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A incidência de contribuição previdenciária no aviso prévio indenizado

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É inconstitucional a norma proposta pelo Decreto nº 6.727/09, sobretudo por ter proposto alteração de ordem tributária, quando, conforme os ditames constitucionais, tais alterações somente podem ser realizadas por meio de lei complementar.

1 INTRODUÇÃO

Com o advento do Decreto nº 6.727/09, houve a alteração do dispositivo da alínea "f", inciso V do artigo 214 do Decreto n.º 3.048/99, vindo a modificar a aplicabilidade da contribuição previdenciária em face do instituto do aviso prévio indenizado, já que excluiu tal parcela do rol de verbas que não integram o salário-de-contribuição.

Em resumo, de forma bastante direta e objetiva, a supracitada norma excluiu a alínea "f" do inciso V do artigo 214 do Decreto 3.048/09, fazendo com que a grafia ali prevista (aviso prévio indenizado) viesse a compor o salário-de-contribuição para todos os efeitos, inclusive, e especialmente, para o efeito tributável, já que, com a alteração, a verba indenizada do aviso prévio passou a sofrer incidência de contribuição previdenciária.

Nesta linha, o presente estudo, em seu primeiro tópico, analisa e preceitua algumas considerações acerca do aviso prévio, especialmente em sua modalidade indenizada, fazendo ainda uma análise acerca de sua natureza jurídica, ou seja, de sua característica indenizatória, como o próprio nome indica. Além disso, demonstra-se a interdisciplinaridade do tema, já que envolve diferentes ramos do direito. Tudo isso, no intuito final de angariar argumentos para ensejar o quão equivocada se demonstrou a alteração proposta pela novel norma processual, sobretudo no que se refere à sua inconstitucionalidade.

Em seguida, já dentro do segundo tópico, o estudo em tela propõe uma investigação acerca da incidência de contribuição previdenciária em face das parcelas de natureza indenizatória, partindo-se do pressuposto de que, em verdade, apesar da alteração proposta pelo Decreto nº 6.727/09, a natureza indenizatória da parcela do aviso prévio indenizado se manteve incólume, sendo, portanto, impossível sua tributação, tal como as demais parcelas indenizatórias encontradas no inciso V do artigo 214 do Decreto nº 3.048/99. Nesse contexto, o estudo também passa pela verificação jurisprudencial do tema proposto, sobretudo para firmar e justificar o entendimento conclusivo do presente texto.

Seguindo na análise do tema, a terceira parte deste estudo salienta o ponto cerne da discussão, concluindo pela inconstitucionalidade da norma proposta pelo Decreto nº 6.727/09, sobretudo por ter proposto alteração de ordem tributária, quando, conforme os ditames constitucionais, tais alterações (de ordem tributária) somente podem ser realizadas por meio de Lei Complementar. Em palavras mais claras, todo arcabouço analisado no presente trabalho objetiva trilhar entendimento desconforme com o novel decreto, com base não somente na equivocada alteração da natureza jurídica da parcela do aviso prévio indenizado, como também na forma inadequada e, pois, inconstitucional com que foi imposta.


2 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO AVISO PRÉVIO

Nas relações de emprego, quando uma das partes deseja rescindir, sem justa causa, o contrato de trabalho por prazo indeterminado, deverá, antecipadamente, notificar à outra parte, ou seja, deverá avisá-la previamente, para evitar a surpresa na ruptura do contrato de trabalho, possibilitando ao empregador o preenchimento do cargo vago e ao empregado uma nova colocação no mercado de trabalho.

O aviso prévio tem relevância para a legislação trabalhista, nos seus atuais desdobramentos, sob a ótica da proporcionalidade ao tempo de serviço, idade do trabalhador e da simetria e da isonomia das partes quando da sua concessão na rescisão do contrato de trabalho. A finalidade do aviso prévio, portanto, é de não deixar o empregador desamparado quando da ruptura do contrato de trabalho promovida pelo empregado; de outro norte, como dito anteriormente, o objetivo também é não deixar o empregado desamparado, neste caso, quando o desejo de rescisão parte do empregador. Enfim, assegurou-se às partes, igual e reciprocamente, o direito unilateral de manifestar sua vontade de rescindir o contrato de trabalho, isso mediante a figura do aviso prévio.

