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Questões criminais controvertidas na Lei nº 9.099/95

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Agenda 01/10/2009 às 00:00

VIII) Suspensão Condicional do Processo: controvérsias

Muitas discussões sobre a aplicação da suspensão condicional do processo, também chamada de "sursis processual" pela doutrina, são parecidas com as controvérsias em relação a transação penal apesar de serem institutos diversos. Entretanto, é importante conhecer a posição doutrinária e jurisprudência especificamente em relação ao "sursis processual" mesmo sob pena de parecer repetitivo.

a) cabe suspensão condicional do processo em ação penal privada?

Da mesma forma que na transação penal, a doutrina e a jurisprudência ainda se divide sobre a possibilidade de se aplicar a suspensão condicional do processo nos crimes de ação penal privada.

RÔMULO ANDRADE é contra a aplicação do sursis processual em crimes de ação penal privada. Diz o autor:

"Não nos parece possível a suspensão condicional do processo quando se tratar de ação penal de iniciativa privada, pois para esses casos já é possível dispor da ação penal com o perdão e a perempção, além de que o caput do art.89 se refere apenas ao Ministério Público [33]".

Da mesma opinião é FERNANDO CAPEZ que leciona:

"Não cabe suspensão condicional do processo em ação penal exclusivamente privada, pois nessa já vigora o princípio da disponibilidade, existindo outros mecanismos de disposição do processo (perempção e perdão do ofendido) [34]"

Do lado daqueles que admitem o sursis processual em crimes de ação penal privada encontramos a lição do magistrado GUILHERME DE SOUZA NUCCI que ensina:

"Suspensão condicional do processo em ação privada: parece-nos que é viável. A analogia in bonam partem novamente deve ser invocada. Se o querelante propuser, aceitando-a o réu, nenhum prejuízo a este ocorrerá. Ao contrário, somente pode beneficiar-se" [35].

Também EUGÊNIO PACELLI opina favoravelmente a possibilidade de aplicação do sursis processual nas ações penais privadas argumentando que:

"[...] Cuidando-se, pois, de norma não incriminadora, a aplicação dela in bonam partem revela-se perfeitamente possível.

Quanto à alegação de já existir, para as ações privadas, a disponibilidade da pretensão punitiva (renúncia, perdão, etc.), não nos parece também decisivo semelhante argumento, para impedir a aplicação da suspensão condicional do processo naquele tipo de ação penal (privada).

[...] não há motivo para não se estender às ações privadas a adoção de medidas despenalizadoras, como é o caso do art.89 [...] Ora, se o próprio Estado, titular da maioria esmagadora da iniciativa penal, entende politicamente conveniente e adequada a utilização de critérios processuais não punitivos, porque não permitir a mesma via em todos os crimes, para os quais a reprovabilidade seja equivalente? [36]"

ADA PELLEGRINI – e seus companheiros de escrita –, que era contra a possibilidade, passou a admitir o sursis processual nos crimes de ação penal privada. Apesar de longa, vale transcrever parte da lição da jurista:

"Bem refletido o assunto, no entanto, impõe-se destacar que a transação processual (suspensão do processo) não possui a mesma natureza do perdão (que afeta imediatamente o ius puniendi) nem da perempção (que é sanção processual ao querelante inerte, moroso). Havendo proposta e aceitação da suspensão do processo não se pode dizer que o querelante esteja sendo disidioso. Está agindo. Está fazendo uma opção pela incidência de uma resposta estatal alternativa, agora permitida, mas que é também resposta estatal ao delito. Isto não é inércia. Muito menos indulgência (perdão). Nem sequer abandono da lide [...] Se o querelante pode o mais, que é perdoar, é evidente que também pode o menos (optar pela solução alternativa do litígio).

O fato de o art.89 mencionar exclusivamente ''Ministério Público'', ''denúncia'', não é obstáculo para a incidência da suspensão na ação penal privada, por causa da analogia (no caso in bonan partem), que vem sendo sendo reconhecida amplamente na hipótese do art.76.

Acima de preciosismos linguísticos está o interesse maior na efetiva realização de uma política criminal alternativa, assim como o interesse do próprio acusado de valer-se, querendo, dessa resposta estatal alternativa.

[...]

