Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

O acesso à justiça e a obrigatoriedade da submissão prévia das demandas individuais trabalhistas à comissão de conciliação

Exibindo página 1 de 2
Agenda 22/11/2009 às 00:00

Resumo: A inclusão do art. 625-A ao H, na CLT, feita pela Lei n.º 9.958/2000, trouxe a obrigatoriedade de submissão das demandas individuais trabalhistas à Comissão de Conciliação Prévia, nos locais em que esta for instituída. Parte da doutrina e da jurisprudência considera que consiste em uma condição da ação ou um pressuposto processual, enquanto que para a outra se trata de verdadeira afronta ao Princípio da Inafastabilidade de Acesso à Justiça. O debate transcendeu a instância das Varas e dos Tribunais Trabalhistas, alçando os fóruns do Tribunal Superior do Trabalho e da própria Corte Suprema do País – o STF. Pelo confronto entre princípios e regras, e sob o manto da proporcionalidade e da razoabilidade, este estudo conclui que este dispositivo deve ser facultativo, sob pena de dificultar ainda mais o acesso à Justiça por parte daquele que merece maior proteção do Estado Democrático de Direito.

Sumário: 1. Introdução. 2. Do debate constitucional. 2.1 Da Comissão de conciliação Prévia: breve histórico, natureza jurídica e finalidade. 2.2 Da declaração de tentativa de conciliação como condição da ação ou pressuposto processual. 2.3 Do Princípio da Inafastabilidade do Acesso à Justiça. 2.3.1 Dos significados do acesso à Justiça. 2.4 Da obrigatoriedade da submissão da demanda individual trabalhista à Comissão de Conciliação Prévia e o Princípio da Inafastabilidade do Acesso à Justiça: discussão doutrinária. 2.5 Sob a ótica da jurisprudência. 3. Considerações finais. 4. Referências.


1. INTRODUÇÃO

O presente estudo versa sobre o acesso à Justiça e a obrigatoriedade da submissão das demandas individuais trabalhistas à Comissão de Conciliação Prévia (CCP).

Apresenta como escopo verificar a constitucionalidade da exigência da tentativa de conciliação prévia extrajudicial, trazida pela Lei n.º 9.958, de 12 de janeiro de 2000, à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT, arts. 625-A a H), em face, sobretudo, do Princípio Constitucional da Inafastabilidade do Acesso à Justiça, insculpido no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Tal discussão mostrou-se salutar à formação profissional após análises feitas nos bancos escolares da Universidade Estácio de Sá, no Campus Resende, mais especificamente durante a realização das disciplinas de Direito Processual do Trabalho II, ministrada pelas professoras Maria Inês Gerardo e Érika Machado de Almeida, e a de Tópicos de Direito Constitucional, lecionada pelo professor Rogério Madureira Stefano.

Durante o curso, evidenciou-se que o tema em tela demanda grande polêmica e intenso debate constitucional, não só despertando grande interesse por parte do autor, como vasta discussão doutrinária e jurisprudencial que, até o momento, são bastante divergentes.

Junto a isso, procurou-se enfatizar essa discussão devido ao confronto entre princípios insculpidos na Carta Constitucional, permeando-se assuntos do ramo trabalhista e do ramo constitucional, portanto interdisciplinar, tornando vasto o campo de estudo, proporcionando alcançar um maior conhecimento sobre a ciência do Direito e sua repercussão na sociedade.

Para se atingir a plenitude do objetivo, primeiramente, no desenvolvimento, será demonstrado o debate constitucional sobre o tema.

Em seguida, será dado um enfoque sobre o instituto da conciliação prévia, trazendo-se um breve histórico, sua natureza jurídica e finalidades para a qual foi criada.

No momento seguinte, abordar-se-á o Princípio da Inafastabilidade do Acesso à Justiça, insculpido no art. 5º, inciso XXXV, da Carta Magna. Para tanto, será realizada uma digressão aos conceitos de princípio, de norma jurídica e de regra, assim como seu posicionamento dentro do sistema.

A fim de confrontar a exigência infraconstitucional da submissão das demandas individuais trabalhistas à conciliação prévia extrajudicial, realizada nas CCP, com o Princípio da Inafastabilidade do Acesso ao Judiciário, na próxima etapa se discutirá o que a doutrina e a jurisprudência têm trazido como entendimento e lições.

Para isso, essa fase foi dividida em duas: a primeira, condizente com os ensinamentos doutrinários e, a outra, dizendo respeito aos posicionamentos jurisprudenciais não só dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRT), como também do Superior (TST), alcançando-se, inclusive, o entendimento do próprio Supremo Tribunal Federal (STF), que, até o momento, é divergente.

Após este minucioso estudo, na busca de uma compreensão mais detalhada sobre a situação-problema anunciada, reservou-se a última parte às considerações finais da pesquisa. Nela, serão pesados e valorados os argumentos até então abordados e se indicará a posição em que se acredita existir um maior benefício, tendo como parâmetro não só a sistemática do ordenamento jurídico, como também a busca da Justiça social.

Para viabilizar este trabalho, realizou-se uma pesquisa aplicada, de forma sistemática, obedecendo-se aos postulados científicos que visarão a responder a hipótese levantada na situação-problema. O método da pesquisa se consubstanciou na pesquisa bibliográfica e documental, baseando-se em fontes tais como a Constituição Federal e a legislação infraconstitucional afim, livros de renomados autores das áreas trabalhista, constitucional e filosófica, e artigos científicos publicados em revistas especializadas de Direito.

Ampliando-se o horizonte acerca da discussão, efetivou-se uma busca sobre o posicionamento dos Três Poderes da República. Quanto ao Judiciário, a investigação se deu por meio de sites dos Tribunais Regionais do Trabalho, do Tribunal Superior do Trabalho e do Supremo Tribunal Federal, buscando-se posicionamentos em acórdãos e enunciados. No tocante ao Executivo, o site do Ministério do Trabalho e Emprego foi de grande valia. Finalizando, com relação ao Poder Legislativo, a procura se deu em Projetos de Lei, nos quais se desvendou o pensamento atual do Poder Legislativo acerca do tema.


2. DO DEBATE CONSTITUCIONAL

A Lei n.º 9.958, de 12 de janeiro de 2000, trouxe uma inovação à CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas): incluiu os arts. 625-A ao 625-H, versando sobre as Comissões de Conciliação Prévia e sua aplicabilidade no Direito processual trabalhista brasileiro.

Dentre as implementações, destaca-se a constante do art. 625-D, mais especificamente no §2º, in fine, que trouxe a exigência da tentativa de conciliação entre empregado e empregador antes do ajuizamento de qualquer demanda individual trabalhista.

De tal tentativa, podem surgir duas consequências: 1 - no caso de êxito do acordo, a conciliação será reduzida a termo e servirá como título executivo extrajudicial, com eficácia liberatória geral para as partes (art. 625-E, parágrafo único, CLT). 2 - No caso de insucesso, será fornecida ao empregado e ao empregador uma declaração da tentativa frustrada, que deverá ser juntada à eventual reclamação trabalhista (art. 625-D, §2º, in fine, CLT).

A doutrina e a jurisprudência discutem acerca da natureza dessa declaração que deverá ser juntada à demanda laboral, no caso de não haver acordo. Para uma corrente, a declaração é compreendida como pressuposto processual (BRASIL, 2008a). Para outra linha, este documento é uma condição da ação (ALMEIDA, 2006; MARTINS, 2007).

Em que pese a importância dessa diferenciação sobre a natureza jurídica – pressuposto processual ou condição da ação –, o que se discutirá com maior intensidade neste trabalho, e que também é discutido por outra grande parte da doutrina e da jurisprudência, inclusive dos Tribunais Superiores, é a constitucionalidade dessa exigência prevista na lei supracitada, sobretudo frente aos Princípios Constitucionais da Inafastabilidade do Acesso à Justiça e do Devido Processo Legal (art. 5º, XXXV, e LIV, da CRFB/88, respectivamente).

