Conclusão
Em um Estado Democrático de Direito e solidário, é fundamental a efetivação da dignidade humana para todos os cidadãos, consubstanciada na realização dos Direitos Humanos. Um Estado preocupado com a realização do bem comum deve seguir esta linha, não se distanciando desse caminho em hipótese alguma, sob pena de reconhecimento de uma inadmissível desigualdade de tratamento entre iguais seres humanos, todos dotados da mesma dignidade.
Em que pese o princípio da dignidade humana estar previsto no ordenamento jurídico brasileiro, verifica-se uma vergonhosa e perversa situação nos estabelecimentos carcerários. As disposições constitucionais e os muitos dispositivos da Lei de Execução Peal que visam garantir direitos e tratamento digno aos presos não encontram efetividade real, restando as suas benesses inalcançáveis. As garantias estão legalizadas, consolidando a idéia de serem respeitadas e estendidas a todos, mas não há apreço por parte da sociedade e do Estado, encontrando-se a massa carcerária totalmente desprovida de atenção e consideração.
Vê-se um quadro doloroso nos presídios, que retrata um dia a dia repleto de contrariedades em relação ao sistema. Como se deixou tal fato acontecer com essas pessoas? Tantas necessidades não supridas, tantos horrores vivenciados, tanto descaso por seus corpos e almas! Aqueles que erram são condenados a uma experiência que degrada e destrói: é impossível passar pelo sistema penitenciário livre de seqüelas.
Existe uma grande falta de vontade do Estado em investir no setor carcerário, uma enorme omissão na concretização dos direitos fundamentais dos condenados. E, por trás disso, é captada a imagem de uma sociedade que não perdoa, que não dá chances, que excluí quando deveria tentar incluir. A evolução moral necessária não foi alcançada pela sociedade, e isso resta comprovadamente demonstrado na tolerância que existe em relação à caótica situação prisional.
Porém, todo ser humano merece que se apostem nele. Desistir dessas pessoas não é humanismo. O "colocar-se" no lugar do outro é atitude que consegue fazer vibrar as fibras do coração e muitas vezes mudar toda a concepção que alguém possui em relação à determinada situação. Deixa-se, com humildade, um convite a todos aqueles que defendem a rigorosidade extrema da punição carcerária, que repensem e estendam o valor da vida humana àqueles que se encontram em tão frágil situação. Qualquer pessoa que esteja no cárcere possui necessidades que devem ser supridas e negar-lhe o atendimento dessas necessidades constitui uma perversa forma de tratar um ser humano.
Na busca da evolução, como sociedade e como indivíduos, um dos principais passos consiste em sensibilizar-se com o tropeço do outro e não querer vingança, mas lutar para que aquele tenha condições e oportunidades de reparar o erro e viver de forma diferente. Que tal influenciar o Estado a oferecer uma realidade diferente nos cárceres? Onde existe firme vontade, não há lugar para o fracasso. Muitas mudanças estão nas mãos da sociedade e a sua concretização depende apenas de bom ânimo e, antes de tudo, de amor pela vida. Pela sua, e pela do outro.
Referências
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Notas
- TOCQUEVILLE, Aléxis de. A democracia da América, São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1997, p. 790.
- O art 1°, inc. III, da Constituição Federal de 1988: "A República Federativa do Brasil, formada pela União indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III – dignidade da pessoa humana".
- THUMS, Gilberto. Sistemas Processuais Penais. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, p.100.
- Kant apud SARLET, Ingo Wolgang. Dignidade e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 33.
- SODER, José. Direitos do Homem. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1960, p. 9.
- MOARES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas S.A, 2006, p. 16.
- Ibidem, p. 16.
- SARLET, Ingo Wolgang. Dignidade e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 40.
- SARLET, Ingo Wolgang. Dimensões da dignidade, ensaios de filosofia do direito e direito constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 161.
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- THUMS, Gilberto. Sistemas Processuais Penais. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, p. 244.
- THUMS, Gilberto. Sistemas Processuais Penais. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, p. 169. Quanto à efetividade das garantias fundamentais, bem, é inquestionável que a Constituição possui elevada força normativa. Porém, em muitos aspectos da vida social percebemos carência na efetividade de tais garantias. Não entraremos em detalhes quanto a essa afirmação, eis que maiores delongas a respeito da real efetividade das normas contidas na Carta Magna não se constitui no objetivo deste trabalho, embora reconheçamos a indiscutível importância do assunto.
