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Concorrência lícita.

Publicidade comparativa não denigre marca alheia

Agenda 23/05/2009 às 00:00

Resumo: O presente estudo visa investigar a publicidade comparativa à luz do ordenamento jurídico pátrio, estabelecendo os pressupostos para sua licitude sob os prismas ético, consumerista, marcário e, notadamente, concorrencial, destacando, rapidamente, as principais ações constitutivas de concorrência desleal.

Palavras-chave: Publicidade Comparativa; Concorrência desleal; Propriedade industrial; Proteção ao consumidor; Ética publicitária.


Como elemento catalisador das técnicas promocionais, a publicidade enseja, não raramente, abusos como forma enganosa em relação ao consumidor e como instrumento de concorrência desleal.

Para minimizar os abusos no que tange à atividade publicitária em si, sem prejuízo da invocação das disciplinas consumerista, de proteção da propriedade industrial e da concorrência desleal, aplica-se o Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária (Cbap), com âmbito de incidência maior que o das normas sobre publicidade previstas no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), de cuja aplicação se encarrega o Conselho Nacional de Auto-regulamentação Publicitária (Conar).

Vale citar, ainda, a Lei 4.680/65, regulamentada pelo Decreto 57.690/66 e alterado pelo Decreto 4.563/02, que regula o exercício da profissão de publicitário e agenciador de propaganda.

Sob o prisma da ética publicitária, poderá a mensagem publicitária comparativa ser admitida desde que respeite o disposto no Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária (art. 32, Cbap), valendo destacar que a mensagem veiculada deve ser objetiva, porquanto o escopo dos anúncios comparativos deve ser o esclarecimento do consumidor, sem prejuízo, à obviedade, do interesse imediato de aumento das vendas por parte do anunciante.

Poderá a publicidade mostrar-se condenável para a ética do setor, sem, contudo, ser ilícita sob viés consumerista, marcário ou concorrencial, uma vez que o critério de que o anúncio não deve ressaltar aspectos exclusivamente valorativos ou de cunho emocional é limitado aos princípios da ética publicitária.

Com efeito, no que tange à defesa do consumidor em relação a eventuais práticas publicitárias espúrias, é encontrado o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990), a organização da defesa do consumidor (Decreto 2.181/1997) e as leis que tratam da regulamentação de produtos sujeitos aos regulamentos especiais.

Sob tal viés será sancionada somente quando ilícita, ou seja, quando simulada, enganosa e abusiva. Não basta que a informação seja inverídica, devendo o anúncio veicular mensagem falsa como se verdadeira fosse; se o consumidor não tem condições de perceber a falsidade da informação, então a publicidade é lícita, apesar de conter falsidades.

A publicidade comparativa ocorre "quando a mensagem destaca um produto ressaltando suas características em relação a outros similares de outras marcas", [01] "(...) seja para demonstrar a superioridade do primeiro sobre o segundo, seja para igualá-lo e assim permitir que usufrua o padrão de qualidade por este ostentado no mercado". [02]

A publicidade comparativa por si só não representa ofensa a direito de consumidor, não existindo norma jurídica que proíba ou limite sua utilização, exceto se a publicidade for ilícita em função da veiculação de informações enganosas ou for abusiva. Este, o viés consumerista.

No pertinente ao direito marcário do concorrente, a rigor não existe lesão de qualquer natureza pela tão só menção da marca registrada que ele titulariza, a não ser em duas hipóteses: 1. se, ao mencionar a marca ou marcas da concorrência, o empresário anunciante as imita em seus produtos ou serviços ou, de qualquer forma, induz em confusão os destinatários da mensagem (art. 189, I, Lei 9.279/96); 2. se a publicidade comparativa pode contribuir para a degenescência da marca (arts. 130, III e 131, Lei 9.279/96).

Interessa-nos mais particularmente, contudo, a publicidade comparativa à luz da concorrência.

De fato, o crescimento da concorrência, a estandardização dos produtos, o desejo por novos mercados e, especialmente, a atuação emulatória ou parasitória de certos empresários, ensejam a prática de determinadas ações, contrárias à moral e à lei, que invadem a esfera de direitos da concorrência, merecendo, portanto, resposta adequada do ordenamento jurídico. [03]

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A concorrência tem como elemento fundamental o intuito de alargar a clientela em prejuízo dos concorrentes, de forma que é o emprego de meios inidôneos para alcançar este objetivo, desrespeitando as regras do jogo e provocando a turbação do livre funcionamento do mercado e prejuízos para os legítimos titulares dos direitos violados, que vai identificar e distinguir a deslealdade competitiva da prática leal.

