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Como o lawfare sabota a democracia em Goiás

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Os autores afirmam que o uso estratégico da Justiça em Goiás abriu caminho para a ascensão da extrema-direita e exterminou a gestão ambiental democrática.

Resumo: Esse trabalho visa analisar algumas das questões relacionadas a prática do lawfare e como ele sabota a democracia no Estado de Goiás, constituindo-se ameaça à estrutura política e jurídica em um país democrático que defende os direitos humanos. Para tanto, buscou-se com essa pesquisa analisar as práticas de lawfare ocorridas em Goiás e se elas interferiram na realidade política do Estado. A pesquisa contou com a metodologia exploratória apresentando um cenário vigente, sendo utilizada a técnica bibliográfica e qualitativa. Para a sua realização foram analisados os casos emblemáticos e expressivos de lawfare no Estado de Goiás. Por fim, restou comprovado que o uso estratégico do aparato de justiça para promover a aniquilação do inimigo político, representado pelas lideranças democráticas e de centro-esquerda, abriu espaço para a consolidação dos agentes políticos defensores das pautas extremistas de direita no Estado de Goiás.

Palavras-chave: Lawfare. Democracia. Estado de Goiás.

Sumário: Introdução. 1. Efeitos Diretos do Lawfare. 2. Lawfare nas Gestões do Partido dos Trabalhadores em Goiânia. 3. Lawfare Contra um Réu sem Crime que abriu o Caminho para a destruição da Democracia no Brasil. 4. Lawfare Contra Marconi Perillo: Consolidação da Extrema-direita em Goiás. 5. Lawfare para minar processos Políticos Emergentes. 5.1. Lawfare na Área do Meio Ambiente. 5.1.1. Gestão Ambiental em Goiânia. 5.1.2. Elementos do Lawfare Seminal. 5.1.3. Gestão Ambiental em Goiás. 5.2. Lawfare na Área da Saúde Pública. Conclusão. Referências.


INTRODUÇÃO

Sabe-se que o lawfare enquanto “o uso da lei como a arma da guerra é a mais nova característica do combate do século XXI” (Dunlop, 2021, p.2), o qual, em um sentido estrito, segundo Gloppen (2017), consiste em estratégias de mobilização jurídica contendo alguma forma de litígio motivada por um objetivo de transformação social que vai além da vitória em um processo judicial individual.

Segundo Zanin Martins et al. (2019, p. 20-21), é preciso distinguir os termos lawfare e insurgência: este, conforme descrição de Jean e John Comaroff, é “caracterizado como o legítimo uso de litígios estratégicos para promover objetivos políticos e sociais”, enquanto aquele deve ser descrito “a partir do momento em que o Direito deixou de ser uma instância de resolução pacífica de controvérsias para se metamorfosear, perversamente, em arma do Estado para abater os inimigos”. O lawfare, portanto, é uma agressão ao princípio da imparcialidade da jurisdição.

Cabe ressaltar que a análise empreendida neste artigo não adota critérios de preferências políticas, mas procura situar quando e como as práticas de lawfare interferiram na realidade política do Estado de Goiás desde a redemocratização da República Federativa do Brasil e condicionaram a constituição do cenário político que se tem hoje, baseado numa concepção autoritária, policial-militar, que resulta no aumento de violações de direitos humanos, extinção das prerrogativas de advogados criminalistas e crescimento da violência policial e carcerária.

Também, se propõe a demonstrar que no Estado de Goiás, a exemplo do que aconteceu em relação ao país, os casos de lawfare serviram à uma das seguintes hipóteses: fortalecimento de uma lógica de estado militarizado ou à desmoralização de políticas públicas, de obras públicas ou de projetos políticos destinados à parcela da população que mais necessita da atuação do estado ou ao desenvolvimento socioeconômico sustentável.

Esta pesquisa objetiva aprimorar e atualizar conhecimentos sobre o tema enfocado, aplicando-se o método qualitativa bibliográfica, a partir da análise dos dados suficientemente levantamentos por meio de pesquisa primária e secundária sobre casos emblemáticos e expressivos de lawfare no Estado de Goiás, bem como utilizou o método exploratório de processos contendo o objeto da pesquisa.