- DOTTI, René Ariel. A crise do sistema penitenciário. Disponível em: http://www.memorycmj.com.br/cnep/palestras/rene_dotti.pdf . Acesso em: 30 ago. 2008.
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- BRASIL. Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 jul. 1984, arts. 1º, 2º e 66.
- CARVALHO, Salo de. Penas e Garantias. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p.170.
- LYRA, Roberto. Comentários ao Código de Processo Penal. Vol. VI. Rio de Janeiro: Forense, 1944, p. 11.
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- SCAPINI, Marco Antônio Bandeira. Execução Penal: controle da legalidade. In: CARVALHO, Salo de (coord.) Crítica à execução penal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007, p. 311.
- Ibidem, p. 311.
- O art. 5º da Constituição Federal, em seu inciso XLVII, alínea "e" estabelece que não haverá penas cruéis.
- SCAPINI, Marco Antônio Bandeira. Execução Penal: controle da legalidade. In: CARVALHO, Salo de (coord.) Crítica à execução penal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007, p. 307.
- CATÃO, Yolanda & SUSSEKIND, Elisabeth. Os direitos dos presos. Rio de janeiro: Forense, 1980, p. 64.
- SCHROEDER, Simone. Regressão de Regime: uma releitura frente aos princípios Constitucionais. Abordagem crítica. In: CARVALHO, Salo de (coord.). Crítica à execução penal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007, p. 499.
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- MARQUES JÚNIOR, Ayrton Vidolin. A participação da comunidade na execução penal . Jus Navigandi. Teresina, ano 11, n. 1544, 23 set. 2007. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/10447>. Acesso em: 01 set. 2008.
- Ibidem.
- Ibidem.
- CARVALHO, Salo de. Pena e Garantias. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p.234.
- Ibidem, p. 234.
- KANT, Immanuel. A metafísica dos costumes. Trad. Edson Bini. Bauru: EDIPRO, 2003, p. 76.
- O art. 1º diz que a execução penal tem por objetivo efetivar as deposições da sentença e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado.
- Um exemplo desse comportamento foi o grande apelo que houve, por parte da sociedade, para que houvesse um tratamento mais rigoroso para determinados delitos, o que redundou na Lei dos Crimes Hediondos, conforme Lei n° 8072 de 1990.
- FREIRE, Christiane Russomano. A violência no sistema penitenciário brasileiro contemporâneo. São Paulo: IBCCRIM, 2005, p. 120.
- BAUDRILLARD, Jean. A conjuração dos imbecis. In: MARTINS, Francisco Menezes & SILVA, Juremir Machado (orgs.). Para navegar no século XXI. Porto Alegre: EDIPUCRS/Sulina, 2003, p. 99-100.
- CARVALHO, Salo de. Anti Manual de Criminologia. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008, p. 123.
- BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 45.
- AZEVEDO, Rodrigo Ghringuelli de. Visões da Sociedade Punitiva: elementos para uma sociologia do controle penal. In: Gauer, Ruth Maria Chittó. Sistema Penal e Violência. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, p. 12.
- GUINDANI, Miriam Krenzinger A. Tratamento penal: a dialética do instituído e do instituinte. In: CARVALHO, Salo de (org.). Crítica à execução penal. Rio de janeiro: Lúmen Júris, 2007, p.185.
- Ibidem, p.185.
- Ibidem, p. 185.
- CARVALHO, Salo de. Anti Manual de Criminologia. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008, p.103.
- SCHMIDT, Andrei Zenkner. Direitos, Deveres e Disciplina na Execução Penal. In: CARVALHO, Salo de (org.). Crítica à execução penal. Rio de janeiro: Lúmen Júris, 2007, p. 233.
- Carvalho, Salo de. Penas e Garantias. Lúmen Júris, Rio de Janeiro: 2003, p. 266.
- Ibidem, p. 107.
- ZAFFARONI, Eugenio Raul. Sentido y Justificación de la pena. In: Jornadas sobre sistema penitenciário y derechos humanos. Buenos Aires: Editores del Puerto s.r.l., 1997, p. 38.
- Ibidem.