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Nexo técnico epidemiológico

Agenda 14/09/2008 às 00:00

Fica presumida a natureza ocupacional da doença do trabalho sempre que verificada a sua correlação com a atividade econômica da empresa, invertendo-se, assim, o ônus da prova.

SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Nexo técnico epidemiológico - NTEP. Conceito; 3.Irradiação dos efeitos do NTEP para a seara judicial; 4. Da constitucionalidade do NTEP. ADI 3931; 5. Outras críticas ao NTEP; 6. Considerações finais; 7. Referências bibliográficas.


1. INTRODUÇÃO.

O tema ora enfocado refere-se à principal modificação introduzida no cenário jurídico pela Lei 11.340, de 26.12.2006, que acresceu o artigo 21-A e parágrafos à Lei 8.213/91 e instituiu o chamado nexo técnico epidemiológico – NTEP.

De acordo com este dispositivo legal, fica presumida a natureza ocupacional do agravo sempre que verificada a correlação entre a entidade mórbida incapacitante, elencada na Classificação Internacional de Doenças – CID, e a atividade econômica desenvolvida pela empresa, invertendo-se, assim, o ônus da prova, não mais cabendo ao empregado provar que a doença foi adquirida ou desencadeada pelo exercício de determinada função por si exercida.

Os efeitos que essa presunção legal pode gerar na esfera administrativa e também na judicial, críticas à sua aplicação, bem como considerações sobre a constitucionalidade do instituto, são temas objeto de análise no presente estudo que, sem ter qualquer pretensão de esgotar o assunto, visa contribuir para a melhor compreensão dessa inovação legislativa, utilizando-a em prol de uma prestação jurisdicional mais justa e efetiva.


2. NEXO TÉCNICO EPIDEMIOLÓGICO - NTEP. CONCEITO.

O conceito do nexo técnico epidemiológico foi introduzido no ordenamento jurídico pátrio através da edição da medida provisória nº 316, de 11 de agosto de 2006, posteriormente convertida na Lei nº 11.430, de 26 de dezembro de 2006, que acrescentou o artigo 21-A à Lei nº 8.213/91, com a seguinte redação:

"Art. 21-A. A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID, em conformidade com o que dispuser o regulamento.

§ 1o A perícia médica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando demonstrada a inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo.

§ 2o A empresa poderá requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de cuja decisão caberá recurso com efeito suspensivo, da empresa ou do segurado, ao Conselho de Recursos da Previdência Social."

Com esta inovação legislativa, o perito médico do INSS ao verificar que o agravo que acometeu o segurado é de ocorrência comum em trabalhadores que pertencem a determinado segmento econômico, pode presumir a natureza acidentária dessa incapacidade, ficando autorizada, assim, a concessão do benefício previdenciário-acidentário, independente da emissão da CAT – comunicação de acidente de trabalho pela empresa.

A presunção da incapacidade acidentária, contudo, não é realizada discricionariamente pelo médico perito, mas obtida com base em dados estatísticos probabilísticos, através dos quais se verifica que trabalhadores que laboram em empresas que desenvolvem certa atividade econômica estão mais suscetíveis estatisticamente a adquirir determinadas patologias de origem ocupacional.

Assim, presume-se o nexo causal entre o agravo e o trabalho mediante o cruzamento/combinação do CNAE (Código Nacional de Atividade Econômica) e a entidade mórbida motivadora da incapacidade (relacionada na Classificação Internacional de Doença – CID, em conformidade com a Lista B, do Anexo II, do Regulamento da Previdência Social), sendo tal nexo intitulado de epidemiológico não por estar atrelado ao estudo de epidemias propriamente dito, mas por ser um instrumento de diagnóstico de fenômenos, relacionado ao "estudo da ocorrência, da distribuição e dos determinantes de um agravo à saúde em uma população", com definido por Luís Rey, em seu Dicionário de Termos Técnicos de Medicina e Saúde.

Com espeque em tal dispositivo legal, poderia o médico perito do INSS diante de um segurado, por exemplo, acometido de LER – lesão por esforço repetitivo – definir como ocupacional a origem da patologia, na hipótese de o obreiro laborar na atividade bancária, haja vista o risco potencial dessa atividade, exaustivamente comprovado por dados estatísticos da própria autarquia previdenciária.

Antes da inserção desta inovação legislativa, o segurado ao ser acometido de uma doença ocupacional, deveria fazer prova perante a autarquia previdenciária do nexo de causalidade entre a moléstia adquirida e o trabalho exercido, o que se revelava uma árdua tarefa, haja vista que em casos tais relutavam as empresas em emitir a CAT – comunicação do acidente de trabalho, por vislumbrarem nessa conduta a assunção de culpa e responsabilidade pela patologia ocorrida.