Não obstante a alteração na CLT ter sido formulada por uma lei – a de nº 9.958/00 –, a qual possui a presunção de ser constitucional, por seguir o devido processo legislativo (art. 59, CF/88), e sancionada pelo Executivo (art. 66, CF/88), também é verdade que, no caso concreto, a aplicação da Lei cabe ao Poder Judiciário, sendo esta sua função precípua.

E ao Judiciário caberá fazer essa análise sob a ótica do que de maior há em nosso sistema democrático de direito: a nossa Carta Constitucional. Por meio de uma interpretação sistemática, histórica e sociológica da Carta, e inspirando-se em princípios e valores constitucionais, deverá o operador do Direito compreender – e aplicar – o mens legis na busca do que Aristóteles denominou de mesotes (justo meio) (ARISTÓTLES, 2002).

Convém destacar que, dentro desta filtragem constitucional, o fenômeno da constitucionalidade emerge nos Estados Democráticos de Direito não como um modismo ou uma simples onda, mas, pelo contrário, representa um novo passo rumo à concretização da Justiça social.

Ora, se para os diversos campos do Direito é importante essa nova abordagem, quiçá na área do Direito do Trabalho, na qual, como é sabido, historicamente mais representa a evolução dos direitos e das garantias do Homem.

Em um dos eixos de estudo que aborda tal discussão, o da Antropologia Jurídica, em muito se respalda esta posição. Para esse eixo, existiriam duas teorias do Direito: aquela que a lei estabelece e aquela que ocorre na prática. É justamente sobre esta que este estudo ora investiga.

Mister destacar, antes de se chegar a alguma conclusão, que, no campo dos conflitos individuais, um trabalhador não possui as mesmas condições que seu empregador. Daí surgir a ideia de hipossuficiência, da vulnerabilidade e, consequentemente, o mais importante princípio trabalhista: o da Proteção (SÜSSEKIND, 2003). Aliás, assevera este renomado autor trabalhista: "A necessidade de proteção social aos trabalhadores constitui a raiz sociológica do Direito do Trabalho." (SÜSSEKIND, 2003).

Destarte toda essa garantia ao trabalhador já erigida aos pilares constitucionais, constata-se, por outro lado, um aparente choque entre regra e princípios. Em face dessa discussão, é preciso buscar o que leciona a doutrina atual e o que vem aplicando a jurisprudência dos tribunais.

2.1 Da Comissão de Conciliação Prévia: breve histórico, natureza jurídica e finalidade

O instituto da conciliação no Direito do Trabalho encontra assento no âmbito internacional, por meio da Recomendação n. 92 da Organização Internacional do Trabalho, (OIT), de 1951, a qual prevê dois tipos: a judicial e a extrajudicial.

No Brasil, a experiência com a heterocomposição no Direito do Trabalho, na sua forma conciliação, pode-se remontar à Lei n. 1.637, de 5.11.1907, que previu a criação dos Conselhos Permanentes de Conciliação e Arbitragem.

Bem verdade que a Constituição de 1824, portanto ainda no Império, previa, em seu art. 161, a necessidade de negociação como uma condição para o ajuizamento de ações. Assim constava: "Sem se fazer constar, que se tem intentado o meio da reconciliação, não se começará processo algum." (PISCO, 2008, p. 88).

Já Evaristo de Moraes Filho (2003, p. 714) considera que "coube ao governo Washington Luís instituir no Estado de São Paulo os primeiros organismos de uma autêntica justiça do trabalho, os chamados Tribunais Rurais, pela Lei n. 1.869, de 10.10.22.", nos quais funcionaria uma espécie de composição de conflitos trabalhistas.

Em 1932, por meio do Decreto n. 21.396, foram criadas as Comissões Mistas de Conciliação e, no mesmo ano, instituídas as Juntas de Conciliação e Julgamento, com a finalidade de decidir os conflitos individuais de trabalho.

De se destacar que a Justiça do Trabalho no País, como organismo judiciário, especial, só se instalou em 1939, por meio do Decreto-Lei n. 1.237. No ato da criação essa Justiça foi dividida em 3 níveis. Conforme Moraes Filho (2003), tratavam-se dos seguintes: 1) as Juntas de Conciliação e Julgamento; 2) os Conselhos Regionais de Trabalho; 3) o Conselho Nacional do Trabalho.

Foi no primeiro desses níveis que se previu, como o próprio nome sugere, o instituto da conciliação como meio de resolução dos dissídios individuais trabalhistas. As Juntas de Conciliação e Julgamento possuíam a competência para conciliar e julgar os dissídios individuais.

Todavia, fora com o advento da Lei n. 9.958, sancionada em 12 de janeiro de 2000, que houve a inserção na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) - arts. 625-A ao 625 H - da previsão das Comissões de Conciliação Prévia (CCP) como forma de heterocomposição dos conflitos trabalhistas, de natureza extrajudicial.

Amador Paes de Almeida (2008), acompanhado por outros, entende que a constituição dessas comissões é de caráter facultativo. Assim diz o próprio art. 625-A, CLT: "As empresas e os sindicatos podem instituir Comissões de Conciliação Prévia (...)".

Em consequência, a obrigatoriedade de a questão trabalhista ser submetida à Comissão de Conciliação só ocorrerá se esta existir na localidade da prestação de serviços. É o que ratifica o art. 625-D, CLT.

Consoante menciona Sérgio Pinto Martins (2008), a natureza jurídica das Comissões de Conciliação Prévia é de mediação, pois são órgãos privados, de solução de conflitos extrajudiciais, e não público. Sendo assim, ainda conforme este autor, trata-se de um meio de resolução de conflitos trabalhista com a intervenção de terceiro, daí a denominação de heterocomposição.

Nas palavras de Evaristo de Moraes Filho (2003, p. 712), "a heterocomposição do conflito toma lugar da autocomposição ou a substitui quando impossível esta ou não realizada. A solução do conflito é transferida para uma pessoa estranha às partes (...).".

Há duas formas de intervenção de terceiros no conflito trabalhista: a primeira, suave e tênue, sem poder coercitivo, uma vez que a decisão final cabe às partes, como a conciliação e a mediação; a outra forma será a arbitragem ou a própria intervenção judicial.

Pode-se dizer, então, que a conciliação ou sua tentativa realizada pelas CCP situa-se a meio caminho entre a autocomposição e a heterocomposição, eis que as partes possuem papel decisivo no seu êxito.

Mas o porquê da criação dessa Comissão? O que o legislador pretendia (e pretende) com a aplicação do instituto da conciliação no âmbito trabalhista nacional?

Já em 1951, a OIT previu como objetivo dos organismos de conciliação voluntária a prevenção e a solução dos conflitos do trabalho entre empregadores e trabalhadores (Recomendação n. 92).

Amador Paes de Almeida (2008) diz que foi com grande expectativa que os juslaboristas e os órgãos sindicais viram a criação das Comissões no Direito do Trabalho. Acreditavam ser um esforço no sentido de modernização dessa Justiça Especializada, tendo como característica principal, talvez, a possibilidade de descongestionar os vários órgãos da Justiça do Trabalho.

Continua o renomado autor supracitado afirmando que "as comissões de conciliação prévia devem ser vistas como inegável esforço no sentido de desafogar a Justiça do Trabalho e acelerar as soluções dos conflitos trabalhistas individuais." (ALMEIDA, 2008, p. 522).

Sérgio Pinto Martins (2008, p. 53) também comenta essa mudança na CLT: "O fator positivo da norma é que o conflito pode ser resolvido na própria empresa e não irá para a Justiça do Trabalho, sendo uma espécie de filtro. Pode diminuir o número de processos na Justiça do Trabalho em razão do efetivo funcionamento das Comissões.".

O Tribunal Superior do Trabalho também se posicionou no tocante ao objetivo das Comissões em tentar aliviar a sobrecarga de processos submetidos ao Judiciário Trabalhista.

