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A ilegalidade da exigência de contratação de provedor de acesso à internet para conexão com tecnologia ADSL

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4. DA DEFESA DOS PROVEDORES E OPERADORAS DE TELEFONIA.

Em Ação Civil Pública pioneira sobre o tema aqui exposto, movida pelo Ministério Público Federal de Bauru-SP, subscrito pelo Procurador da República Pedro Antônio de Oliveira Machado contra a Telefônica (Telesp) e a ANATEL, nos autos do processo n° 2002.61.08.004680-9, a Associação Brasileira dos Provedores de Acesso, Serviços e Informações da Rede Internet (ABRANET), interveio no processo na qualidade de assistente, face o seu interesse na resolução da demanda.

Desta feita, foi prolatada sentença condenando a Telefônica a suspender a imposição de contratação de provedores de acesso para que o usuário tivesse acesso ao serviço de internet Speedy, decisão a qual foi recorrida pelas demandadas.

A ABRANET, por seu turno, traz a lume argumento de bastante relevância em defesa dos provedores de acesso à internet. Eduardo Fumes Parajo, presidente da ABRANET afirma que "os provedores estão do lado dos usuários" e que "existe um impeditivo legal para evitar a verticalização e o monopólio deste mercado. O custo da conexão à internet está lá e o setor de provimento de acesso investiu muito neste serviço. Isso deve ser lembrado". Crê ainda o representante da categoria ser um equívoco achar que os preços aos usuários finais seriam reduzidos, já que os custos de serviços de valor agregado prestados pelos provedores - como suporte, conteúdo e e-mail, entre outros - teriam que ser repassados à operadora de telecomunicações.

Em consonância com os argumentos da ABRANET, a ANATEL afirmou nos autos do Agravo de Instrumento n° 2004.01.00.019097-0/GO que a inexigência de contratação de provedores de acesso retira das empresas provedoras de conexão à internet serviço legalmente deferido a elas, causando-lhes prejuízos e desestruturação de suas finanças, afetando a economia e, mais, contribuindo para o aumento do desemprego no país.

Em verdade, aquela associação juntamente com a autarquia federal pugnam para que seja observado o princípio da livre concorrência, corolário da ordem econômica constitucional previsto no art. 170, inciso IV e art. 173, §4°, da Constituição Federal de 1988, o qual costuma ser identificado com a liberdade de atuar nos mercados buscando a conquista de clientela, com a expectativa de sua aplicação levar os preços de bens e serviços, fixados pelo jogo dos agentes em disputa, a níveis razoavelmente baixos, chegando no caso extremo de concorrência perfeita, a se igualarem ao custo marginal do produto. Aponta-se, no entanto, que essa liberdade jurídica de conquista de clientela pelos concorrentes deve somar-se a liberdade dos consumidores de usufruírem de alternativas. (NUSDEO, 2007, p.138)

Não há dúvida de que em sendo considerada a desnecessidade de contratação de provedores de internet para que seja realizada a conexão à internet de banda larga ADSL, muitos provedores decretariam falência, principalmente os pequenos provedores, bem como se extinguiriam os recursos para investimentos em tecnologias para o aperfeiçoamento dos serviços por eles prestados. Inclusive estimularia o monopólio (?) do acesso à internet às operadoras de telecomunicação.

E o aviso foi dado. Após a sentença, do processo de n° 2002.61.08.004680-9, que determinou que a Telefônica suspendesse a imposição de contratação de provedores de acesso aos consumidores do serviço Speedy, em Bauru-SP, a mesma enviou comunicado aos seus clientes fornecendo-lhe login e senha para que tivessem acesso à internet, contudo, alertando que lhes seria cobrada uma taxa de R$ 8,70, entretanto, sem informar se seria uma taxa mensal ou única.

Tratou-se de elevação do preço do serviço sem justa causa, violando desta forma o previsto no art. 39, X, do Código de Defesa do Consumidor. O fato ensejou sanções pela Secretaria Nacional de Direito Econômico (SNDE) e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) já que explícito o aumento abusivo dos lucros da fornecedora, ante a inexistência de custo adicional para que esta disponibilize a conexão à internet aos consumidores.


5. DA IMPROPRIEDADE DAS ALEGAÇÕES DAS FORNECEDORAS.

Ante as alegações retromencionadas, aparentemente a operadora de telecomunicação estaria livre para cobrar o valor que lhe aprouvesse pelo acesso à internet. Errado. Esta é a ideia que os provedores querem que os consumidores creiam.

A ANATEL, no uso de suas atribuições, têm o dever de regular e fiscalizar as atividades das concessionárias de serviços de telecomunicação, inclusive quanto às práticas e preços por elas empregadas.

