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A situação jurídica dos agentes comunitários de saúde, agentes de combate a endemias e outros.

Inconstitucionalidade do art. 2º, parágrafo único, da EC nº 51/2006, e do art. 2º, caput e §§ 1º e 2º, Emenda nº 53 à Lei Orgânica do Distrito Federal

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Agenda 16/03/2009 às 00:00

Não é possível que certos indivíduos sejam presenteados com um cargo ou emprego público permanente sem terem participado com sucesso prévio em legítimo certame concursal ou "processo seletivo público".

Palavras-chave: Agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias e outros. Situação jurídica em face da Emenda Constitucional n. 51/2006, Lei federal n. 11.350, de 5 de outubro de 2006, e da Emenda à Lei Orgânica do Distrito Federal n. 53/2008 e Leis distritais n. 3.870/2006 e 3.716/2005. Investidura em emprego público permanente com dispensa de aprovação em concurso público e de processo seletivo público. Violação aos princípios da República, da moralidade administrativa, da igualdade-isonomia e do concurso público.

Resumo: O artigo procura demonstrar que é inconstitucional o disposto no art. 2º, par. único, da Emenda Constitucional n. 51/2006, bem como o capitulado no art. 2º, §§ 1º e 2º, da Emenda 53/2008 à Lei Orgânica do Distrito Federal, no quanto agraciaram com um cargo ou emprego público permanente, sem necessidade de prévia aprovação em concurso público nem em processo seletivo público, os indivíduos que atuavam nas funções previstas na redação atual do art. 198, § 4º, da Constituição Federal de 1988, assim como médicos, cirurgiões-dentistas, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, farmacêuticos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, fisioterapeutas, técnicos dentários e outros. Considera-se presente ofensa aos princípios constitucionais da República, da igualdade-isonomia, do concurso público (art. 37, II, Constituição Federal de 1988), da moralidade administrativa (art. 37, caput, Constituição Federal de 1988). Intenta-se evidenciar que, numa república, deve ser ampla e igualitária a oportunidade de participação em procedimentos de disputa para seleção de pessoal a ser contratado pela Administração Pública, não se justificando que certos indivíduos sejam presenteados com um cargo ou emprego público permanente sem terem participado com sucesso prévio em legítimo certame concursal ou "processo seletivo público" (instituto ainda desconhecido em sua ontologia no direito brasileiro positivo).


1. Introdução

Cuida-se, no presente artigo, da interpretação do disposto na Emenda 51/2006, a qual estatuiu em seu art. 2º, parágrafo único:

Art. 2º. Após a promulgação da presente Emenda Constitucional, os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias somente poderão ser contratados diretamente pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios na forma do § 4º do art. 198 da Constituição Federal, observado o limite de gasto estabelecido na Lei Complementar de que trata o art. 169 da Constituição Federal.

Parágrafo único. Os profissionais que, na data de promulgação desta Emenda e a qualquer título, desempenharem as atividades de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias, na forma da lei, ficam dispensados de se submeter ao processo seletivo público a que se refere o §4º do art. 198 da Constituição Federal, desde que tenham sido contratados a partir de anterior processo de Seleção Pública efetuado por órgãos ou entes da administração direta.

A seu turno, o art. 198, da Constituição Federal de 1988, passou a vigorar com esta redação:

Art. 198.........................................................................

§ 4º Os gestores locais do sistema único de saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação. .(Incluído pela Emenda Constitucional nº 51, de 2006)

§ 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 51, de 2006)

§ 6º Além das hipóteses previstas no § 1º do art. 41 e no § 4º do art. 169 da Constituição Federal, o servidor que exerça funções equivalentes às de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias poderá perder o cargo em caso de descumprimento dos requisitos específicos, fixados em lei, para o seu exercício. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 51, de 2006)

Por sua vez, estatui a Emenda n. 53 à Lei Orgânica do Distrito Federal:

Art. 1º O art. 205 da Lei Orgânica do Distrito Federal passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 1º, 2º e 3º:

Art.205................................................................................

§ 1º Os gestores do Sistema Único de Saúde poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e a complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação.

