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O prazo para a revisão do ato administrativo quando favorável ao contribuinte

Agenda 10/12/2009 às 00:00

Indaga-se: em sendo detectado um vício que torne ilegal o ato administrativo de lançamento tributário, há algum prazo extintivo para a sua revisão e correção?


1. Introdução

É cediço que as modalidades de lançamento tributário são eleitas pela própria lei que rege o tributo, [01] e que "o direito de fazer o lançamento de ofício existe em relação a todos os tributos," pela sua própria natureza ou pelo descumprimento de deveres tributários. E ainda, "em todos os casos, a Fazenda Pública terá sempre o direito de lançar". [02]

Disciplina o Código Tributário Nacional - CTN:

Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:

(...)

Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública. (grifamos)

Por esse excerto legal, tem-se que a revisão de ofício do lançamento pela autoridade administrativa somente poderá ser realizada enquanto a Fazenda Pública tiver o direito de assim proceder.

- Questiona-se inicialmente então: que direito é esse?

O caput do art. 149 do CTN trata do direito de a autoridade administrativa efetuar de ofício o lançamento e sua revisão. Assim, o direito descrito no parágrafo único do mencionado artigo refere-se ao direito de constituir, ou seja, de lançar o crédito tributário por meio do lançamento de ofício.

Desse modo, considerando que nos termos do art. 173, I, do CTN, [03] a Fazenda Pública somente pode constituir, de ofício, o crédito tributário nos cinco anos a contar do exercício seguinte àquele em que ele poderia ser lançado, é também nesse prazo decadencial que sua revisão poderá ser efetuada, por estar sujeita ao mesmo regime jurídico do lançamento a ser revisto.


2. A revisão do ato administrativo

O controle administrativo, segundo Hely Lopes Meirelles, [04] deriva do poder-dever de autotutela que a Administração tem sobre seus próprios atos e agentes, e que é normalmente exercido pelas autoridades superiores. Para a Administração Pública é amplo o dever de anular os atos administrativos ilegais.

Impõe, nesse sentido, o art. 55 da Lei nº 9.784/99 [05] o dever à Administração de declarar ou reconhecer a nulidade de todos os atos, tanto os atos nulos como os anuláveis, ressalvadas as exceções legais, que podem ser convalidados expressamente.

Assim, todo agente público, ao detectar algum vício que torne ilegal o ato administrativo, tem o dever de comunicar o fato à sua chefia imediata, para que o ato seja revisto de ofício pela autoridade competente.

De um modo geral, essa revisão pode se dar, por iniciativa da autoridade administrativa, por meio de fiscalização hierárquica, ou ainda por recursos administrativos. [06]

Nos termos do art. 114, da Lei nº 8.112/90, [07] a Administração deve rever seus atos, a qualquer tempo, quando eivados de ilegalidade, não havendo assim prazo para a eliminação dos atos inválidos.


3. O prazo para a revisão do ato de lançamento tributário

Indaga-se: em sendo detectado vício ou incorreção (omissão ou inexatidão) no ato de lançamento tributário, que torne ilegal o ato administrativo, há prazo para a Administração efetuar a sua revisão e correção?

Os princípios jurídicos da segurança e estabilidade devem nortear as relações jurídicas que não podem ficar paradas no tempo sem um termo final.

Segundo dispõe o art. 53 da Lei nº 9.784/99, [08] a Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, respeitados os direitos adquiridos.

Porém, se o ato possui defeito de formação, certamente que não lhe pode ser atribuída a estabilidade derivada nem do ato jurídico perfeito, nem do direito adquirido, além de a própria segurança jurídica restar prejudicada, por estar aberta a possibilidade de sedimentação de situações consolidadas ao arrepio da lei, sem o devido calço legal. [09]

Com fundamento no parágrafo único do art. 149, do CTN, em regra, a Administração fazendária tem prazo para efetuar a revisão, de ofício ou a pedido, do ato de lançamento tributário.

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Por sua vez, a revisão de ato de lançamento tributário pode resultar tanto a favor do sujeito passivo, quando há uma redução ou anulação do valor do crédito tributário exigido, como desfavorável a ele, ao se agravar a exigência tributária.

Tratando-se de revisão de ato de lançamento tributário, que resulte no agravamento da exigência, isto é, que seja desfavorável ao contribuinte, a exemplo da majoração do crédito tributário lançado, ou ainda da anulação total ou parcial do lançamento em que se necessite de um novo lançamento, dúvidas não há quanto à existência de um prazo decadencial de 5 (cinco) anos para que a Fazenda realize o ato de revisão, nos termos do art. 173 do CTN.