Diante da dificuldade do segurado fazer tal prova, o benefício era tido como auxílio doença comum, fato prejudicial ao trabalhador, pois não lhe conferia o direito aos depósitos de FGTS durante o período de afastamento, nem lhe concedia a estabilidade acidentária prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91 quando do seu retorno à atividade.

Interessante observar que após a adoção do nexo técnico epidemiológico o registro de doenças ocupacionais cresceu significativamente, a exemplo da LER – lesões por esforço repetitivo – que, segundo dados da Previdência Social, nos últimos onze meses, aumentou 512,3%, sendo certo que esse aumento não foi do número de casos de doenças, mas sim da classificação destas moléstias como ocupacionais, antes equivocadamente enquadradas pela Previdência Social como "comuns".

Analisando-se a exposição de motivos da Medida Provisória antes aludida, extrai-se que a finalidade na sua edição foi primordialmente neutralizar os efeitos da sonegação da CAT e combater os nefastos efeitos das subnotificações, na medida em que a ocultação das doenças ocupacionais além de impedir o correto enquadramento dos benefícios previdenciários concedidos pelo INSS, mascaravam a realidade fática, pois indicavam um número de segurados afastados por incapacidade comum quando, na verdade, a origem de tais afastamentos era tipicamente ocupacional.

Fica evidente, então, que a presunção legal do artigo 21-A, da Lei nº 8.213/91, instituiu na seara administrativa a inversão do ônus da prova em prol do empregado, passando ao INSS a obrigação de estabelecer o nexo e transferindo ao empregador o ônus de provar que a doença contraída pelo obreiro não foi provocada pela atividade laboral exercida, podendo valer-se, para tanto, de mapeamento de riscos e sinistros, rol das CAT’s emitidas, número reduzido de ações administrativas e judiciais ajuizadas, dentre outros.

Importante destacar que referida presunção legal é do tipo relativa - juris tantum - admitindo prova em sentido contrário, razão pela qual prevê a Lei o contraditório e a ampla defesa, reconhecendo ao empregador o direito à contraprova, no prazo de quinze dias, cabendo ainda recurso com efeito suspensivo dessa decisão.

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Destaco, outrossim, que a inversão do ônus do prova revela-se bastante razoável, haja vista a maior facilidade que dispõe o empregador na obtenção dos meios de prova, seja por ser detentor de todas as informações (PPRA, PCMSO, laudos periciais), seja por dispor de setor médico na empresa, possuindo exames admissionais, demissionais e outros.

Resta indagar, agora, se a fixação do nexo técnico epidemiológico - NTEP irradia efeitos também na esfera judicial ou se limita a produzir conseqüências apenas e tão somente no âmbito administrativo.


3. IRRADIAÇÃO DOS EFEITOS DO NTEP PARA A SEARA JUDICIAL.

Neste tocante, entendo que a presunção legal do NTEP pode produzir efeitos também na esfera judicial, pois ao se estabelecer a correlação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade, reconhece-se a elevada incidência estatística da patologia nessa atividade empresarial, a qual pode ser considerada como atividade normal de risco para fins de aplicação da teoria da responsabilidade civil objetiva, estampada no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil.

Desta forma, aplicar-se-ia a inversão do ônus da prova nas ações trabalhistas que visam obter indenização por doença ocupacional, sendo desnecessária a prova de culpa da empresa, que já estaria presumida pela conclusão do laudo da Previdência Social de que a atividade desenvolvida pelo empregador, por sua natureza, implica em riscos à saúde dos seus empregados.

Assim, uma vez aplicada a presunção legal e reconhecido, pela Previdência Social, que a doença que acometeu o segurado foi provocada pelas condições ambientais de trabalho de risco a que o mesmo estava submetido, tais conclusões podem ser tidas pelo magistrado como fatos incontroversos, dispensando a dilação probatória, conforme autorizado pelo artigo 334, inciso IV, do Código de Processo Civil, que preconiza não dependerem de prova os fatos "em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade".