Neste contexto, DOMINGOS SÁVIO ZAINAGHI [01] define o aviso prévio como "a comunicação que uma das partes do contrato de trabalho deve fazer a outra, de que pretende rescindir a avença". De modo bastante semelhante, SERGIO PINTO MARTINS [02] ensina que:

[…] é a comunicação que uma parte do contrato de trabalho deve fazer a outra de que pretende rescindir o referido pacto sem justa causa, de acordo com o prazo previsto em lei, sob pena de pagar uma indenização substitutiva.

Como bem apontado por AMAURI MASCARO NASCIMENTO [03], o instituto conceitua-se como a:

[…] comunicação da rescisão do contrato de trabalho pela parte que decide extingui-lo, com a antecedência a que estiver obrigada e com o dever de manter o contrato após essa comunicação até o decurso do prazo nela previsto, sob pena de pagamento de uma quantia substituta, no caso de ruptura do contrato […]

Ainda sob a ótica do supracitado autor, o aviso prévio tem, desse modo, "tríplice caráter: comunicação, tempo e pagamento".

O estudo da atual concepção do aviso prévio e da análise dos conceitos dos grandes doutrinadores acerca do tema permite-nos afirmar que o aviso prévio de iniciativa do empregado é a exteriorização do seu exercício de liberdade de trabalho. Porém, para se valer de tal liberdade, ele deve observar os prazos estipulados, sob pena de indenização substitutiva ao empregador. De outro lado, o aviso prévio de iniciativa do empregador nada mais é do que o exercício limitado de seu poder potestativo, limitado em razão da necessária observância do quanto prescrito em lei, já que, ao dispensar o empregado, o patrão deve comunicá-lo com antecedência mínima prevista legalmente, sob pena de indenizá-lo.

Com força do quanto previsto pela Constituição Federal de 1988, atualmente a duração do aviso prévio é de 30 (trinta) dias, independentemente do tempo de serviço do empregado na empresa e da forma de pagamento do salário. Neste sentido, o aludido mestre, AMAURI MASCARO NASCIMENTO, assim leciona:

Trata-se de uma nova concepção sobre a duração do aviso prévio, agora variável. A CLT previa dois prazos: 30 dias como regra geral e 8 dias para pagamento efetuados por semana ou tempo inferior; com o novo principio constitucional a duração mínima é de trinta dias. Foi revogada a duração de 8 dias. Os empregados que ganham por semanal ou tempo inferior também terão direito ao aviso prévio de 30 dias.

Como se pode ver, portanto, o instituto em questão serve para amparar os pactuantes das relações empregatícias, de modo que é bastante uma breve leitura das considerações acima para se perceber o claro e único objetivo indenizatório da verba do aviso prévio.

Com efeito, apesar de parecer redundante, para fins de análise do presente estudo, partiremos do pressuposto de que o aviso prévio indenizado possui – de forma inegável – o caráter e a natureza de verba indenizatória.

Nesta linha de raciocínio, ou seja, conforme o pressuposto acima, temos que o aviso prévio em sua modalidade indenizada encontrava-se corretamente inserido no rol de verbas constantes no § 9º do artigo 214 do Decreto Regulamentador nº 3.048/99 [04], especificamente no inciso V, alínea "f", dado seu óbvio caráter indenizatório. Ora, por sua própria característica, condizente, inclusive, com as demais verbas ali constantes, ele não deve compor a base de cálculo do salário-de-contribuição e, portanto, não deve sofrer incidência de tributo (contribuição previdenciária).

Desse modo, a crítica proposta no presente estudo é em face do quanto preceituado pelo Decreto Regulamentador nº 6.727, de 12.01.2009 [05], que simplesmente revogou a alínea "f" do inciso V do § 9º do artigo 214 do Decreto nº 3.048/99, alterando o caráter indenizatório da parcela do aviso prévio indenizado, de modo que este passou a integrar ou compor o salário-de-conrtibuição do empregado, noutras palavras, passou a integrar a base de cálculo para incidência de contribuição previdenciária.

É certo que todas as verbas constantes no rol previsto pelo precitado § 9º, inciso V, do artigo 214 do decreto 3.048/99 são verbas de caráter indenizatório, ou seja, servem para reparar alguma perda ou repor qualquer redução pecuniária sofrida pelo empregado no decorrer da relação de emprego, ou ainda para auxiliar a manter a efetividade de tal relação, bem como o cumprimento das atividades que lhe são inerentes. Portanto, o aviso prévio indenizado, até então disposto na alínea "f" do aludido rol do artigo 214 do decreto 3.048/99, somente o integrava em razão de sua característica indenizatória.

