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Reserva legal.

Questões pontuais do ponto de vista jurídico, especialmente em relação à região da campanha e fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul

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Agenda 05/03/2010 às 00:00

SUMÁRIO : Introdução. Reserva Legal. 1) Conceito, especificações de incidência, porcentagem e compensação. 1.1) Conceito jurídico de reserva legal. 1.1.1) "Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural". 1.1.2) "Excetuada a de preservação permanente". 1.1.3) "Necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, á conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção da fauna e flora nativas". 1.1.3.1) "Uso sustentável dos recursos naturais". 1.1.3.2) "Conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção da fauna e flora nativas".2) Questões controvertidas – Bioma Pampa. 2.1) Necessidade de cerco ao entorno da área de reserva legal. 2.2) Da necessidade de averbação da área de reserva legal junto a matrícula do imóvel. 2.2.1) Obrigatoriedade de averbação da área de reserva legal somente nos casos previstos em lei. 2.2.2) Obrigatoriedade indiscriminada de averbação da área de reserva legal. 2.2.3) Recomposição da área de reserva legal. Conclusão


Introdução

No início de 2010, fica cada vez mais premente a necessidade de esclarecimentos relativos à necessidade de averbação, na matrícula do imóvel rural, da área de reserva legal constante na propriedade, ainda que tenha havido prorrogação por mais três anos para que seja feita a averbação.

Ocorre que, apesar da legislação que obriga a averbação ter sido concebida pela Medida Provisória nº 2.166-67 de 2001, alterando o Código Florestal, Lei nº. 4771/65, inúmeros produtores rurais ainda não averbaram a área de reserva legal do seu imóvel, haja vista os numerosos problemas que este ato importará, quais sejam: restrição da propriedade, diminuição da produção, custos elevados, entre outros.

Para os produtores localizados no bioma pampa, a averbação da área de reserva legal ainda não foi levada a cabo de maneira plena, posto que existem fundadas dúvidas as quais a lei não esclarece. Revelam-se como questões frequentes, ofertadas pelo meio rural, indagações referentes ao fato da necessidade de cercamento da área de reserva legal, bem como o florestamento ou reflorestamento da mesma. Ainda, erigem-se dúvidas acerca da possibilidade de criação de gado nestas áreas.

No meio jurídico, as perquirições fundam-se em saber até que ponto é válida a sanção de multa imposta ao proprietário que deixar de averbar a sua área de reserva legal. Não são diferentes os anseios do meio acadêmico em descrever quando deve ser feita a averbação. Outrossim, existem inúmeras indagações, principalmente no âmbito dos registradores, a fim de se esclarecer qual o espírito da exigência de se dar existência registral da área referida.

Destarte, o texto a seguir será tratado com a devida parcimônia, necessária para analise pontual de cada problema existente. O estudo proposto será desenvolvido de forma a vincular o meio ambiente com o âmbito jurídico, se detendo principalmente, com a devida acuidade, na relação direta da área de reserva legal com o bioma pampa.


Reserva Legal

O conceito de área de reserva legal é encontrado no artigo 1º, parágrafo 2º, inciso III do Código Florestal Brasileiro, Lei nº 4771 de 1965, já alterado e tantas vezes remendado, atualizado e modernizado por inúmeras medidas provisórias.

Disciplina o referido mandamento que reserva legal é a área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.

1.1) Delimitando o conceito jurídico de reserva legal:

1.1.1) "Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural": temos que propriedade é uma extensão de terras, aonde um determinado sujeito possui título (domínio) e posse, ou apenas posse no caso de ter arrendado o imóvel. Já posse rural configura-se naqueles casos em que o indivíduo tem a posse, mas não possui o título, ou seja, o sujeito está utilizando o bem, mas não detém a propriedade do mesmo, uma vez que não tem o seu nome averbado na matrícula do imóvel junto ao registro de imóveis. A posse rural é facilmente identificável quando exemplificada em casos fáticos, especialmente na situação das pessoas que podem requerer o usucapião, ou seja, possuem a posse, mas ainda estão desprovidas do título (Registro do imóvel).

1.1.2) "Excetuada a de preservação permanente": Antes de adentrarmos na especificação do conceito, deve-se examinar, ainda que superficialmente, o que é uma área de preservação permanente.