Na análise do Recurso de Revista n.º TST-RR-924/2005-491-01-00-8, 1ª Turma, versando sobre o tema, o Ministro Relator Vieira de Melo Filho assim pronunciou: "A previsão constante do art. 625-D tem por escopo facilitar a conciliação extrajudicial dos conflitos, com vistas a aliviar a sobrecarga do Judiciário Trabalhista (...)." (apud PISCO, 2008, p. 95).

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

O Poder Executivo, por intermédio do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), corrobora o entendimento com relação à finalidade: "As Comissões de Conciliação Prévia contribuem para diminuir a enorme carga sobre a Justiça do Trabalho. Com isso, ganha o trabalhador que busca proteção, (...), e ganha também o empregador, hoje onerado pela necessidade de manter uma estrutura jurídica complexa e pelos custos de sucumbência." (BRASIL, 2007, p. 1).

Explana ainda o MTE que já foram criadas até o momento 1.233 Comissões de Conciliação Prévia em todo o país, sendo a grande maioria formada por comissões intersindicais (73%).

Pelo que se percebe, seja pela doutrina, seja pelos Poderes Constitucionais, a finalidade da Comissão de Conciliação Prévia é de desafogar o Poder Judiciário das raclamações trabalhistas individuais, eis que muitas podem ser resolvidas por via da composição. Estimula-se, portanto, a resolução dos conflitos de forma extrajudicial. Garante-se, ainda, uma maior celeridade na solução e, com isso, uma economia de ambas as partes – empregador e empregado.

Convém destacar que, desde 2002, o MTE, por meio da Portaria n.º 264, articulou-se com o Tribunal Superior do Trabalho, com o Ministério Público do Trabalho, com as Centrais Sindicais CGT, SDS e Força Sindical, com a Associação Nacional dos Sindicatos da Micro e Pequena Indústria, e com as Confederações Patronais CNC, CNT, CNF e CNA, surgindo desse encontro a criação de um Termo de Cooperação Técnica, assinado também em 5 de junho de 2002, para promover o aprimoramento do instituto das Comissões de Conciliação Prévia.

2.2 Da declaração de tentativa de conciliação como condição da ação ou pressuposto processual

Grande discussão existe, ainda hoje, acerca da natureza da declaração de tentativa de conciliação prévia no seio da Justiça Laboral. Ora se vê tal objeto como condição da ação, ora como pressuposto processual.

Sérgio Pinto Martins (2008), dentre outros, afirma ser a declaração comprobatória de tentativa da conciliação uma condição da ação.

Como fundamento alega o autor que os pressupostos processuais de existência de um processo são a jurisdição, o pedido e as partes. Já os de validade do processo são a competência, a ausência de suspeição, a inexistência de coisa julgada e de litispendência, a capacidade processual dos litigantes, a regularidade da petição inicial e da citação.

Outrossim, indica o mesmo autor que o art. 267, VI, do CPC - que trata sobre a resolução do processo sem julgamento do mérito - traz as condições da ação de forma meramente exemplificativa, daí a conjunção "como", no dispositivo.

Em sua análise pormenorizada sobre o tema, MARTINS (2008) elenca que a CLT, em seu art. 625-D, emprega o verbo "será" no imperativo, indicando que o empregado terá de submeter sua reivindicação à comissão antes de ajuizar a ação na Justiça do Trabalho.

Não obstante, o §2º do mesmo artigo também usa o verbo "dever" no imperativo, obrigando, portanto, o empregado a juntar com a petição inicial da reclamação trabalhista a declaração frustrada da tentativa de conciliação.

Amador Paes de Almeida (2008) também afirma ser a declaração de tentativa de conciliação prévia uma condição da ação. Esse autor indica que o direito de ação não é absoluto e para a consecução de tal direito existem algumas condições: as comuns a todo o processo, que seriam a legitimidade para a causa, o interesse de agir e a possibilidade jurídica do pedido, e a específica do processo trabalhista no dissídio individual, qual seja, a prévia submissão da reivindicação à comissão de conciliação.

Ainda enfatiza o insigne professor: "A conciliação prévia como condição da ação. Conquanto facultativa a criação de comissão de conciliação prévia, tanto no âmbito da empresa como no intersindical, uma vez criada e instalada, torna-se obrigatória a submissão a ela de qualquer demanda trabalhista". Esse, aliás, é o preceito do art. 625-D, da Consolidação.

Parte da jurisprudência, favorável a tese de constitucionalidade da Lei n.º 9.958/00, assegura ser a declaração de tentativa de conciliação um pressuposto processual. Esse é o entendimento, verbi gratia, dos seguintes julgados: TST-RR-237/2005-061-01-00-8; TST-RR-1.044/2003-461-02-85.2; TST-RR-362/2003-315-02-00.4; TST-RR-1.016/2001-009-04-40.9, todos do Tribunal Superior do Trabalho (TST) (BRASIL, 2008, p. 2-3).

Recentemente, no Tribunal Superior do Trabalho, por meio do acórdão TST-RR-528/2003-095-15-00.5, em sede de recurso de revista, o Ministro Aloysio Corrêa da Veiga inovou o entendimento acerca da natureza da declaração de tentativa. Para ele, não passaria de um requisito da petição inicial, conforme o art. 284 do CPC, restando ao autor, ora empregado, a oportunidade de emendá-la, não acarretando a extinção do processo sem a extinção do feito.

Complementa o Ministro do TST que se não ocorrera a conciliação no âmbito judicial, nem em 1ª, nem em 2ª instância, ultrapassada está qualquer tentativa de acordo no âmbito extrajudicial. Provado está que o empregador não tem nenhuma proposta a ser oferecida. Extinguir o feito nessa fase seria contrariar inúmeros princípios, tais como o da celeridade, o da economia processual, da informalidade, o da instrumentalidade e o caçula do art. 5º da Carta Republicana, o da razoável duração do processo.

Sendo assim, vislumbra-se que encarar a regra do art. 625-D da CLT como obrigatória, de caráter impositivo, e não como mera faculdade, estar-se-ia indo de encontro à finalidade procurada pelo legislador, pelo administrador público e pelos juslaboristas. Os efeitos almejados por esses estar-se-iam "saindo pela culatra", ou seja, o que se tem verificado quanto à prática forense é uma mora maior no processo, ferindo a celeridade, a economia processual, a informalidade e o mais novo dos direitos fundamentais estatuídos pela Constituição: o da Razoável Duração do Processo (art. 5º, LXXVIII, CF/88).

Ademais, fere-se o próprio fim do instituto da conciliação extrajudicial: a prevenção ou a solução espontânea, voluntária e opcional dos conflitos do trabalho entre empregadores e trabalhadores, evitando-se o abarrotamento de processos no âmbito do Judiciário.

2.3 Do Princípio da Inafastabilidade do Acesso à Justiça

O Princípio da Inafastabilidade do Acesso à Justiça encontra assento no Texto Constitucional de 1988, localizando-se no TÍTULO II - DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS, mais precisamente no famoso e transcendental artigo 5º, em seu inciso XXXV. Diz a Carta: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.".

Todavia, esse princípio – e a garantia nele contida - não é inédita no ordenamento jurídico Pátrio. A Carta Magna de 1946 trazia esse princípio em uma redação quase idêntica a da atual: "A lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual.".

Para Celso Ribeiro Bastos (1999), este princípio já poderia até mesmo ser encontrado na Primeira Constituição Republicana, a de 1891, porque estava implícito na sistemática constitucional adotada.

Igualmente ao autor supracitado, a Juíza Claudia de Abreu Lima Pisco (2008) discorre, acrescentando que, durante certo tempo, o sistema brasileiro previu a necessidade de negociação prévia como uma condição para o ajuizamento de ações. Foi durante a vigência da Constituição do Império – 1824 – a qual trazia no art. 161 tal exigência: "Sem se fazer constar, que se tem intentado o meio da reconciliação, não se começará processo algum.".

Todavia, continuando sua observação sobre esta exigência do art. 161, da Constituição do Império, Pisco (2008) traz a seguinte informação: "(...) o Decreto n. 359, de 1890, de acordo com as idéias da época, aboliu a exigência." (PISCO, 2008, p.88). A Constituição de 1891 seguiu esse entendimento e não fez constar qualquer exigência de prévia tentativa de conciliação para o ajuizamento de ação.