A despeito de se tratar de questão recente, diversos Regionais já vêm decidindo com base na presunção legal estatuída no artigo 21-A, da Lei nº 8.213/91, conforme se infere da ementa a seguir colacionada, oriunda do E.TRT da 4ª Região, in verbis:

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA. DOENÇA OCUPACIONAL. NEXO DE CAUSALIDADE. Presumível o "nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo", nos termos do art. 21-A da Lei nº 8.213/91, porquanto a doença apresentada pela reclamante tem, segundo o Regulamento da Previdência Social, relação com o trabalho por ela desempenhado na ré. Incumbia à reclamada fazer prova a infirmar essa presunção, ônus do qual não se desfez. Laudo médico que conclui pela possibilidade de nexo de causalidade entre a lesão e a atividade laboral. Testemunhas que indicam que a tarefa preponderante da empregada era de digitação. Indenização correspondente a danos patrimoniais e danos morais devidas. Apelo desprovido.

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE. PENSÃO MENSAL VITALÍCIA. Em nenhum momento a prova dos autos aponta para a existência de definitiva redução ou perda da capacidade laborativa. Por tal motivo, não há falar, na hipótese, em direito à pensão mensal vitalícia. Provimento negado. (TRT 4ª Região, ACÓRDÃO 01540-2006-383-04-00-4 RO, Juíza Relatora Euridice Josefina Bazo Tôrres, DJ 24 de julho de 2008).

Ainda no intuito de demonstrar que estas alterações legislativas não têm aplicação restrita ao âmbito administrativo, imperioso transcrever o teor do enunciado 42, aprovado na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, ocorrida no Tribunal Superior do Trabalho, em 23 de novembro de 2007 e que, certamente, será de valiosa contribuição no estudo desta presunção legal, vejamos:

"Acidente de trabalho. Nexo técnico epidemiológico. Presume-se a ocorrência de acidente de trabalho, mesmo sem a emissão da CAT – Comunicação de Acidente de Trabalho, quando houver nexo técnico epidemiológico conforme art. 21-A da Lei 8.213/1991".

Não se olvide, porém, que referida presunção legal também na esfera judicial é juris tantum, podendo o empregador em Juízo se desobrigar do pagamento de indenização caso comprove a existência de alguma excludente de responsabilidade civil, como por exemplo, a demonstração de que a doença foi adquirida por culpa exclusiva da vítima, pré disposições genéticas do obreiro, força maior ou fato de terceiro.


4. DA CONSTITUCIONALIDADE DO NTEP. ADI 3931.

Tão logo introduzida no ordenamento jurídico, referida presunção legal já teve sua constitucionalidade questionada junto ao Supremo Tribunal Federal, através da Ação Direta de Inconstitucionalidade de n º 3931, ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria – CNI.

Afirma a entidade sindical proponente que o artigo 21-A da Lei nº 8.213/91 e os §§ 3º, 5º a 13 do artigo 337 do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99) são inconstitucionais por violarem frontalmente o §1º do artigo 201, o inciso XXVIII do artigo 7º e o inciso XIII, do artigo 5º, todos da Constituição Federal.

Inicialmente aduz a CNI que o artigo 201, §1º, da Carta Magna, estabelece que as aposentadorias especiais somente podem ser concedidas nos casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física do trabalhador, não podendo a lei simplesmente presumir que todos os trabalhadores de empresa de determinado segmento estão sujeitos à exposição de algum agente nocivo, sem que haja a prova da efetiva e permanente exposição do obreiro ao agente causador da doença.

Destaca, ainda, que de acordo com a Constituição Federal, a aposentadoria especial para ser concedida exige a correlação entre a atividade efetivamente exercida pelo trabalhador na empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade, sendo inconstitucional, portanto, a relação estabelecida entre a atividade da empresa e o agravo motivador da incapacidade, no artigo 21-A impugnado.

Aduz a requerente que tanto o §1º do artigo 201 quanto o inciso XXVIII do artigo 7º da CF exigem prova da causalidade entre o agravo e a doença para que o trabalhador possa fazer jus à aposentadoria especial, a benefícios do seguro acidentário ou a qualquer vantagem decorrente do trabalho em condições insalubres ou perigosas, sendo insuficiente o reconhecimento dessa causalidade por verificações estatísticas.

Nesta esteira, defende a Confederação ser absolutamente insustentável que a presunção legal se dê com base unicamente em dados estatísticos, pois no seu entender "os estudos epidemiológicos e as máximas da experiência comum nada provam a respeito do caso concreto... Daí a insuficiência de uma prova simplesmente numérica ou estatística e a necessidade de uma prova personalizada, particularística, para que a responsabilidade não seja apenas uma questão de sorte".

Por fim, sustenta a entidade sindical de grau superior, a ofensa ao inciso XIII, do artigo 5º da Constituição Federal, pois não poderia a lei obrigar o médico perito a reconhecer a natureza acidentária de determinada incapacidade se disso não estiver convencido, sob pena de afronta direta à sua liberdade profissional, assegurada no preceito constitucional antes mencionado.

