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Controle de constitucionalidade e cláusula de reserva de plenário.

Vantagens e desvantagens da Súmula Vinculante nº 10 do STF

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Agenda 02/10/2009 às 00:00

5 VANTAGENS E DESVANTAGENS DA SÚMULA VINCULANTE Nº 10

Decerto que, como toda e qualquer mudança, a alteração trazida pela súmula vinculante nº 10 do modelo nacional de controle de constitucionalidade possui vantagens e desvantagens.

Visualiza-se, dentre as vantagens mais relevantes, a diminuição no número de recursos extraordinários. Isto porque as decisões plenárias do Supremo tenderão a serem acatadas pelos Tribunais no julgamento dos incidentes de inconstitucionalidade, aproximando-as ao stare decisis da common law. Assim, evitar-se-á a dependência da deliberação do Senado para suspender a lei declarada por inconstitucional pelo Supremo (artigo 52, X da CRFB/88) como forma de se dar efeitos gerais ao controle difuso, hipótese esta bastante rara na prática nacional.

Outra importante vantagem é a padronização dos julgamentos, ao menos no âmbito de um mesmo Tribunal, o que dá mais segurança jurídica aos interessados. Um ambiente legal seguro e estável contribui para o desenvolvimento econômico, estimula a autocomposição dos conflitos e facilita o planejamento das políticas públicas, principalmente as de longo prazo.

A aplicação do incidente de inconstitucionalidade também é uma ferramenta útil para a solução de conflitos repetitivos, particularmente comuns nas questões que envolvem direito tributário, previdenciário e administrativo, as quais, hoje, são parcialmente responsáveis pelo elevado grau de congestionamento do Judiciário.

Por fim, o processo de controle de constitucionalidade incidental tende a se tornar mais democrático e participativo, com a discussão no incidente de inconstitucionalidade, perante o Tribunal, das grandes questões importantes para a sociedade, através do amicus curiae.

Por outro lado, esta inovação não trás só vantagens.

Note-se que, diferentemente do que ocorre com outros Tribunais constitucionais europeus, o Supremo Tribunal Federal não é submetido ao controle democrático para a sua composição. Para se citar o exemplo do Tribunal Constitucional alemão, o Bundesverfassungsgericht, o mesmo é composto por dezesseis juízes eleitos pelo Parlamento Federal e pelo Conselho Federal [14]. Em regra, a composição do Tribunal Constitucional alemão reflete diretamente a representação parlamentar dos partidos políticos, respeitando, portanto, a vontade popular e a real disposição de poderes e tendências da sociedade.

Ao seu turno, a Suprema Corte pátria não possui a legitimidade democrática conferida por um processo eleitoral. No sistema previsto no artigo 101 da CRFB/88, os Ministros são indicados pelo Presidente da República, sem um mandato fixo, exercendo suas funções até atingirem os 70 anos de idade. Assim, a composição da Corte Maior não necessariamente representa o equilíbrio das forças políticas. Ademais, os Ministros da Corte Maior não estão submetidos ao controle direto democrático ou ao crivo eleitoral [15].

Assim, ao se atribuir maior importância às decisões do Supremo, o que parece ser uma consequência obvia da aplicação da Súmula Vinculante nº 10, estar-se-á agravando os problemas de legitimidade democrática daquele órgão, o qual, sem se submeter ao controle democrático, poderá tomar cada vez mais decisões políticas no lugar do Poder Legislativo. Decerto que, neste caso, a preocupação é bastante justa, pois a existência de um órgão jurisdicional legislando sem controle poderia dar origem a uma ditadura do Poder Judiciário. Neste sentido, aponta-se a crítica de Lenio Streck:

Já para a situação que almeja a extensão dos efeitos de controle concentrado ao difuso, não há nada que autorize o Supremo Tribunal Federal a operar mencionada sistemática no texto de nossa Constituição, tampouco na tradição de nossa doutrina de controle da constitucionalidade. [...] – não somente pela razão de ser novo posicionamento – mas, fundamentalmente, por não encontrar respaldo autorizador constitucional expresso, exigência igualmente razoável em virtude de termos um sistema jurídico escrito, herdeiro da noção romano-germânica de direito. Ao contrário: o art. 52, X aponta em outro sentido.