Não é porque já reinava o princípio da oportunidade em relação à ação penal privada, acrescente-se, que devemos, sempre, raciocinar, em termos de punição total (resposta estatal tradicional, prisão) ou renúncia total (perdão, perempção). Tercius datur. A introdução no nosso ordenamento jurídico de uma forma alternativa de solução do conflito obriga-nos a questionar a bipolaridade tradicional entre as duas alternativas clássicas na ação penal privada, surge agora a possibilidade de algo intermediário (cumprimento de algumas condições, dentre elas a reparação dos danos, durante certo período de prova, com eficácia extintiva da punibilidade). Muitas vezes, à vítima não interessa o processo clássico (por causa de todos os transtornos que ele provoca), nem tampouco o perdão puro e simples.

[...]

Consideram-se ainda (e esse argumento é de fundamental relevância) os interesses públicos gerais presentes no instituto da suspensão, que transcendem em muito os interesses pessoais dos envolvidos no litígio. Dentre aqueles destacam-se: ressocialização do infrator pela via alternativa da suspensão, reparação de danos sem necessidade de processo civil de execução, desburocratização da justiça, aplicação do Direito Penal e da pena de prisão como ultima ratio etc. Inviabilizada a suspensão na ação penal privada, nada disso será alcançado. Nem tampouco a meta político-criminal que o legislador quis imprimir para a chamada criminalidade de menor ou médio potencial ofensivo. Se até mesmo em relação aos crimes de ação penal pública, que envolve interesses públicos indiscutíveis, estes cedem para a incidência da suspensão do processo, com muito maior razão deve ser admitida em relação aos crimes de ação penal privada, onde predominam interesses privados. Pela própria natureza, estes a fortiori não contam com a primazia diante dos interesses públicos" [37].

Percebe-se que aqueles doutrinadores que são contra a aplicação da transação penal nos casos de ação penal privada também são contra a aplicação do sursis processual no mesmo tipo de ação (privada). Já aqueles que são a favor, também admitem o sursis processual em ação penal privada, isto porque, apesar de serem institutos diversos, há semelhanças entre ambos, logo, a coerência impera nas opiniões doutrinárias.

Aqui, estamos com a doutrina que admite a suspensão condicional do processo em crimes de ação penal privada e para isso basta a aplicação por analogia o artigo 86 da Lei nº 9.099/95.

A suspensão condicional do processo é instituto novo no direito processual penal brasileiro e deve ser aplicado em qualquer tipo de ação penal. O simples fato de haver institutos referentes a ação penal privada anteriores ao sursis processual não inviabiliza a utilização deste instituto. O direito processual penal deve evoluir e adotar novos conceitos e institutos para que a justiça penal seja mais célere e despenalizadora de condutas de pouca ou média ofensividade criminal.

Assim, apesar de não estar escrito na lei a possibilidade de suspensão condicional do processo em crimes de ação penal privada, nada impede a sua aplicação por meio da analogia, já que é norma mais benéfica.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reiteradas vezes admitindo a suspensão condicional do processo em crimes de iniciativa privada. Vejamos:

"[...] Não vislumbro óbice à aplicação da Lei n° 9.099/95 aos crimes sujeitos a procedimentos especiais. desde que obedecidos os requisitos autorizadores, entendendo pela possibilidade da transação e da suspensão do processo até mesmo nas ações penais de iniciativa exclusivamente privada" (RHC nº 8.480/SP, rel. Min. Gilson Dipp)

"A Lei n. 9.099/95, desde que obedecidos os requisitos autorizadores, permite a transação e a suspensão condicional do processo, inclusive nas ações penais de iniciativa exclusivamente privada" (5.ª T., no HC n. 13.337/RJ, rel. Min. Felix Fischer, j. em 15.5.2001, DJ de 13.8.2001, p. 181).

"A Terceira Seção desta Egrégia Corte firmou o entendimento no sentido de que, preenchidos os requisitos autorizadores, a Lei dos Juizados Especiais Criminais aplica-se aos crimes sujeitos a ritos especiais, inclusive aqueles apurados mediante ação penal exclusivamente privada. Ressalte-se que tal aplicação se estende, até mesmo, aos institutos da transação penal e da suspensão do processo"(5.ª T., HC n. 34.085/SP, rel. Min. Laurita Vaz, j. em 8.6.2004, DJ de 2.8.2004, p. 457).

"A Lei dos Juizados Especiais incide nos crimes sujeitos a procedimentos especiais, desde que obedecidos os requisitos autorizadores, permitindo a transação e a suspensão condicional do processo, inclusive nas ações penais exclusivamente privadas". (HC n. 33.929/SP, rel. Min. Gilson Dipp, j. em 19.8.2004, DJ de 20.9.2004, p. 312).