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O que se está a dizer, enfim, é que a alteração proposta pelo decreto regulamentador de nº 6.727/09, qual seja, a exclusão da alínea "f" do rol de verbas indenizatórias em questão, implicou na alteração da natureza jurídica do instituto ali previsto, ou seja, alterou de modo totalmente transverso e inadequado a natureza jurídica da verba inerente ao aviso prévio indenizado, tornando-a verba de caráter remuneratório e fazendo com que ela compusesse o salário-de-contribuição e, assim, sofresse incidência de contribuição previdenciária.

O fato é que o presente estudo não se destina a analisar a incidência em si de contribuição previdenciária em face da parcela do aviso prévio indenizado, apesar de seu caráter notadamente indenizatório, mas, sim, o modo como fora feita a alteração legislativa para que tal incidência ocorresse, sobretudo considerando-se que a matéria detém caráter tributário, que, por previsão constitucional, somente pode ser regulamentada por Lei específica.

Neste contexto, percebe-se que o tema é por demais polêmico, razão pela qual, sobretudo pelo seu caráter multidisciplinar – já que envolve diversos ramos do Direito, quais sejam: Previdenciário, Tributário e Trabalhista –, o presente estudo se destina a analisá-lo de modo bastante amplo, o que significa que o assunto não será aqui esgotado, mesmo porque ele é por demais recente e ainda não encontrou assente definitivo nos campos doutrinários e jurisprudenciais. Importante frisar, ainda, que todas as considerações serão baseadas e analisadas sob o aspecto do segurado obrigatório, mais especificamente o empregado, sendo certo que, nas demais hipóteses de segurados, a modalidade do aviso prévio indenizado não influencia de forma preponderante. Mais uma razão, pois, para o tema não ser esgotado no presente estudo.


3 DA INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA EM FACE DE PARCELAS INDENIZATÓRIAS E DA NATUREZA INDENIZATÓRIA DO AVISO PRÉVIO INDENIZADO

O aviso prévio, como conceituação didática, é, indubitavelmente, uma forma de notificação, momento em que – como visto no intróito do presente estudo – uma das partes da relação contratual de trabalho cientifica a outra da rescisão do pacto laboral.

Neste particular, o estudo em tela destina-se a verificar a incidência de contribuição previdenciária em face de verbas que possuam caráter notadamente indenizatório, em especial o aviso prévio na modalidade indenizada. O fato é que, a natureza jurídica – pontue-se, desde já, indenizatória – do instituto do aviso prévio em sua modalidade indenizada, isto sem que se tenha que falar em qualquer vício de linguagem ou inobservância das normas formais da escrita, passou a ser considerada como se fosse verba remuneratória, vindo a integrar para todos os fins o salário-de-contribuição.

Dessa forma, ao iniciar o estudo da natureza jurídica do aviso prévio, é prudente vislumbrar que a questão deve ser analisada sob vários aspectos e visões. Nesse sentido, faz-se imperioso destacar o entendimento de MAURÍCIO GODINHO DELGADO [06], que assim aduz acerca do aviso prévio:

[…] é instituto de natureza multidimensional, que cumpre as suas funções de declarar à parte contratual adversa a vontade unilateral de um dos sujeitos contratuais no sentido de romper, sem justa causa, o pacto, fixando, ainda, prazo tipificado para a respectiva extinção, com o correspondente pagamento do período de o aviso […]

Nesta esteira, entende SÉRGIO PINTO MARTINS [07] que o aviso prévio consiste de natureza multifacetada. Vejamos:

A primeira é de comunicar à outra parte do contrato de trabalho que não há mais interesse na continuação do pacto. Num segundo plano, o aviso prévio também pode ser analisado como o tempo mínimo que a lei determina para que seja avisada a parte contrária de que vai ser rescindido o contrato de trabalho, de modo a que o empregador possa conseguir novo empregado para a função ou o empregado possa procurar novo emprego. Em terceiro lugar, diz respeito ao pagamento que vai ser efetuado pelo empregador ao empregado pela prestação de serviços durante o restante do contrato de trabalho, ou à indenização substitutiva pelo não cumprimento do aviso prévio por qualquer das partes. Há, assim, a combinação dos elementos comunicação, prazo e pagamento. (Grifos nossos).