Para tanto, foram estudados casos de lawfare dirigidos contra as lideranças dos partidos democráticos e populares em Goiás, a exemplo de todos os prefeitos eleitos pelo Partido dos Trabalhadores para dirigir Goiânia, a capital do estado de Goiás, assim como a aplicação deste instrumento para interromper a sequência de gestão democrática à frente do governo estadual, com repercussões nas políticas públicas emergentes do meio ambiente e da saúde pública. No mesmo sentido, o caso da guerra jurídica que visou aniquilar uma liderança-chave na formação da coligação de democracia popular no Brasil. Tais casos constituíram instrumentos de sabotagem da democracia e de abertura de espaço para o avanço da extrema-direita no estado de Goiás.


1. EFEITOS DIRETOS DO LAWFARE

Lawfare (formada do inglês law, "direito", e warfare, "guerra"; em português: guerra jurídica) é uma palavra-valise introduzida nos anos 1970, e que originalmente se refere a uma forma de guerra na qual o direito é usado como arma. Basicamente, seria o emprego de manobras jurídico-legais como substituto de força armada, visando alcançar determinados objetivos de política externa ou de segurança nacional. (Wikipedia, On-line, 2023).

Sobre os estudos feitos tanto pelos aspectos negativos quanto positivos no uso da lei como instrumento de guerra (sobretudo no contexto das discussões sobre segurança internacional e contraterrorismo) vários estudiosos de Ciências Políticas e do Direito Internacional entendem o lawfare como o uso ilegítimo da legislação (nacional ou internacional) em manobras jurídicas com a finalidade de causar danos a um adversário político (estrangulando-o financeiramente, politicamente, moralmente, encurtando seus prazos e etc.) de modo que este não possa perseguir objetivos, tais como concorrer e se manter em uma função pública/política. Nesse sentido, o lawfare seria comparável ao uso estratégico de processos judiciais visando assim criar impedimentos a adversários políticos - uma prática conhecida, nos países anglo-saxões, como SLAPP, acrônimo de Strategic Lawsuit Against Public Participation (Ação Judicial Estratégica Contra a Participação Pública).

O trabalho feito pela causídica e ativista Cleide Martins, representante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia - Núcleo Distrito Federal – ABDJ/DF, em conjunto com outros juristas, e que despertou a elaboração de um grupo de estudos na Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Rio de Janeiro (OAB/RJ), tomando como ponto de partida os estudos em relação ao lawfare, e que também foi desenvolvido pelo Grupo Prerrogativas, nos desdobramentos da Operação Lava Jato (ou Vaza Jato), foram de suma importância, haja vista a constatação de abusos de toda a ordem e toda sorte na mencionada operação, e que à época da elaboração desta minuta coincidiu com a cassação do ex procurador do Ministério Público Federal –MPF, e ex deputado federal pelo Paraná Deltan Dallagnol (Podemos/PR), que atuou naquela operação, e usou a mesma como um trampolim político, assim como o Senador pelo Paraná Sérgio Moro (União Brasil/PR) sem se importar com as consequências de seus atos. De certa forma ele está bebendo a mesma taça de veneno que ofereceu aos acusados naquela operação. Provou rápido do próprio veneno. Moro será o próximo, quem viver verá.

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No atual contexto político brasileiro, o termo lawfare tem sido empregado principalmente no sentido de uso de instrumentos jurídicos para fins de perseguição política, de destruição da imagem pública e inabilitação de um adversário político. Tal situação é combatida pelo Grupo Prerrogativas e pela Rede Lawfare Nunca Mais, em toda a Federação Brasileira.

A prática do lawfare foi definida como a estratégia de utilizar, ou mal utilizar a lei em substituição aos meios militares tradicionais para se alcançar um objetivo operacional. A expressão lawfare também significa o uso do sistema jurídico como parte de uma estratégia contra adversários políticos, ou seja, o uso das leis como uma arma política. E em termos simples, o lawfare poderá ser entendido como o uso da legislação como uma arma para alcançar um fim político-social, um tipo assédio judicial/processual que tem como objetivo calar o adversário ou minar a sua credibilidade perante à sociedade.