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O Supremo Tribunal Federal (STF) admite a possibilidade da suspensão condicional do processo ser aplicada em ação penal de iniciativa privada:

"[...] Suspensão condicional do processo instaurado mediante ação penal privada: acertada, no caso, a admissibilidade, em tese, da suspensão, a legitimação para propô-la ou nela assentir é do querelante, não, do Ministério Público". (HC 81720 – SP – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 19.04.2002 – p. 00049)

b) quem pode propor a suspensão condicional do processo ?

Dúvida não há que a titularidade para propor a suspensão condicional do processo nos crimes de ação penal pública incondicionada ou condicionada é do Ministério Público, conforme dispõe o art.89 da Lei nº 9.099/95.

Entretanto, já vimos que é possível a suspensão condicional do processo em crime de ação penal privada. Mas, nesse caso, quem poderia propor o sursis processual, o ofendido, o autor do delito, o magistrado ou o Ministério Público?

A maioria da doutrina que admite o sursis processual em crime de ação penal privada é da opinião que a vítima é a legitimada para fazer a proposta de suspensão condicional do processo ao autor do delito. Mas, nessa hipótese, e se a vítima se recusasse, injustificadamente, a propor o sursis processual, alguém poderia fazê-lo?Quem?

Nessa hipótese, ADA PELLEGRINI apresenta a seguinte solução:

"Caso se considere que a suspensão do processo é direito público subjetivo do acusado, desde que presentes todos os seus requisitos legais, não pode o querelante recusar a proposta de suspensão injustificadamente. Havendo recusa, ou se possibilita ao querelado requerer a suspensão (podendo o querelante, depois da concessão, controlar o ato judicial pela via recursal) ou é o caso de se admitir o habeas corpus contra tal ato ilegal, sendo que tal ação constitucional deve ser julgada pelo próprio juiz de primeiro grau. Deferido o writ, o juiz impõe ao querelante uma obrigação de fazer (a proposta). De outro lado, não se considerando a suspensão como direito público subjetivo, na hipótese de recusa do querelante, ficaria inviabilizada a suspensão" [38].

Assim, para essa autora a vítima deve propor o sursis processual. E, para aqueles que consideram o sursis processual como direito subjetivo do autor do crime, caso a vítima não apresentasse a proposta, o autor do delito poderia requerer ao magistrado que lhe concedesse a suspensão condicional do processo e o juiz aplicaria o sursis mediante a solicitação ou o autor do delito poderia ingressar com habeas corpus para que o magistrado obrigasse a vítima à apresentar a proposta de sursis processual.

Ainda segundo a jurista, já para aqueles que entendem que o sursis processual não é um direito subjetivo do autor do crime, mas mera faculdade do autor da ação, não haveria solução jurídica para a recusa e a suspensão não seria possível, dando-se continuidade ao processo criminal [39].

Já o jurista TOURINHO FILHO defende que no caso de recusa da vítima em apresentar a proposta de sursis processual pode o magistrado fazê-lo de ofício. Diz o renomado processualista:

"... Na lei não existe nenhuma restrição...Observe-se que a Comissão Nacional da Escola Superior da Magistratura, já citada, na sua 11ª conclusão, frisou: ‘O disposto no art.76 abrange os casos de ação penal privada’. Se é assim na transação, com muito mais forte motivo se se tratar de suspensão condicional do processo. No mesmo sentido o Enunciado n.26 do VI Encontro Nacional de Coordenadoria de Juizados Especiais Cíveis e Criminais: ‘Cabe transação e suspensão condicional do processo também na ação penal privada’.

E na hipótese de o querelante não formular o pedido? Para aqueles que, como nós, entendem que a suspensão condicional do processo, uma vez satisfeitas as exigências legais, é um direito público subjetivo do réu, evidente que ante a recusa do querelante em querer formular a proposta (satisfeitos todos os requisitos legais), nada impede possa faze-lo o próprio Juiz, ainda que o querelado não se manifeste nesse sentido" [40].

Por seu turno, o juiz FLÁVIO AUGUSTO FONTES DE LIMA é um dos poucos que escreveu que o Ministério Público é legitimo para propor a suspensão condicional do processo no caso de ação penal privada. Leciona o magistrado:

"Como já visto, impõe-se a aplicação da suspensão condicional do processo na ação penal privada e, consequentemente, em qualquer ação penal.

O acusado tem um direito público subjetivo a ser submetido à suspensão condicional do processo, quando se enquadra nas exigências legais. Esse direito é amparado pela Constituição da República, e se funda basicamente no direito à igualdade e à liberdade.