§ 2º Lei disporá sobre o regime jurídico e a regulamentação das atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias.

§ 3º Além das hipóteses previstas no art. 41, § 1º, e no art. 169, § 4º, da Constituição Federal, o servidor que exerça funções equivalentes às de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias poderá perder o cargo em caso de descumprimento dos requisitos específicos fixados em lei para o seu exercício.

Art. 2º Os agentes comunitários de saúde e os agentes de combate às endemias somente poderão ser contratados diretamente pelo Distrito Federal na forma do art. 205, § 1º, da Lei Orgânica do Distrito Federal, observado o limite de gasto estabelecido na Lei Complementar de que trata o art. 169 da Constituição Federal.

§ 1º Os profissionais que, na data da promulgação desta Emenda e a qualquer título, desempenharem as atividades de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias, na forma da lei, ficam dispensados de se submeter ao processo seletivo público a que se refere o art. 205, § 1º, da Lei Orgânica do Distrito Federal, desde que tenham sido contratados a partir de processo de seleção pública efetuado por órgãos ou entes da administração direta e indireta do Distrito Federal ou por outras instituições com a efetiva supervisão e autorização da administração direta.

§ 2º Aplica-se o disposto neste artigo aos profissionais que, na data da promulgação desta Emenda e a qualquer título, desempenharem as atividades de médico, cirurgião-dentista, enfermeiro, psicólogo, nutricionista, farmacêutico, terapeuta-ocupacional, fisioterapeuta, assistente social, técnico em enfermagem, técnico em higiene dental, técnico em prótese dental, auxiliar de enfermagem, auxiliar de consultório dentário, auxiliar de prótese dentária e auxiliar de laboratório, na forma da lei, ficando dispensados de se submeterem ao processo seletivo público a que se refere o art. 205, § 1º, da Lei Orgânica do Distrito Federal, desde que tenham sido contratados a partir do processo de seleção pública efetuado por órgão ou ente da administração direta e indireta do Distrito Federal ou por outras instituições com a efetiva supervisão e autorização da administração direta, resguardados os direitos dos atuais aprovados em concursos públicos.

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2. Da violação aos princípios constitucionais da República e da igualdade

Percebe-se, de pronto, que o art. 2º, parágrafo único, da Emenda 51/2006, viola gravemente o princípio republicano, bem como o princípio da isonomia, na medida em que favorece um determinado grupo de indivíduos, agraciando-os com um cargo-emprego público permanente de agente comunitário de saúde ou de combate às endemias nos quadros da Administração Pública, sem qualquer exigência de aprovação em procedimento público legitimamente disputado com outros cidadãos possivelmente interessados, o que não pode ser admitido na ordem constitucional brasileira.

Sobre o princípio republicano enunciam os constitucionalistas Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco:

Estampado no caput do art. 1º da Constituição de 1988, esse princípio traduz a nossa opção por uma república constitucional, ou seja, por uma forma de governo na qual – em igualdade de condições ou sem distinções de qualquer natureza – a investidura no poder e o acesso aos cargos públicos em geral – do Chefe de Estado ao mais humilde dos servidores – são franqueados a todos os indivíduos que preencham tão-somente as condições de capacidade estabelecidas na própria Constituição ou, de conformidade com ela, em normas infraconstitucionais. [01]

Alexandre de Moraes confirma que:

Existe, assim, um verdadeiro direito de acesso aos cargos, empregos e funções públicas, sendo o cidadão e o estrangeiro, na forma da lei, verdadeiros agentes do poder, no sentido de ampla possibilidade de participação da administração pública. [02]