Celso Ribeiro Bastos (1999) menciona que foi em 1891 que se deu a filiação do Brasil ao sistema da tripartição dos Poderes de maneira desenganada (a Constituição do Império continha um Quarto Poder, o Poder Moderador). Desta feita, inspirou-se a partir de então na Constituição norte-americana. E é devido a esta influência que se consegue explicar o motivo pelo qual sempre "coube o recurso último para todas as lesões de direito, provenham de onde provierem, ao Poder Judiciário." (BASTOS, 1999, p. 214).

Entende Bastos (1999, p. 214) que "é certo que a lei poderá criar órgãos administrativos diante dos quais seja possível apresentarem-se reclamações contra decisões administrativas", mas também afirma que "estes remédios administrativos não passarão nunca de mera via opcional.".

Isso se torna possível afirmar, uma vez que a qualquer que seja a lesão, ou mesmo a ameaça, surge imediatamente o direito subjetivo público de ter, o prejudicado, a sua questão examinada por um dos órgãos do Poder Judiciário.

José Afonso da Silva (2007, p. 219) discorrendo sobre o Princípio do Acesso à Justiça, inclui nesse o mandamento da Igualdade, dizendo que "formalmente, a igualdade perante a Justiça está assegurada pela Constituição, desde a garantia de acessibilidade a ela (art. 5º, XXXV).".

Contudo, ressalva o autor que "realmente essa igualdade não existe. Acredita que tratar como igual sujeitos com diferenças econômicas e sociais não é outra coisa senão ulterior forma de desigualdade e Justiça." (SILVA, 2007, p. 219).

Mas esclarece José Afonso da Silva (2007, p. 431) que "a Constituição Federal (CF) protege o cidadão, inclusive, quando se sentir simplesmente ameaçado, possibilitando o ingresso em juízo". Continua o autor demonstrando que a CF ampliou o acesso ao Judiciário, antes mesmo da concretização da lesão.

Se se chama atenção para esse caso, de modo indistinto a todos os ramos do Direito, quanto mais se preocupa no tocante à Justiça do Trabalho, que reconhecidamente convive com as maiores desigualdades reais/substanciais encontradas no seio social.

Para Fernando Capez et al (2004), a Constituição Federal traz um núcleo de normas intangíveis, as denominadas cláusulas pétreas – art. 60, §4º, IV – das quais os direitos e as garantias fundamentais fazem parte.

Diz o autor supra que, neste caso, pelo gozo dessa posição constitucional, esses direitos só poderão vir a ser ampliados, nunca restringidos, nem por emenda constitucional, quanto mais por lei ordinária.

Continua Capez et al (2004), mais especificamente quanto ao art. 5º, inciso XXXV, da CF, que esse condiz com a indeclinabilidade da prestação jurisdicional e que, por sua vez, é uma derivação do Princípio da Isonomia (direito à igualdade).

Assevera que do Princípio da Igualdade decorrem, dentre outros, o "princípio da igualdade perante a Justiça, que se traduz na garantia de acessibilidade a ela (art. 5º, XXXV) e na assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados (art. 5º, LXXIV)." (CAPEZ et al, 2004, p. 61).

Paulo Bonavides (2008) ratifica esse pensamento, denominando essas garantias como garantias constitucionais qualificadas ou de primeiro grau. Explica que essas regras constitucionais são protegidas simultaneamente contra dois legisladores: o ordinário e o próprio constituinte, que poderia vir a emendar a Constituição.

A garantia constitucional de 1º grau – como, verbi gratia, a do art. 5º, inc. XXXV – protege o espírito da Carta constitucional, portanto está fora do poder de emenda, livre do poder de alteração que tente suprimi-lo ou restringi-lo.

Qualquer modificação dessas garantias significaria supressão ou mudança da essência, da natureza e da própria razão de ser da Lei Suprema.

Paulo Bonavides (2008, p. 549), para ilustrar tal vislumbramento com essa segurança, indica o seguinte: "Nunca houve, no constitucionalismo brasileiro, (...), uma defesa constitucional tão rígida de dois princípios supremos do velho Estado de Direito do liberalismo: a separação dos Poderes e os direitos e garantias individuais.".

Intrinsecamente ligado ao acesso à Justiça, o Princípio do Devido Processo Legal – art. 5º, inc. LIV, CF – também prevê, além da elaboração regular e correta da lei, a sua razoabilidade e o enquadramento nas preceituações constitucionais. Foi o que se consolidou como devido processo legal em sentido material ou substancial.

Aliás, PISCO (2008), inspirando-se nos ensinamentos de Ada Pellegrine Grinover, diz que o Princípio da Proteção Judiciária, ou da Inafastabilidade do Controle Judiciário, é uma regra que se prende na cláusula do due process of law (art. 5º, inc. LIV, CF/88).

Alexandre de Moraes (2006) entende que sempre que houver violação do direito, mediante lesão ou ameaça, deverá ser chamado a intervir o Poder Judiciário, que, no exercício da jurisdição, deverá aplicar o direito ao caso concreto.

Continua o livre-docente alegando que "o Poder Judiciário é obrigado a efetivar o pedido de prestação judicial requerido pela parte, pois a indeclinabilidade da prestação judicial é princípio básico que rege a jurisdição." (MORAES, 2006, p. 71).

Alerta Moraes (2006) que toda violação de direito corresponde a uma ação correlativa, independentemente de lei especial que a outorgue.

Idêntico raciocínio é o do já citado mestre José Afonso da Silva (2007), pois menciona que no art. 5º, inciso XXXV, da CF/88 já está inserido o direito de invocar a atividade jurisdicional, como direito público subjetivo. Assegura-se, neste caso, o direito de agir, o direito de ação.

Como exemplo cristalino, de se ver que a Constituição de 1988, diferentemente da anterior, afastou a obrigatoriedade de esgotamento da instância administrativa para que a parte possa acessar o Judiciário.

Este procedimento, até então vigente, era tido, por uns, como jurisdição condicionada ou instância administrativa de curso forçado (MORAES, 2006) e, por outros, como contencioso administrativo ou jurisdição dúplice (PISCO, 2008), o que lembraria bem o art. 161, da Carta Imperial já transcrito, traduzindo-se, portanto, em um retrocesso.

Alexandre de Moraes (2006, p. 72) ressalvou apenas um único caso admitido pela CF/88 desse tipo de contencioso: "A Constituição Federal exige, excepcionalmente, o prévio acesso às instâncias da justiça desportiva, nos casos das ações relativas à disciplina e às competições desportivas reguladas em lei (art. 217, §1º, CF)".

Por conseguinte, apenas com relação ao objeto mencionado no art. 217, §1º, da Carta, há a necessidade de se recorrer à administração, antes de se dirigir ao Poder Judiciário, e só.

Todavia, mesmo assim, diz o próprio Texto Constitucional que, se em sessenta dias o processo administrativo não estiver concluído, a lide poderá ser levada ao Judiciário.

Se esse afastamento temporário do acesso direto se dá nos assuntos ligados aos desportos e competições previstas em lei, não é igualmente verdadeiro afirmar que em outros casos poderá o legislador impor ou criar óbices no acesso à Justiça, quiçá, ainda mais, quanto aos créditos trabalhistas, que gozam de natureza especial e alimentar.

Ademais, há que se destacar que a conciliação, como trazida pela Lei n.º 9.958, de 12 de janeiro de 2000, não é nem realizada em órgãos administrativos públicos, como o é na Argentina (Lei n.º 24.635, 1996). Conforme a Juíza do TRT 1ª Região Claudia de Abreu Lima Pisco (2008) trata-se de meio alternativo de solução de conflitos de interesse, inter partes, ocorrendo extrajudicialmente.

2.3.1 Dos significados do acesso à Justiça

Mauro Cappelletti e Bryant Garth (apud ALVIM, 2003, p. 1) reconhecem que a expressão "acesso à Justiça" é de difícil definição. Porém, indicam pelo menos duas finalidades nela contidas. A primeira é o entendimento que o sistema jurídico deve ser igualmente acessível a todos. A segunda diz que esse sistema deverá produzir resultados que sejam individual e socialmente justos.