A prática de lawfare é planejada de forma que aparente acontecer dentro da legalidade e, muitas vezes, essa aparência é criada com o auxílio da imprensa, pois primeiro se promove o linchamento público virtual/viral, depois o linchamento processual propriamente dito de sua vítima da vez. Por este motivo, o termo lawfare é utilizado, na maior parte das vezes, com uma conotação negativa, pois passa a ideia de um uso abusivo e ilegítimo da lei para prejudicar um determinado adversário público/político.

Nesse sentido, o lawfare possui algumas características e táticas sobejamente usadas na Operação Lava Jato, a seguir relacionadas: instauração de processos judiciais sem qualquer mérito contendo acusações sem materialidade (provas), destituídas de embasamento consistente; manipulação do sistema legal, com aparência de legalidade, para fins políticos; abusar do sistema legal para prejudicar a reputação dos adversários; Promover ações judiciais para desacreditar os oponentes; tentar influenciar a opinião pública para obter publicidade negativa para o inimigo; judicializar a política, ou seja, utilizar a lei e a sua aplicação como instrumento para conectar meios e fins políticos; promover a desilusão popular; utilizar o direito como forma de constranger adversários; bloquear e retaliar as tentativas dos adversários de utilizarem procedimentos e normas legais disponíveis para defesa dos seus direitos (CNN Brasil, 2020).

Ou seja, uma vez que um oponente é escolhido para ser a cobaia da vez da prática nociva do lawfare, a legislação e os procedimentos legais e os meios de comunicação passam a ser utilizados pelos agentes públicos e políticos como uma forma de perseguir a estas pessoas. Gerando toda ordem de estragos, não atingindo somente só a reputação dos envolvidos nas tramas desembocadas em lawfare, mas a toda uma nação que poderá ficar refém do lawfare, como se viu após os abusos de autoridade perpetrados na Operação Lava Jato, e que eclodiram no abismo social/jurídico e político hoje existente no Brasil.


2. LAWFARE NAS GESTÕES DO PARTIDO DOS TRABALHADORES EM GOIÂNIA

O Partido dos Trabalhadores (PT) por 3 (três) vezes elegeu candidatos para o exercício de mandatário máximo do Poder Executivo de Goiânia, quais sejam, o prefeito Darci Accorsi na gestão entre 1993 e 1996; o prefeito Pedro Wilson na gestão entre 2001 e 2004; e o prefeito Paulo Garcia na gestão entre abril de 2010 e dezembro de 2016. Tem-se que em suas carreiras políticas, estes dirigentes políticos do PT foram condenados judicialmente ao menos uma vez, o que pode significar que o avanço do campo político progressista no Estado de Goiás foi indiscutivelmente obstruído pelas instituições locais, uma vez que nenhum outro dirigente de partido político diverso do PT recebeu, na história de Goiânia, até o presente, o mesmo procedimento e tratamento, aqui discutido, dos órgãos de controle e da justiça no estado de Goiás. Senão vejamos.

2.1. DARCI ACCORSI (1993 a 1996)

O professor Darci Accorsi foi o primeiro prefeito da história de Goiânia eleito por uma coligação de partidos políticos de centro-esquerda, liderada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) em aliança com o Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB), Partido Comunista do Brasil (PcdoB), Partido Socialista Brasileiro (PSB) e Partido Verde (PV).

A Administração de Centro-Esquerda, no período de 1° de janeiro de 1993 a 1° de janeiro de 1997, adotou políticas públicas inovadoras em vários aspectos da gestão municipal, sobretudo,

[...] na valorização dos servidores públicos com um aumento da média salarial de US$ 209,90 para US$ 523,00 (137,13%) e com a implantação dos Planos de Cargos e Salários da Educação e da Saúde; os orçamentos aplicados nestas áreas estratégicas tiveram aumentados, respectivamente, de 77,5% e de 75,9%, em comparação com o governo anterior. No plano político, foi efetivado o processo democrático de participação popular e de construção da cidadania, por meio do Projeto Goiânia Viva e do Orçamento Participativo, sendo executadas e concluídas 120 obras, sob uma nova forma de expressão, reivindicação e fiscalização exercidas pela sociedade organizada. [...]

