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Contrato por tempo determinado:

inconstitucionalidade, significado, efeitos

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Agenda 01/08/1999 às 00:00

4. Desatenção à autonomia normativa

Outro aspecto resultante da aplicação do recente contrato de prazo determinado isento do cumprimento de contribuições e direitos sociais ao trabalhador, corresponde à desatenção ao estímulo que a Constituição Federal fornece à autonomia normativa. Por outras palavras, aquela contratação termina inibindo, ademais, com qualquer possibilidade de negociação direta e espontânea entre os parceiros sociais da produção, porquanto ofereceu uma pretendida solução, pronta e acabada, desestimulando a ocorrência do diálogo entre patrões e empregados no sentido de encontrar alternativas criativas, adequadas aos particulares problemas do ambiente de trabalho de uma determinada unidade produtiva ou da categoria ou, ainda, da empresa, por exemplo.

No Brasil, a Constituição da República apontou a alta relevância da autocomposição dos conflitos de interesses antagônicos entre os fatores sociais da produção no art. 7°, incisos VI, XIII, XIV e XXVI; e, art. 8°, inciso VI, o qual tornou obrigatória a participação dos sindicatos de categoria nas negociações coletivas de trabalho (de um certo modo, também configurando um estímulo ao diálogo, vale recordar que o art. 11 da CF criou o representante único, cuja responsabilidade consiste a manutenção do entendimento direto com o empresário, e que há outras possíveis representações, previstas na CLT, como, por exemplo, as seções sindicais e os delegados, ambos lembrados e permitidos no art. 517, parágrafo segundo, da Consolidação, as comissões mistas admitidas no art. 621 da mesma, as quais podem ser reguladas em convenções e acordos coletivos de trabalho).

A função negocial do sindicato tem especial importância por permitir o desenvolvimento de um processo de positivação da norma jurídica através da negociação entre as partes sociais envolvidas no processo produtivo para o estabelecimento das condições de trabalho; a criação normativa, um fenômeno próprio do Direito do Trabalho, é grandemente divulgada no nível coletivo.

O esforço das partes envolvidas na negociação, trabalhadores e empregadores, de preparar leis laborais para suprir as falhas e a incapacidade do Estado para a solução de todos os problemas tipicamente trabalhistas, tem como resultado a perda do monopólio legislativo deste mesmo, o qual se faz através das autoridades públicas competentes, que passa para a autonomia dos grupos profissionais e econômicos.

Consoante o ordenamento brasileiro, o sindicato, o legítimo representante dos interesses econômico-laborais, ou dos trabalhadores ou dos empresários, é elevado à categoria de fonte primária de direito. A indicação que a atuação das associações sindicais fornece revela que as mesmas detêm poder social, isto é, que constituem autoridade estritamente nos assuntos que lhe são pertinentes, os organizativos, econômicos e laborais. A faculdade normativa criadora, o poder de produzir normas jurídicas aplicáveis e extensíveis, por exemplo, numa negociação de âmbito nacional, a todos os envolvidos na produção, determina que, esta prerrogativa de elaborar normas, só pode ser exercitada quando houver a presença de ambos os seus protagonistas: trabalhadores, de um lado, e empresários, de outro.

Correspondendo a um aspecto da autonomia dos sindicatos, a negociação coletiva pressupõe, para tornar-se efetiva, uma reserva de competência em favor daqueles referidos fatores sociais: é preciso que o Estado admita o autônomo poder normativo das entidades. A respeito desta autonomia, impende salientar que, o que se deu na Constituição Federal, foi a declaração do poder, relativo às entidades sindicais, de elaborar leis de regulamentação dos relacionamentos laborais. A eficácia das normas de origem não-estatal é garantida pelo Estado, através do reconhecimento de seu valor à construção e atualização do Direito, desde que formalizem pactos convencionais lícitos que respeitem a supremacia da Constituição.

A declaração de autonomia normativa dos particulares é percebida naqueles artigos constitucionais apontados há pouco, combinados com os termos do inciso I do art. 8° , o qual veda terminantemente interferências e intervenções dos poderes públicos na vida da organização sindical e que, por conseguinte, proíbe a demarcação de restrições à realização de todas as atividades organizativas das entidades classistas. Dentre estas diligências organizativas, destaca-se a autocomposição dos conflitos, em especial as atividades negociais.