Concluem, nesse aspecto, que: "Sem dúvida, uma premissa básica será a de que a Justiça social, tal como desejada por nossas sociedades modernas, pressupõe o acesso efetivo." (apud ALVIM, 2003, p. 1).

Dentro desta perspectiva já dizia Miguel Reale (1998, p. 379), no tocante à ideia de Justiça que esta "implica constante coordenação racional das relações intersubjetivas, para que cada homem possa realizar livremente seus valores potenciais visando atingir a plenitude de seu ser pessoal, em sintonia com os da coletividade". Tudo isso, insta salientar, entendendo a Justiça como "concreta experiência histórica, isto é, como valor fundante do Direito ao longo do processo dialógico da história." (REALE, 1999, p. 379).

Segundo Cappelletti e Garth (apud ALVIM, 2003, p.1), pode-se compreender o acesso à Justiça, historicamente falando, em três fases, ou em "três ondas".

A primeira onda diz respeito à assistência judiciária gratuita aos menos favorecidos. Na ordem jurídica nacional, a ideia proveniente dessa onda se consubstanciou por meio da Lei n.º 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, salvaguardada pela Carta Magna de 1988 – art. 5º, inc. LXXIV.

A segunda trata da representação dos interesses coletivos (lato sensu). Nessa maré inserem-se direitos, como por exemplo, ao meio ambiente sadio (art. 225, CF/88) e as ações coletivas (art. 5º, XXI, CF), a ação civil pública (Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985) e o Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1990). Nessa onda, também fora muito prestigiado o Parquet como legítimo representante da sociedade no pleito dos direitos difusos.

Contudo, é na 3ª onda que se deve concentrar mais atenção. Junto a ela, ex vi, o instituto da conciliação, ou melhor, o incentivo às soluções alternativas de conflito de interesse. Vem ainda a concretude dos Juizados Especiais e a possibilidade do jus postulandi, isto é, quando a própria parte postula seus direitos em Juízo, sem a necessidade de patrocínio por advogado.

No Direito, como traz Pisco (2008), existem os métodos alternativos de solução de conflito de interesses (MASC) ou, como denomina o direito norte-americano, o alternative dispute resolution, representado pela sigla ADR. Também, nesse esteio, veio ao ordenamento a Lei n.º 9.307/96, instituindo e disciplinando a arbitragem, pela qual se favorece a solução dos litígios por meio de uma espécie de justiça privada.

Todas essas ondas, na verdade, significam a procura de uma Justiça com melhores condições para garantir a rapidez e a eficácia do processo. Diz o Exmo. Dr. Juiz Carreira Alvim (2003, p.10-11) que "hoje o problema do acesso à Justiça não pode ser visto mais sob a ótica da "entrada" da ação, mas sim sob a apreensão da mora na "saída" de seus efeitos, pois poucos conseguem obter o resultado dentro de um prazo razoável.".

Desta feita, não há mais que se falar em óbices, além dos já previstos, que visem a dificultar o acesso ao Judiciário. Deve-se procurar atingir a maior celeridade possível do processo, a fim de garantir a prestação jurisdicional em um razoável tempo. Considerando-se a declaração de tentativa de conciliação como condição da ação (ou pressuposto processual) e extinguindo-se o feito sem a resolução do mérito, mais uma vez estar-se-ia condenando à inépcia todos os princípios contidos nos métodos alternativos de solução de conflitos.

Quanto mais por se tratar de uma relação litigiosa na qual não há igualdade entre as partes. Incabível de se imaginar que um processo seja extinto, sem julgamento do mérito, com fulcro no art. 267, IV (ou VI) do CPC, porque não se demonstrou a declaração de tentativa de conciliação. Um dos objetivos da Justiça, segundo "ondas cappellettianas", é justamente de tentar conciliar as partes. Por outro lado, imaginar que um processo que alcançou o TST seja extinto por esta causa, no mínimo é sufocar qualquer ideia de razoabilidade.

2.4 Da obrigatoriedade da submissão da demanda individual trabalhista à Comissão de Conciliação Prévia e o Princípio da Inafastabilidade do Acesso à Justiça: discussão doutrinária

A discussão doutrinária acerca do instituto da conciliação extrajudicial, na forma trazida pela Lei n.º 9.958/2000 à CLT (art. 625-A a H), está longe de ser uníssona. Vários posicionamentos divergentes surgiram - e vem surgindo - a respeito do tema.

Para uns, a exigência legal constante do art. 625-D da CLT é mero requisito da petição inicial, o que traria a possibilidade da emenda logo no início do trâmite processual – art. 284, CPC, solucionando-se o impasse imediatamente, conforme as palavras do Ministro TST Aloysio Corrêa da Veiga (BRASIL, 2008b).

Outros entendem ser a exigência um pressuposto processual ou uma condição da ação, o que representaria um obstáculo ao prosseguimento do processo, ocasionando a extinção do feito sem a resolução do mérito, consoante o art. 267, IV ou VI, do CPC, respectivamente.

Em outra linha, há aqueles que garantem ser tal exigência uma verdadeira afronta ao Princípio Constitucional da Inafastabilidade da Justiça ou da Garantia de Acesso à Justiça, consagrado no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988 (PISCO, 2008).

Ex vi, exemplificativamente, essas posições: para Sérgio Pinto Martins (2007, p. 55), o procedimento instituído pelo art. 625-D da CLT "representa condição da ação para ajuizamento da reclamação trabalhista." Diz ainda esse doutrinador que "não se trata de pressuposto processual". Os pressupostos processuais do processo são jurisdição, pedido e partes. Os de validade são a competência, a ausência de suspeição, a inexistência de coisa julgada e de litispendência, a capacidade dos litigantes, a regularidade da petição inicial e da citação. Sendo assim, o rol quanto aos pressupostos processuais é taxativo, numerus clausus, na visão deste autor.

Todavia, no tocante ao art. 267, inc. VI, do CPC, há um rol meramente exemplificativo pelo que se apreende do próprio texto legal. Diz tal preceito que o processo é extinto sem resolução do mérito quando não concorrer alguma das condições da ação, "como". Por essa conjunção, Martins (2007) fundamenta seu posicionamento. Para o autor, isso demonstraria que o rol das condições da ação previsto no CPC não se restringe apenas à possibilidade jurídica do pedido, à legitimidade das partes e ao interesse processual.

Finaliza o doutrinador asseverando não ser inconstitucional a exigência do art. 625-D, da CLT, pois as condições da ação devem ser estabelecidas em lei e não se está privando o empregado de ajuizar a ação, desde que tente a conciliação, previamente.

Acompanhando esta tese, Almeida (2008, p. 533) afirma: "Na existência de CCP na localidade da prestação do serviço, o empregado deve, obrigatoriamente, submeter sua reivindicação à comissão, como condição prévia à propositura da ação trabalhista."

Também afirma este autor, ao encontro de Martins (2007), que "tal imposição não se nos afigura inconstitucional" (ALMEIDA, 2008, p. 533), acarretando-se o julgamento conforme o art. 267, inc. VI, do CPC, extinguindo-se o feito sem a resolução do mérito.

Mas, ao mesmo tempo, data vênia, até certo ponto dualista, Almeida (2008) também diz que a Justiça do Trabalho no Brasil tem por fim solucionar os conflitos de interesse entre patrões e empregados, bem como processar e julgar as ações oriundas das relações de trabalho. Alerta o autor que o direito processual do trabalho, mais do que o processual civil, tem a finalidade pública, cuja função social é acentuada, assumindo especial relevo.

A Juíza Claudia de Abreu Lima Pisco (2008) rechaça a posição de Almeida (2008) sobre a imposição da tentativa de conciliação ser uma condição da ação e de sua obrigatoriedade estar dentro dos parâmetros de constitucionalidade. Lembra a d. Juíza que esta condição deverá ser observada dentro do binômio necessidade/adequação. É isto que comprovará o interesse de agir ou o interesse processual. A condição estará presente quando a parte demonstrar ter havido lesão (ou a simples ameaça) do direito material. Com a lesão encontrar-se-á presente o interesse material e, por conseguinte, o processual.

