anos.

Na oportunidade, a Corte modulou os efeitos da decisão, de modo a impedir a repetição de indébito de valores recolhidos pelo contribuinte acima do prazo estabelecido no julgado e, portanto, em detrimento do critério de proteção do particular em face do Estado, o Supremo Tribunal Federal optou por realizar a modulação como forma de manter a estabilidade das relações tributárias já extintas pelo pagamento ou execução.

Entretanto, tal como o caso em exame neste estudo de caso, o tema não foi modificado pelo Supremo Tribunal Federal, uma vez que a jurisprudência nos tribunais nacionais já era nesse sentido.

Por estas considerações e entendimentos doutrinários verifica-se claramente que é possível a modulação dos efeitos da decisão definindo um marco temporal para a concessão do benefício da revisão da vida toda, uma vez que a questão já havia sido discutida e em certa medida pacificada tanto no STJ, quanto nas próprias tratativas internas do INSS sobre o assunto, bem como que, não se pode olvidar o impacto significativo que terá os cofres públicos a partir da operacionalização da decisão.

Sobre os autores
Jamil Pereira de Santana

Mestre em Direito, Governança e Políticas Públicas pela UNIFACS - Universidade Salvador | Laureate International Universities. Pós-graduado em Direito Público: Constitucional, Administrativo e Tributário pelo Centro Universitário Estácio. Pós-graduado em Licitações e Contratos Administrativos pela Universidade Pitágoras Unopar Anhanguera. Atualmente, pós-graduando em Direito Societário e Governança Corporativa pela Legale Educacional. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio da Bahia. 1º Tenente R2 do Exército Brasileiro. Membro da Comissão Nacional de Direito Militar da Associação Brasileira de Advogados (ABA). Membro da Comissão Especial de Apoio aos Professores da OAB/BA. Professor Orientador do Grupo de Pesquisa em Direito Militar da ASPRA/BA. Membro do Conselho Editorial da Revista Direitos Humanos Fundamentais e da Editora Mente Aberta. Advogado contratado das Obras Sociais Irmã Dulce, com atuação em Direito Administrativo e Militar.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTANA, Jamil Pereira; GONÇALVES, Paulo Victor Silva. A revisão da vida toda.: Modulação dos efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 1.276.977-DF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7500, 13 jan. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/107996. Acesso em: 22 nov. 2024.

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