Ora, ao contemplar determinados destinatários da norma com favoritismo, em vista de "regularizar e efetivar" a situação das pessoas que já trabalham na atividade de agente comunitário de saúde em certas áreas do território nacional, ampliando a disciplina singular para todos os entes federados, dispensando o recrutamento pela via do concurso público, ao argumento de que a realização do certame concursal poderia permitir que terceiros mais qualificados, como médicos e enfermeiros de nível superior, se sagrassem vencedores nas provas respectivas e "tirariam o lugar" dos menos qualificados, que presentemente trabalham no mister, não há dúvida de que a emenda constitucional em comento colidiu diretamente com o princípio republicano ao conferir uma espécie de reserva de cargos ou empregos públicos para certos indivíduos – os que atualmente já trabalham como agentes comunitários, a pretexto de lhes conceder direitos trabalhistas e previdenciários, mas com um efeito muito maior: o de lhes doar um posto permanente na Administração Pública, sem o lastro sagrado do concurso público. Confira-se, a esse propósito, transcrição do voto do relator na Proposta de Emenda à Constituição nº 7-B, de 2003, que deu origem à indigitada EC nº 51/2006, publicado no Diário dos Deputados na data de 24 de novembro de 2005, a revelar os motivos anti-republicanos da proposição:

"Como fazer com que o Agente Comunitário seja contratado pelas prefeituras como servidor efetivo, sem transformá-lo em um burocrata com vínculo com a comunidade? Como contratar um agente para atuar junto à comunidade que ele mora sendo, ao mesmo tempo, um servidor competente e representativo da sua Comunidade? Como contratar um verdadeiro agente comunitário de saúde e, ao mesmo tempo, evitar que profissionais de outras áreas, com escolaridade mais elevada do que a necessária como médicos recém-formados, estudantes universitários entre outros, façam o concurso público, sejam aprovados e passem a atuar em outras funções dentro da estrutura de assistência médica do município?

[...]

O substitutivo oferecido em anexo busca, do mesmo modo, resolver a situação dos profissionais que já atuam na área, não para criar um universo amplo e indiscriminado de contemplados, mas para conferir alguma espécie de sustentação jurídica a situações fáticas que hoje se situam no limite da clandestinidade e angustiam milhares de pais e mães de família, além de colocar em permanente risco de descontinuidade o relevante serviço que prestam com tanta eficiência e afinco".

Pasme-se: o motivo da doação dos empregos ou cargos públicos, invocado pelo legislador constituinte ordinário reformador da Constituição, é a falta de qualificação ou a menor capacidade dos beneficiários do favor inusitado e inconstitucional da outorga de um posto permanente na Administração Pública aos indivíduos que já trabalham na função, privilegiando-os em detrimento de outros tantos cidadãos que também almejariam gozar do beneplácito estatal, juntamente com tantos desempregados e outros milhões que lutam, devotadamente, na preparação para disputa pelos cargos e empregos administrativos pela via estreita e nobre dos concursos públicos, meio de respeito ao postulado republicano.

Sobre o caráter de princípio sensível da República na Constituição de 1988, leciona André Ramos Tavares:

Princípios sensíveis são, em parte, princípios considerados pela Constituição expressamente como princípios fundamentais. Assim ocorre com a [...] República. A Constituição brasileira proclama o ideal republicano, não só por acentuar logo no art. 1º que o Brasil é uma República, mas também por adotar a transitoriedade no exercício do poder, a legalidade (governo de lei e não de homens), a moralidade e a eficiência como pautas constitucionais direcionadas aos diversos agentes do Estado (servidores, funcionários públicos e mandatários de cargos eletivos. [03]

Confirma o professor Uadi Lammêgo Bulos sobre o princípio republicano: "Ele não pode sofrer emendas constitucionais, haja vista o limite implícito no art. 60, § 4º, I, da Carta de 1988. Sua observância é obrigatória por parte dos entes federativos, a começar pela União." [04]

Ao assim fazer, a despeito de se tentar alterar, inicialmente, na veiculação da proposta de emenda constitucional, uma nova forma de recrutamento de pessoal para os agentes comunitários de saúde, com modificação do inciso II do art. 37 da Carta, o legislador reformador esbarrou, contudo, além de não ter alterado a redação do citado dispositivo constitucional, num atentado à cláusula republicana, o que tornou a emenda inconstitucional (arts. 1º, caput, 3º, caput e inciso IV, 4º, caput, Constituição Federal de 1988):

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

..................................................................

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

.......................................................................

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios.