Na verdade, há uma questão que se levanta como condição de possibilidade na discussão acerca da validade (e da força normativa) do art. 52, X, da Constituição do Brasil. Trata-se de uma questão paradigmática, uma vez que sua ratificação (o que vem sendo repetido pelo menos desde 1934), em uma Constituição dos tempos de Estado Democrático de Direito, dá-se exatamente pela exigência democrática de participação da sociedade no processo de decisão acerca da (in)constitucionalidade de uma lei produzida pela vontade geral. [16]

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De fato, entende Lenio Streck que seria antidemocrático que o STF, sem consulta ao Senado, estendesse efeitos gerais e abstratos a uma decisão proferida no controle difuso. Na sua visão, seria necessária a intervenção da vontade popular, representada pelo Poder Legislativo (Senado), para legitimação da decisão quanto à inconstitucionalidade de uma Lei elaborada pelos representantes do povo. Apesar de não concordarmos integralmente com o nobre professor, partilhamos de algumas de suas preocupações quanto à legitimidade democrática deste tipo de controle.

Outra desvantagem evidente é que a aplicação da cláusula do full bench inibe a chamada justiça do caso concreto, cerceando parcialmente a autonomia jurisdicional e mesmo impedindo uma solução que poderia ser justa dentro de uma lide específica. Por sinal, não são poucos os que militam contra se emprestar efeitos vinculantes às decisões do Supremo, entendendo estes que tais decisões violam o livre convencimento motivado e a autonomia do julgador.

Por fim, não se pode negar que as demandas que envolvam questões constitucionais novas tenderão, num primeiro momento, a ter uma resposta jurisdicional mais lenta. Parece bastante claro que o procedimento de julgamento do incidente de inconstitucionalidade, com manifestação da maioria absoluta dos desembargadores e discussão com terceiros interessados, tenderá a ser mais pausado e cauteloso do que o simples julgamento de um caso concreto.

Todavia, pesando-se prós e contras, parece-nos que o modelo de controle de constitucionalidade nacional tem mais a ganhar do que a perder. Ademais, a súmula em análise simplesmente reforça a intenção inegável do constituinte, eis que foi este quem elegeu a cláusula de reserva de plenário como garantia constitucional – diga-se de passagem, desde 1934. Em um estado democrático de direito, pretender-se advogar contra esta cláusula somente seria admissível dentro de um debate sobre a alteração do sistema constitucional, não sendo cabível pretender-se simplesmente ignorar uma regra da Carta Magna. Ressalte-se, ainda, que estando tal cláusula vinculada às garantias do devido processo legal (due process of law), há que se apontar que a mesma possui status de cláusula pétrea.

Podemos citar o exemplo positivo dos efeitos da súmula na própria questão dos "cinco mais cinco" da repetição de indébito, acima tratada, a qual foi finalmente pacificada. Após o advento da súmula vinculante nº 10, o STJ acabou por julgar, em seu órgão especial, o incidente de inconstitucionalidade dos artigos 3º e 4º da LC 118/2005, tendo entendido que a segunda parte do artigo 4º, que aplicava retroativamente o artigo 3º, é inconstitucional, resolvendo a questão no âmbito daquela corte (STJ: EDcl no EResp 480.187 / MG; e EDcl no REsp 740.567 / MG).

Por todo o exposto, entendemos que a súmula vinculante nº 10 veio em boa hora reforçar a cláusula de reserva de plenário, sendo um importante avanço no modelo de controle de constitucionalidade pátrio. Esta evolução no controle difuso de constitucionalidade dará mais segurança jurídica, padronizando a prestação jurisdicional e diminuindo a necessidade de recursos extraordinários, o que, espera-se, acabará por dar maior celeridade aos julgamentos do STF.


REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BINENBOJM, Gustavo. A nova jurisdição constitucional brasileira: legitimidade democrática e instrumentos de realização. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

DIDIER JUNIOR, Fredie. O recurso extraordinário e a transformação do controle difuso de constitucionalidade no direito brasileiro. In: NOVELINO, Marcelo (org.). Leituras complementares de direito constitucional. 2. ed. Salvador: Jus Podium, 2008. cap. VI.

ELIAS, Eduardo Arrieiro. A Lei Complementar nº 118 e o prazo para repetição do indébito tributário: problemas à vista.Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/21133/20697>. Acesso em: 13 de abril de 2009.

MARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira. Controle concentrado de constitucionalidade: comentários à Lei n. 9.868, de 10-11-1999. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

MENDES, Gilmar. Jurisdição constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

MENDES, Gilmar; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

SLAIBI FILHO, Nagib. A argüição de inconstitucionalidade e a súmula vinculante nº 10 como instrumentos da hermenêutica constitucional. Disponível em: <http://www.nagib.net/artigos_texto.asp?tipo=2&area=1&id=511>. Acesso em 17 abr. 2009.

STRECK, Lenio Luiz; OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de; LIMA, Martonio Mont´Alverne Barreto. A Nova Perspectiva do Supremo Tribunal Federal sobre o controle difuso: mutação constitucional e limites da legitimidade da jurisdição constitucional. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br/cgi-bin/upload/texto1300.pdf>. Acesso em: 17 abr. 2009.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Movimento processual nos anos de 1940 a 2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=estatistica&pagina=movimentoProcessual>. Acesso em: 27 fev. 2009.

______. Debates que Integram a Ata da 16ª (Décima Sexta) Sessão Ordinária, do Plenário, Realizada em 18 de Junho de 2008 - Debates Para a Aprovação da Súmula Vinculante nº 10. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/ cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/DJe_172_2008.pdf>. Acesso em 11 abr. 2009.

US SUPREME COURT. A brief overview of the Supreme Court. Disponível em: <http://www.supremecourtus.gov/about/briefoverview.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2009.


NOTAS EXPLICATIVAS

  1. BINENBOJM, 2004, p. 35.
  2. ______, ______, p. 36-46.
  3. Gráfico produzido pelo autor a partir dos dados coletados. Fonte de dados: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Movimento Processual nos anos de 1940 a 2009.
  4. US SUPREME COURT. A Brief Overview of the Supreme Court.
  5. BARROSO, 2009, p. 88.
  6. SLAIBI FILHO, 2009, p. 10.
  7. BINENBOJM, 2004, p. 47-74.
  8. ELIAS, 2005.
  9. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Debates que Integram a Ata da 16ª Sessão Ordinária, do Plenário (18/06/2008).
  10. ______. AI 472.897-AgR/PR.
  11. DIDIER JUNIOR, 2008, p. 273-274.
  12. SLAIBI FILHO, 2009, p. 8-9.
  13. MARTINS e MENDES, 2009, p. 459-460.
  14. MENDES, 2005, p. 3-7.
  15. BINENBOJM, 2004, p. 47-55.
  16. STRECK; OLIVEIRA; LIMA, 2009, p. 15-16.
Sobre o autor
Gustavo Augusto Freitas de Lima

Procurador Federal. Mestre em Direito, na linha de pesquisa de Políticas Públicas. Pós-Graduado em Direito Público. Professor de cursos de graduação e pós graduação, nas cadeiras de Direito Administrativo e Direito Constitucional. Membro do Conselho Editorial da Revista da AGU.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Gustavo Augusto Freitas. Controle de constitucionalidade e cláusula de reserva de plenário.: Vantagens e desvantagens da Súmula Vinculante nº 10 do STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2284, 2 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13609. Acesso em: 28 dez. 2024.

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