Sem falar na extrema importância para a cidade, os recursos destinados à área do meio ambiente, fundamentalmente, na recuperação e implantação dos Parques Botafogo, Areião e Jardim Botânico, além da implantação do Parque Vaca Brava em parceria com a iniciativa privada. No plano dos investimentos, conseguimos avanços significativos, principalmente no que se refere aos serviços de infraestrutura com quase um milhão de metros quadrados de asfalto até 1995. A maior prova do acerto da nossa Administração está na matéria veiculada pela revista Exame que classificou Goiânia como a segunda cidade brasileira a reunir condições favoráveis aos investimentos dos mais diversos setores do mercado [...]. (Accorsi, 1995).

Entrementes, desde o início do seu mandato, o prefeito Darci Accorsi foi alvo de persecução judicial implacável, por parte do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), que instaurou inúmeras ações civis públicas nas esferas penal, civil e administrativa, com ênfase nas imputações de improbidade administrativa. O volume acusatório contra o prefeito petista inaugurou o arsenal de uso estratégico da lei, do direito ou do poder judiciário como arma de perseguição política em Goiás.

O procedimento do inquérito civil público – ICP foi utilizado pelo Parquet não para formação de prévia convicção à propositura da ação civil pública - ACP, mas sim, como arma política de devassa administrativa e de ingerência nas políticas públicas de competência do executivo para os fins de perseguição política.

Observou-se no caso Darci Accorsi procedimentos característicos do uso estratégico do direito, por meio de uma contundência na instauração de inquéritos, convocação de coletivas, anúncio público de providências e até pedido de prisão, típicos da espetacularização do processo penal. Cada inquérito civil público ou inquérito policial instaurado contra o prefeito era acompanhado por intensiva e abusiva publicização do ato, a partir de um Parquet ativista e emissor de juízos de valores pré-formados, por meio de releases, informações, notas e coletivas à imprensa escrita, falada e televisada. Na mesma esteira, em sintonia com a acusação, a autoridade responsável pela investigação procedia implacavelmente ao indiciamento do acusado. Sem dúvida, o prefeito Darci Accorsi cumpriu seu mandato como um calvário, submetido a intenso bombardeio persecutório.

As implicações histórica, política e jurídica relacionadas à Administração do Prefeito Darci Accorsi e as implicações pessoais decorrentes podem ser avaliadas a partir da Carta do Leitor, in litteris:

Gostaria de saber por anda aquela senhora que há três anos ocupou essa coluna para escrever um artigo de prejulgamento do governo do professor Darci Accorsi. [...] Pois bem, no seu artigo ela dizia que antes que a Prefeitura de Goiânia passasse para Darci, ela queria andar pelas ruas da Capital e admirar, pela última vez, os jardins floridos, porque o PT não seria capaz de conservá-los. Ledo engano, minha senhora. A administração do prefeito Darci não só conservou os jardins como aumentou a quantidade e a qualidade das flores. Além disso, em três anos, realizou obras pelas quais todos ansiávamos. Todo esse trabalho deu a Goiânia o título internacional de “Cidade Modelo de Área Ambiental” e cidade exemplar de qualidade de vida. [...] Darci, que sofreu tantas críticas em sua administração, censurado e fritado por alguns segmentos, está realmente de alma lavada. Célia Maria Jacarandá Maciel, Setor Oeste – Goiânia (O Popular, 1996, p.6)

A persecução judicial contra o professor Darci Accorsi envolveu seu nome, imagem e pessoa a crimes de corrupção que, conforme restou provado, ele não praticou. Inobstante, teve sua prisão preventiva decretada quando já não era mais prefeito de Goiânia. Em agosto de 2005, no exercício da função de diretor da Indústrias Químicas do Estado de Goiás (IQUEGO), foi acusado de fraude em licitação. A Polícia Federal, na chamada Operação Roupa Suja, ao cumprir a ordem de prisão decretada contra o ex-prefeito, conduziu o custodiado algemado, com imagens veiculadas no Jornal Nacional e nos maiores veículos de comunicação do país, em voo comercial para um presídio federal no Rio de Janeiro, onde permaneceu preso e depois liberado.

Darci Accorsi foi um dos primeiros martirizados pelo lawfare. Submetido à espetacularização penal, foi linchado e humilhado publicamente. Anos depois, foi absolvido de todas as acusações, até sua morte, em 20 de novembro de 2014, aos 69 anos, sem que a sua honra tenha sido retratada pelos detratores.

