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Nova lei do mandado de segurança: Lei nº 12.016/2009.

Algumas breves impressões

Agenda 13/08/2009 às 00:00

Tendo recebido a sanção presidencial, passou a vigorar no ordenamento jurídico brasileiro a nova lei do Mandado de Segurança, a Lei 12.012/09, que dispõe sobre o mandado de segurança individual e, também, sobre o coletivo.

O novo diploma legal cristalizou algumas questões já amplamente debatidas nos tribunais brasileiros. Entretanto, em alguns pontos, a proposta deixou a desejar. Em relação ao mandado de segurança coletivo, o grande ponto de interesse, não é tudo que pode ser elogiado com sinceridade. Dos 29 artigos da lei, apenas dois tratam do MS coletivo.

Primeiramente, vamos com os elogios:

1) Felizmente, do novel diploma não constaram referências aos limites territoriais de eficácia da decisão em processo coletivo, afugentando, por disposição expressa, a disciplina do famigerado art. 16 da Lei 7.346/85, restringindo-se o novo texto ao seguinte:

Art. 22.

No mandado de segurança coletivo, a sentença [sic] fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante.

2) Na redação original do projeto de lei, havia a possibilidade de emenda à inicial, caso ocorresse erro na indicação do legitimado passivo, prevista no art. 6º, §4º. Existe controvérsia sobre o tema, sendo que muitos dos magistrados brasileiros extinguiam o feito de plano caso constatem a ilegitimidade, pois entendem que as vias ligeiras do MS não comportavam emendas à exordial. Porém, o dispositivo em comento foi vetado pelo Presidente.

3) A nova lei parece ter se inclinado para o entendimento de que legitimada passiva no MS não é a autoridade coatora, mas a pessoa jurídica a que ela se vincula, conforme se depreende da análise dos arts. 7º, II; 9º; 14, §2º; e 15. Isso pode acabar com uma dúvida que tem assolado tanto gabinetes de juízes quanto bancos de universidade.

Agora, encaremos a iniciativa com franqueza:

1) Infelizmente, esqueceram-se dos direitos difusos na nova disciplina, fazendo-se menção apenas a direitos coletivos e individuais homogêneos a serem tutelados por MS coletivo. Entretanto, como o writ insere-se no microssistema de processo coletivo, os direitos difusos não ficam de fora de nosso famoso remédio heróico, agora na sua outra modalidade, a coletiva.

Art. 21.

  (...)

Parágrafo único.  Os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo podem ser: 

I - coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica; 

II - individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante. 

2) Legitimados para a propositura do MS coletivo foram apenas os partidos políticos com representação no Congresso Nacional, no que interessa estritamente aos interesses partidários, apenas (encerra-se, assim, dissonância doutrinária a respeito da amplitude de atuação dos partidos), as organizações sindicais, as entidades de classe ou as associações constituídas há, pelo menos, um ano, cada qual dentro de sua pertinência temática.

O requisito da constituição ânua foi colocado sem exceções, contrariando o art. 5º, § 4º da lei 7.347/85, o qual prevê hipótese de desconsideração desse requisito quando haja manifesto interesse social, dada a relevância da questão debatida. Todavia, um apelo ao microssistema coletivo pode contornar o problema.

De outro lado, perdeu-se a oportunidade de ampliar o rol de legitimados ativos, o qual seria muito bem composto com a presença do Ministério Público e da Defensoria Pública, como acontece na Ação Civil Pública, uma vez que a CF/88 não veda a ampliação do rol de legitimados, mas apenas indica alguns. A ampliação é de todo recomendável, já que a esses órgãos cabe a tutela de inúmeros direitos transindividuais, não sendo crível que devam defendê-los somente através das vias comuns.

3) Continua a existir a objetável previsão de não cabimento do MS caso a lei permita o uso de algum recurso administrativo dotado de efeito suspensivo para atacar o ato de autoridade suscetível de impugnação via MS. A previsão consta do art. 5º do diploma:

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Art. 5º

  Não se concederá mandado de segurança quando se tratar: 

I - de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução; 

4) Houve um deslize na redação do art. 22, §1º, ao lado de um erro grosseiro. Confira-se o teor do dispositivo:

Art. 22. (...) 

§ 1º  O mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva. 

O MSC não induz litispendência e isso é correto. Mas, pela lei, os efeitos benéficos da coisa julgada não serão fruídos pelo impetrante a título individual (que ingressou com um processo de MS individual) se ele não requerer a desistência de seu mandado de segurança individual no prazo de 30 dias a contar da ciência do curso do MSC.

O deslize a que se fez alusão refere-se à restrição dos efeitos benéficos apenas com relação a processos de MS individual. Ora, o interessado pode ter se valido das vias ordinárias, através de uma ação comum, buscando a mesma coisa pretendida no MSC. Será que precisaria abrir mão de sua pretensão individual apenas quando tenha manejado o writ constitucional? A resposta é negativa. Tanto processos comuns quanto processos de MS individual deverão ser passíveis exclusão de eventuais efeitos benéficos obtidos nos processos coletivos, dentre os quais se situa o de MS coletivo.

O erro grosseiro refere-se à previsão de desistência por parte do interessado a título individual, e isso porque não pode haver, no caso, desistência, mas sim, suspensão do processo individual, bastando imaginar o que ocorreria se o MSC não lograsse êxito. Nesse caso o interessado, tendo desistido, teria que entrar com um novo MS ou uma nova ação ordinária, pagando, inclusive, custas processuais novamente (se for o caso), enfrentado mais expedientes processuais, muitos deles repetidos, Sem contar com o consumo de papel e os gastos com autuação. Isso representa uma afronta à economia e celeridade processuais.

A iniciativa de nova regulamentação do mandado de segurança é bem-vinda, na medida em que cristaliza, de vez, vários entendimentos jurisprudenciais dominantes. Mas, de acordo com o que fora brevemente exposto nas linhas acima, a lei é carente de algumas pequenas revisões, a fim de se evitarem novas discussões nos tribunais e na doutrina.

Sobre o autor
Júlio César Cerdeira Ferreira

Advogado. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Autor de diversos trabalhos acadêmicos. Atuante nas áreas de Propriedade Intelectual, Direito Tributário, Contratos e Responsabilidade Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Júlio César Cerdeira. Nova lei do mandado de segurança: Lei nº 12.016/2009.: Algumas breves impressões. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2234, 13 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13317. Acesso em: 22 nov. 2024.

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