O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), não permitiu que o Grupo Otimismo de Apoio ao Portador de Hepatite C ingressasse como amicus curie em processo que discute a obrigatoriedade ou não de o Estado fornecer medicamento de alto custo não incluído na lista do SUS (Sistema único de Saúde).
O amigo da corte, em latim amicus curiae, é um terceiro que intervém no processo para oferecer à Corte sua perspectiva acerca da questão constitucional controvertida, informações técnicas acerca de questões complexas cujo domínio ultrapasse o campo legal ou, ainda, defender os interesses dos grupos por ele representados, no caso de serem direta ou indiretamente afetados pela decisão a ser tomada.
Ao todo, o ministro Marco Aurélio permitiu o ingresso de seis entidades no Recurso Extraordinário (RE) n. 566.471, no qual o governo do Rio Grande do Norte contesta decisão da 4ª Vara da Fazenda Pública de Natal que o obrigou a fornecer o medicamento a uma paciente. Outras sete entidades, incluindo o Grupo Otimismo de Apoio ao Portador de Hepatite C, não foram admitidas.
Ao negar o pedido do Grupo Otimismo, o ministro Marco Aurélio explicou "que já se conta, no processo, com manifestações suficientes ao esclarecimento da matéria". Segundo ele, "a admissão, sem limites, de terceiros, acaba por prejudicar a tramitação do processo, repercutindo no julgamento".
As seguintes entidades participarão como amici curiae no RE: o Instituto de Bioética, Direito Humanos e Gênero (Anis), a Defensoria Pública da União, o estado do Rio de Janeiro, o estado de São Paulo, a Associação Brasileira de Assistência à Mucoviscidose (Abram) e o Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).
Além do Grupo Otimismo, não foram admitidos o Grupo de Pacientes Portadores de Hipertensão Arterial Pulmonar dos Hospitais Públicos do Rio de Janeiro, o Instituto Canguru – Grupo Especializado em Doenças Metabólicas, a Associação Paulista dos Familiares e Amigos dos Portadores de Mucopolissacaridoses, a Associação dos Familiares e Amigos dos Portadores de Doenças Graves, e os municípios de Boa Vista e do Rio de Janeiro.
São muitas as questões subjacentes à decisão que negou a participação dos sete amici curiae: quem pode ser amigo da corte? Nos julgamentos colegiados, o amicus curiae contribui para o esclarecimento do relator ou de todos os ministros que participarão do julgamento? O amicus curiae cumpre apenas um papel informacional? Se o plenário do STF, na ADI n. 4071, decidiu que a inclusão do processo em pauta marca o limite final para o ajuizamento do pedido de intervenção, qual a razoabilidade de se permitir o ingresso de uns e se negar o de outros dentro do período que antecede a inclusão do processo em pauta? E a isonomia processual, leva o direito de intervir aquele que primeiro pedir? Qual o limite da discricionariedade do relator ao escolher quais amici curiae ele deixará intervir no processo? Quanto mais informação melhor ou o elevado número de amicus curiae pode ser fundamento para o indeferimento do pedido de intervenção no STF, onde já houve processo que contou com a participação de 71 amici [01]?
No gráfico abaixo temos o número de pedidos de intervenção deferidos por ministro do STF:
Gráfico – Amicus Curiae deferidos por Ministro do STF
- ADI n. 2.999, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 15.5.2009.
- Preocupações em esse potencial desequilíbrio foram compartilhadas por KRISLOV, Samuel. The Amicus curiae Brief: from friendship to advocacy. The Yale Law Journal, vol. 72, p. 695-721, 1963; O’BRIEN, Zeldine. The Court Make a New Friend? Amicus curiae Jurisdiction in Ireland. Trinity College Law Review, vol. 7, p. 5-28, 2004; SCHACHTER, Madeleine. The Utility of Pro Bono Representation of U.S.-Based Amicus curiae and Multi-National Courts as a Means of Advancing The Public Interest. Fordham International Law Journal, vol. 28, p. 88-144, 2005.
- KRISLOV, Samuel. The amicus curiae briefs: from friendship to advocacy. Yale Law Journal, nº 72, 1963, p. 699.
- O principio da vedação de supressão de instâncias articula-se com o oferecimento, pelo amicus, de argumentos que não tenham sido apreciados pelas instâncias originárias e com o instituto da preclusão e o oferecimento de informações novas pelos amici já na fase recursal extraordinária.