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Primeiras impressões sobre a nova Lei do Mandado de Segurança (2009)

Agenda 13/08/2009 às 00:00

Lei nº 12.016, de 7/8/2009 — "Disciplina o mandado de segurança individual e coletivo e dá outras providências"

"Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público."

O dispositivo é de um sutil autoritarismo, na medida em que exclui um instituto jurídico da legislação antiga, o qual era uma das opções menos lentas de coibição de eventuais ilegalidades praticadas por essas autoridades. Note-se que o conceito de "gestão comercial" é excessivamente indeterminado e seu contorno, para fins de mandado de segurança, demorará a ser delineado pela jurisprudência, de modo que aos prejudicados restarão alternativas mais trabalhosas, como por exemplo, medidas cautelares, antecipação da tutela ou a representação das irregularidades ao Ministério Público.

"Art. 4º Em caso de urgência, é permitido, observados os requisitos legais, impetrar mandado de segurança por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidade comprovada."

O legislador "parou no tempo" do telegrama, radiograma e do fax. Só faltou falar do telex. Apesar da existência da Lei do Processo Eletrônico (nº 11.419/06), a disposição específica do final do artigo, sobre "meio eletrônico de autenticidade comprovada", pode gerar intermináveis discussões recursais, até ao Supremo, acerca do cabimento da impetração por e-mail convencional (não-autenticado digitalmente), que convinha ser expressamente permitida. Enfim, na prática, o oposto da suposta agilidade que o legislador pretendeu.

Art. 4º, § 1º.

"Poderá o juiz, em caso de urgência, notificar a autoridade por telegrama, radiograma ou outro meio que assegure a autenticidade do documento e a imediata ciência pela autoridade."

§ 3º. "Para os fins deste artigo, em se tratando de documento eletrônico, serão observadas as regras da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil."

Uma notificação expedida por magistrado ou cartorário, a partir de seu e-mail oficial, de domínio ".jus.br" ou ".gov.br", poderá ser questionada pela autoridade impetrada, pelos motivos expostos acima, apesar da sua evidente autenticidade. No papel, é medida de país desenvolvido. Mas, sabendo-se que a ICP-Brasil está longe de abranger todas as unidades judiciais (onde, muitas vezes, sequer chegou a informática em rede), a agilidade pretendida pela Lei será letra morta até lá, salvo se o texto legal for interpretado pelos Tribunais de maneira flexível e coerente com a realidade judicial brasileira.

"Art. 5º

Não se concederá mandado de segurança quando se tratar:

II - de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo;"

Aqui a lei não foi explícita o suficiente na interpretação mais adequada – de que se trata do cabimento em tese de recurso com efeito suspensivo, e não do cabimento do efeito suspensivo no caso concreto. Assim sendo, há uma brecha para que os advogados impetrem mandado de segurança quando o efeito suspensivo for denegado no seu caso. Melhor redação seria: II – de decisão judicial para a qual a lei preveja recurso com efeito suspensivo

Art. 6º , § 3º.

"Considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática."

A Lei não evoluiu na solução do velho problema da legitimidade passiva no MS, que tanta discussão gera, por vezes, quando a autoridade coatora não fica claramente definida, em razão da complexidade da estrutura administrativa. Note-se que "ordem", no contexto, pode ser interpretado como "edição de norma abstrata", ao sabor de quem convier. Vale dizer: nenhum ponto da jurisprudência quase sexagenária da Lei de 1951 foi incorporado à nova Lei, e as respectivas discussões não foram pacificadas, pelo menos em parte. O resultado, mais questões secundárias para o foro debater ad aeternum, como se não tivéssemos mais nada para ocupar o tempo de advogados, procuradores e magistrados…

Art. 7º

, § 2º. "Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza."

"§ 5º. As vedações relacionadas com a concessão de liminares previstas neste artigo se estendem à tutela antecipada a que se referem os arts. 273 e 461 da Lei nº 5.869, de 11 janeiro de 1973 – Código de Processo Civil."

Na parte final, "pagamento de qualquer natureza", não está bem claro se se refere apenas aos servidores públicos — interpretação que parece mais racional. Racional mas não aceitável, na medida em que o MS terá utilidade mitigada contra as piores arbitrariedades praticadas pelo Poder Público contra os servidores. Interpretado literalmente, não cabe liminar mesmo em caso, por exemplo, de mora nos vencimentos, o que é absurdo e totalitário.

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Art. 7º

, § 4º. "Deferida a medida liminar, o processo terá prioridade para julgamento."

"Art. 20 [caput]. Os processos de mandado de segurança e os respectivos recursos terão prioridade sobre todos os atos judiciais, salvo habeas corpus."

Sob a Lei anterior (nº 1.533/51), todos os MS tinham prioridade legal, exceto sobre habeas corpus (art. 17), determinação mantida no caput do art. 20 do novo diploma. Essa prioridade muitas vezes era impraticável. Assim, de ambos, o § 4º do art. 7º está mais de acordo com a realidade forense, abarrotada de processos.

"Art. 8º. Será decretada a perempção ou caducidade da medida liminar ex officio ou a requerimento do Ministério Público quando, concedida a medida, o impetrante criar obstáculo ao normal andamento do processo ou deixar de promover, por mais de 3 (três) dias úteis, os atos e as diligências que lhe cumprirem."

Elogiável dispositivo contra os chicaneiros. É disso que o direito processual precisa.

Art. 14, § 1º.

"Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição."

O instituto do reexame necessário, apesar de questionamentos no âmbito acadêmico, permanece firme e forte. Não se poderia esperar outra coisa.

"Art. 15. Quando, a requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada ou do Ministério Público e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso suspender, em decisão fundamentada, a execução da liminar e da sentença, dessa decisão caberá agravo, sem efeito suspensivo, no prazo de 5 (cinco) dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte à sua interposição.

§ 1º. Indeferido o pedido de suspensão ou provido o agravo a que se refere o caput deste artigo, caberá novo pedido de suspensão ao presidente do tribunal competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário."

Na esteira do comentário anterior, o legislador aproveitou para distanciar mais ainda o Poder Público dos meros cidadãos, instituindo expressamente duas instâncias de suspensão de segurança. Já para os pobres mortais, o efeito suspensivo nos Tribunais ditos Superiores é de concessão excepcional.

"Art. 16 [caput]. Nos casos de competência originária dos tribunais, caberá ao relator a instrução do processo, sendo assegurada a defesa oral na sessão do julgamento."

Em seu afã governista, o legislador "esqueceu" de garantir também a sustentação oral pelo patrono dos impetrantes. Nada mais de acordo com o princípio constitucional da isonomia, que, por enquanto, ainda não foi revogado.

"Art. 26. Constitui crime de desobediência, nos termos do art. 330 do Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940, o não cumprimento das decisões proferidas em mandado de segurança, sem prejuízo das sanções administrativas e da aplicação da Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, quando cabíveis."

A desobediência a toda e qualquer ordem judicial deveria ser crime previsto expressamente (e não implicitamente, como no artigo 330 do CP), como parece de bom senso, a fim de ensejar maior eficiência e evitar maiores discussões a respeito da tipicidade do fato delituoso. Todavia, aqui há um passo nesse sentido.

Sobre o autor
Ricardo Feitosa Vasconcelos

Bacharel em Direito. Servidor do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VASCONCELOS, Ricardo Feitosa. Primeiras impressões sobre a nova Lei do Mandado de Segurança (2009). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2234, 13 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13320. Acesso em: 22 nov. 2024.

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