Assim, verifique-se desde logo que tudo que será analisado neste tópico levará em consideração a ótica da segunda parte do terceiro ponto abordado pelo precitado autor na transcrição acima (parte grifada); em outras palavras, cuidará o presente estudo de analisar as acepções que envolvem o caráter indenizatório, ou seja, relativos ao pagamento em si do instituto do aviso prévio.

Neste prisma, e por ser de fundamental importância para o tema em questão, necessário se faz distinguir verbas salariais de verbas indenizatórias. Ora, indenização é a reparação de danos, enquanto que salário é a contraprestação pela realização de uma atividade ou serviço. Pontue-se, por oportuno, o entendimento de AMAURI MASCARO NASCIMENTO [08] no particular:

Não se confunde com salário a indenização de dispensa sem justa causa e outras, como diárias e ajuda de custo cuja natureza é também a de ressarcimento de gastos do empregado movimentando-se em serviço. Diárias e ajuda de custo são, portanto, indenizações. Chamam diárias quando reiteradas e ajudas de custo quando eventuais

Ao analisarmos com maior acuro as considerações do renomado autor acima, percebemos que somente devem sofrer incidência de contribuição previdenciária as grafias de caráter remuneratório, porque tais valores não tiveram o condão de reparar qualquer dano ou perda, mas, tão somente, de adimplir o serviço prestado pelo empregado, o que não ocorre com a verba de caráter indenizatório, que, por sua vez, tem a finalidade de recompor com pecúnia eventual perda sofrida pelo empregado em razão do exercício de sua atividade.

Com efeito, por opção legislativa, especificamente na Lei 8.212/1991 [09], que dispõe sobre a organização da Seguridade social e institui seu plano de custeio, temos que, em relação ao trabalhador empregado, somente há incidência de contribuição previdenciária em face das parcelas integrantes do seu salário-de-contribuição, conforme artigo 11, parágrafo único, alínea "c" da precitada Lei. Ainda em tal diploma legal, a grafia salário-de-contribuição é definida e conceituada em seu artigo 28, inciso I [10], que exclui o aviso prévio indenizado da sua composição, na certeza de sua natureza notadamente indenizatória.

Em resumo, temos que as verbas que sofrem incidência de contribuição previdenciária compõem o salário-de-contribuição e possuem caráter remuneratório, enquanto que, do contrário, a recíproca não é verdadeira, ou seja, as verbas de natureza indenizatória não compõem o salário-de-contribuição e, pois, não sofrem incidência de qualquer tributo, sobretudo, previdenciário.

Outro entendimento não pode ser concluído após uma simples análise das verbas consideradas pela legislação como isentas da incidência de contribuição previdenciária, estas previstas no § 9º do artigo 214 do Decreto nº 3.048/99, que segue abaixo transcrito, já que verificamos que em sua grande maioria são verbas de cunho indenizatório, e não remuneratório, pelo que não há que se falar em incidência de desconto, sobretudo a título de tributo, mais especificamente, de contribuição previdenciária, conforme acima prenunciado.

Assim, antes mesmo de verificarmos as grafias consideradas isentas pela legislação de contribuição previdenciária, ou seja, que não compõem o salário-de-contribuição conforme acima salientado, é importante destacar e repisar que o objetivo da percepção deste tipo de verba é exatamente a recomposição de um dano ou de uma perda sofrida, sendo certo, portanto, que não seria plausível se entender que, em face de uma verba com tais características, houvesse desconto a qualquer título, sobretudo tributário.

Oportuno, portanto, verificarmos o teor do § 9º do artigo 214 do Decreto 3.048/99 [11], especialmente em seu inciso V, para entendermos melhor o que será proposto na conclusão do texto ora analisado. Vejamos:

[…]

§ 9º Não integram o salário-de-contribuição, exclusivamente:

[…]