[...] Se, preenchidos os requisitos legais e o querelante se omitir ou se recusar a propor, deverá o Ministério Público como custos legis apresentar proposta de suspensão substitutiva do processo a ser deferida pelo juiz" [41].

Nota-se a divergência doutrinária na solução da controvérsia existente quando a vítima se recusa a propor o sursis processual.

Em nosso sentir, nos crimes de ação penal privada a iniciativa de propor o sursis processual deve ser, inicialmente, da vítima. Se a mesma se omitir, o Ministério Público ou o autor do delito podem requerer e o juiz determinar que ela (vítima) se pronuncie sobre o a possibilidade de propor o sursis processual.

Instada a se manifestar e recusando-se, injustificadamente, a propor a suspensão condicional do processo, parece-nos que, se preenchidos os requisitos legais, deve o Ministério Público propor o sursis processual ao autor do crime.

As idéias apresentadas pela jurista ADA PELLEGRINI não nos parece as mais sensatas. Vejamos cada uma: 1) permitir que o próprio autor do crime apresentasse a proposta: aqui teríamos a situação do próprio autor do crime dizer quais condições iria cumprir, inclusive quanto pagaria para reparar o dano, o que nos apresenta como absurdo; 2) admitir habeas corpus para obrigar a vítima a apresentar a proposta de sursis processual: essa hipótese foge completamente aos objetivos do instituto, pois, o que ocorreria se a vítima se recusasse, mesmo com o deferimento do habeas corpus a propor o sursis processual? Seria a vítima presa por desobediência? Ficaria presa até quando? O que aconteceria com o processo nessa hipótese? Essa solução parece fugir a lógica; 3) a recusa mesmo injustificada da vítima inviabilizaria a suspensão, prosseguindo-se com o processo: aqui deixa-se nas mãos da vítima o poder de decisão total sobre a continuação do processo, mesmo o autor do crime preenchendo os requisitos legais, causando total ofensa o princípio da igualdade entre autores de crimes de ação penal pública (em regras mais graves) e autores de crimes de ação penal privada (menos graves), o que é inconcebível em um Estado Constitucional Democrático de Direito como o brasileiro.

Por outro lado, a posição do ilustre processualista TOURINHO FILHO em admitir que o juiz, de ofício, apresente a proposta de sursis processual, salvo melhor juízo, implica em ofensa ao princípio da inércia jurisdicional e até de ofensa ao art.129, I, da Constituição Federal, pois se o magistrado pudesse propor sursis processual em ação penal privada poderia também fazê-lo na ação penal pública ante a recusa injustificada do Ministério Público. Logo, nos parece inviável que o magistrado apresente a proposta de sursis processual de ofício, seja em crimes de ação penal pública seja em crime de ação penal privada [42].

Consentânea com o nosso pensamento é a posição do Supremo Tribunal Federal. Veja-se o teor da Súmula 696 da Suprema Corte:

"Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o Juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art.28 do Código de Processo Penal".

Como dito acima, nos crimes de ação penal privada a iniciativa de propor o sursis processual deve ser, inicialmente, da vítima. Se a mesma se omitir, o Ministério Público ou o autor do delito podem requerer e o juiz determinar que ela (vítima) se pronuncie sobre o a possibilidade de propor o sursis processual. Instada a se manifestar e recusando-se, injustificadamente, a propor a suspensão condicional do processo, parece-nos que, se preenchidos os requisitos legais, deve o Ministério Público, na qualidade de fiscal da lei, propor o sursis processual ao autor do crime. Dessa forma, a posição doutrinária que nos parece a mais correta é a do juiz FLÁVIO AUGUSTO mencionada acima.

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) têm uma decisão onde admite apenas a vítima como parte legitima para propor o sursis processual, excluindo o Ministério Público:

"[...] Suspensão condicional do processo instaurado mediante ação penal privada: acertada, no caso, a admissibilidade, em tese, da suspensão, a legitimação para propô-la ou nela assentir é do querelante, não, do Ministério Público". (HC 81720 – SP – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 19.04.2002 – p. 00049)

Em que pese a decisão da Suprema Corte Brasileira, continuamos a defender que possa o Ministério Público propor a suspensão condicional do processo nos crimes de ação penal privada nos casos de recusa injustificada da vítima, pois, aceitando o posicionamento do STF deixaríamos para a vítima decidir a continuação ou não do processo, mesmo preenchidos os requisitos legais, causando séria desigualdade entre autores de crimes de ação penal pública e autores de crime de ação penal privada.

c) admite-se suspensão condicional do processo em concurso de crimes?