A área de preservação permanente é encontrada tipificada nos artigos 2º e 3º do Código Florestal. É conceituada como sendo "uma área protegida coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas".

Diferentemente da área de reserva legal, a área de preservação permanente não precisa ser declarada, posto que sua concepção vem da lei, é automática, devendo ser respeitada por todos.

A norma que legisla, já conceitua e apresenta as áreas consideradas de preservação permanente, que são descritas da seguinte forma:

a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d''água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será:

1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d''água de menos de 10 (dez) metros de largura

2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d''água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura

3 - de 100 (cem) metros para os cursos d''água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura

4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d''água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura

5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d''água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros

b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d''água naturais ou artificiais;

c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d''água", qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura

d) no topo de morros, montes, montanhas e serras

e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na linha de maior declive

f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues

g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais

h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação

O parágrafo único deste artigo traz a proposição de que os planos diretores das cidades devem respeitar os limites impostos por este Código, bem como as regiões metropolitanas dos grandes centros devem seguir estas imposições ambientais.

Conclui-se, portanto, que a área de preservação permanente deve ser respeitada dentro da zona urbana. Na prática, o que se vê é que o Plano Diretor das cidades, quando este existe, prevê os limites, mas dado o infinito número de habitantes das grandes metrópoles, e o elevado percentual de pessoas de baixa renda, estas áreas acabam ocupadas de forma irregular, causando uma grande celeuma para o ente público, posto que para retirar as pessoas das áreas consideradas de preservação permanente, deve colocá-las em outra região, o que demanda grande investimento público. Como inexiste verba suficiente para realizar esta mudança, a área de preservação permanente acaba sendo desrespeitada.

A crítica não pode ficar restrita às grandes metrópoles, posto que as cidades do interior, principalmente aquelas de médio porte, já estão com suas áreas de preservação permanente invadidas pela população de baixa renda, principalmente em virtude do êxodo rural que se acentuou nas últimas décadas.

Como vimos, as áreas de preservação permanente estão conceituadas na lei e, portanto, tem sua obrigatoriedade concebida do texto legal. Logo, são automáticas. Contudo, é facultado ao Poder Público, através de ato administrativo (portaria, decisão, resolução...) declarar uma determinada área como de preservação permanente. Entretanto, esta declaração não pode ser discricionária, devendo seguir os requisitos impostos na lei, mais precisamente no artigo 3º e suas alíneas:

Art. 3º Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas:

a) a atenuar a erosão das terras;

b) a fixar as dunas;

c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;

d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares;

e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;

f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção;

g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;

h) a assegurar condições de bem-estar público.

Diferentemente da área de reserva legal, a área de preservação permanente pode ser suprimida em casos peculiares, estipulados no Código Florestal. Outra peculiaridade adstrita à APP e que difere da ARL é o fato de que a primeira pode ser acessada por pessoas e animais para obtenção de água, desde que não exija a supressão e não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa, enquanto a ARL deve ser preservada para a sua regeneração. Dessa forma, impende-se a conclusão de que em áreas florestais a ARL legal deve ser cercada, já no bioma Pampa, no nosso ponto de vista, não há esta necessidade. Contudo, este assunto será aprofundado no curso do texto.

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Fechada a lacuna acerca da APP, que foi aberta com intuito de possibilitar ao leitor uma visão superficial sobre o assunto, passa-se ao exame do tópico "b" do presente estudo.

A área de reserva legal deve ser delimitada no interior da propriedade, com a exclusão das áreas de preservação permanente, ou seja, as APPs devem ser excluídas da área total do imóvel, para o fim de quantificação da área reservada para a reserva legal.

Para chegarmos a porcentagem de área de reserva legal, que deve ser apartada da utilização no imóvel, deve-se atentar para alguns parâmetros estabelecidos por lei, quais sejam, a região em que este imóvel está localizado.

Dessa forma, foram estabelecidas as necessidades ou como a lei preferiu denominar, os limites, os quais abaixo são transcritos:

Existe uma escala legal, indicando a porcentagem que cada proprietário deverá reservar na sua propriedade para instituir a reserva legal. Essa parcela obrigatória é regida pelo artigo 16 e seus incisos do Código Florestal (Lei 4771/65):

- oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta localizada na Amazônia Legal;

O próprio Código Florestal traz em seu artigo 1º, parágrafo 2º, inciso VI, os Estados que constituem a Amazônia Legal, são eles: Acre, Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá e Mato Grosso e as regiões situadas ao norte do paralelo 13º S, dos Estados de Tocantins e Goiás, e ao oeste do meridiano de 44º W, do Estado do Maranhão.