Carlos Henrique Bezerra Leite (2006) entende que o art. 625-D da CLT, deve ser interpretado consoante o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição, em função de que o trabalhador tem a opção de formular sua reclamação trabalhista perante a CCP ou, se preferir, ajuizar diretamente a sua demanda perante a Justiça do Trabalho.Continua o autor dizendo que "a CCP nada mais é do que meio alternativo de acesso à Justiça, tal como preconizado por Mauro Cappelletti, como terceira onda de acesso a uma ordem justa." (LEITE, 2006, p. 283).

Busca Leite (2006) lições contidas no próprio art. 114, da Carta Magna, que versa sobre a Justiça do Trabalho, e que prevê como prestação dessa Justiça especializada a competência para processar e julgar, vindo a ser contraditória a hipótese de negativa dessa jurisdição por ausência de tentativa de conciliação extrajudicial.

Enfatiza o autor supracitado que "se a Justiça Especializada pode o mais (processar e julgar), evidentemente que pode o menos (conciliar)." (LEITE, 2006, p. 283).

Nesse sentido, colhem-se os seguintes julgados: "TRT 2ª Região, processo RS 01-01514-2003-026-02-00, julgado em 13.01.2004. Rel. Min. Fernando Antonio Sampaio da Silva; TRT 17ª Região: RO 01168.2002-004-17-00.5, julgado em 23.10.2003. Rel. Juíza Annabella Almeida Gonçalves" (LEITE, 2006, p. 283). Nesta última decisão, assim se posicionou a Juíza Annabella Gonçalves: "(...) a ausência de passagem pela CCP deve ser admitida como expressão de vontade do jurisdicionado, que fica suprida pela tentativa conciliatória judicial, pois o livre acesso à jurisdição é assegurado pelo inciso XXXV, do art. 5º, da Constituição Federal de 1988." (LEITE, 2006, p. 283).

Constata-se, portanto, que a posição de Carlos Henrique Bezerra Leite (2006) se coaduna com os ensinamentos do mestre Miguel Reale (1999). Para este, pode-se concluir que a compreensão do Direito somente poder ser atingida graças à correlação unitária e dinâmica de suas três dimensões – o fato, o valor e a norma. Proclama o ilustríssimo autor: "(...) esses elementos ou fatores não só se exigem reciprocamente, mas atuam como elos de um processo de tal modo que a vida do Direito resulta da integração dinâmica e dialética dos três elementos que a integram." (REALE, 1999, p. 65).

Em artigo científico publicado pela Revista LTr., a Juíza do TRT da 1ª Região Claudia de Abreu Lima Pisco (2008, p. 95) lembra que "todo o ordenamento jurídico deve ser interpretado de forma harmônica, dada sua unidade jurídica." Alerta ainda que "(...) as leis ordinárias devem receber uma interpretação de forma que se adaptem às garantias constitucionalmente asseguradas.".

Dentro dessa ótica, a submissão das demandas individuais trabalhistas às CCP deve ocorrer voluntariamente, e não de forma obrigatória. Uma vez não ocorrida, ou não tentada, não se pode retirar do autor, reclamante, o direito de ação.

Ao pensar de outra forma, continua a magistrada, "estar-se-ia condicionando o exercício desse direito em total afronta aos termos da Carta Magna, já que esse está amplamente garantido no inciso XXXV do art. 5º da Constituição da República, sem qualquer ressalva." (PISCO, 2008, p. 96).

Fábio Konder Comparato (2006, p. 528), ao se referir sobre as possíveis lacunas da lei ou a aparente antinomia, ensina que: "(...) é de justiça interpretá-la num sentido mais preciso e concreto, a fim de estender a norma genérica à hipótese em questão, atendendo-se, assim, mais ao espírito do que à letra da lei.".

Convém trazer à tona, dentro desse posicionamento, que por meio de três Projetos de Lei que tramitam na Câmara dos Deputados - PL 498/03, de autoria da Deputada Drª. Clair (PT/PR); PL 1974/03, originário da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (ANAMATRA), e PL 2483/03, de autoria do Deputado Carlos Nader (antigo PFL/RJ) – busca-se a alteração da CLT, com o substitutivo que tira a obrigatoriedade da submissão do conflito trabalhista às comissões, antes do ajuizamento da ação.

O Projeto de Lei 498/03 foi aprovado, em 08 de agosto de 2007, pela Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP) da Câmara dos Deputados, seguindo-se os outros dois apensados.

Segundo Cláudio José Montesso, Presidente da ANAMATRA, que é entidade autora de um dos PL, o projeto resgata "a verdadeira vocação das comissões para efetivamente compor conflitos existentes entre empregados e empregadores." (ANAMATRA, 2007, p.1).

Reforçando esse entendimento, Renato Henry Sant’Anna, Diretor de Assuntos Legislativos da ANAMATRA, afirma que "fica claro que a diminuição da quantidade de processos na Justiça do Trabalho não pode ser obtida a qualquer custo, dificultando o acesso ao Poder Judiciário." (ANAMATRA, 2007, p.1).

Contudo, a discussão doutrinária prossegue...

2.5 Sob a ótica da jurisprudência

Não diferentemente da doutrina, persiste ainda hoje nos tribunais a discussão acerca da exigência trazida pelo art. 625-D da CLT. Não constitui, aliás, privilégio apenas dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRT), alcançando-se já a instância superior, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e, extrapolando a esfera trabalhista, no âmbito da própria Corte Suprema da República – o Supremo Tribunal Federal (STF).

Com tamanha divergência, em todos os graus de jurisdição, torna-se inequívoca a polêmica sobre o assunto e o quão sensível se faz a sua análise em sede jurisprudencial, uma vez que, daí, de uma decisão ou acórdão, poderão surgir inúmeras consequências, sobretudo no cotidiano social.

Neste capítulo buscou-se trazer à tona os mais recentes e elucidativos julgados sobre o tema em questão, a fim de possibilitar uma análise e discussão mais epistemológica sobre o assunto, dentro do que preconizam os mandamentos da hermenêutica.

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região entendeu que o comparecimento do reclamante (empregado) perante a Comissão de Conciliação Prévia (CCP), para a obtenção de título extrajudicial (CLT, art. 625-E, parágrafo único), é faculdade, não constituindo, portanto nem condição de ação, nem tampouco pressuposto processual (BRASIL, 2008b, p. 2).

Com essa decisão, o Egrégio Tribunal da 15ª Região desconsiderou a tese preliminar, em sede de recurso interposto pela reclamada, que pleiteava a extinção do feito sem julgamento do mérito, baseada na falta de condição da ação.

A tese do TRT da 1ª Região, convergindo com o da 15ª Região, é de que a submissão dos litígios trabalhistas à CCP, quando instituída, não pode constituir obstáculo à propositura da ação, sob pena de ferir o Princípio Constitucional da Inafastabilidade da Jurisdição, previsto no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal (BRASIL, 2008a, p. 1-2).

Já no TST, o Ministro Ives Gandra Martins Filho, quando relator do processo nº 237/2005-061-01-00.8 TST-RR, analisando tal decisum supracitada, expôs que importará em extinção do feito sem resolução do mérito, com base no art. 267, IV, do CPC, a reclamação trabalhista (RT) que for ajuizada sem a observância do disposto no art. 625-D, §2º, da CLT, sem justificar o motivo da não-submissão da controvérsia à CCP (BRASIL, 2008a, p. 2-4).

Entende o relator Ministro que tal previsão não fere o Princípio da Legalidade, do Acesso ao Judiciário, do Direito Adquirido e do Ato Jurídico Perfeito insculpidos no art. 5º, inc. II, XXXV e XXXVI, da CRFB/88, pois a passagem pela CCP, diz o Ministro, "é curta, de apenas 10 dias (CLT, art. 625-F), e a parte pode esgrimir eventual motivo justificador da impossibilidade concreta do recurso à CCP (CLT, art. 625-D, §4º)." (BRASIL, 2008a, p. 2).