V - as importâncias recebidas a título de:

a) indenização compensatória de quarenta por cento do montante depositado no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, como proteção à relação de emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa, conforme disposto no inciso I do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;

b) indenização por tempo de serviço, anterior a 5 de outubro de 1988, do empregado não optante pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço;

c) indenização por despedida sem justa causa do empregado nos contratos por prazo determinado, conforme estabelecido no art. 479 da Consolidação das Leis do Trabalho;

d) indenização do tempo de serviço do safrista, quando da expiração normal do contrato, conforme disposto no art. 14 da Lei n° 5.889, de 8 de junho de 1973;

e) incentivo à demissão;

f) aviso prévio indenizado; (Revogado pelo Decreto nº 6.727, de 2009)

g) indenização por dispensa sem justa causa no período de trinta dias que antecede a correção salarial a que se refere o art. 9º da Lei nº 7.238, de 29 de outubro de 1984;

h) indenizações previstas nos arts. 496 e 497 da Consolidação das Leis do Trabalho;

i) abono de férias na forma dos arts. 143 e 144 da Consolidação das Leis do Trabalho;

j) ganhos eventuais e abonos expressamente desvinculados do salário;

j) ganhos eventuais e abonos expressamente desvinculados do salário por força de lei; (Redação dada pelo Decreto nº 3.265, de 1999)

l) licença-prêmio indenizada; e

m) outras indenizações, desde que expressamente previstas em lei;

[…]

(Grifos)

Destaque-se, a fim de verificar o quão determinante é a característica indenizatória da verba para que esta não tenha que sofrer a incidência de qualquer contribuição/tributação, que a alínea "m" do texto legal acima, amplifica de forma por demais subjetiva o rol de verbas que não devem compor salário-de-contribução, de modo que, para tanto, apenas faz uma única exigência, qual seja, que a verba detenha caráter indenizatório.

Portanto, após a mera leitura do texto legal acima, o que se infere é que o fato de a verba deter cunho indenizatório é fator determinante para que ela não integre o salário-de-contribuição, sendo isenta, portanto, para fins de incidência do tributo previdenciário.

É neste prisma, pois, que a revogação da alínea "f" acima transcrita se perfaz de modo um tanto quanto equivocado, eis que acarreta na integralização da verba do aviso prévio indenizado no salário-de-contribuição, vindo a transformar uma verba notadamente indenizatória em salarial, apenas para fazer incidir a contribuição previdenciária em face da mesma.

Inobstante a toda linha de argumentação travada, apenas para reafirmar o caráter não tributável da verba do aviso prévio em sua modalidade indenizatória, verifiquemos o teor da Lei 7.713/88 [12], a qual versa sobre o Imposto de Renda, onde podemos verificar que sequer tal tributo (imposto e renda) é aplicável ou considerado quanto se trata de aviso prévio indenizado. Vejamos:

Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:

[…]

V - a indenização e o aviso prévio pagos por despedida ou rescisão de contrato de trabalho, até o limite garantido por lei, bem como o montante recebido pelos empregados e diretores, ou respectivos beneficiários, referente aos depósitos, juros e correção monetária creditados em contas vinculadas, nos termos da legislação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço;

Demais disso, o texto da legislação acima ainda inclui na isenção os valores creditados nas contas do FGTS dos trabalhadores, isso, notadamente, dado seu caráter indenizatório, é claro. Neste particular, apesar de não haver qualquer incidência de tributo em face de tal verba fundiária – inclusive previdenciário – os valores relativos ao aviso prévio são contemplados em seu cálculo. Assim, para fins de cálculo da verba fundiária, o tempo relativo ao aviso prévio é levado em consideração, inclusive quando de sua modalidade indenizada, neste particular por força jurisprudencial.

Neste aspecto, a construção do entendimento jurisprudencial trilhou caminho diverso do quanto visto no presente estudo. Melhor esclarecendo, o fato é que a jurisprudência tem sido assente no sentido de determinar que o tempo relativo ao aviso prévio, ainda que na sua modalidade indenizada, integra, para todos os fins, o tempo de serviço do empregado.

Portanto, tal período seria observado para fins de contagem para aposentadoria do empregado, o que vem sendo utilizado como fundamento pela corrente que defende a alteração proposta pelo decreto nº 6.727/09, ou seja, que aprova a integralização do aviso prévio indenizado no salário de contribuição.

De toda sorte, pontue-se desde logo que, apesar do que vem sendo observado nas jurisprudências, o fato de o aviso prévio integrar ou não o tempo de contribuição ou ser considerado para fins de contagem do tempo de serviço e/ou para fins de cálculo do FGTS não implica e não autoriza a mudança de seu caráter indenizatório, pelo que, portanto, não há que se falar em incidência de contribuição previdenciária em face de tal verba sob esta justificativa, eis que por demais frágil e insubsistente, como se verá a seguir. Ora, não se pode alterar a natureza de uma verba somente em razão de sua integralização na composição de determinada base de cálculo, até porque, essencial e teleologicamente, a verba se manteve incólume.