De outro ângulo, a República visa a promover o bem de todos, sem formas de discriminação, não somente com características negativas, mas também a título de favoritismos. Todos os cidadãos têm assegurado o direito de concorrer, em igualdade de condições, para acesso aos cargos públicos, para usufruto do benefício da contratação permanente nos quadros funcionais do Estado. Não se pode elaborar uma sistemática de recrutamento de pessoal na Administração Pública que dispensa o procedimento do concurso público para, em seu lugar, conceder uma espécie de proteção partidarizada de certas pessoas que já trabalham como agentes comunitários de saúde, com menor grau de instrução, apenas sob o pretexto de que a realização do certame concursal poderia gerar o efeito de que outros sujeitos mais qualificados pudessem ser aprovadas no concurso para cargos ou empregos, roubando o lugar julgado pretensamente cativo de quem já trabalha presentemente na função, ainda que na qualidade de mero contratado de entidades de organização da sociedade terceirizadas, via convênio com o Poder Público. A própria justificativa da emenda constitucional, no particular, pois, colide com o princípio republicano, assim como consubstancia atentado ao capitulado no art. 37, I, da Constituição Federal de 1988: "os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; (redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998).

Adverte, com pertinência, no ponto, o professor de direito constitucional e desembargador Kildare Gonçalves Carvalho:

A formulação mais moderna do princípio da igualdade de acesso a cargos públicos aponta para a idéia de oportunidade eqüitativa; este valor, seja quais forem as posições econômicas dos cidadãos, tem de ser aproximadamente igual, ou, no mínimo, suficientemente igual, para que todos tenham uma oportunidade eqüitativa de ocupar cargos públicos e de influenciar o resultado das decisões políticas. [05]

Não é possível estabelecer que os indivíduos que já atuam como médicos no interior do país, por exemplo, a despeito da conveniência administrativa nesse sentido, estariam dispensados de prestar concurso público para ingresso em cargos ou empregos públicos de profissionais de saúde na Administração Pública municipal ou estadual, em face do primado da cláusula republicana, a sobrepor-se mesmo que tivesse sido revogado – quando não o foi – o dispositivo do inciso II do art. 37 da Carta, que exige concurso público para provimento de cargos ou empregos administrativos. Quiçá conviesse que os agentes de polícia que fazem as vezes de delegados de Polícia Civil, com desvio de função, ante a falta de titulares para os cargos de delegado, fossem contratados no posto superior na instituição policial, mas contra pretensão dessa natureza se insurge o instituto constitucional do concurso público, como forma de efetivar o preceito isonômico e republicano de igualdade para disputa de acesso aos cargos permanentes na Administração Pública.

Em outras palavras, a exigência de concurso público para a constituição de vínculo profissional permanente com o Estado, por meio da investidura em cargo ou emprego público, decorre diretamente do princípio republicano, do qual o inciso II do art. 37 da Carta é somente um reflexo desse postulado inafastável. O preceito de que todos são iguais perante a lei, no regime republicano, de per si, ainda que tivesse sido alterado o inciso II do art. 37 da Carta, para o fim de apaniguar os contemplados pela Emenda 51/2006 à Constituição Federal (art. 2º, par. único), ainda assim exigiria igualdade de disputa e oportunidade de ingresso nos quadros administrativos do Estado, porquanto um cidadão não pode ter mais direito do que outro igual quanto ao bem da vida da obtenção de um cargo ou emprego público, benefício visado por muitos, sobretudo em meio ao grave quadro de desemprego, baixas remunerações e falta de estabilidade que se vivencia na iniciativa privada. Quantos desempregados não desejariam se inscrever em certame concursal público para disputar uma das vagas para os cargos ou empregos públicos de agente comunitário de saúde ou de combate às endemias? Quantos pais de família não precisam desse posto para sustentar seus núcleos familiares? Por que os que presentemente foram contratados pelo Estado, precariamente, ou os recrutados por entidades privadas para o desempenho da função seriam aquinhoados com um "presentão" de um posto administrativo permanente nos quadros funcionais dos entes federados, em prejuízo de outros cidadãos que sonhariam com a mesma benesse?