O Ministro Relator Ives Gandra trouxe, ainda, ao acórdão proferido, outros julgados do TST que vão ao encontro de sua tese: TST-RR-1.044/2003-461-02-85.2, Rel. Min. João Oreste Dalazar, 1ª Turma, DJ de 22/09/06; TST-RR-362/2003-315-02-00.4, Rel. Min. Carlos Alberto, 3ª Turma, DJ de 11/10/07; TST-RR-1.016/2001-009-04-40-9, Rel. Juiz Convocado Cláudio Couce de Menezes, 3ª Turma, DJ de 25/02/05; TST-RR-464/2002-023-04-00.8, Rel. Min. Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, DJ de 19/10/07. (BRASIL, 2008a, p. 2-3)

Nesse acórdão (237/2005-061-01-00.8 TST-RR) os Ministros da Egrégia 7ª Turma do TST acompanharam o voto do Ministro Relator Ives Gandra (BRASIL, 2008.a, p. 4). Isso em 28 de maio de 2008.

Por outro lado, o Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, analisando um recurso de revista interposto em face da decisão do E. TRT 15ª Região, acordou da seguinte forma: reconheceu o recurso, em sede de revista, por divergência jurisprudencial - que é uma das condições recursais exigidas pela CLT e CPC (BRASIL, 2008b, p. 1).

Passou, a seguir, a analisar o mérito dos fundamentos alegados pela reclamada, quanto à falta de condição da ação, logo, falta de um requisito preliminar à formação do processo, pelo fato de existir na localidade uma CCP, e não ter o reclamante (empregado) tentado realizar o acordo extrajudicial (BRASIL, 2008b, p. 2).

Antes de adentrar especificamente no exame da matéria, o Min. Veiga efetuou uma verdadeira digressão acerca dos motivos que fizeram entrar em vigor no processo do trabalho a regra da submissão prévia do empregado à CCP (BRASIL, 2008b, p. 3).

O Relator, de fato, ministrou uma aula sobre a CCP no Direito Pátrio. Elencou seu fundamento legal – art. 625-D, caput, e §3º, da CLT, inserido pela Lei n.º 9.958/00; explicou a natureza jurídica e a finalidade, assim como debateu sobre a constitucionalidade ou não da exigência da declaração da tentativa de acordo como condição da ação frente aos Princípios da Inafastabilidade de Acesso ao Judiciário, do Direito de Ação e, até mesmo, o da Separação dos Poderes, pois vislumbrou que, em tese, a lei infraconstitucional criou um obstáculo de acesso à justiça (BRASIL, 2008b, p. 3-5).

O Ministro Relator reconheceu que, anteriormente, entendia a submissão da demanda à Comissão de Conciliação Prévia uma condição da ação que, quando não atendida, determinava a aplicação do inciso VI do art. 267 do CPC, com a consequência de extinção do processo sem julgamento do mérito (BRASIL, 2008b, p. 4).

Atestou o Min. Aloysio Corrêa da Veiga que "tal pensamento, todavia, decorria exatamente da preocupação com o reconhecimento das comissões como solução favorável à resolução dos conflitos extrajudicialmente, e como medida adotada com o fim (...), que é o desafogamento do aparelho judiciário, além do estímulo da prática da conciliação prévia entre empregados e empregadores." (BRASIL, 2008b, p. 4).

Esse entendimento, aliás, não é exclusividade dele no TST. Quando relator em um Recurso de Revista (RR), o Ministro Vieira de Mello Filho também se pronunciou no sentido de que "(...) a intenção do legislador foi de desafogar a Justiça do Trabalho, e só. Na verdade, trata de uma faculdade do interessado. Tanto o é que nem as CCP foram criadas obrigatoriamente, nem a lei vislumbra qualquer obrigatoriedade." (BRASIL, 2008c, p. 2).

Assevera o Ministro Vieira de Mello Filho que extinguir o processo, sem julgamento do mérito "seria ofender o art. 5, LXXVIII, da Constituição Federal (...).". Ademais, evoca o referido Ministro que: "O art. 5º, XXXV, da Constituição Federal não pode ser restringido por qualquer diploma legal, por se constituir em garantia individual, nos termos do art. 60, §4º, CF." (BRASIL, 2008c, p. 4).

Almejando um estudo com maior profundidade sobre o tema sensível ora em tela, o Ministro Aloysio Corrêa da Veiga se utilizou, a posteriori, do ponto-de-vista de alguns renomados doutrinadores sobre o assunto. Dentre eles, constam no acórdão os mestres Moacir Amaral Santos e Valentin Carrion.

Também, como embasamento teórico-argumentativo, o Min. Veiga se debruçou nos exames de Ministros da Corte Suprema do País, uma vez que o E. STF, embora não tenha decidido definitivamente sobre a questão, já vem analisando a inconstitucionalidade do art. 625-D da CLT.

O Ministro Marco Aurélio, verbi gratia, abriu divergência ao Min. Rel. do STF no sentido de que se deve dar interpretação consoante à Constituição Federal, passando a tratar como facultativa a submissão à Comissão de Conciliação. Complementou o Ministro Marco Aurélio que, caso não seja assim, "é possível que o procedimento por ela (CLT) previsto signifique verdadeira condição prévia do processo que impeça o exercício do direito de ação desses titulares antes do esgotamento da frustração dessa nova fase." (BRASIL, 2008b, p. 4).

Nesses termos, também, pronunciaram-se os Excelentíssimos Senhores Ministros Sepúlveda Pertence, Cármem Lúcia, Eros Grau e Ricardo Lewandowski. Pediu vista regimental aos autos o Min. Joaquim Barbosa, a fim de realizar um estudo pormenorizado (BRASIL, 2008b, p. 4).

O Ministro Relator do TST Aloysio Corrêa da Veiga, para enriquecer seu fundamento no acórdão, buscou apoio da opinião manifestada pelo Exmo Juiz Jorge Luiz Souto Maior, que disse, resumidamente, não considerar a passagem do empregado-reclamante pelas CCP sequer uma condição da ação. "Não deve o juiz, diante de uma reclamação trabalhista, extinguir o processo sem julgamento do mérito e ponto, caso não seja tentada a solução extrajudicial". Sob a ótica do direito mais justo, asseverou o Juiz Souto Maior, "não se faz bem se acomodar com o mal menor." (apud BRASIL, 2008b, p. 5).

Prossegue o Juiz que o art. 625-D, da CLT, não previu nenhuma sanção ou penalidade que justificasse esse procedimento de extinção do feito. Para corroborar, acrescentou que no projeto da Lei 9.958/00 até existia tal previsão, mas que não fora aprovada com esta redação.

Compartilhando desse argumento, o Ministro Vieira de Mello Filho, do TST, também afirma que "a submissão à CCP era prevista no projeto de lei como condição da ação trabalhista, mas não foi aprovado" e, ainda, "o legislador não impôs qualquer penalidade àquele que recorre diretamente à Justiça do Trabalho." (BRASIL, 2008c, p. 2).

Aliás, trata-se de princípio de hermenêutica a noção de que as regras de restrição de direitos não se interpretam ampliativamente; além de que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei." (CF, art. 5º, inc. II).

O Ministro Aloysio Corrêa da Veiga considerou, por fim, a ausência de submissão à CCP como um requisito da petição inicial, cabendo ao juiz determinar sua emenda, afastando o entendimento de que se trata de condição da ação não cumprida, "eis que o interesse de agir é evento que demanda principalmente a utilidade da jurisdição, e que não se demonstra tão-somente pela não-submissão à CCP." (BRASIL, 2008b, p. 5).

Por conseguinte, entendeu o d. Min. Rel. supramencionado que "não é possível a extinção do processo, sem julgamento do mérito, sem a possibilidade de o empregado sanar e juntar o documento essencial disposto na regra do art. 625-D, da CLT." (BRASIL, 2008b, p. 5).