3.1 Do entendimento jurisprudencial acerca do tema

A discussão jurisprudencial acerca do tema aqui proposto justifica o presente sub-tópico, na medida em que toda alteração da legislação que acarretou na revogação do quanto previsto pela alínea "f" do inciso V do artigo 214 do Decreto 3.048/99, ou seja, que fez com que o aviso prévio indenizado passasse a sofrer incidência de contribuição previdenciária, se justificou na alteração jurisprudencial que envolveu a parcela do aviso prévio, especificamente em sua modalidade indenizada, até porque, na modalidade trabalhada, não há dúvidas quanto à integralização do período e sua incidência para efeito de contribuição previdenciária.

Ocorre que o entendimento jurisprudencial há muito vem considerando o tempo relativo ao aviso prévio, em sua modalidade indenizatória, para fins de cômputo de várias outras verbas, dentre elas o FGTS e a indenização adicional de que trata o artigo 9º da Lei 6.708/79, sendo tais questões, inclusive, sumuladas pelo Tribunal Superior do Trabalho. Assim, é bastante uma simples verificação do quanto disposto pelas Súmulas de nº 182, 305 e 371 [13] para se perceber a intenção da referida corte superior. Vejamos:

Nº 182 AVISO PRÉVIO. INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA. LEI Nº 6.708, DE 30.10.1979 (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

O tempo do aviso prévio, mesmo indenizado, conta-se para efeito da indenização adicional prevista no art. 9º da Lei nº 6.708, de 30.10.1979.

Histórico:

Súmula alterada - Res. 5/1983, DJ 09.11.1983 Nº 182 O tempo do aviso prévio, mesmo indenizado, conta-se para efeito de indenização adicional do art. 9º, da Lei 6.708/79. Redação original - Res. 3/1983, DJ 19.10.1983 Nº 182 O tempo do aviso prévio, mesmo indenizado, conta-se para efeito de indenização compensatória do art. 9º, da Lei 6.708/79.

Nº 371 AVISO PRÉVIO INDENIZADO. EFEITOS. SUPERVENIÊNCIA DE AUXÍLIO- DOENÇA NO CURSO DESTE (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 40 e 135 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

A projeção do contrato de trabalho para o futuro, pela concessão do aviso prévio indenizado, tem efeitos limitados às vantagens econômicas obtidas no período de pré-aviso, ou seja, salários, reflexos e verbas rescisórias. No caso de concessão de auxílio-doença no curso do aviso prévio, todavia, só se concretizam os efeitos da dispensa depois de expirado o benefício previdenciário.

(ex-OJs nºs 40 e 135 da SBDI-1 – inseridas, respectivamente, em 28.11.1995 e 27.11.1998) (Grifos)

Quanto à prenunciada súmula 305, o entendimento do TST é no sentido de que "o pagamento relativo ao período de aviso prévio, trabalhado ou não, está sujeito à contribuição para o FGTS".

Dessa forma, indene de dúvidas que a intenção da atual jurisprudência é fazer integrar o período do aviso prévio indenizado no cômputo das demais parcelas, o que, certamente, ocasionou a alteração legislativa que ora se comenta.

O fato é que, em verdade, o que se percebe é que o intuito ainda trilha o caminho compensatório para o empregado, ou seja, a intenção é, na verdade, ampliar ao máximo o caráter indenizatório do aviso prévio, fato que se pode compreender com uma clareza ímpar quando se analisa com maior acuro as considerações e o teor das aludidas súmulas.

Com efeito, a interpretação a ser dada após a análise da suposta ampliação desejada pela jurisprudência, deve seguir a linha restritiva, ou seja, somente nos itens efetivamente abordados de forma reiterada e, pois, pacificadas. Em outras palavras, devem se restringir apenas nas hipóteses sumuladas, não cabendo qualquer extrapolamento de sua interpretação.

Ademais, é importante deixar claro que o simples fato de a jurisprudência ter encampado uma interpretação e uma aplicabilidade extensiva ao instituto do aviso prévio indenizado, por si só não enseja a alteração da característica indenizatória do instituto em si, de modo que este, em verdade, nuca perdera sua peculiaridade e característica indenizatória.