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Vale salientar ainda que o CADE, autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça, detém a competência de órgão de combate às infrações à ordem econômica, tanto preventiva quanto repressivamente. Atuando inclusive sempre que caracterizar-se imposição de preços excessivos ou do aumento injustificado de preços, além de outras circunstâncias econômicas e mercadológicas relevantes, conforme disposição do art. 21, § único, da Lei n° 8884/94.

Ademais, sobre o caput do art. 170 da Constituição da República o Supremo Tribunal Federal já deliberou em Ação Direita de Inconstitucionalidade chegando ao seguinte entendimento, no que se refere ao combate ao abuso do poder econômico:

"Em face da atual Constituição, para conciliar o fundamento da livre iniciativa e do princípio da livre concorrência com os da defesa do consumidor e da redução das desigualdades sociais, em conformidade com os ditames da justiça social, pode o Estado, por via legislativa, regular a política de preços de bens e de serviços, abusivo que é o poder econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros." (ADI-QO 319, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 30/04/93).

Não obstante o princípio da livre concorrência e o da livre iniciativa, citados pelo eminente Ministro no julgado acima, figurarem no texto constitucional como princípios norteadores da ordem econômica, deve-se tomar cuidado quando estes por ventura venham a confrontar com o direto à proteção dos consumidores. Demais se do confronto provier prática abusiva contra o consumidor, qual seja, pagar em dubiedade pelo mesmo serviço.

Ensina o insigne José Afonso da Silva [p.792, 2006] que o princípio da livre iniciativa é a liberdade de desenvolvimento da empresa no quadro estabelecido pelo Poder Público, e, portanto, possibilidade de gozar das facilidades e necessidade de se submeter às limitações postas pelo mesmo. No entanto, será ilegítima sua arguição quando exercida com o objetivo de puro lucro e realização pessoal do empresário, afastando assim o fundamento de justiça social mediante a abusividade do poder econômico.

Enquanto que a livre concorrência, constante no art. 170, inciso IV da Carta Magna, visa a repressão à dominação de mercados e consequente eliminação da concorrência, ambos mediante abuso do poder econômico, preconizada no art.173, §4º, do writ.

Os dois princípios se complementam no mesmo objetivo. Visam tutelar o sistema de mercado e, especialmente, proteger a livre concorrência contra a tendência açambarcadora da concentração capitalista.

Entretanto, salienta o mesmo autor que, "na verdade, não existe mais economia de mercado nem livre concorrência, desde que o modo capitalista evoluiu para as formas oligopolistas" [p.793, 2006].

Deve-se ter em mente, primeiramente, que as empresas de telefonia já possuem o monopólio natural dos serviços de telecomunicação, inclusive quanto à prestação do serviço de conexão à internet via ADSL. Isto não quer dizer que não haja concorrência, pois se a concessionária do serviço de telecomunicação vier a cometer abusos no exercício da concessão, poderá a Administração retirá-la da empresa. Assim, esta para manter sua continuidade na prestação do serviço, deve pautar-se no interesse da Administração, bem como investir em seu aprimoramento e desenvolvimento uma vez que é ciente que se ela não o fizer, outras empresas farão com o intuito de obter a concessão.

Deste modo, no que atinge o cerne da questão aqui abordada, não há o menor cabimento na afirmação dos provedores de que sua inexigibilidade causaria o monopólio da prestação de serviço de comunicação pelas telefonias. O que ocorre em verdade é a inviabilidade da concorrência por motivos econômicos e/ou inviabilidade técnica para tanto.

A ausência de concorrência explica a gestão dos preços cobrados pelo serviço das prestadoras de telecomunicação, quando, por exemplo, o serviço Velox, prestado pela Telemar, cobra no Rio de Janeiro-RJ o valor de R$ 79,90 pela velocidade de 1Mbps, e está atualmente oferecendo promoção de R$44,90 para este plano até maio/09, e em Natal-RN o valor de R$ 72,90 pela velocidade de 300Kbps. Enquanto que naquela cidade o Serviço GVT, concorrente, tem plano de 1Mbps por R$ 49,90, na cidade do Natal não possui concorrente à Telemar, a não ser nas demais espécies de conexão à internet: cabo, rádio, satélite, etc.

Quanto à redução dos investimentos na área, ora, os provedores de acesso simplesmente alugam a infra-estrutura das operadoras de telecomunicação, não podendo se falar assim que a concorrência entre aqueles venha a estimular estas a investirem em pesquisa e desenvolvimento de suas operações. Isto é, se há uma preocupação quanto ao monopólio destas prestadoras de serviços de telecomunicação, cabe ao Estado, bem como com o auxílio da ANATEL, promover soluções para que outras empresas possam prestar serviço de telecomunicação para concorrer niveladamente com as preexistentes.