E na hipótese de se constatar um vício que torne nulo o lançamento tributário e que o resultado da revisão do ato seja favorável ao sujeito passivo, tem a Administração fazendária prazo para sanear o vício?


4. A revisão do ato de lançamento favorável ao contribuinte

Pode-se sustentar que, com base no referido parágrafo único do art. 149, do CTN, a Administração teria prazo para efetuar qualquer revisão do ato de lançamento tributário, independentemente de o resultado da revisão ser favorável ou não ao sujeito passivo. Assim, se a Administração, ou o contribuinte, permanecer inerte, por determinado prazo legal, o direito de revisar ou pleitear a revisão do ato estaria extinto pela decadência.

Nesse sentido, corrobora a tese dos que alegam que não faria sentido o contribuinte permanecer inerte, deixando de se manifestar no prazo legal, e após passar todo o trâmite administrativo, pudesse ainda requerer a alteração do ato administrativo. Até porque, para que serviria então todo o processo administrativo, com suas regras e prazos?

É cediço que para que o contribuinte possa usufruir o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, relevante que sejam cumpridas as regras processuais, em especial o prazo para interposição de recurso, disposto na legislação regente.

Por sua vez, a Administração deve primar pela legalidade de seus atos, não precisando aguardar o pronunciamento do administrado para rever e sanar ilegalidades. Assim, independente de provocação, deve Ela rever de ofício seus atos e declarar a nulidade ou anular os seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos, nos termos das Súmulas nº 346 e 473 do STF. [10]

Quando o prazo recursal se expira, ocorre o que se denomina de preclusão, e assim o pedido de revisão intempestivo deixa de ser conhecido. Contudo, quem perde prazo deixa de ter o direito de ver examinada a matéria substantiva, ou seja, a análise do mérito, e não ao exame em face de razões de legalidade do ato. Desse modo, em sendo levantada alguma ilegalidade, a Administração não pode se escusar de saná-la sob o argumento de ter havido o transcurso de prazo, pois o ato nulo é declarado ou simplesmente reconhecido, não podendo ser convalidado. [11]

É o caso, por exemplo, de um contribuinte que após o trânsito em julgado administrativo, ou em fase de execução fiscal, venha a comprovar já ter efetuado o pagamento do tributo exigido, ou a existência de erro material, como a troca de números na soma do total devido. [12]

No mesmo sentido, pode-se afirmar que se um contribuinte vier a parcelar ou pagar um crédito tributário que demonstre posteriormente ser indevido, cabe à Fazenda Pública receber e analisar o pedido, não como recurso e sim como uma revisão de ato a pedido da parte interessada, limitando-se a análise quanto à legalidade do ato. [13]

Verifica-se assim se a obrigação tributária verdadeiramente existiu, para num segundo momento tratar do fato de o contribuinte ter "confessado" a dívida tributária, ou extinta a obrigação tributária pelo pagamento, sob pena de estar o Fisco se apropriando de algo que não lhe pertence, em flagrante violação ao princípio da legalidade.

Nesses casos, mesmo já transcorrido o prazo de 5 anos para qualquer ato de revisão, a Administração fazendária, após verificado a procedência das alegações, deve rever, de ofício ou a pedido, a ato administrativo. Isso porque, a obrigação tributária é uma obrigação ex lege, ou seja, o tributo somente é devido se estiver previsto em lei, nos termos do art. 3º do CTN. [14]

Disciplina ainda o art. 54 da Lei nº 9.784/99, [15] que o direito de a Administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, ocorrendo assim a chamada "convalidação tácita", salvo comprovada má-fé. Ou seja, todos os atos administrativos que sejam prejudiciais ao administrado podem ser revistos a qualquer tempo, pois não corre o prazo decadencial, assim como aqueles atos que lhe sejam favoráveis, porém praticados com má-fé.

Importante frisar que, no caso de ato praticado com má-fé, em sendo descoberta a prática pela Administração, terá ela prazo para se manifestar, porém a contar do conhecimento ou descoberta do ato e não da data em que o ato foi praticado. Assim, a partir de sua descoberta, inicia-se o prazo decadencial de 5 anos, porquanto não pode a Administração permanecer inerte após ter conhecimento do ato praticado com má-fé.

Nos termos do art. 65 da Lei nº 9.784/99, [16] tem-se também que os processos administrativos de que resultem sanções poderão ser revistos, a qualquer tempo, a pedido ou de ofício, quando surgirem fatos novos ou circunstâncias relevantes suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada. Ou seja, a prática de um ato de lançamento, com vícios de ilegalidade, resulta em uma sanção indevida ao contribuinte, passível de ser sanada a qualquer prazo.