A ADI ajuizada encontra-se atualmente conclusa à relatora, a Ministra Carmen Lúcia, para apreciação do pedido de reconsideração do despacho que indeferiu o ingresso da ANAMATRA na condição de amicus curiae por ausência de pertinência temática, não tendo havido, ainda, qualquer pronunciamento acerca da constitucionalidade dos dispositivos impugnados.


5. OUTRAS CRÍTICAS AO NTEP.

Além dos argumentos ventilados na ADI aludida, alguns doutrinadores apontam outras críticas à adoção do nexo técnico epidemiológico, podendo-se mencionar a questão atinente aos riscos de supernotificações de doenças ocupacionais inexistentes, o desprezo de pré disposições genéticas da vítima e a substituição do trabalho humano pela automação em razão do aumento dos custos com prevenção.

Primeiramente, no que tange aos argumentos sustentados na ADI, não visualizo a afronta ao artigo 201, §1º, da CF, pois com o reconhecimento do nexo técnico epidemiológico pelo INSS, chega-se apenas à caracterização da natureza acidentária da incapacidade, não podendo daí se inferir que por tal fato possuirá o obreiro, incontinenti, o direito à aposentadoria especial.

Fica evidente, então, que o nexo técnico epidemiológico não regula a aposentadoria especial, nem se refere aos direitos aos adicionais de periculosidade e insalubridade, limitando-se a estabelecer o nexo entre a patologia e o trabalho exercido, não havendo de se cogitar da alegada afronta ao exposto no artigo 201, §1º, da Constituição Federal.

No que se refere à outra crítica suscitada na ADI, no sentido de que o artigo 21-A deveria fazer menção à atividade exercida pelo trabalhador e não ao ramo da atividade econômica da empresa, igualmente não merece acolhida, posto que se assim tivesse previsto o legislador, estar-se-ia abrindo a possibilidade para a prática ainda maior de fraudes. Explica-se.

Estabelecendo a Lei a presunção da natureza ocupacional da doença pelo exercício de determinada função/atividade, é certo que haveria escusa dos empregadores em anotar nas carteiras de trabalho de seus empregados a real função por eles exercida, preferindo registrar função diversa, em relação a qual não existam significativas incidências estatísticas de doença.

Ainda que em Juízo pudesse o obreiro demonstrar que as anotações em sua CTPS encontravam-se em dissonância com o principio da primazia da realidade, na seara administrativa não seria oportunizado ao obreiro a produção de tal prova, mormente por não possuir o médico perito do INSS competência para apurar esses fatos, nem emitir qualquer juízo de valor com o fim de afastar a presunção de veracidade que reveste as anotações contidas na carteira de trabalho do trabalhador.

Nesta esteira, avulta inarredável que para a autarquia previdenciária seria considerado apenas e tão somente a função anotada na CTPS do obreiro, o que se revela sobremaneira frágil e de fácil manipulação por parte do empregador, em manifesto prejuízo ao segurado que se veria privado do percebimento do benefício previdenciário-acidentário, pouco ou nada podendo fazer no âmbito administrativo.

De outra monta, destaco que também não merecem prosperar as alegações levantadas de que seria necessária a prova efetiva e permanente da exposição do obreiro ao agente causador da doença, pois como se trata de mera presunção relativa, pode e deve o empregador, tanto administrativamente quanto judicialmente, provar a inexistência dessa exposição ao agente nocivo, o que - se provado - obstacularizará a concessão do benefício pretendido ao trabalhador.

Pelos mesmos fundamentos, pode-se rechaçar as críticas acerca dos riscos de supernotificações de doenças ocupacionais, do desprezo às pré disposições da vítima e ofensa à liberdade profissional do médico, pois, como dito alhures, o médico perito poderá deixar de aplicar o nexo técnico epidemiológico sempre que dispuser de dados que demonstrem a inexistência de nexo causal, dados esses passíveis de demonstração pelo empregador, vez que lhe é amplamente assegurado o contraditório e a ampla defesa.

Por fim, menos razoável ainda me parece a crítica referente ao estímulo da substituição do trabalho humano pela automação, em razão do aumento dos custos com prevenção aos acidentes de trabalho, pois é de curial sabença que a nossa Carta Magna, em inúmeros dispositivos constitucionais, impõe ao empregador o dever de zelar por um ambiente de trabalho sadio e seguro, bem como estabelece a obrigação de promover medidas que reduzam os riscos inerente ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.