6. CONCLUSÃO

Este artigo teve o intuito de demonstrar e denunciar a prática abusiva de "venda casada" exercida pelas empresas prestadoras de serviço de telecomunicações, ao exigirem dos consumidores que contrataram com elas o serviço de conexão à internet, a contratação de provedor de acesso para que pudessem utilizá-la, bem como ante a inércia da ANATEL permitindo tal prática.

Pode-se, outrossim, verificar a ilegalidade da referida exigência tanto da forma técnica, pois que a transmissão de dados é feita pela estrutura daquelas empresas sem a necessidade de interferência dos provedores de acesso, quanto da forma jurídica; seja através da lei – no caso da Lei Geral de Telecomunicações, que é clara quanto à vinculação dos serviços a serem prestados por cada empresa –, seja através de princípios constitucionais – ante a impropriedade da alegação das fornecedoras de que haveria violação da livre concorrência, o que ficou comprovado, do contrário, não haver qualquer violação ao princípio mencionado; ou até através da utilização da análise econômica do direito para se chegar compreender a inteligência e a vontade da lei.

Assim, a empresa provedora do serviço de conexão à internet não deve coagir, por qualquer meio ou artifício, o consumidor a contratar os serviços de um provedor de mero conteúdo, por caracterizar a repudiada prática de "venda casada" de produtos. Deve ser ressaltado que não se está obrigando a empresa de telecomunicação a prestar nenhum serviço adicionado, mas, tão-somente, o serviço técnico, físico de conexão à rede de computadores, incluindo a disponibilização dos protocolos de internet (I.P.), autenticação e autorização dos usuários. Desse modo, se o consumidor necessitar de algum serviço de valor adicionado, poderá buscar uma empresa provedora, prestadora de serviço de valor adicionado (ACP. Sentença. Nº 2003.17089-4. 2ª Vara da Justiça Federal de Goiás).

É de louvar-se aqui a iniciativa do Ministério Público em afrontar empresas do porte da "Telefônica", em defesa do consumidor, que pouco pode se defender de cláusulas abusivas constantes dos chamados contratos de adesão.

Espera-se que essas investiduras dos parquets não se atenham ao âmbito estadual, mas que em breve possam ser apreciadas pelos tribunais superiores a fim de consolidar, erga omnes, a prática aqui denunciada como vedada em nosso ordenamento jurídico.


REFERÊNCIAS

MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais. 4ª ed. 2002.

NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços Públicos & Relação de Consumo. Curitiba: Juruá, 2006.

NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva. 2ª ed. 2005.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros. 27ª ed. 2006.

TANENBAUM, Andrew Stuart. Computer Networks. Rio de Janeiro: Campus. 4ª ed. 2004.

MOREIRA, Daniela. IDG NOW!. ABRANET diz que ausência de provedor não vai baratear banda larga. Disponível em: <http://www.saojosedoscampos.com.br/consumidor/index.php?id=20764&cat=39>. Acesso em: 23 jul. 2009.

______. IDG NOW!. ABRANET diz que ausência de provedor não vai baratear banda larga. Disponível em: <http://idgnow.uol.com.br/telecom/2007/08/28/idgnoticia.2007-08-28.7511880983/>. Acesso em: 23 jul. 2009.

NUSDEO, Ana Maria de Oliveira apud CORDEIRO, Rodrigo Aiache. Poder Econômico e livre concorrência: uma análise econômica na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 2007. p. 138. Dissertação: Universidade Presbiteriana Mackenzie. São Paulo. Disponível em: <http://mx.mackenzie.com.br/tede/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=512>.Acesso em 23 jul. 2009.

RONDON, Claudia. Speedy inicia cobrança de "taxa do provedor". Disponível em: <http://info.abril.com.br/aberto/infonews/052008/30052008-16.shl> Acesso em: 22 jul. 2009.


Notas

  1. Conceitua o SCM a Resolução 272/01 em seu artigo 3°, conforme segue: Art. 3º. Serviço fixo de telecomunicações de interesse coletivo, prestado em âmbito nacional e internacional, no regime privado, que possibilita a oferta de capacidade de transmissão, emissão e recepção de informações multimídia, utilizando quaisquer meios, a assinantes dentro de uma área de prestação de serviço.
Sobre a autora
Aruanã Barbosa de Morais Arantes Alcoforado

Bacharel pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALCOFORADO, Aruanã Barbosa Morais Arantes. A ilegalidade da exigência de contratação de provedor de acesso à internet para conexão com tecnologia ADSL. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2435, 2 mar. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14404. Acesso em: 17 nov. 2024.

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