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Explosão cambial, onerosidade excessiva e divisão de prejuízos entre exportadores e bancos

Agenda 07/01/2009 às 00:00

Reina o silêncio sobre como serão encerradas as operações de venda de dólar futuro, efetuadas por diversas companhias exportadoras, no capítulo referente à apropriação dos resultados, em geral prejuízos.

A súbita explosão cambial ocorrida em setembro e outubro de 2008, não prevista pelas autoridades financeiras, ao desequilibrar os contratos celebrados entre as partes em epígrafe, cria o espaço para aplicação dos artigos 478 a 480 do Código Civil atual.

Em "Obrigações e Contratos", Arnoldo Wald assim aborda o tema: "Foi, todavia, com as grandes modificações no valor da moeda (como a atual) que o problema da imprevisão passou a adquirir maior relevância, reconhecendo-se a ‘ilusão da moeda estável’ no direito contemporâneo, especialmente na chamada Era da Incerteza".(pág. 276) E continua: "De fato, em seus arts. 478 a 480, o legislador, inspirado no texto constitucional, admite a resolução ou a revisão do contrato por excessiva onerosidade para reequilibrar a relação contratual, adotando a tese consolidada na jurisprudência e seguindo o exemplo do ‘Codice Civile’ italiano" (pág. 283). Prossegue Wald: "Para não dar um caráter absoluto e radical dessa conseqüência, qual seja a resolução do contrato (ao abrigo do art. 478) o legislador, no art. 479 do novo Código Civil (que diz: ‘A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato.) previu a possibilidade de evitá-la, se o réu propuser o restabelecimento do equilíbrio, modificando eqüitativamente as condições do contrato. Na realidade, diante de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, melhor seria admitir simplesmente que se mantivesse a equação contratual, ou seja a relação inicialmente estabelecida entre as partes." (pág. 284)

Embora uns poucos analistas (incluo-me entre eles) previssem o aumento das cotações do dólar face ao real, assim não previra o Banco Central em seu Relatório Focus, por exemplo, o de 20.06.08, quando apontava para taxas de câmbio para fins do corrente 2009 a oscilarem entre R$ 1,73 a 1,76 versus o dólar. Em setembro de 2008 o Bradesco, em apresentação a Apimec, sugeria taxas de $1,75 e 1,85 para fins de 2008 e 2009, respectivamente.

Portanto, sobretudo a partir da quebra do banco americano Lehman Brothers. a 15.09.08, acelera-se uma crise mundial, plenamente enquadrável, conforme o jurista citado, como "acontecimento extraordinário e imprevisível", afetando as cotações do real frente ao dólar, desvalorizando-as e criando condições jurídicas para a revisão contratual citada.

Precedentes jurisprudenciais foram criados pelo Superior Tribunal de Justiça ao apreciar, em diversos contratos de arrendamento mercantil ou ‘leasing’, o impacto trazido pela desvalorização cambial de 1999 que, percentualmente, muito se aproxima da atual.

Em cerca de 65 julgados consultados, aquele Tribunal fixou o entendimento sobre revisão contratual em virtude daquela súbita alteração, acrescentando ainda a tese da divisão do ônus eqüitativamente entre as partes contratantes, tese, aliás, contida no artigo 479 do Código Civil acima transcrito, "oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato". Num de seus julgados (Agravo Regimental 2003/0199429-2), de 01.06.2004, menciona que o tema foi pacificado pela 2ª Seção, ao mencionar: "I. Decisão que afastou a abusividade da cláusula contratual que prevê a correção das parcelas de leasing com base em moeda estrangeira, repartindo igualmente os ônus da brusca variação ocorrida a partir de 19.01.1999, calcada na jurisprudência pacificada na 2ª Seção do STJ, nos termos do Resp n. 471.594/SP..."

No Recurso Ordinário 2002/00889807-4, em Mandado de Segurança RMS 15154/PE, julgamento de contrato administrativo da 1ª Turma em 19.11.02, em sua ementa, recolhe-se o seguinte entendimento daquele Tribunal: "1. ... Deveras, a Constituição Federal ao insculpir os princípios intransponíveis do art. 37 que iluminam a atividade da administração à luz da cláusula mater da moralidade, torna clara a necessidade de manter-se esse equilíbrio (econômico-financeiro do contrato), ao realçar as ‘condições efetivas da proposta’." 2. O episódio ocorrido em janeiro de 1999, consubstanciado na súbita desvalorização da moeda nacional frente ao dólar norte-americano, configurou causa excepcional de mutabilidade dos contratos administrativos, com vistas à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das partes." "3. Rompimento abrupto da equação econômico-financeira do contrato. Impossibilidade de início da execução com a prevenção de danos maiores."

Portanto, o Superior Tribunal de Justiça acolheu, em contratos de arrendamento mercantil, revisão em virtude da brusca desvalorização do real frente ao dólar em 1999, abrigando ainda, na última ementa acima transcrita, a tese da teoria da imprevisão em contratos administrativos com base no mesmo evento, o que pode indicar uma tendência em privilegiar tal fato como nucléico à teoria da imprevisão, concluindo pela revisão contratual e derivada distribuição dos prejuízos entre as partes contratantes.

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O portal Jus Navigandi traz artigo do advogado Aldemir Ferreira, intitulado "Maxidesvalorização cambial na presente crise mundial e os contratos de swap desproporcionais e excessivamente onerosos" aonde o Autor, indo mais além, invoca a possibilidade de extinção do contrato de ‘swap’ sem ônus para os contratantes, considerando ainda "... absoluta imoralidade um contrato que prevê riscos limitados e totalmente definidos para uma das partes (os bancos geralmente têm seu risco limitado ao CDI) enquanto para a outra parte prevê riscos absolutamente ilimitados, podendo até causar-lhe asfixia financeira e ‘morte’ comercial, a depender da oscilação que a moeda brasileira tenha na atual crise econômica mundial, a maior desde a grande depressão nos anos 30 do século XX."

Desdobramentos nos balanços de bancos e exportadoras por conta da crise cambial ainda podem ocorrer, há menos que o silêncio reinante sobre o tema, sobretudo da parte dos bancos, objetive evitar explosão especulativa das cotações do dólar face ao real. Ou esta seria a razão para o Banco Central ter vendido dólares até agora? Porque, do ponto de vista financeiro, ao ocorrerem resgates contra suas reservas externas por investidores estrangeiros, a única maneira de reduzi-los ou inibi-los é desvalorizar o real e respectivos ativos em real. O Banco Central sabe disso e por alguma razão atual contra esta lógica.

Sobre o autor
Paulo Guilherme Hostin Sämy

Experiência anterior em bancos, RH, mercado financeiro, comércio exterior e marketing. Eleito Analista do Ano 2004 da Abamec/Apimec - Associação dos Analistas do Mercado de Capitais. Articulista do Monitor Mercantil desde 1998, com temas correlacionados à área financeira, economia e política. Publicação anterior de artigos na revista da ABAMEC,- sobre mercado financeiro - em 'Tendências do Trabalho', então da Editora Suma Econômica - sobre administração - e na revista "Engenho e Arte", sobre alguns aspectos iniciáticos. Vídeos de treinamento publicados através da Editora Suma Econômica: "Criatividade em Equipe" e "O Príncipe: Estratégias de Ataque e Defesa nas Disputas de Poder".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SÄMY, Paulo Guilherme Hostin. Explosão cambial, onerosidade excessiva e divisão de prejuízos entre exportadores e bancos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2016, 7 jan. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12178. Acesso em: 22 nov. 2024.

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