Importante colocar ainda que o prazo extintivo, descrito no parágrafo único do art. 149 do CTN, refere-se especificamente ao direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário e de efetuar a sua revisão, e não para desconstituir ou desfazer um ato nulo, em favor do sujeito passivo, que pode ser realizado a qualquer tempo.

Desse modo, a Administração Fazendária deve rever, a qualquer tempo, seus atos eivados de ilegalidade, de ofício ou a pedido, quando os seus efeitos forem prejudiciais ou desfavoráveis ao contribuinte ou responsável, ou seja, não há prazo para assim proceder.


Referências

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 5ª ed., 1995, São Paulo: Atlas.

MACHADO, Hugo de Brito. Processo administrativo tributário, Caderno de Pesquisas Tributárias – nova série, n. 5, Coord. de Ives Gandra, São Paulo: Centro de Extensão Universitária/Revista dos Tribunais, 1999.

MEIRELLES, H. L. Direito administrativo brasileiro. 19. ed. Atualizada. São Paulo: Malheiros, 1994.


Notas

BRASIL. CTN. "Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: I - quando a lei assim o determine;". (grifamos)

(2) MACHADO, H. B. Obra citada, p. 141.

(3) BRASIL. CTN. "Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;"

(4) MEIRELLES, H. L. Obra citada, p. 566.

(5) UNIÃO. Lei nº 9.784, de 29/01/1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. "Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração." (grifos não do original)

(6) MEIRELLES, H. L. Obra citada, p. 185.

(7) UNIÃO. Lei nº 8.112, de 11/12/1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. "Art. 114.  A administração deverá rever seus atos, a qualquer tempo, quando eivados de ilegalidade." (grifos não do original)

(8) UNIÃO. Lei nº 9.784/99. "Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, (...) respeitados os direitos adquiridos."

(9) OLIVEIRA NETTO, Sérgio de. Inexistência de prazo decadencial para a declaração de nulidade de ato administrativo na Administração Pública Federal . Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 59, out. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/3295>. Acesso em: 11 out. 2009.

(10) BRASIL. STF. SÚMULA: "346 - A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PODE DECLARAR A NULIDADE DOS SEUS PRÓPRIOS ATOS" e 473 - A ADMINISTRAÇÃO PODE ANULAR SEUS PRÓPRIOS ATOS, QUANDO EIVADOS DE VÍCIOS QUE OS TORNAM ILEGAIS, PORQUE DELES NÃO SE ORIGINAM DIREITOS; (...)" Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula Acesso em: 11 out. 2009.

(11) DI PIETRO, M. S. Z. Obra citada, pp. 201-205.

(12) Nesse sentido, tem-se julgado do STJ afirmando que "o erro material não faz coisa julgada". No RMS 11111/RJ, Min. Rel. Eliana Calmon proferiu em seu voto: "Também é certo que a autoridade judicial pode, a qualquer tempo, impugnar o erro material, de ofício, porque o mesmo impede o trânsito em julgado. Entende-se por erro material aquele identificado a olhos vistos, sem interpretação alguma, sem ilações ou juízo de valor. É o erro de grafia, troca de números, enfim, o equívoco meramente gráfico." (grifamos)

(13) HABLE, José. O pedido de reconsideração no processo administrativo. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1979, 1 dez. 2008. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/12031>. Acesso em: 11 nov. 2009.

(14) BRASIL. CTN. "Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada." (grifos não do original)

(15) UNIÃO. Lei nº 9.784/99. "Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé."

(16) UNIÃO. Lei nº 9.784/99. "Art. 65. Os processos administrativos de que resultem sanções poderão ser revistos, a qualquer tempo, a pedido ou de ofício, quando surgirem fatos novos ou circunstâncias relevantes suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada."

Sobre o autor
José Hable

Auditor Fiscal da Secretaria de Fazenda do Distrito Federal. Conselheiro e Presidente do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais (TARF). Mestre em Direito Internacional Econômico pela Universidade Católica de Brasília. Pós-graduado em Direito Tributário, com o título de especialista docente em Direito Tributário, pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal – AEUDF e Instituto de Cooperação e Assistência Técnica – ICAT (2000). Graduado em Direito pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília – CEUB (1999). Graduado em Administração de Empresas pela Faculdade Católica de Administração e Economia - FAE (1990). Graduado em Agronomia pela Universidade Federal do Paraná UFPR (1990). Professor de Direito Tributário. Autor de livros.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HABLE, José. O prazo para a revisão do ato administrativo quando favorável ao contribuinte. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2353, 10 dez. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13990. Acesso em: 25 dez. 2024.

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