Como se sabe apresentam-se como espécies de concurso de crimes o concurso material, o formal e o crime continuado, regidos pelos sistemas do cúmulo material e da exasperação, empregados em nosso Código Penal.

DAMÁSIO DE JESUS explica objetivamente a diferença entre os concursos:

"Na aplicação da pena, verifica-se que, no concurso material, quando existe o cúmulo material, há pluralidade de condutas e de crimes, incidindo a soma das sanções (art. 69, caput, do CP); no formal, em que foi adotado o sistema da exasperação, existem unidade de conduta e pluralidade de crimes, levando-se em conta uma das penas, ou a mais grave, com agravação (art. 70, caput); no crime continuado, nele também recaindo a exasperação, temos, na verdade, um concurso material abrandado, limitando-se a consideração da lei, por razões de política criminal e unicamente para efeito de aplicação da pena, a apenas um delito e uma só resposta penal detentiva, embora com acréscimo (art. 71, caput)" [43].

Nos três casos, para efeito de admissão do sursis processual, considera-se isoladamente a pena abstrata mínima de cada um dos delitos ou os princípios do cúmulo material e da exasperação?

Boa parte da doutrina entende que as penas mínimas abstratas não podem ser somadas para o fim de impedimento da medida. Ou seja, as infrações penais devem ser consideradas isoladamente.

Nesse sentido, leciona FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO:

"Se há concurso formal, crime continuado ou mesmo concurso material, as infrações em si, consideradas insuladamente, não apresentam gravidade. É o que basta. As penas não podem ser somadas. Não fosse assim, difícil seria explicar a ratio essendi do art.119 do Código Penal" [44].

Também ADA PELLEGRINI adota essa posição:

"Não importa qual seja a natureza do concurso: material, formal ou crime continuado. A concessão da suspensão, em qualquer hipótese, deve ser regida, conforme nosso entendimento, pelo critério bifásico individual-global. No primeiro momento, pensamos que de modo algum podem ser somadas as penas mínimas de cada delito para o efeito de excluir, ab initio, a suspensão. Quanto à pena (requisito objetivo) o critério de valoração é individual (CP, art.119, e Súmula 497 do STF). Cada crime deve ser considerado isoladamente, com sua sanção mínima abstrata respectiva." [45]

Do outro lado, encontramos doutrinadores que advogam que as penas mínimas abstratas devem ser somadas ou acrescidas da majorante e, caso ultrapassem o limite de 01 (um) ano o sursis processual será inadmissível.

Essa é a opinião do juiz GUILHERME DE SOUZA NUCCI para quem:

"No caso de concurso material, a soma das penas mínimas dos delitos em concurso deve ser o indicativo para a utilização, ou não, do benefício previsto no art.89 (ex.:se alguém for acusado de três delitos, em concurso material, cada um deles com seis meses de pena mínima, a soma dará um ano e meio, logo, está fora do alcance da suspensão condicional do processo). Quando se trata de concurso formal ou crime continuado, toma-se a pena do mais grave dos delitos imputados ao réu, acrescentando-se, igualmente, o mínimo possível, para que se obtenha a pena efetivamente mínima. Se ultrapassar um ano, não cabe a suspensão condicional do processo [46]".

Também adepto a esta posição, temos o promotor de justiça FERNANDO CAPEZ para quem: "As infrações, portanto, não serão consideradas isoladamente, mas de acordo com o total de pena resultante da aplicação da regra do concurso de crimes" [47].

Aqui estamos com a primeira corrente doutrinária. A tese da inadmissibilidade da suspensão condicional do processo no concurso material, formal e no crime continuado, não encontra respaldo legal, uma vez que a lei, para tal fim, não impõe a soma das penas nem a consideração de uma delas com acréscimo, devendo-se lembrar sempre da norma do art.119 do Código Penal [48] que não teria sentido ao adotar-se a segunda corrente doutrinária.

Entretanto, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal adotam a segunda posição. Vejamos:

Súmula 243 do STJ: "O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de 1 (um) ano".

Súmula 723 do STF: "Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano".

Sobre o autor
Sandro Carvalho Lobato de Carvalho

Promotor de Justiça de Matinha (MA). Pós-graduando em Direitos Difusos, Coletivos e Gestão Fiscal pela Escola Superior do Ministério Público do Maranhão.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Sandro Lobato. Questões criminais controvertidas na Lei nº 9.099/95. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2283, 1 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13600. Acesso em: 23 dez. 2024.

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