II

 - trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de cerrado localizada na Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte por cento na propriedade e quinze por cento na forma de compensação em outra área, desde que esteja localizada na mesma microbacia, e seja averbada nos termos do § 7º deste artigo;

O destaque deste regramento fica por conta do fato de sua maleabilidade. Não se trata de uma norma rígida, pois admite que dentro do que foi estipulado (35%), um percentual pode se dar através de compensação ambiental. Assim, a exigência cogente ao proprietário é que 20% do seu imóvel deva ser reservado, mas os outros 15% exigidos por lei, podem ser compensados.

A compensação é realizada conforme preceitua o artigo 44, inciso 3º, do Código Florestal: se compensa a área de reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia.

O fato de não existir área apta dentro destes critérios não desobriga o proprietário que optou pela compensação, segundo o artigo 44, parágrafo 4º: Na impossibilidade de compensação da reserva legal dentro da mesma micro-bacia hidrográfica, deve o órgão ambiental estadual competente aplicar o critério de maior proximidade possível entre a propriedade desprovida de reserva legal e a área escolhida para compensação, desde que na mesma bacia hidrográfica e no mesmo Estado, atendido, quando houver, o respectivo Plano de Bacia Hidrográfica.

Na prática, a compensação pode se dar de três formas: com o proprietário adquirindo outra área, arrendando uma área sob regime de servidão florestal ou reserva legal, e por fim, através da aquisição de cotas de reserva florestal.

Primeira: o proprietário que buscar a compensação pode adquirir uma área dentro dos parâmetros descritos no inciso 3º, parágrafo 4º do artigo 44 da Lei. Dessa forma, aquele sujeito que não quer reservar parte de sua propriedade para reserva legal, por inúmeros motivos, mas principalmente pela produtividade e aptidão da terra para a lavoura, pode adquirir uma nova propriedade, respeitados os limites legais, e nesse novel imóvel instituir a sua área de reserva legal. Gize-se, ainda que evidente, que este novo imóvel deve conter a extensão de área que se busca compensar, sendo vedada uma área menor, mas nada impede uma extensão maior.

Para aqueles produtores que são detentores de terras férteis e com excelente relevo para o cultivo ou pecuária, esta seria uma excelente alternativa, mas que esbarraria, sem dúvidas, no alto valor que deveria ser investido na compra de uma nova área.

Segunda: O parágrafo 5º do artigo 44 do Código Florestal, prevê a possibilidade do sujeito que optar pela compensação, arrende uma área sobre o regime de servidão florestal ou reserva legal.

O texto legal é claro em relação ao arrendamento, podendo o proprietário de um imóvel arrendar uma área a fim de instituir a sua reserva legal. Esta situação pode resultar de inúmeros motivos, mas principalmente pelo fato da propriedade original estar destinada, em sua totalidade, para a lavoura ou pecuária, dando um excelente retorno ao produtor.

O arrendamento é uma boa alternativa ao produtor que pretende utilizar a totalidade de sua propriedade por um prazo determinado, ou seja, por estar cultivando uma determinada cultura, é sabedor que o seu cultivo esgotará a terra em um determinado prazo (desprezando a possibilidade de adubo e fertilizantes). Logo, este proprietário pode arrendar uma área pelo prazo que desejar, assim que terminado o prazo avençado, poderá desarrendar esta área utilizada para reserva legal, e instituir na sua propriedade, que não esta mais sendo utilizada na sua totalidade, a nova área de reserva legal.

Contudo, para produtores que não tem interesse em utilizar a sua propriedade por um prazo determinado, esta alternativa não se revela fática, pois irreal pensar que alguém estaria tendo despesas intermitentes com uma área que nunca utilizará.

A Servidão Florestal ocorre da seguinte forma: o proprietário de um imóvel institui na sua propriedade determinada área de servidão florestal e arrenda esta área a outro proprietário que não dispõe em seu imóvel da área de reserva legal.