Outro caminho não pode ser verificado, como se observa da decisão [14] que abaixo segue:

RECURSO DE EMBARGOS. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. NATUREZA JURÍDICA. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. DESPROVIMENTO. O pré-aviso indenizado consiste em uma retribuição não resultante de um trabalho realizado ou de tempo à disposição do empregador, mas de uma obrigação trabalhista inadimplida. O EFEITO DE PROJEÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO INERENTE AO AVISO PRÉVIO, EM QUAISQUER DE SUAS MODALIDADES, NÃO DESVIRTUA A NATUREZA JURÍDICA QUANDO RETRIBUÍDO DE FORMA INDENIZADA. Muito embora não esteja o aviso prévio indenizado relacionado no § 9º do artigo 28 da Lei nº 8.212/91, o inciso I desse mesmo dispositivo legal definiu como salário-de-contribuição, para efeito de incidência da contribuição social, as importâncias recebidas para retribuir o trabalho por serviços prestados ou tempo à disposição de empregador. A par da natureza indenizatória do aviso prévio indenizado, como reparação de uma obrigação trabalhista inadimplida, não decorrente da realização de trabalho, tampouco de tempo à disposição do empregador. O advento do Decreto nº 3.048/99, que regulamenta a Lei da Seguridade Social, veio a reforçar o fato de o pré-aviso indenizado não integrar o salário-de-contribuição, ao assim dispor expressamente em seu artigo 214, § 9º, inciso V, alínea f, de modo a tornar manifestamente clara a isenção da importância recebida a título de aviso prévio indenizado para efeito incidência de contribuição previdenciária. Recurso de embargos não conhecido. (Grifos)

Assim, outro norte não há, senão aquele orientado pelo mestre JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, em oportuna consideração aos ensinamentos de OROZIMBO NONATO [15], na obra Comentários à Lei do Mandado de Segurança. Vejamos:

[…] Por outro lado o direito é sempre certo, as interpretações é que variam. E variam subjetivamente. Aquilo que a um juiz pode parecer certo e incontestável, a outro juiz, trabalhando de maior percuciência crítica ou menos armado de convicções doutrinárias, pode não parecer evidente. Assim o direito pode parecer certo e incontestável a um juiz e não o parecer a outro […]

A análise acima, portanto, reafirma a conclusão de que as meras alterações jurisprudenciais e específicas acerca da aplicabilidade da verba do aviso prévio indenizado não têm o condão ou a finalidade de alterar a natureza indenizatória de tal verba, fato que há muito vem sendo considerado nos julgados diversos que envolvem o tema, que, por sua vez, estão reafirmando a característica reparatória do instituto.

Neste sentido, em linhas de finalmente, vejamos o aresto [16] abaixo, o qual esclarece a impressão fidedigna acerca da interpretação acima:

EMBARGOS AVISO PRÉVIO INDENIZADO - CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA NÃO-INCIDÊNCIA. Os valores pagos a título de aviso prévio indenizado, por NÃO se destinarem a retribuir trabalho nem a remunerar tempo à disposição do empregador, não se sujeitam à incidência da contribuição previdenciária. Embargos não conhecidos. (Grifos)

Em resumo, portanto, não há que se falar na alteração legislativa proposta pelo decreto nº 6.727/09, especialmente pelo fato de ele sugerir alteração da natureza indenizatória do instituto do aviso prévio indenizado, vindo a fazer com que tal grafia sofra incidência de contribuição previdenciária e, portanto, promovendo alteração legislativa em face de matéria tributária, isso, por óbvio, de modo totalmente inadequado e equivocado, porquanto inobservados os ditames constitucionais específicos.

Sobre os autores
Victor Vigolvino Figueiredo

Advogado, graduado em Direito pela Faculdade de Alagoas – FAL, pós-graduado em Direito Previdenciário pela Faculdade Integrada Tiradentes - FITS, advogado associado do escritório ALNPP – Advogados

Jorge Valentim de Araújo

Advogado, graduado em Direito pela Faculdade Brasileira de Ciências Jurídicas –SUESC. Militar reformado. Pós-graduado em Direito Aeronáutico e Espacial pela Sociedade Brasileira de Direito Aeroespacial – SBDA

Francisco da Silva Carvalho

Advogado, graduado em Direito pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FIGUEIREDO, Victor Vigolvino; ARAÚJO, Jorge Valentim et al. A incidência de contribuição previdenciária no aviso prévio indenizado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2438, 5 mar. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14443. Acesso em: 5 nov. 2024.

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