No direito brasileiro, a Constituição Federal de 1988 regulamentou a forma de atuação dos agentes econômicos, estatuindo os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, IV) e, no que tange ao respeito à ordem econômica, determinou a livre concorrência (art. 170, IV), além de dispor acerca dos direitos industriais e autorais. Por outro lado, previu a repressão ao abuso do poder econômico, que visa à dominação dos mercados, eliminação da concorrência ou aumento arbitrário dos lucros (art. 173, § 4º).

O tratamento legislativo da concorrência desleal é dado pela Lei 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial - LPI), que define o crime de concorrência desleal em seu art. 195, merecendo em leis especiais, certas referências, como na Lei n. 8.884/94 (Lei Antitruste), capitulando a concorrência desleal por meio da exigência de exclusividade, para publicidade (art. 21, VII).

O Código Civil também garante ao prejudicado o direito ao ressarcimento por prejuízos em função de concorrência desleal, por atos que firam a reputação ou os negócios alheios, obedecendo aos postulados básicos da teoria do ato ilícito (art. 927, CC).

Para os fins da disciplina jurídica da concorrência, deve se considerar como de concorrência desleal todo ato de concorrente que, valendo-se de força econômica de outrem, aproveita indevidamente de sua criação e de seu aviamento, para captar, sem esforço próprio, a respectiva clientela. [04]

Com efeito, a publicidade comparativa pode caracterizar a concorrência desleal em situações de falsidade, confusão, denigração, parasitismo e predação.

A falsidade publicitária existe quando há inconformidade entre o anúncio e a verdade a ele subjacente, veiculado ao público em detrimento de concorrente, prejudicando sua imagem junto aos consumidores.

A publicidade comparativa apenas se torna denigratória quando excedidos seus limites, ou seja, seu conteúdo desvia-se da informação verdadeira, objetiva e direta no que tange às qualidades do produto ou serviço anunciado, para indicar falhas ou defeitos do concorrente, com intensidade suficiente para derrear sua reputação, crédito ou confiança que o mercado lhe deposita.

No tocante à confusão, trata-se de prática tendente a captar clientela alheia mediante assemelhação indevida dos elementos distintivos, de forma a afastar a diversificação natural dos produtos.

Já a concorrência parasitária trata-se do uso injustificado da imagem de uma empresa por outra para aproveitar-se do seu prestígio, não havendo intenção de denegrir a marca alheia, possibilidade que, no entanto, não pode ser afastada.

Por derradeiro, a predação (ou comparação predatória) constitui na atuação do anunciante que deseja manter sua hegemonia via exclusão dos demais concorrentes com abuso do poder econômico.

Desta forma, na publicidade comparativa não há intenção de denegrir a marca alheia (em que pese tal efeito possa vir a ocorrer).

A publicidade comparativa, portanto, se insere nos meios possíveis de atividades negociais de que se valem as empresas para formação, manutenção e expansão de sua clientela, sendo que esta potencialidade de iniciativa pode e deve ser desenvolvida com ampla liberdade, desde que se manifeste à luz dos princípios da veracidade, honestidade e da correção profissional, necessários para o respeito e defesa da concorrência.


Notas

  1. SCHMIDT, Lélio Denícoli. A publicidade comparativa à luz da Lei de Propriedade Industrial. Revista da ABPI. São Paulo, nº 52, p. 141.
  2. SANTOS, Fernando Gherardini. Direito do marketing: uma abordagem jurídica do marketing empresarial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2000. p. 32.
  3. BITTAR, Carlos Alberto. Teoria e prática da concorrência desleal. São Paulo: Saraiva. 1989. p. 35.
  4. Ibid. p. 37.
Sobre o autor
Marcel Thiago de Oliveira

Advogado e Assessor Jurídico da Câmara Municipal de Rio Claro / Graduado em Ciências Jurídicas e Mestrando em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba - UNIMEP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Marcel Thiago. Concorrência lícita.: Publicidade comparativa não denigre marca alheia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2152, 23 mai. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12859. Acesso em: 22 dez. 2024.

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