Assim, aquele proprietário que por algum motivo não puder ou não quiser instituir no seu imóvel uma área de reserva legal, poderá arrendar de outro proprietário uma área que foi instituída como de servidão florestal.

Deve se elucidar que está área de servidão florestal quando instituída em uma propriedade, deve ser feita levando-se em conta a exclusão da área de reserva legal constante neste imóvel. Esta servidão deve ser averbada junto à matrícula do imóvel. Trata-se de um instituto de direito privado e, portanto, regulado pelo Código Civil.

Terceira: A terceira forma de compensação é feita através da aquisição de cotas de reserva florestal – CRF, disciplinada no artigo 44-B do Código Florestal. As Cotas de Reserva Florestal são títulos que representam área com vegetação nativa. Esses títulos são adquiridos por proprietários rurais que tenham ultrapassado o limite legal de desmatamento.

Uma determinada área de mata nativa dá origem a uma CRF. Cabe ao proprietário do imóvel rural em que se situa a área vinculada à CRF a responsabilidade plena pela manutenção das condições de preservação da vegetação nativa dessa área.
A CRF só pode ser utilizada para compensar reserva legal de imóvel rural situado no mesmo Estado e no mesmo bioma da área à qual o título está vinculado.

O parágrafo único do artigo 44-B dispõe que a regulamentação destas cotas disporá sobre as características, natureza e prazo de validade do título de que trata este artigo, assim como os mecanismos que assegurem ao seu adquirente a existência e a conservação da vegetação objeto do título.

Esta regulamentação está instituída no projeto de lei nº 5876/2005, que hoje encontra-se na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados no Congresso Federal.

O Projeto se perfaz da seguinte maneira:

"Proposta

O proprietário rural interessado na emissão de CRF deve apresentar ao órgão federal executor do Sisnama, por intermédio do órgão estadual competente, proposta acompanhada de:

- certidão atualizada da matrícula do imóvel expedida pelo serviço de registro de imóveis competente;

- cédula de identidade do proprietário, quando se tratar de pessoa física;

- ato de designação de responsável, quando se tratar de pessoa jurídica;

- certidão negativa de débitos do imóvel rural emitida pelo órgão federal competente;

- memorial descritivo do imóvel, devidamente georreferenciado na forma da legislação que regula os registros públicos, com a indicação da área a ser vinculada ao título.

Emissão

Aprovada a proposta, a CRF será emitida pelo órgão federal executor do Sisnama em favor de proprietário rural, identifiando:

- o número da CRF no sistema registro;

- o nome do proprietário rural da área vinculada ao título;

- a localização exata da área vinculada ao título;

- o bioma correspondente à área vinculada ao título;

- a dimensão da área vinculada ao título;

- a classificação da área;

Transferência

A CRF pode ser vendida ou doada a pessoa física ou a pessoa jurídica de direito público ou privado, mediante termo assinado pelo seu titular e pelo adquirente.

Admite-se a transferência de CRF para:

- compensação da reserva legal prevista no Código Florestal;

- proteção de áreas de interesse ambiental, a critério dos órgãos ambientais.

Cancelamento

A CRF pode ser cancelada somente nos seguintes casos:

- por solicitação do proprietário rural, em caso de desistência de manter áreas nas condições previstas;

- automaticamente, por término do prazo da servidão florestal;

- por decisão do órgão federal executor do Sisnama, no caso de degradação da vegetação nativa da área vinculada à CRF cujos custos e prazo de recuperação ambiental inviabilizem a continuidade do vínculo entre a área e o título.

O cancelamento da CRF utilizada para fins de compensação de reserva legal só pode ser efetivado se assegurada reserva legal para o imóvel no qual a compensação foi aplicada.

Crime ambiental

O projeto acrescenta à Lei de Crimes Ambientais (9605/98) pena de detenção de um a três anos ou multa, ou ambas, para quem degradar área de reserva legal ou utilizá-la em desacordo com as normas de proteção. Segundo o projeto, incorre nas mesmas penas quem degradar área vinculada a Cota de Reserva Florestal ou utilizá-la em desacordo com as normas de proteção. [01]"

A Cota de Reserva Florestal nada mais é do que a instituição de uma servidão florestal transformada em títulos. Na prática funciona da seguinte maneira: o proprietário de um imóvel institui uma servidão florestal em determinada parte do seu imóvel, excluída a sua reserva legal, e transforma esta área fruto da servidão em títulos, que podem ser comercializados ou doados.