Por que os demais integrantes da sociedade e da república brasileira não podem ser contemplados com a fortuita contemplação de um emprego público ou de um cargo administrativo?

Odete Medauar comenta que a exigência de concurso público "figura desdobramento dos princípios da moralidade, impessoalidade e igualdade, sobretudo". [06] A seu turno, Uadi Lammêgo Bulos, comentando sobre a lei que deve definir a forma de acesso aos cargos e empregos públicos, asserta:

Essa lei não poderá estabelecer privilégios de qualquer tipo, muito menos desequiparações arbitrárias e abusivas, de sorte a beneficiar pessoas de acordo com a raça, cor, origem, status social, condição econômica etc. [...] Evidente que o estrangeiro, assim como o brasileiro, para ocupar cargo ou emprego público, precisa fazer concurso de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargos em comissão, declarados em lei de livre nomeação e exoneração. [...] Quaisquer discriminações atentatórias ao princípio da igualdade de todos perante a lei será inconstitucional. Nesse sentido: STF, Pleno, RE 141.864-8, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 1º -10-1993; STF, 2ª T., re 120.305-6/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 21-9-1995. [...] A voz ´de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego´ não pode servir de apanágio para a quebra da obrigatoriedade do concurso público de provas ou de provas e títulos. Logo, será inconstitucional a lei que flexibilizar o ritual dos concursos, independentemente da natureza, simples ou complexa, de determinado encargo. [...] Qualquer investidura no serviço público depende de concurso. [07]

O caráter fisiológico do art. 2º, par. único, da Emenda Constitucional n. 51/2006, resta nítido ao permitir que as pessoas que já atuam como agentes comunitários de saúde não tenham que prestar concurso público nem sequer participar de procedimento de seleção pública para serem investidos em cargo ou emprego na Administração Pública, tendo recebido um presente dos propositores da norma reformadora da Constituição Federal, na contramão da cláusula da igualdade e da república:

Art 2º ......................................................................

Parágrafo único. Os profissionais que, na data de promulgação desta Emenda e a qualquer título, desempenharem as atividades de agente comunitário de saúde ou de agente de combate às endemias, na forma da lei, ficam dispensados de se submeter ao processo seletivo público a que se refere o § 4º do art. 198 da Constituição Federal, desde que tenham sido contratados a partir de anterior processo de Seleção Pública efetuado por órgãos ou entes da administração direta ou indireta de Estado, Distrito Federal ou Município ou por outras instituições com a efetiva supervisão e autorização da administração direta dos entes da federação.

Antevê-se que o dispositivo em apreço padece de gravíssima eiva de inconstitucionalidade, por constituir forma de presentear com um cargo ou emprego público permanente, sem a exigência de prévia sagração legítima e necessária em concurso público de provas, determinados indivíduos que figuravam como contratados em contratos temporários com a Administração Pública, ou até, pior ainda, por meio de organizações particulares terceirizadas, num tratamento privilegiado manifestamente incompatível com o princípio constitucional da igualdade e com o princípio republicano, a reclamar urgente argüição de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.

Sendo assim, resta cristalino que a Administração Pública não deve investir em cargo ou emprego público os beneficiários do art. 2º, par. único, da Emenda 51/2006, sob pena de a autoridade administrativa responsável incorrer em ato de improbidade administrativa, por frustrar a licitude de concurso público (art. 11, V, Lei federal n. 8.429/1992). Não podem ser formalizados contratos de emprego público com essas pessoas nem sequer prorrogados os já entabulados, em face da inconstitucionalidade da medida, como exaustivamente demonstrado supra.

Sobre o autor
Antonio Carlos Alencar Carvalho

Procurador do Distrito Federal. Especialista em Direito Público e Advocacia Pública pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Advogado em Brasília (DF).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Antonio Carlos Alencar. A situação jurídica dos agentes comunitários de saúde, agentes de combate a endemias e outros.: Inconstitucionalidade do art. 2º, parágrafo único, da EC nº 51/2006, e do art. 2º, caput e §§ 1º e 2º, Emenda nº 53 à Lei Orgânica do Distrito Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2084, 16 mar. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12468. Acesso em: 23 dez. 2024.

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