4. Conclusões
De tudo quanto foi exposto pode-se concluir que o usuário prejudicado pela Enersul, pessoa natural ou jurídica, não está adstrito ao parcelamento concedido pela ANEEL. Pode perfeitamente ingressar em Juízo para exigir da concessionária a repetição do indébito de uma só vez, acrescidos de juros legais e correção monetária.
No caso do usuário tutelado pelo Código de Defesa do Consumidor, a repetição do indébito é dobrada pelo parágrafo único do artigo 42 desse estatuto legal.
Além disso, tem direito o usuário, qualquer que seja, por força principalmente do artigo 7.º, II, da Lei de Concessões, o direito de requerer liminar para que se exija da Enersul o aqui denominado extrato analítico da dívida, consistente na relação mês a mês, desde abril de 2004 até dezembro de 2007, os seguintes dados:
a) os valores efetivamente cobrados da parte requerente;
b) ao lado, os valores que deveriam ter sido cobrados (em razão do recálculo da revisão tarifária de 2003);
c) a diferença de um pelo outro;
d) a atualização monetária da diferença;
e) o detalhamento, de forma simples e inteligível ao usuário, das premissas técnicas que levaram à composição dos valores corretos.
Vale lembrar, ainda, que não custa requerer também seja determinada multa diária para o caso de descumprimento da apresentação do extrato analítico da dívida.
Uma última questão, deixada propositalmente para o final: com a apresentação do extrato analítico da dívida pela Enersul, o usuário pode dispensar a perícia técnica, cuja necessidade é hoje a principal razão das tantas ações extintas sem resolução do mérito no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis.
Com efeito, o pedido liminar pode mesmo ser cumulado com a ação de repetição de indébito em sede dos Juizados Especiais, presumindo-se aqui que o Poder Judiciário não se furtará a garantir ao consumidor o direito garantido pelo artigo 7.º, II, da Lei 8.987/1995 [17].
É certo, porém, que o usuário não ficará vinculado aos números apresentados pela Enersul. Pode, por óbvio, discordar e exigir seja o extrato sujeito à perícia. Se isso acontecer, consoante vem decidindo a grande maioria dos magistrados dos Juizados Especiais sul-mato-grossenses, será o caso de extinção da ação principal sem resolução do mérito e ingresso com outra, na Justiça Comum.
Na prática isso raramente ocorrerá. Em verdade o que deseja o consumidor é um mínimo de respeito. De posse do extrato analítico informando a totalidade de seu crédito, a tendência é de que o consumidor evite os custos, no mais amplo sentido, de uma prova pericial, para abreviar o efetivo recebimento de seu crédito, ainda que em valor potencialmente menor.
Observa-se, finalmente, que o fornecimento de um extrato analítico da dívida incorreto pode ser também evitado por requerimento de multa cominatória quando da liminar. De certa forma, tanto o não fornecimento quanto o fornecimento incorreto são espécies de desatendimento da ordem judicial. O requerimento, é claro, deve constar do próprio pedido liminar.
Notas
- Disponível em: http://www.aneel.gov.br/cedoc/areh2007571.pdf; acesso em 10/01/2009.
- Disponível em: http://www.aneel.gov.br/cedoc/areh2007571_1.pdf, acesso em 10 de janeiro de 2009.
- Disponível em: https://www.in.gov.br/imprensa/visualiza/index.jsp?data=08/04/2008&jornal=1&pagina=62&totalArquivos=88, acesso em 10/01/2009.
- Resolução Homologatória n.º 624/2008:
(..)
"Art. 7º Fixar o valor de - R$151.122.221,68 (menos cento e cinqüenta e um milhões, cento e vinte e dois mil, duzentos e vinte e um reais e sessenta e oito centavos), base abril de 2008, a título de ajuste financeiro decorrente do recálculo da Revisão Tarifária de 2003, a ser utilizado pela ANEEL em parcelas anuais, nesta revisão tarifária e nos reajustes anuais subseqüentes, no sentido de atenuar eventuais aumentos tarifários.
§ 1º As tarifas do Anexo III contemplam a primeira parcela do ajuste financeiro de que trata o "caput", no valor de -R$18.450.387,51 (menos dezoito milhões, quatrocentos e cinqüenta mil, trezentos e oitenta e sete reais e cinqüenta e um centavos).
§ 2º As tarifas de que tratam o § 1º deverão constar da fatura de energia elétrica, em separado, com menção de que tratam da primeira parcela do ajuste financeiro decorrente do recálculo da Revisão Tarifária de 2003.
§ 3º O saldo não amortizado do ajuste financeiro será remunerado mensalmente pela taxa SELIC.
§ 4º Nos reajustes tarifários anuais será calculado o saldo a compensar em função do montante efetivamente considerado nas faturas de energia elétrica ter sido maior ou menor do que o considerado no processo tarifário imediatamente anterior.
A Justiça estadual é competente para processar e julgar as ações de rito ordinário ou cautelar, sob o procedimento comum, nas quais figuram como parte a Brasil Telecom S/A e usuário, envolvendo questão acerca da legalidade de cláusula relativa à ''assinatura básica residencial ou não residencial'' de contrato de prestação dos serviços de telefonia, motivo pelo qual é desnecessária a participação da Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel. (Apelação Cível nº 2007.001179-8/0000-00, 1ª Turma Cível do TJMS, Rel. Josué de Oliveira. j. 05.06.2007). TJMS-018850)
TJMS-018611) APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - ANATEL - LITISCONSORTE PASSIVO - DESNECESSIDADE - COBRANÇA DA TARIFA MENSAL DE ASSINATURA BÁSICA DE TELEFONE -ILEGALIDADE - FALTA DE PREVISÃO LEGAL - LEI Nº 9.472/97 E RESOLUÇÃO Nº 85/90 - COBRANÇA ABUSIVA E ILEGAL NOS TERMOS DO CDC - REPETIÇÃO DE INDÉBITO - IMPOSSIBILIDADE - DECISÃO QUE PRODUZ EFEITOS EX NUNC SOMENTE APÓS A DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ATO NORMATIVO ADMINISTRATIVO QUE PREVIA A POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA MENSAL - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
A ANATEL não é litisconsorte necessária da ação ajuizada pelo consumidor que visa a discutir a legalidade da cobrança da tarifa básica mensal pela concessionária do serviço público.(...)" (Apelação Cível nº 2007.021352-9/0000-00, 3ª Turma Cível do TJMS, Rel. Rubens Bergonzi Bossay. j. 12.11.2007, maioria).