A diferença marcante entre a servidão florestal passível de arrendamento e a servidão florestal negociável através de cotas, no nosso entender, é a responsabilidade pela preservação da área de servidão. Na servidão fruto de arrendamento, quem fica responsável pela área é o arrendatário, enquanto na servidão por cotas de reserva, quem fica responsável pela área é o proprietário que instituiu a servidão.

Destarte, aquele proprietário que não quiser ou não possuir área de reserva legal em sua propriedade, poderá adquirir cotas de reserva florestal a fim de compensar a inexistência no seu imóvel de ARL.

Apresentada as três formas de compensação da área de reserva legal, impõe-se mencionar que a lei consagra outro mecanismo que possibilita ao proprietário que não possui ou não quer instituir área de reserva legal cumprir a legislação.

Trata-se do dispositivo contido no artigo 44, parágrafo 6º do Código Florestal, o qual prevê a possibilidade do proprietário rural se desonerar da obrigação de compensar, desde que faça a doação ao órgão ambiental competente de área localizada no interior de unidade de conservação de domínio público, pendente de regularização fundiária.

Aquele produtor rural que não quiser instituir área de reserva legal em sua propriedade e nem desejar compensar esta área através das três possibilidades descritas a cima, pode cumprir a determinação legal, desde que doe ao Órgão Administrativo instituidor da Unidade de Conservação (IBAMA – federal, SEMA – estadual e órgão municipal) área condizente com o percentual exigido para reserva legal em sua propriedade, dentro de uma unidade de conservação e desde que esta área esteja pendente de regularização fundiária.

Destaca-se que apesar da lei não tratar essa possibilidade como uma forma de compensação, esta doação pode ser enquadrada sim como uma alternativa a fim de compensar a reserva legal. A lei trata esta doação como uma forma de desoneração do proprietário rural, mas na sua essência, reveste-se como uma modalidade de compensação da área de reserva legal que o proprietário não possui ou não quer instituir.

A Lei nº. 9985/2000, regulamentada pelo Decreto 4340/2002, disciplina as unidades de conservação, que podem ser exemplificadas como as áreas de proteção ambiental (APA), Parques Nacionais, Reservas Ecológicas... . A grosso modo, uma vez que esse ponto não é o centro do estudo, unidades de conservação pendentes de regularização fundiária são aquelas extensões em que o Poder Público instituiu como unidade de conservação, que dependendo do caso, pode haver a necessidade de ser realizada uma desapropriação, indenização ou remoção das populações que por lá habitavam.

Deste modo, se houver um Decreto consolidando aquela área como de unidade de conservação e nenhuma atitude positiva for tomada pelo Estado a fim de indenizar os proprietários ou remover as pessoas habitantes deste local (quando necessário, pois haverá casos em que é prescindível indenizar ou remover as pessoas), poderá considerar-se esta unidade de conservação como pendente de regularização fundiária.

Portanto, é concebido para aquele proprietário que não quer instituir no seu imóvel a área de reserva legal e nem tem interesse em compensar a referida área, a possibilidade de auxiliar o Poder Público através da injeção de dinheiro, ou seja, através de doação de áreas dentro de unidades de conservação pendentes de regularização fundiária.

Analisando o artigo em comento, sob o enfoque restritivo, percebe-se de forma singela, que a previsão contida no mesmo, diz respeito à possibilidade de um proprietário adquirir uma área dentro de uma unidade de conservação, já instituída pelo Estado, mas não efetivada, e doá-la para o ente público dando o domínio legal de forma plena ao Estado.

III

 - vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País; e

IV - vinte por cento, na propriedade rural em área de campos gerais localizada em qualquer região do País.

Na análise contextual destes incisos III e IV cumulados com os incisos I e II, percebe-se que os primeiros foram restritivos, demarcando de forma cabal a área em que pretendiam instituir os índices trazidos em seus bojos, enquanto os segundos são amplos e residuais, atingindo as demais regiões, que não aquelas abarcadas pelos primeiros.

O Brasil possui seis biomas, a saber: Pampa ou campos sulinos, que na lei vem conceituados como campos gerais, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Amazônico e Pantanal Mato-Grossense.