6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Após as considerações até aqui expendidas, entendo que a introdução do nexo técnico epidemiológico no ordenamento jurídico trouxe e trará inúmeros benefícios ao empregado, dentre eles a significativa redução da burocracia no procedimento para concessão de benefícios acidentários, pois ao se presumir o nexo entre o CNAE e o CID, fica o segurado eximido da difícil tarefa de produzir provas dignósticas.

Se tal presunção legal confere vantagens ao obreiro, não se pode por tal fato concluir que seja inteiramente prejudicial ao empregador, na medida em que o NTEP funciona como uma simples ferramenta a ser utilizada pelo médico perito, não significando uma conclusão diagnóstica final e podendo ter sua incidência afastada sempre que verificado, no caso concreto, a inexistência do nexo.

A constitucionalidade do NTEP parece-me incontestável, na medida em que não afronta qualquer preceito constitucional, mas sim consagra cânones de máxima relevância, como os princípios da dignidade da pessoa humana, da ampla defesa e do contraditório, garantindo àquele acometido por doença a devida cobertura previdência, bem como ao empregador o direito de afastar a incidência da presunção legal mediante prova em sentido contrário.

Como é evidente, a construção dessa inversão do ônus da prova encontra-se alicerçada em mapeamentos e análises de casos concretos, nos quais se observou que determinadas doenças possuem maior incidência estatística em certos ramos de atividade econômica, sendo razoável presumir em casos tais a natureza ocupacional da doença.

A lógica do sistema do nexo epidemiológico - de transferir para empresa o dever de demonstrar que a patologia não tem natureza ocupacional - revela-se bastante acertada, haja vista a maior facilidade de acesso à informação que dispõe o empregador, já que tem por obrigação manter atualizada a documentação referente às condições do ambiente de trabalho, tais como PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário), PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional), PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais) e ASO (Atestado de Saúde Ocupacional).

Não se pode olvidar, ainda, que essa inversão do ônus da prova trazida pelo NTEP servirá de incentivo para as empresas serem mais diligentes e cuidadosas com o meio ambiente de trabalho, cumprindo rigorosamente as normas de segurança e medicina do trabalho e prevenindo a ocorrência de acidentes, mormente diante da possibilidade de redução ou majoração da contribuição do SAT (seguro de acidente de trabalho) conforme o resultado dos dados estatísticos epidemiológicos de cada empresa, inovação bastante salutar também trazida pela Lei 11.430/06.

Como outrora aludido, entendo que essa presunção legal trazida pela Lei 11.430/06, não tem aplicação restrita ao âmbito administrativo, irradiando seus efeitos também para a esfera judicial e permitindo a aplicação da teoria da responsabilidade civil objetiva, isto é, independente da configuração da culpa patronal, por se estar diante de "atividade normal de risco" a que se refere o parágrafo único, do artigo 927 do Código Civil.


7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2005.

DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Doença ocupacional e nexo técnico epidemiológico. Paraná on line, 03 de fevereiro de 2008. Disponível em: <http://www.parana-online.com.br/canal/direito-e-justica/news/280748/ >.

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Acidentes do trabalho. Doenças ocupacionais e nexo técnico epidemiológico 2ª ed. São Paulo: Ed. Método, 2008.

LIMA, George Duarte de. O nexo epidemiológico e as doenças ocupacionais – presunção legal da culpa do empregador. Disponível em:<http://georgedlima.blogspot.com/2007/10/o-nexo-epidemiolgico-e-as-doenas.html>, em 31 de outubro de 2007.

LONTRA, Ricardo T. NTE – Nexo técnico epidemiológico e NTEP – nexo técnico epidemiológico previdenciário. Disponível em: http://sindicato.com.br/artigos/nte-ntep.htm, em 30.11.2007.

MACHADO, Sidnei. Nexo epidemiológico Presunção legal faz prova de doença ocupacional. Revista jus vigilantibus, em 09 de setembro de 2008. Disponível em:< http://jusvi.com/artigos/22276>.

MARTINEZ, Wladimir Novaes. Prova e contraprova do nexo epidemiológico. São Paulo: LTR, 2008.

OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional. 3ª ed. São Paulo: LTR, 2007.

WEBGRAFIA:

www.stf.gov.br

www.planalto.gov.br

Sobre a autora
Maria Rita Manzarra Garcia de Aguiar

Juíza do Trabalho do TRT da 21ª Região (RN). Especializanda em Processo Penal pela Universidade de Fortaleza (CE). Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AGUIAR, Maria Rita Manzarra Garcia. Nexo técnico epidemiológico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1901, 14 set. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11729. Acesso em: 22 nov. 2024.

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