Tudo isso, respaldou o Ministro, atendendo aos Princípios da Instrumentalidade e da Razoável Duração do Processo. Ademais, continua proferindo no acórdão, que "no processo do trabalho, é necessário que a questão seja examinada mais profundamente com base nos princípios antes citados, pois o fator tempo, útil e necessário em razão da natureza alimentar dos créditos trabalhistas, é elemento do qual não pode se divorciar o julgador." (BRASIL, 2008b, p. 4).

Corroborando tal preocupação quanto aos créditos trabalhistas, o Min. Vieira de Mello Filho enfatiza que seria impossível não ponderar a natureza desses créditos, uma vez que se destinam ao suprimento das necessidades materiais básicas não só do empregado, mas de toda sua família.

Acrescenta o Ministro Mello Filho que, caso ocorresse a extinção do feito sem a resolução do mérito, devido a um posicionamento favorável à falta de condição da ação ou de um pressuposto processual, significaria um verdadeiro retrocesso da marcha processual, o que iria postergar ainda mais a pretensão de um direito material que já encontra respaldo pleno (BRASIL, 2008c, p. 5).

Acordaram com o Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga todos os demais Ministros da Colenda 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade. Isso, em 04 de junho de 2008 (BRASIL, 2008b, p. 5).

Percebe-se, claramente, que o tema em tela gerou - e vem gerando – grande controvérsia. Nota-se que tal discussão não se resume aos assentos acadêmicos, aos escritórios de advocacia, às instituições ligadas às funções da justiça e aos sindicatos. Não! Vai além, transpondo as Varas do Trabalho, chegando aos Tribunais Regionais de todo o País, alcançando as portas do Supremo Tribunal Federal, que também debate o tema e de maneira divergente.

Salientando-se tamanhas e inúmeras controvérsias, basta verificar que, dentro de um espaço de menos de dez dias, no corrente ano, o Egrégio TST se posicionou de forma divergente apreciando o tema. As 6ª e 7ª Turmas, em discussão sobre dois recursos de revistas, tendo como responsáveis pela relatoria os Ministro Ives Gandra Martins Filho e Aloysio Corrêa da Veiga, manifestaram entendimentos divergentes (BRASIL, 2008a, p. 5 e BRASIL, 2008a, p. 5).

Não muito distante, em 30 de maio de 2007, a 1ª Turma desse Superior Tribunal, por meio da relatoria de um recurso de revista sob responsabilidade do Ministro Vieira de Mello Filho, já havia se pronunciado em sentido muito parecido com o acordado pela 6ª Turma, de 04 de junho de 2008. Todavia, pelo que se apreende da pesquisa, essa tese ainda não é uma unanimidade.

Mister explanar que tamanha reflexão se faz necessária devido às inúmeras consequências que possam advir, caso seja declarada a inconstitucionalidade ou mesmo a constitucionalidade das alterações da CLT acarretadas pela Lei n.º 9.958/00.

Se, de um lado, se presenciar a declaração de constitucionalidade, muitos processos que tramitam na Justiça do Trabalho que versam sobre o assunto e se enquadram no caso, serão, de fato, declarados extintos sem resolução do mérito, por força do art. 267, CPC, por falta de condição da ação (inc. VI).

Sendo assim, alguns princípios constitucionais, possivelmente, ficarão à margem dessa solução, como o da própria Inafastabilidade de Acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV, CF), o do Direito de Ação (art. 5º, XXXIV, CF), do Devido Processo Legal (art. 5º, LIV, CF) e, dependendo do caso, o da Razoável Duração do Processo (art. 5º, LXXVIII, CF).

Por outro lado, caso seja declarada a inconstitucionalidade dessa exigência infraconstitucional, ou dada uma nova redação, tornando facultativa a submissão prévia às CCP dos conflitos individuais trabalhistas (e não mais obrigatória), as Comissões de Conciliação perderão, provavelmente, a razão ou a finalidade para serem instituídas, pois não raramente os empregados preferirão acionar diretamente o Judiciário, devido ao fato de acreditarem em uma maior imparcialidade desse órgão.

Também advirão consequências, tais como o possível abarrotamento de processos trabalhistas no Judiciário, acarretando a diminuição na celeridade processual e, indiretamente, afetando também o Princípio da Celeridade e da Razoável Duração do Processo.

Todavia, nesse caso, mister ressaltar, serão respeitados os Princípios da Inafastabilidade da Jurisdição, do Devido Processo Legal, do Direito de Ação e outros afins, tornando possível a prestação jurisdicional garantida na Carta Constitucional, dando-se um enfoque dentro do que hoje se denomina visão pós-positivista, de interpretação segundo a Constituição, realizando-se uma "filtragem constitucional", isto é, interpretando-se o ordenamento jurídico por meio de uma "lente" constitucional.

Escolhe-se o ensinamento, mais uma vez recordando, do Exmo. Senhor Juiz Luiz Souto Maior que soberana e oportunamente afirma: "(...) Sob o ponto de vista da luta por um direito mais justo, não sou muito a favor de se acomodar com o mal menor, ou seja, de se acatar o entendimento de que a tentativa de acordo nas comissões de conciliação constitui uma condição da ação (...)." (apud BRASIL, 2008b, p.5).

Sob esta ótica, entende-se que é de grande valia a aplicação do Princípio da Proporcionalidade, dentro da concepção de que este tem origem no processo de afirmação concreta dos direitos fundamentais, refletindo-se em uma sistemática do novo constitucionalismo, que busca a otimização de seus mandamentos (ARAÚJO, 2002).

É um princípio de natureza jurídico-dogmática, independente e aberta, cogente e vinculante, e que goza de dignidade constitucional, de conteúdo imanente ao Estado de Direito, e que serve, dentre outros, como restrição ao poder discricionário do legislador e do aplicador da norma.

Hoje, por sinal, esse princípio vem sendo muito utilizado pelo E. STF na análise e na investigação de uma solução mais justa para os conflitos de interesse. Aliás, crê-se piamente que a questão objeto deste estudo receberá uma certa pitada desse ingrediente de hermenêutica constitucional quando de seu desfecho.

Acredita-se que, para o caso em tela, deve-se buscar a resolução do impasse dentro de um modelo ou sistema que mescle a segurança das regras jurídicas e a oportunidade de aprimoramento e aplicação ao caso concreto das normas calcadas nos princípios constitucionais.

Foge-se, assim, dos dois extremos: 1. do sistema jurídico fechado, no qual as regras são as únicas fontes de resolução dos conflitos (no caso, a obrigatoriedade de submissão prévia das demandas individuais trabalhistas à CCP, antes do ajuizamento das RT), o que poderia acarretar ricos de arbitrariedade; 2. de um sistema jurídico totalmente aberto, baseado exclusivamente em princípios, pois daí decorreria grande risco para a segurança jurídica. "O melhor sistema é o que contém regras e princípios como normas jurídicas, aquelas dando uma certa estabilidade ao sistema, e estes possibilitando o seu aprimoramento, atuando como mandamentos de integração e de otimização normativa" (ARAÚJO, 2002, p. 17).

Nas palavras de Willis Santiago Guerra Filho (apud ARAÚJO, 2002, p.55) "O princípio da proporcionalidade permite concretamente a distribuição compatível dos direitos fundamentais.".

Ou como indica Francisco Fernandes de Araújo (2002, p. 9, 43 e 54) "o que é proporcional é esteticamente belo e substancialmente justo", ao estudar os Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade, assim como suas aplicações no Direito na busca de uma melhor Justiça social.

Contudo, o debate sob a ótica da jurisprudência prossegue...

Sobre o autor
Walfredo Bento Ferreira Neto

Pós-graduando em Direito Público e em Direito Militar. Bacharel em Direito. Licenciado em Geografia. Professor de Geografia na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA NETO, Walfredo Bento. O acesso à justiça e a obrigatoriedade da submissão prévia das demandas individuais trabalhistas à comissão de conciliação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2335, 22 nov. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13888. Acesso em: 21 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!