2.2. PEDRO WILSON (2001 a 2004)

Pedro Wilson foi condenado em primeira instância pela acusação de improbidade administrativa. ajuizada pelo MP-GO, por ter feito contratos tidos como irregulares quando foi prefeito de Goiânia (2001 a 2004). Ele teve as contas rejeitadas em 2004 pelo Tribunal de Contas do Município (TCM) por supostos atos dolosos de improbidade administrativa em um termo de parceria feito entre a prefeitura e uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip).

Posteriormente, em 2013, quando estava à frente da Agência Municipal de Meio Ambiente, foi condenado em ação que tramitou na 2ª Vara da Fazenda Pública Municipal de Goiânia, que julgou procedente ação civil pública – ACP proposta pelo MP-GO. Segundo o órgão ministerial, o acusado contraiu despesas e não efetuou os pagamentos, consoante lançamentos em restos a pagar, não deixando saldo suficiente para o pagamento em caixa para o exercício posterior, como prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Entrementes, as condenações em primeiro grau impostas ao ex-prefeito Pedro Wilson não foram confirmadas pelas instâncias superiores do Poder Judiciário, tanto que, possuindo ficha limpa, o ex-prefeito de Goiânia Pedro Wilson foi nomeado para o cargo de superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Goiás, conforme portaria ministerial publicada pelo Ministro da Cultura no Diário Oficial da União (DOU) de 19 de maio de 2023.

A Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010) é uma legislação brasileira originada de um projeto de lei de iniciativa popular que teve assinatura de 1,6 milhão de brasileiros. O objetivo da lei é garantir a probidade e a moralidade no serviço público, impedindo o seu exercício por pessoas condenados em razão da prática de crimes contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público; por crimes contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência; e por crimes contra o meio ambiente e a saúde pública. Também não estão aptos ao serviço público, sequer podendo concorrer às eleições em qualquer nível de poder candidatos que tenham cometido crimes eleitorais com previsão de pena privativa de liberdade; crimes de abuso de autoridade, quando houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública; de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; de tráfico de entorpecentes e drogas afins; crimes de racismo, tortura, terrorismo e hediondos; de redução à condição análoga à de escravo; crimes contra a vida e a dignidade sexual; e crimes praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando (Supremo Tribunal Federal, 2020).

Dessa forma, pode-se afirmar que Pedro Wilson foi vítima da guerra jurídica instaurada contra o inimigo, qual seja, as lideranças do campo democrático e de centro-esquerda em Goiás.

2.3. PAULO GARCIA (2010 a 2016)

Paulo Garcia foi eleito vice-prefeito de Goiânia, pelo Partido dos Trabalhadores (PT), na chapa encabeçada por Iris Rezende, do PMDB, na eleição de 5 de outubro de 2008, tendo assumido a Chefia do Executivo, em abril de 2010, com a renúncia do prefeito Iris Rezende, que se lançou candidato a governador de Goiás. Em seguida, foi eleito prefeito de Goiânia, no pleito de 6 de outubro de 2012. Portanto, Paulo Garcia (PT) exerceu a Chefia do Executivo Municipal da Capital durante o período de abril de 2010 a dezembro de 2016.

Paulo Garcia foi vítima de perseguição judicial em vários processos, em função do exercício do encargo de Prefeito de Goiânia. Qualquer problema administrativo era motivo para interposição de ação judicial, desde problemas com iluminação, até acusação de sobrepreços em obras de reforma do Parque Mutirama. Foi pedida a sua prisão pelo ex-Vice-Prefeito Agenor Mariano, em razão do prefeito não atender indicações a cargos públicos de interesse político. Em todos estes casos foi constatado que a responsabilidade não era do ex-prefeito.