No Bioma Pampa, Bioma Mata Atlântica, Bioma Caatinga e Bioma Pantanal, o índice da propriedade destinado à reserva legal será de 20% (vinte por cento). Já no bioma Amazônico, a porcentagem da área de reserva legal é 80% (oitenta por cento).

Contudo, o problema que emerge é em relação ao Bioma Cerrado, pois parte dele encontra-se dentro da área do que a lei conceituou como Amazônia Legal. Dessa forma, quando a propriedade se encontrar no bioma cerrado dentro da área da Amazônia legal, esta terá que respeitar a porcentagem de 35% (trinta e cinco por cento) de área de reserva legal. Já se esta propriedade estiver situada dentro do bioma cerrado, mas fora da Amazônia legal, deverá respeitar o índice residual de 20% (vinte por cento) do total da propriedade para instituir a área de reserva legal.

O mapa fornecido pelo IBGE possibilita uma melhor compreensão da extensão e abrangência de cada bioma:

Os índices descritos acima e que são impostos para a constituição da reserva legal, ganham maior relevo e críticas quando analisados do seguinte ponto de vista: A restrição percentual legal impede a utilização da totalidade da propriedade. Dessa forma, em respeito aos parâmetros cogentes, temos que nas propriedades situadas dentro da Amazônia Legal, apenas 20% (vinte por cento) da extensão total da propriedade pode ser utilizada para cultivo ou criação. No Cerrado, localizado dentro da Amazônia Legal, apenas 65% (sessenta e cinco por cento) do imóvel pode ser usufruído e nos demais imóveis, localizados fora destas regiões, a fruição da propriedade passa a ser de 80% (oitenta por cento).

O avassalador número de criticas surge do fato de que a área de reserva legal deve ser demarcada tendo em vista a extensão total do imóvel, desprezando-se as áreas de preservação permanente. Ora, se um imóvel de 100 hectares possuir 30 hectares de área de preservação permanente, a porcentagem para auferir a área de reserva legal incidirá ainda assim sobre 100 hectares. Se considerarmos o percentual de 20% (vinte por cento), que é o mínimo, temos que a área de reserva será de 20 hectares. Logo, restará a extensão de 50 hectares para produzir, o que inviabiliza verdadeiramente a produção de qualquer produto agropecuário em uma propriedade.

Ao nosso sentir, o modelo mais adequado seria considerar as áreas de preservação permanente, permitindo que dentro destas áreas fosse instituída a reserva legal. Logo, a área de reserva legal poderia ser instituída dentro da área de preservação permanente, obrigando, neste caso, o proprietário a tornar intocável aquela área onde estivesse a reserva legal.

1.1.3) "Necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.": A reserva legal foi instituída com o espírito de ser o sustentáculo do meio ambiente em caso de esgotamento total dos recursos naturais de uma propriedade. Com isso, pensou o legislador em garantir um embrião dentro de uma área aonde fosse capaz que a própria natureza, por si só, se regenerasse em caso do resto da propriedade entrar em colapso ambiental.

A porcentagem prevista em lei foi o modo que o legislador encontrou como sendo o mínimo possível para possibilitar que a natureza inicie o seu processo de regeneração em caso de degradação total da propriedade. Assim, os limites estabelecidos no texto legal foram obtidos através de estudos realizados por técnicos na área, sendo este mínimo de reserva legal essencial para que a natureza, por desforço próprio, volte ao seu status quo anterior à agressão.

Fragmentando o texto em destaque temos que:

1.1.3.1) "Uso sustentável dos recursos naturais": A área de reserva legal não pode ter sua vegetação suprimida. Entretanto, a lei previu em seu artigo 17, parágrafo 2º a possibilidade do proprietário utilizar esta área, segundo o diploma legal "A vegetação da reserva legal não pode ser suprimida, podendo apenas ser utilizada sob regime de manejo florestal sustentável".

Portanto, a área de reserva legal é intocável para fins de alteração, mas pode ser explorada economicamente, através de manejo florestal sustentável, que tem como característica a extração da madeira sem o comprometimento do ecossistema florestal, o que repercute no baixo impacto sobre a floresta remanescente.