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Sendo assim, é possível notar que a autonomia coletiva negocial manifesta, enfim, um fenômeno de descentralização do poder normativo estatal para alcançar centros periféricos menores que expressam a realidade da dinâmica dos problemas laborais e que não estabelecem órgãos públicos estatais. Significa isso apenas o reconhecimento da capacidade normativa ínsita às organizações de trabalhadores e de empregadores, da autonomia dos mesmos para resolver sobre seus particulares interesses amplamente, com a reserva dos pontos básicos e elementares que mantém a eqüidade em uma relação laboral, como é o caso dos direitos sociais trabalhistas, uma das faces dos direitos fundamentais, ou seja, ressalvada a constitucionalidade de todo ato normativo.

A este respeito, cumpre acrescentar que, consistindo uma tendência forte do sindicalismo no plano internacional, a negociação direta vem sendo verificada como uma das mais importantes atividades das organizações sindicais desenvolvidas, nas últimas décadas, nos países de ambiente democrático mais adiantado.

Esta questão é aqui abordada porque tem sido notado que é justamente através do incentivo à prática da negociação espontânea e voluntária em vários e ilimitados âmbitos de contratação que muitas alternativas originais têm sido descortinadas para transpor os males econômicos (a solução dos problemas sociais está relacionada em linha direta com a dos econômicos), definindo a verdadeira expressão da autonomia normativa e da autocomposição de conflitos, a fonte primeira do Direito do Trabalho.


5. Conclusões

Verificou-se a inconstitucionalidade do recente contrato de trabalho por tempo determinado, isento do cumprimento de obrigações sociais, tais como o FGTS, o 13° salário, as férias e a indenização compensatória, da seguinte maneira: - desde o Preâmbulo da Constituição da República, observou-se que ficam definidos, entre os fins e objetivos do Estado democrático de direito brasileiro, a plena realização dos direitos sociais, os quais, fazendo especial referência àqueles inscritos no art. 7° constitucional, integram o Título da Constituição relativo aos direitos e garantias fundamentais; - e, que a supremacia da Lei Fundamental impede a eficácia de qualquer ato normativo que lhe é inferior, subordinado, e contrário às suas disposições ainda em vigor.

A eliminação, em um contrato de trabalho criado através de um recurso legislativo infraconstitucional, do exercício de direitos fundamentais, consiste tentativa infrutífera de dar fim ao vigor de certos artigos da Lei Suprema, os quais permanecem intactos e atingem obrigatoriamente todo e qualquer ato normativo, seja de origem estatal, seja particular, eivando a todos os que não respeitarem sua letra de inconstitucionalidade.

O mencionado contrato desvaloriza profundamente o trabalho humano, transformando todo o trabalhador, daquela oportunidade legislativa infraconstitucional em diante, em mero prestador de serviços (que assume uma condição semelhante à daquele que, contratado por prazo indeterminado, apenas completou o período de experiência), sem acesso legal à garantias fundamentais que auxiliam a conduzir ao equilíbrio a contraprestação por suas atividades, bem como, põe em risco, numa progressão geométrica, a continuidade da existência de oportunidades que permitam uma relação de emprego.

Outro aspecto resultante da aplicação do contrato de prazo determinado livre de contribuições sociais, corresponde à desatenção ao estímulo que a Constituição Federal fornece à autonomia normativa, visto que termina inibindo, ademais, com qualquer possibilidade de autocomposição de conflitos de interesses antagônicos, em especial a negociação direta e espontânea entre os parceiros sociais da produção, o diálogo. É importantíssimo o incentivo à prática da negociação espontânea e voluntária em vários e ilimitados âmbitos de contratação, porquanto é desse modo que muitas alternativas originais têm sido descortinadas para transpor os males econômicos, definindo a verdadeira expressão da autonomia normativa, a fonte primeira do Direito do Trabalho.

Sobre a autora
Cristiane Rozicki

mestre e doutoranda em Instituições Políticas e Jurídicas pela UFSC, pesquisadora do CNPq em Florianópolis (SC)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROZICKI, Cristiane. Contrato por tempo determinado:: inconstitucionalidade, significado, efeitos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 34, 1 ago. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1154. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Texto escrito durante a vigência da Medida Provisória que deu origem à lei que regula o contrato de trabalho por tempo determinado, e depois atualizado.

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