Muitas narrativas afirmam que a morte do ex-prefeito Paulo Garcia, ocorrida em 30 de julho de 2017, por infarto, foi motivada por seus problemas na justiça. Nesse sentido, afirma Anselmo Pereira, vereador por Goiânia no seu décimo mandato consecutivo:

Não desacredite que a morte do ex-prefeito de Goiânia, Paulo Garcia, aos 58 anos de idade, de infarto fulminante, tenha causas que podem estar associadas aos fatores do mesmo fenômeno – lawfare – que levaram ao suicídio do reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

A morte do ex-prefeito de Goiânia, Paulo Garcia, ocorreu no contexto de uma infinidade de procedimentos, inquéritos, processos administrativos, ações cíveis e penais instaurados contra a sua pessoa física, com intensa, longa e persistente repercussão midiática, em decorrência única e exclusiva do exercício do encargo que o povo da Capital lhe conferiu, tanto de vice-prefeito, na eleição de 5 de outubro de 2008, como de prefeito, em 6 de outubro de 2012, ambas as eleições pelo Partido dos Trabalhadores (PT).

E não existe aqui defesa do partido dele, até mesmo por não coadunar com suas práticas, mas o fato é que foram abertos tantos procedimentos e ações de improbidade que tornou passível questionar tal volume persecutório. A revelar aos leitores, pela primeira vez em público, cinco dias antes de morrer, ele ligou angustiado e confessou não estar dando conta mais de continuar.

Esse é um quadro perigosamente revelador da letalidade da guerra jurídica, utilizada com a finalidade política de interromper a trajetória do PT, que dizer, a lei ostensivamente usada como arma de guerra para transmitir à população o recado de que não tinha como a administração pública prosperar com o PT à frente da Prefeitura.

Não se discute se o prefeito petista fazia política certa ou errada, mas o uso ostensivo e volumoso de instrumentos legais lançados contra ele, numa clara evidência da caracterização do lawfare como instrumento de alcance do objetivo político, qual seja, fazer com que ele não conseguisse prosperar na administração. A guerra jurídica deflagrada contra o ex-prefeito logrou o resultado literal de aniquilação do inimigo! (Pereira, 2020, p. 333-335).

Sendo assim, deve ser levado em consideração que os agentes políticos que estiveram à frente da Prefeitura de Goiânia, em outras gestões, não receberam o mesmo tratamento que a justiça e os órgãos de controle da administração pública dispensaram ao prefeito Paulo Garcia. A exemplo disso, tem-se que o atual prefeito deste município, Rogério Cruz, sequer se tornou réu em ação judicial em primeira instância, diante das inúmeras evidências de ilegalidades que vieram à público durante o seu mandato, como as denúncias de contratações de serviços sem fins justificáveis, nas quais houve dispensa de licitação ou que foram licitadas de forma a direcionar tais serviços para empresas específicas.

Neste sentido, tem-se os casos de contratação de equipamento de reconhecimento facial para instituições de ensino, aquisição de materiais escolares defasados sem justificativa, bem como, em relação à má-gestão da Companhia de Urbanização de Goiânia (COMURG). Tais escândalos não foram motivações suficientes para ensejar quaisquer providências instauradas pelos órgãos de controle da moralidade pública. Quedaram-se, inertes, até o momento, órgãos responsáveis como o MP-GO e o TCM-GO (Folha, 2024).

Contraditoriamente com a situação atual, a crise política que infligiu o final da gestão do ex-prefeito Paulo Garcia se tornou combustível para inúmeros processos que sofreu, em detrimento de questões legitimamente jurídicas, uma vez que o mesmo tratamento inquisitivo e punitivista não foi dispensado ao gestor que o sucedeu à frente da mesma municipalidade.

Sobre os autores
Camilo Bueno Rodovalho

Advogado, Pós-Graduado em Direito Empresarial pela – FGV Direito SP, Assessor Parlamentar na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, Membro do Colegiado Nacional da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) e Coordenador do Núcleo Goiás da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD-GO).

Fernanda Santos

Bacharela em Direito, Especialista latu sensu em Direito do Consumidor pela Universidade Federal de Goiás – UFG e Coordenadora do Núcleo Goiás da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD-GO).

Osmar Pires Martins Junior

Bacharel em Direito pela Universidade Paulista - UNIP, Mestre em Ecologia pela UFG, Doutor em Ciências Ambientais pela UFG, Professor pós-doc associado ao Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa, Ensino e Extensão em Direitos Humanos da UFG (NIPEE-DH – UFG).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODOVALHO, Camilo Bueno; SANTOS, Fernanda et al. Como o lawfare sabota a democracia em Goiás. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7628, 20 mai. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/109375. Acesso em: 22 dez. 2024.

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