O manejo florestal sustentável se dá através de técnicas nas quais se busca balancear as características das propriedades e produtores (pequenas áreas de floresta), limitação de mão-de-obra e investimento) com as técnicas de manejo aplicadas, ou seja, ciclos de corte curto, intensidade de corte baixa e uso de tração animal para o arraste da madeira. Essa maneira de agir possibilita o crescimento da floresta mesmo diante das extrações que são feitas.

Exemplificativamente, o manejo florestal funciona respeitando os seguintes critérios: Baixo volume a ser extraído por hectare; Extração não mecanizada, com utilização de tração animal, o que gera menor dano ambiental pela não utilização da mecanização na fase de exploração; Planejamento cuidadoso com queda direcionada, proteção das árvores remanescentes e planejamento das trilhas de arraste.

Dessa forma o proprietário não fica engessado em relação àquela área de reserva legal. Contudo, a lei só previu o uso sustentável dos recursos naturais através do manejo florestal. Todavia, este Código abarca outros biomas que não possuem área florestal em sua essência, o que gera grande dúvida acerca de como usar, de forma sustentável, uma propriedade coberta em sua plenitude por campos nativos. O uso sustentável dos recursos naturais pode se dar através da coleta de frutas, extração de casca, raízes e insumos (como o látex), mas em relação aos campos do bioma pampa fica complexa a análise sobre a utilização de forma sustentável da região, pois nesta área só há pasto e gramíneas em quase toda a sua totalidade. Mas isso será tratado de forma restrita quando analisado o bioma pampa.

1.1.3.2) "Conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas": A palavra conservar vem adjetivada duas vezes, junto com a palavra proteção. Logo, a conclusão imperiosa que se deve abstrair é que a intenção do legislador com a instituição da reserva legal foi a de preservar aquela área restrita, pois só assim é possível reabilitar os processos ecológicos, conservar a biodiversidade e dar abrigo e proteção a fauna e flora silvestre.

Impende portanto, ao proprietário, no mister de sua qualidade, para que seja possível cumprir o zelo exigido por lei, salvo melhor juízo, cercar a área que delimita a reserva legal, pois só assim será possível que os processos naturais se estabeleçam e os cuidados devidos sejam efetivados.

O que a lei quis dizer com a expressão reabilitação dos processos ecológicos, foi a necessidade daquela natureza local restabelecer seu estado primitivo, readquirir o seu equilíbrio natural, sem a intervenção humana, tornar a natureza desta área nua e infanta, sendo que esta matéria já teve sua devida explicitação no momento em que tratou sobre os índices de reserva legal.

A biodiversidade pode ser conceituada, de forma latu sensu, como a vida no planeta. Já de forma restritiva, podemos configurá-la como a variedade genética dentro das populações e espécies, a variedade de espécies da flora, da fauna, de fungos macroscópicos e de microrganismos, a variedade de funções ecológicas desempenhadas pelos organismos nos ecossistemas; e a variedade de comunidades, hábitats e ecossistemas formados pelos organismos.

Portanto, a proteção da flora e da fauna já estariam envolvidas quando se tratou de biodiversidade, mas por opção o legislador, preferiu enquadrá-las de maneira enfática. Sinteticamente, flora pode ser comprendida como a vida vegetal e a fauna como a vida animal que habita uma determinada região. Cada região e cada bioma possuem sua fauna e flora de maneira peculiar, fato este que levou o legislador a adotar índices escalonados para fixação da área de reserva legal, pois existem regiões que se regeneram mais rápido do que outras.

Especificadamente, em relação ao bioma pampa, sua flora permite e necessita da integração do animal bovino, equino, ovino para que haja o perfeito equilibrio. Estes animais fazem as vezes de combatentes das espécies de gramineas invasoras. Deve-se ter muito cuidado quando se trata de conservação e, portanto, levar a cabo medidas que não são condizentes com a realidade, como por exemplo, o cercamento da área, que é um contrasenso à ideia fundadora da necessidade de instituição de área de reserva legal, como adiante será demonstado.

Sobre o autor
Luis Felipe Canto Barros

Advogado. Pós Graduado em Direito Ambiental pela PUCRS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, Luis Felipe Canto. Reserva legal.: Questões pontuais do ponto de vista jurídico, especialmente em relação à região da campanha e fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2438, 5 mar. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14454. Acesso em: 23 dez. 2024.

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